Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
SIMULADO STF DE 25 DE MAIO DE 2018 Voto De início destaco a valiosa importância da presente discussão. Este Tribunal, que possui a competência, e porque não dizer, possui o poder de criar precedentes, acaba sofrendo o overruling de forma indiscriminada e inclusive em alguns casos surge o efeito repristinatório de decisões. É o caso da antecipação da prisão antes do trânsito em julgado. A primeira vez que este Plenário manifestou-se acerca do princípio da presunção de inocência no caso de execução antecipada da pena foi em 28/06/1981, decidindo no sentido de que não é ilegal o mandado de prisão do órgão julgador de segundo grau que determina que se espeça contra o réu. No entanto, em 05/06/2009 essa Corte estabeleceu a exigência do trânsito em julgado da condenação para a execução da pena, assentando que, antes do trânsito em julgado, a prisão somente poderá ser decretada ou mantida a título cautelar. Passados 7 (sete) anos desse julgamento, no HC nº 126.292/SP, o Plenário admitiu a execução provisória do acórdão penal condenatório a partir do exaurimento dos recursos ordinários. Ou seja, houve efeito repristinatório dos entendimentos de 1981 até 2009, o que, ao meu ver, já reflete sinais de instabilidade sobre entendimento de princípio constitucional, que é a presunção de inocência. Dessa forma, ressalto que me alegra a ideia que devido a grande repercussão do debate, as capacitações realizadas ao longo da semana nessa instituição, e o consequente aprofundamento dos nobres julgadores para chegarmos a uma decisão justa e possível, dessa vez haja um precedente que perdure por mais tempo e de forma sólida. Dito isso, passo a votar as ADC’S 43, 44 e 54. Tratam-se de Ação de Constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, que diz que ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. Devido a decisão proferida pelo Supremo no Habeas Corpus 126.292, questiona-se a licitude da antecipação da prisão em segundo grau quando ainda há a possibilidade de recorrer. Como visto, até o HC 84078, esse tribunal decidia pela prisão apenas depois do trânsito em julgado, todavia reconhecendo a prisão cautelar e preventiva nos termos da lei. Em 17 de fevereiro de 2016, no julgamento da referida ação, relatada pelo Ministro Teori Zavascki, este E. Supremo Tribunal Federal passou a admitir que a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, mesmo que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não violaria o princípio da presunção de inocência. Como citado anteriormente, houve overruling, ou seja, foi possível a superação de um precedente criado pelo mesmo órgão. Apesar do lapso temporal entre uma decisão e outra ter sido, ao meu ver, estreito, reconheço os motivos que despertaram a presente discussão. Reconheço a desigualdade social e econômica que repercute na aparente possibilidade de apenas aquele indivíduo com condições financeiras poder usar de todos os recursos que tem direito. Também reconheço desproporcionalidade na possível decisão condenatória que proíbe prisão antes do trânsito em julgado frente ao farto número de acusados que estão presos sem, sequer, terem sido julgados. Concordo, ainda, quanto ao possível lapso temporal, que, de forma vasta, condena o indivíduo muito depois de cometido o crime, fazendo com que não haja os objetivos da pena que é de ressocialização, retribuição e prevenção. No entanto, apesar de reconhecidos estes pressupostos, entendo que este Tribunal, juntamente com o poder judiciário por inteiro e políticas públicas especializadas, já realizam esforços há tempos para um facilitado acesso à justiça e maior diligência. Dá-se isso por meio de por exemplo, a gratuidade da justiça, que segundo o novo CPC, só basta declaração, diminuindo o ônus da parte de provar que é pobre nas formas da lei. Além disso, a Defensoria Pública, apesar de assoberbada, tem articulado para tornar mais eficaz e ampla a sua abordagem. Esses são uns dos pressupostos que estão ao alcance do Poder Judiciário para corroborar em uma maior agilidade do processo e acesso à Justiça. Apesar de infeliz desigualdade econômica, baseada na 2ª geração de Direitos Humanos, essa Constituição possui o princípio de igualdade fundamentado já em seu art. 5º, caput, nos termos “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. Dessa forma, qualquer pessoa, seja ela rica ou pobre, se atendidos os requisitos formais exigidos, poderá ter seu processo conhecido no STJ e STF. Isso se deve ao fato de ser natureza do nosso ordenamento jurídico a presença de graus recursais. Por isso mesmo, entendo ser inválida a comparação com outros países que não possuem tal formato de organização judiciária. Se há em nossa Constituição Federal a disposição no artigo 5º, inciso LV, que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, deve-se entender que o direito recursal até onde for possível faz parte do devido processo legal, pois, no mesmo artigo da Constituição, dessa vez no inciso LIV, diz que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. Como citado na ADC 44, a interpretação não pode contrariar o sentido e o teor da lei, transformando-se em seu contrário. Curioso é quando é colocado neste pleno a ideia de que o dispositivo Constitucional trata do termo “culpado” e não “preso”. Ora, quando o artigo coloca “culpa”, mais se aproxima de prisão do que de liberdade. Entendo ainda que o legislador ao colocar que “ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória” assim o fez usando o termo culpado pra abranger todas as condenações possíveis na esfera do Direito Penal, seja ela condenatória a pagar multa ou medida restritiva de direitos. Interpreta-se, pois, o termo adequando à área do Direito. Nas ações em pleito, é cristalino que a interpretação correta é que “ninguém será condenado a pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado”. É um erro dizer que nos Tribunais Superiores não há exame sobre justiça ou injustiça das decisões proferidas pelas instâncias inferiores, haja vista que dosimetria e regime prisional são muitas vezes tão importantes quanto o julgamento que condena ou absolve. É que, apesar do número de absolvições materiais nesta Corte ser ínfimo, ainda assim reconhece-se a possibilidade de absolvição do condenado de instância inferior, e que caso não houvesse o conhecimento do seu caso neste Supremo, teria estes indivíduos sofrido sérias injustiças. Sei que o objeto desse julgamento não se dá quanto a possibilidade de recorrer em instância superior, mas sim quanto a prisão antecipada antes do trânsito em julgado, contudo, é necessário cogitar-se a situação falada anteriormente, de uma pessoa ser inocente, mas em instância de piso ter sido considerada culpada, ter começado a cumprir sua pena, seria mais inviolável ainda à sua dignidade humana. Não muito diferente é o caso de dosimetria de pena equivocada, que em instância inferior condena por grande quantidade de tempo, uma vez que em grau superior é esclarecida uma quantidade inferior e justa. E se a pena já tiver começado a ser executada? E se até chegar eminstância superior, este condenado já tiver cumprido uma pena ilegal, poderá a decisão proferida nesse Tribunal fazer com que este indivíduo receba de volta os anos perdidos em cárcere? Senhor presidente, é evidente que não. O Supremo Tribunal Federal, ao revelar fidelidade ao postulado constitucional do estado de inocência, não inviabiliza a prisão cautelar (como a prisão temporária e a prisão preventiva) de indiciados ou réus perigosos. No entanto, como dito outrora, quanto ao exacerbado número de presos provisórios no país, reitera-se que é um infortúnio não por falta de precedente jurisdicional, pois apesar do atual CPP não estipular prazos para a prisão preventiva; a jurisprudência, no entanto, tem fixado em 81 dias o prazo desse instituto até o final da instrução criminal. Normas constitucionais às vezes requerem regulação infraconstitucional, é o caso das de eficácia contida. Apesar do inciso LVII já produzir plenos efeitos desde sua publicação, há normas infraconstitucionais que facilitam seu entendimento. Segundo a Lei de Execução Penal, nos artigos 105 e 147, somente a sentença transitada em julgado que condena o réu marca o início da execução da pena privativa de liberdade. Nessa mesma lei, as penas de multa e medida de segurança só serão executadas pós sentença transitada em julgado (é o que diz os artigos 164 e 171 respectivamente). Nesse sentido, de acordo com o artigo 283 do CPP, ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva. Essas leis esclarecem o conteúdo do inciso LVII do artigo 5º. Em oposição a esse entendimento, não há disposição legal alguma que verse de forma clara acerca da possibilidade da execução antecipada da pena. É papel não só dos ministros do STF zelar pela Constituição, mas de cada um de nós. E nisso, não fala-se apenas de artigos dispostos, mas de princípios, seja o tão famigerado Princípio da Presunção de Inocência, seja o tão esquecido hoje, Princípio do In Dubio Pro Reo, e tantos outros que orbitam nesse julgamento. Quantos princípios constitucionais deveriam ser apontados nesta noite para que seja reconhecida a violação da Constituição se for decretada a possibilidade de execução antecipada da pena? O art. 283 do Código de Processo Penal é constitucional. A prisão antes do trânsito em julgado é que é inconstitucional. Se quiserem mudar isso dever-se-á mudar não somente o art. 283 do CPP, mas os 105, 147, 164 e 171 da Lei de Execuções Penais, e inclusive a Constituição, pois entendo clara a disposição no artigo 5º, LVII. Conhecidas as Ações de Declaração de Constitucionalidade e os direitos que nelas orbitam, acolho a ADC 43, 44 e 54. Ressalto que todas as decisões fundamentadas no Habeas Corpus nº 126.282 devem ser revistas por órgão competente. É o meu voto. Jordana Moraes. RESUMO PONTUAL DAS ADC’S 43, 44 E 54 ADC 43 (PEN) Facilita o aumento de presidiários A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 134, incumbia à Defensoria Pública a função de promover a defesa “dos necessitados”70. Assim, caso não se acolha o pedido de declaração de constitucionalidade do art. 283 do CPP, requer-se que a norma seja declarada ainda constitucional enquanto não cesse o estado de coisas inconstitucional que caracteriza o sistema carcerário brasileiro, de modo que, até lá, seja vedado o cumprimento antecipado da pena. Medidas alternativas à prisão previstas no art. 319 do CPP como mecanismo para se evitar o encarceramento provisório decorrente da condenação em segunda instância. (Entendo que tal medida alternativa deveria se dar apenas no âmbito de prisão preventiva.) Não pode retroagir para prejudicar o réu. A jurisprudência da Corte Europeia de Direitos Humanos e do Comitê de Direitos Humanos, em casos recentes, reafirmou a proibição de irretroatividade em relação a normas processuais87 Muitos desses recursos levam à absolvição do réu ou à alteração da pena a ser aplicada. Se a Corte entender que a presunção de constitucionalidade que recai sobre o art. 283 do CPP deve ora ser reafirmada, em cautelar, deveria – é o que ora se requer – determinar que novas execuções provisórias das penas de prisão não sejam deflagradas, e que as que já estiverem em curso sejam suspensas, libertando-se, até que a presenta ADC seja julgada, as pessoas que, por esse motivo, ora se encontram encarceradas. Presume-se a constitucionalidade que recai sobre o art. 283 do CPP em razão de sua evidente compatibilidade com o texto constitucional (artigo 5º, LVII, da Constituição Federal). Não sejam deflagradas novas execuções provisórias de penas de prisão e sejam suspensas as que já estiverem em curso, libertando-se, até que a presente ação seja julgada, as pessoas que ora se encontram encarceradas, sem que a respectiva decisão condenatória tenha transitado em julgado; subsidiariamente, caso essa Corte indefira o pedido anterior, requer-se seja realizada, em caráter cautelar, interpretação conforme a Constituição do artigo 283 do Código de Processo Penal, a fim de determinar, enquanto não se julgar o mérito da presente ação, a aplicação, por analogia, das medidas alternativas à prisão previstas no art. 319 do CPP em substituição ao encarceramento provisório decorrente da condenação em segunda instância; ADC 44 (OAB) Declaração de constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal Controvérsia judicial do julgamento do HC 126.292/SP; Overruling (possibilidade de um precedente que foi criado ser superado) que modificou o HC 85.886/RJ; Se o Supremo decidir pela inconstitucionalidade do artigo 283 do CPP, será necessária também a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 105 e 147 da Lei de Execução Penal. Deixar de aplicar lei que não seja por força de qualquer uma das 6 hipóteses prevista caracteriza arbitrariedade e inconstitucionalidade. Art. 283 do CPP de constitucionalidade espelhada dos incisos LVII e LXI do art. 5º da CF STF aniquilou uma garantia constitucional com o HC 126.282 ao redefinir a expressão “trânsito em julgado” Requereu a concessão de medida cautelar, nos termos do artigo 21 da Lei nº 9.868/99, para determinar a suspensão da execução antecipada da pena de todos os casos em que órgãos fracionários de Segunda Instância com base no HC 126.282/SP, simplesmente ignoraram o dispositivo no artigo 283 do Código de Processo Penal – cuja constitucionalidade se presume. ADC 54 (PC do B) Controvérsia ao princípio da presunção de inocência; “3. A prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar. 4. A ampla defesa, não se pode visualizar de modo restrito. Engloba todas as fases processuais, inclusive as recursais de natureza extraordinária. Por isso a execução da sentença após o julgamento do recurso de apelação significa, também, restrição do direito de defesa, caracterizando desequilíbrio entre a pretensão estatal de aplicar a pena e o direito, do acusado, de elidir essa pretensão.”1 Um número considerável de prisões – na forma de antecipação de pena – vem sendo decretado pelos mais diversos Tribunais do País de forma incompatível com a extensão da garantia da presunção de inocência, tal como definido atualmente pela maioria desse Excelso STF. 1 Trecho do HC 84078, de 5 de fevereiro de 2009
Compartilhar