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Audiência de Custódia: medida eficaz contra a banalização das prisões provisórias?

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS 
Graduação em Direito 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Priscila Januário Ulian 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: 
medida eficaz contra a banalização das prisões provisórias no Brasil? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Poços de Caldas 
2016 
Priscila Januário Ulian 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: 
medida eficaz contra a banalização das prisões provisórias no Brasil? 
 
 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao Curso de Direito da 
Pontifícia Universidade Católica de Minas 
Gerais – Campus Poços de Caldas, como 
requisito parcial para obtenção do título de 
Bacharel em Direito. 
Orientador: Prof. Me. Dório Henrique Ferreira 
Grossi. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Poços de Caldas 
2016 
Priscila Januário Ulian 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: 
medida eficaz contra a banalização das prisões provisórias no Brasil? 
 
 
 
 
Monografia apresentada ao Curso de Direito da 
Pontifícia Universidade Católica de Minas 
Gerais – Campus Poços de Caldas, como 
requisito parcial para obtenção do título de 
Bacharel em Direito. 
 
 
 
 
_____________________________________________________ 
Prof. Me. Dório Henrique Ferreira Grossi - PUC Minas (Orientador) 
 
 
_____________________________________________________ 
Prof. - PUC Minas (Banca Examinadora) 
 
 
_____________________________________________________ 
Prof. - PUC Minas (Banca Examinadora) 
 
 
 
 
 
 
 
Poços de Caldas, ____ de ________________2016. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho aos meus pais, por 
sempre terem me dado todo suporte 
necessário e todo o carinho e paciência 
para que eu pudesse estar aqui hoje. 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Agradeço a Deus por todas as oportunidades que tive em minha vida, sempre 
me guiando e me protegendo. 
Agradeço meus pais por sempre estarem presentes em minha vida. Agradeço 
minha mãe pela dedicação, carinho e coração enorme que possui, sempre cuidando 
de nossa família. Agradeço meu pai por ser um exemplo de caráter, bondade e meu 
espelho para seguir essa carreira. 
Agradeço meus familiares por torcerem por mim e estarem sempre presentes. 
Agradeço minhas amigas Marcele e Gabriela pela paciência, torcida e por 
entenderem minha ausência em vários momentos e também por todo 
companheirismo e amor que compartilhamos nesse período. 
Agradeço todo o corpo docente da faculdade, por constituírem a principal 
base para a formação do meu conhecimento para que essa etapa fosse concluída. 
Agradeço o meu orientador Dório Henrique Ferreira Grossi por ter me ajudado 
a apoiado na escolha do meu trabalho, sendo paciente e compreensivo. 
Por fim, agradeço a todos que de alguma forma estiveram presentes na 
minha vida e me auxiliaram em todas as etapas que culminaram nesse momento tão 
importante. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
RESUMO 
 
O presente trabalho tem por intuito apresentar a audiência de custódia como uma 
medida eficaz no que tange ao combate da banalização das prisões provisórias 
frente a uma cultura do encarceramento predominante no Brasil. Pretende ainda, 
demonstrar sua previsão nos tratados internacionais de direitos humanos dos quais 
o país é signatário, e a necessidade de efetivá-los, juntamente com os direitos 
fundamentais previstos no ordenamento jurídico brasileiro. Para tanto, foram 
analisados dados obtidos através de órgãos oficiais do governo referentes ao perfil 
das prisões brasileiras, além de pesquisa bibliográfica acerca da audiência de 
custódia, com a contraposição de teses doutrinárias para atingir o objetivo 
pretendido. 
 
Palavras-chave: Audiência de custódia. Prisão provisória. Direitos fundamentais. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
The current work presents the court hearing custody as a measure effective in what 
regards to the fight the trivialization of provisional arrest ahead of a imprisonment 
culture in Brazil. Intends too, demonstrate your prediction about the international 
agreement of the humans rights of which the country is part, and the necessity of 
effective it, along with the fundamentals rights provided in the Brazilian legal 
ornament. For this purpose, have been analysed data obtained through official organ 
of the government refering profile of brazilian’s arrest, besides of bibliographic 
research about of the custody hearing, with the opposal of doctrinal theses to reach 
the intended objective. 
 
Keywords: Hearing custody. Provisional arrest. Fundamental rights. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE TABELAS 
 
Tabela 1 - Países que já incorporaram a audiência de custódia no ordenamento 
jurídico...................................................................................................................p. 50. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS 
 
ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade 
ADEPOL/BR - Associação dos Delegados de Polícia do Brasil 
ADPF - Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal 
AJUFE - Associação dos Juízes Federais 
Art – Artigo 
CNJ – Conselho Nacional de Justiça 
CONAMP - Associação Nacional dos Membros do Ministério Público 
CP – Código Penal 
CPP – Código de Processo Penal 
CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 
FENADEPOL - Federação Nacional dos Delegados de Polícia Federal 
MPSP - Ministério Público de São Paulo 
PLS – Projeto de Lei do Senado 
STF – Supremo Tribunal Federal 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 10 
 
2. INFLUÊNCIA DO DIREITO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS HUMANOS 
NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 ................................................................ 13 
2.1 Previsão da audiência de custódia nos diplomas internacionais ................. 14 
2.2 Hierarquia dos tratados internacionais frente ao ordenamento brasileiro .. 16 
2.3 O sistema penal e o poder de punição do Estado .......................................... 19 
2.4 Princípios constitucionais aplicáveis na esfera penal ................................... 20 
2.4.1 Conceito e relevância de princípio ................................................................... 21 
2.4.2 O princípio da dignidade da pessoa humana ................................................... 21 
2.4.3 O princípio da presunção de inocência ............................................................ 23 
2.4.4 O princípio do devido processo legal ............................................................... 24 
2.4.4.1 O princípio do contraditório e da ampla defesa ....................................... 25 
 
3. A PRISÃO PROVISÓRIA NO CONTEXTO BRASILEIRO ................................... 26 
3.1 Prisão em flagrante ...........................................................................................27 
3.1.1 Formalidades da prisão em flagrante ............................................................... 30 
3.2 Prisão preventiva .............................................................................................. 31 
3.3 Prisão temporária .............................................................................................. 32 
3.4 Medidas cautelares diversas da prisão ........................................................... 33 
3.5 Banalização das prisões provisórias no Brasil .............................................. 35 
3.5.1 A cultura do encarceramento ........................................................................... 36 
3.5.1.1 Perfil da população carcerária ................................................................... 38 
 
4. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA ................................................................................. 41 
4.1 Conceito e procedimento ................................................................................. 41 
4.1.1 Atual sistemática do Código de Processo Penal .............................................. 43 
4.2 Previsão normativa dentro do ordenamento brasileiro ................................. 44 
4.2.1 Aspecto global .................................................................................................. 49 
4.3 Posicionamentos contrários ............................................................................ 50 
4.3.1 Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.420 ................................................. 52 
4.4 Resultados do “Projeto Audiência de Custódia” ........................................... 56 
4.4.1 Benefícios frente à sociedade .......................................................................... 63 
 
5. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 65 
 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 67 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
10 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
Ao considerar o paradoxo entre instituição da CRFB/88 (Constituição da 
República Federativa do Brasil de 1988), um marco democrático no país, e o 
decadente cenário do sistema carcerário brasileiro, o presente trabalho tem como 
intuito apresentar a emblemática acerca da criação do instituto da audiência de 
custódia como forma eficaz contra a banalização das prisões provisórias. 
Para tanto, será demonstrada de que maneira a Carta Magna representou 
essa mudança de paradigma no cenário brasileiro, uma vez que se revelou pautada 
em direitos e princípios fundamentais, reflexo da ascensão mundial do princípio da 
dignidade da pessoa humana. Tal conceito se fez presente também nos principais 
tratados internacionais de direitos humanos, os quais o Brasil ratificou dentro do seu 
ordenamento jurídico. 
Dentre os compromissos assumidos frente a esses documentos 
internacionais, está presente a previsão da audiência de custódia, que se caracteriza 
no momento pelo qual o preso em flagrante é apresentado pessoalmente e sem 
demora à autoridade judiciária competente para analisar a legalidade da prisão, 
assim como as medidas posteriores cabíveis. 
Por esse motivo, serão apresentados os tratados internacionais que trazem 
essa solenidade, bem como em que grau de hierarquia se encontram dentro do 
ordenamento pátrio, a fim de indicar a necessidade de serem efetivados, pois até 
então não haviam normas que estabeleciam a dinâmica em que se dariam as 
audiências, descumprindo os compromissos assumidos. 
.Também se faz evidente no trabalho a conceituação da função do direito 
penal e do direito processual penal e a sua relação com o poder punitivo do Estado, 
para caracterizá-lo como última medida a ser tomada para solução de conflitos. De 
igual modo, é evidenciada a supremacia da CRFB/88, em conjunto com as normas 
internacionais de direitos humanos, frente à lei doméstica brasileira, devendo esta se 
harmonizar com os direitos fundamentais previstos em tais diplomas superiores. 
Por essa razão, serão analisados os princípios constitucionais aplicáveis na 
esfera penal, para solidificar a conveniência da criação do instituto em comento, 
como forma também de ampliar o cumprimento de tais direitos essenciais 
asseverados. 
11 
 
Feito isso, passa-se à abordagem da prisão provisória no contexto brasileiro, 
enfatizando as principais espécies e requisitos para sua imposição, que se evidencia 
na real comprovação de sua necessidade e conveniência. O destaque é dado à 
prisão em flagrante, momento crucial da efetivação da solenidade em análise. 
Nesse contexto, é exposta a cultura do encarceramento existente no Brasil, 
que apregoa o uso das prisões cautelares como primeira resposta para combater a 
criminalidade, mesmo quando dissociada de real exigência. Diante disso, é 
destacado o perfil da população carcerária brasileira caracterizada, no geral, pelas 
camadas historicamente marginalizadas na sociedade, reforçando a ideia de que há 
desvio no poder punitivo do Estado. 
Posteriormente, é chegado o instante em que se descreve de forma mais 
minuciosa o conceito e procedimento das audiências de custódia. De igual modo, 
como se mostra sua previsão normativa dentro do sistema jurídico brasileiro e de 
que forma é uma tendência concretizada em vários outros países anteriormente ao 
Brasil. 
Serão, com isso, expressos entendimentos e jurisprudências contrários à 
proposta, basicamente sustentados na falta de estrutura do sistema judiciário, o 
desrespeito à competência legislativa da União, somado ao possível aumento da 
sensação de insegurança na sociedade. 
Posteriormente, serão rebatidos tais argumentos através da demonstração de 
resultados favoráveis obtidos frente aos órgãos do governo, no que tange à 
implementação das audiências de custódia nos entes federativos brasileiros, ao 
mesmo tempo em que serão analisados os benefícios frente à sociedade como um 
todo. 
O estudo é pertinente na medida em que há carência na produção de 
pesquisa com esse enfoque, já que é um tema relativamente novo na esfera jurídica. 
E sendo o sistema judiciário responsável pelo processamento e julgamento dos 
denunciados, faz-se primordial o exame dessa função frente aos direitos basilares 
na legislação brasileira. 
Ante o exposto, o método utilizado para o desenvolvimento do presente 
trabalho será o método dedutivo, uma vez que a partir de constatações gerais sobre 
o impacto da implantação do projeto em comento, se chegará a uma conclusão 
específica sobre a diminuição da banalização das prisões provisórias no país e as 
consequentes vantagens a toda estrutura judicial e social. 
12 
 
Dessa forma, o desenvolvimento será com base em pesquisas doutrinárias e 
bibliográficas e, principalmente, em artigos científicos, além de textos constitucionais 
e infraconstitucionais. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
13 
 
2. INFLUÊNCIA DO DIREITO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS HUMANOS 
NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 
 
A Constituição Federal da República Federativa do Brasil de 1988 
representou, no âmbito jurídico, o processo de democratização do Estado brasileiro 
ao romper-se com o regime militar (1964-1985), gerando crescimento na esfera dos 
direitos fundamentais1. 
Apesar de ter originalmente surgido como uma solução para resolver os 
problemas do regime autoritário, a oposição se fortaleceu com a abertura desse 
processo, permitindo uma mudança lenta e gradual sobre o contexto do domínio 
militar. 
Com isso, a Constituição de 1988 instaura um regime democrático no Brasil,enaltecendo a proteção de camadas marginalizadas da sociedade, com 
estabelecimento de direitos e garantias fundamentais a todas as pessoas. Como 
discorre José Afonso da Silva2: 
 
É a Constituição cidadã, na expressão de Ulysses Guimarães, Presidente 
da Assembleia Nacional Constituinte que a produziu, porque teve ampla 
participação popular em sua elaboração e especialmente porque se volta 
decididamente para a plena realização da cidadania. 
 
Consequentemente, essa mudança de paradigma interno, fez com que o 
tema de direitos humanos ganhasse destaque também nas relações externas, 
culminando na assinatura e incorporação pelo Brasil de diversos tratados 
internacionais que versavam sobre esse tema. 
Assim, o tema da Audiência de Custódia tem sua origem pautada em alguns 
desses tratados internacionais que foram elaborados antes da formulação da 
Constituição Federal de 1988. Portanto, é de suma importância o conhecimento da 
previsão jurídica desses tratados, bem como de seus desdobramentos no plano 
interno nacional. 
Além disso, no presente capítulo, também será demonstrado qual é o grau de 
hierarquia desses instrumentos internacionais frente às normas brasileiras, de forma 
 
1 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14. ed. rev. e 
atual. São Paulo: Saraiva, 2013. 
2 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 6. ed. São Paulo: Revista dos 
Tribunais, 1990. p. 80. 
14 
 
que em respeito a elas fora efetivada a criação do “Projeto de Audiência de 
Custódia”. 
 
2.1 Previsão da audiência de custódia nos diplomas internacionais 
 
Conforme exposto, há diversos tratados internacionais que possuem previsão 
da audiência de custódia, que consiste, basicamente, em um instrumento processual 
que antevê a análise pelo juiz da necessidade da conversão em prisão preventiva do 
sujeito recolhido em flagrante3. 
Assim, a principal base advém da Convenção Americana de Direitos 
Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), internalizada pelo Decreto 
Presidencial 678 4 , 06.11.1992, que estabelece em seu artigo 7.5 a seguinte 
redação5: 
 
Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora à 
presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer 
funções judiciais e tem o direito de ser julgada em um prazo razoável ou de 
ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua 
liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu 
comparecimento em juízo. 
 
Igual efeito tem o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova 
Iorque, incorporado em 1992, pelo Decreto Presidencial 5926, em seu artigo 9º, item 
3, prevê7: 
 
Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá 
ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade 
habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada 
em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de 
pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas 
a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o 
 
3 JURUBEBA, Yuri Anderson Pereira. Relatório pesquisa: concretização da audiência de custódia 
no Estado do Tocantins. 2016. 137f. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós Graduação Stricto 
Sensu, Universidade Federal do Tocantins, Palmas, 2016. 
4 BRASIL. Decreto nº 678, de 6 de novembro de 1992. Promulga a Convenção Americana sobre 
Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica). 
5 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Convenção americana sobre 
direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana sobre direitos 
humanos, San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969. 
6 BRASIL. Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Promulga o Pacto Internacional sobre Direitos 
Civis e Políticos. 
7 ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e 
Políticos, 16 dez. 1966. 
15 
 
comparecimento da pessoa em questão à audiência, a todos os atos do 
processo e, se necessário for, para a execução da sentença. 
 
Destarte, a expressão “sem demora” se apresenta de forma ampla nos 
citados documentos internacionais. Verifica-se que a Corte Interamericana de 
Direitos Humanos (IDH) apurou como demora na apresentação do preso ao juiz em 
prazos de, por exemplo, quatro dias8, uma semana9 e até cerca de trinta e seis 
dias10, após a prisão do agente, afirmando o dever de se ter respeitada a expressão 
no menor prazo possível. 
Além disso, o Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações 
Unidas (responsável por interpretar o Pacto Internacional de Direitos Civis e 
Políticos) estabeleceu que o atraso entre a prisão de um acusado e o 
comparecimento físico perante uma autoridade judicial não pode ultrapassar alguns 
dias11, nem mesmo durante estado de emergência. 
Por tal razão, no Brasil o prazo escolhido para o projeto foi o de 24 (vinte e 
quatro) horas, o mesmo do encaminhamento do auto de prisão em flagrante ao juiz 
competente, já previsto no artigo 306, §1º, do Código de Processo Penal12, fato que 
será mais bem analisado no decorrer da pesquisa. 
Outrossim, a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas 
Cruéis, Desumanos ou Degradantes, foi promulgada pelo Decreto Presidencial 
40/1991 13 . Tal diploma prevê, no art. 2º, §1º, que “Cada Estado Parte tomará 
medidas legislativas, administrativas, judiciais ou de outra natureza com o intuito de 
impedir atos de tortura no território sob sua jurisdição14”. 
Além disso, a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura traz 
a obrigação dos Estados partes a exercer “medidas efetivas a fim de prevenir e punir 
 
8 COSTA RICA. Corte Interamericana de Derechos Humanos. Caso Chaparro Álvarez e Lapo 
Íniguez vs. Equador. Sentença de 21/11/2007. 
9 COSTA RICA. Corte Interamericana de Derechos Humanos. Caso Bayarri vs. Argentina. Sentença 
de 30/10/2008. 
10 COSTA RICA. Corte Interamericana de Derechos Humanos. Caso Castillo Petruzzi e outros vs. 
Perú. Sentença de 30/05/1999. 
11 INFORMATIVO REDE JUSTIÇA CRIMINAL. Edição 5, ano 3, de 2013. Disponível em 
<https://redejusticacriminal.files.wordpress.com/2013/07/rjc-boletim05-aud-custodia-2013.pdf> Acesso 
em 15 ago. 2016. 
12 BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Decreto de lei n. 3.689, de 1941/10/03. 8a ed. rev., 
amp. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 
13 BRASIL. Decreto nº 40, 15 de fevereiro de 1991. Promulga a Convenção Contra a Tortura e 
Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes. 
14 ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção contra a Tortura e outros 
Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes. Adotada pela Resolução 39/46 em 
10 de dezembro de 1984. 
16 
 
a tortura no âmbito de sua jurisdição” (art. 6º, §1º), a propiciar “a qualquer pessoa 
que denunciar haver sido submetida a tortura, no âmbito de sua jurisdição, o direito 
de que o caso seja examinado de maneira imparcial” (art. 8º, §1º), bem como a 
asseverar “que suas autoridades procederão de ofício e imediatamente à realização 
de uma investigação sobre o caso e iniciarão, se for cabível, o respectivo processo 
penal” (art. 8º, §2º) 15. 
Esta última Convenção foi promulgada pelo Brasil por meio do Decreto 
Presidencial 98.386/198916, inserindo-se nesses dois últimos instrumentos, como 
medida no combate à tortura. 
Ademais, a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados, integralizada 
pelo Decreto 7.030/200917, explana em seu art. 26, que “Todo tratado em vigor 
obriga as partese deve ser cumprido por elas de boa fé”. E acrescenta em seu art. 
27: “Uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar 
o inadimplemento de um tratado (...)18”. 
Portanto, verifica-se que, até então, o Brasil não tinha cumprido, no plano 
interno, os compromissos contraídos frente aos diversos atos internacionais 
mencionados, ao passo que não havia previsão de leis específicas regrando os 
procedimentos das audiências de custódia. 
Agora ponderoso salientar o grau de hierarquia em que se encontram os 
tratados e convenções internacionais no âmbito interno brasileiro, o que será 
demonstrado a seguir. 
 
2.2 Hierarquia dos tratados internacionais frente ao ordenamento brasileiro 
 
Em meados de 1977, o pensamento predominante era de que os tratados de 
direitos humanos detinham o status de norma infraconstitucional, ou seja, se 
equiparavam às leis ordinárias. 
 
15 ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção Interamericana para Prevenir e 
Punir a Tortura. 10 dez 1984, resolução n 39/46. 
16 BRASIL. Decreto nº 98.386, de 9 de dezembro de 1989. Promulga a Convenção Interamericana 
para Prevenir e Punir a Tortura. 
17 BRASIL. Decreto nº 7.030, de 14 de dezembro de 2009. Promulga a Convenção de Viena sobre o 
Direito dos Tratados, concluída em 23 de maio de 1969, com reserva aos Artigos 25 e 66. 
18 ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados. 
22 maio de 1969. 
17 
 
Todavia, a Constituição Federal de 1988 previu, de forma inédita, no seu art. 
5º, § 2º, o seguinte texto19: 
 
Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros 
decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados 
internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. 
 
Ora, feita essa previsão, a discussão sobre a posição hierárquica dos tratados 
se acirrou, uma vez que por uma interpretação sistemática e teleológica do Texto, 
concluiu-se que os direitos internacionais formavam e complementavam o catálogo 
daqueles protegidos pela Constituição Federal. Portanto, já entrariam no 
ordenamento no mesmo patamar das normas constitucionais (e não das leis 
ordinárias). 
Entretanto, o entendimento majoritário sobre deterem a posição de norma 
infraconstitucional se manteve, na medida em que os tratados ou convenções 
internacionais “não teriam força normativa para restringir a eficácia jurídica das 
cláusulas constitucionais e dos preceitos inscritos no texto da Carta Magna20”. 
Com o intuito de esclarecer o impasse, foi editada a Emenda Constitucional 
45/04, chamada de “Reforma do Poder Judiciário”, em que os tratados passaram 
efetivamente a ser considerados como normas constitucionais pelo acréscimo do § 
3º, art. 5º, da própria CF/88 (Constituição Federal de 1988), que alude21: 
 
Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem 
aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três 
quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às 
emendas constitucionais. 
 
Logo, foram equiparados às emendas constitucionais e ficaram sujeitos a 
gozar de proteção prevista para as cláusulas pétreas, por força do §3º, art. 5º 
(supramencionado), combinado com o art. 60, §4º, IV 22 , ambos expressos na 
Constituição Federal, portanto, não podendo ser alterados. 
 
19 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 
1988. 
20 JURUBEBA, Yuri Anderson Pereira. Relatório pesquisa: concretização da audiência de custódia 
no Estado do Tocantins. 2016. 137f. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós Graduação Stricto 
Sensu, Universidade Federal do Tocantins, Palmas, 2016. p. 24. 
21 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 
1988. 
22 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 
1988. 
18 
 
Algumas ressalvas devem ser auferidas no que tange à internacionalização 
dos documentos internacionais sobre direitos humanos, pois fora também conferido 
a eles o status normativo supralegal, através da análise de julgados do Supremo 
Tribunal Federal (STF). Isto é, estariam acima da legislação interna (como por 
exemplo, o Código de Processo Penal), e abaixo apenas da Constituição Federal. 
Foi o que se verificou, por exemplo, no seguinte voto23: 
 
PRISÃO CIVIL. Depósito. Depositário infiel. Alienação fiduciária. Decretação 
da medida coercitiva. Inadmissibilidade absoluta. Insubsistência da previsão 
constitucional e das normas subalternas. Interpretação do artigo 5º, inc. 
LXVII e §§ 1º, 2º e 3º, da CF, à luz do artigo 7º, § 7, da Convenção 
Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica). 
Recurso improvido. Julgamento conjunto do RE nº 349.703 e dos HCs nº 
87.585 e nº 92.566. É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que 
seja a modalidade do depósito. 
 
Nesse julgamento, o STF determinou que a norma que previa a prisão civil do 
depositário infiel não tinha sido revogada pela adesão do país ao Pacto Internacional 
dos Direitos Civis e Políticos e ao Pacto de San José da Costa Rica. Esclareceu que 
o que ocorrera foi a suspensão de tal norma, pelos tratados serem normas 
supralegais, estando acima da lei infraconstitucional. 
Em síntese, os tratados e convenções internacionais, que abordarem os 
direitos humanos podem ser equivalentes às emendas constitucionais (respeitado o 
quórum qualificado do §3º, art. 5º, CF/88), ou serem normas supralegais (os 
aprovados antes do advento da reforma ou quando presente quórum simples de 
votação). 
Ademais, toda essa mudança foi resultado da relevância em que foi alçado o 
princípio da dignidade da pessoa humana no contexto mundial, em decorrência do 
fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Por essa razão, a Carta Magna elegeu 
a primazia da dignidade humana como “valor essencial que lhe dá unidade de 
sentido. Isto é, o valor da dignidade humana informa a ordem constitucional de 1988, 
imprimindo-lhe uma feição particular”24. 
Em vista disso, se no plano internacional, esta prioridade se reflete na 
emancipação dos direitos humanos, no constitucionalismo local também se 
 
23 BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Recurso Extraordinário n° 466.343-1, Relator: Minº CEZAR 
PELUSO, Data de Julgamento: 03/12/2008, Tribunal Pleno. 
24 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14. ed. rev. e 
atual. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 89. 
19 
 
concretizou com o advento de princípios, com enfoque na própria dignidade 
humana25, dando sustentação a todos os outros que, na pesquisa apresentada, 
serão examinados no âmbito penal. 
 
2.3 O sistema penal e o poder de punição do Estado 
 
Antes de se examinar os princípios norteadores do ordenamento jurídico, 
cabível o diálogo a respeito do conceito e da função do direito processual penal. 
Como bem define Führer26: 
 
O Processo Penal visa possibilitar a concretização do poder estatal de punir 
da forma mais eficaz, ou seja, a aplicação efetiva do Direito Penal, sempre 
dentro de limites que garantam ao indivíduo a preservação de sua dignidade 
(....) em um Estado Democrático de Direito as garantias do indivíduo não 
podem ser desprezadas em prol das finalidades do Estado. Dái a presença 
de princípios (...)”. 
 
Nesse contexto, o Estado é a única entidade dotada com o poder soberano 
do direito de punir, caracterizando o domínio do ius puniendi (direito de punir). Tal 
direito (ou poder-dever de punir),“é genérico e impessoal porque não se dirige 
especificamente contra esta ou aquela pessoa, mas destina-se à coletividade como 
um todo27”. 
Sendo assim, todo poder deve ser limitado, de forma que o direito processual 
penal “não pode servir à liberação do poder, e sim ao seu controle28”. Ou seja, não 
deveria ser usado para atender os clamores da opinião pública, nem como um meio 
de manipulação vislumbrando uma falsa sensação de segurança na sociedade, para 
captar apoio político. 
Aliás, a essência do erro muitas vezes se inicia exatamente nesse ponto: 
quando se pretende dar respostas à sociedade pelo exercício do sistema criminal29. 
Concernente seria seu uso para a constituição de um verdadeiro controle da 
 
25 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14. ed. rev. e 
atual. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 90. 
26 FÜHRER, Paulo Henrique. Elementos do Direito: Processo Penal. 11 ed. São Paulo: Revista 
dos Tribunais. p. 21, v. 8. 
27 CAPEZ. Fernando. Curso de processo penal. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 44. 
28 MACHADO. Leonardo Marcondes. Resistência crítica e poder punitivo: diálogos em torno da 
audiência de custódia. Porto Alegre: Revista Síntese Direito Penal e Processual Penal, vol. 16, n 
93, ago-set 2015. p. 41. 
29 MACHADO. Leonardo Marcondes. Resistência crítica e poder punitivo: diálogos em torno da 
audiência de custódia. Porto Alegre: Revista Síntese Direito Penal e Processual Penal, vol. 16, n 
93, ago-set 2015. p. 41. 
20 
 
sociedade, enquanto forma indispensável de contenção do poder punitivo abstrato 
do Estado, e não à sua instrumentalização, apoiando-se em critérios normativos 
racionais. 
Diante disso, o texto constitucional deve ser considerado em sua inteira 
supremacia frente às leis infraconstitucionais, de maneira que deve obrigatoriamente 
ser observada na aplicação razoável do direito de punir do Estado, para assegurar a 
máxima efetividade dos direitos e garantias fundamentais. 
De acordo com Mazzuoli30, a “Reforma do Poder Judiciário”, com o acréscimo 
do §3º ao art. 5º (citado anteriormente), que permitiu aos tratados internacionais o 
status de emendas constitucionais, trouxe ao direito brasileiro um novo tipo de 
controle à produção normativa interna: o controle de convencionalidade das leis. 
Isto é, a produção normativa doméstica deve se compatibilizar com os 
tratados de direitos humanos legitimados pelo governo e em vigor no país. 
Consequentemente, o direito processual penal “além de exigir conformação plena e 
urgente à Constituição, também deve passar por ajuste de convencionalidade, ou 
seja, de normatividade convencional31”. 
Isso significa que é fundamental adequá-lo às normas do direito internacional 
às quais o Brasil firmou compromisso, principalmente àquelas voltadas à tutela de 
direitos humanos. 
Feito breve apontamento, passa-se, enfim, ao estudo dos princípios que 
devem ser colocados em primeiro plano na persecução penal, como o caminho a ser 
percorrido para a consolidação do Estado Democrático de Direito, para a mitigação 
das ilegalidades. 
 
2.4 Princípios constitucionais aplicáveis na esfera penal 
 
Objetivando adentrar na questão dos princípios constitucionais aplicáveis na 
esfera penal, insta pontuar acerca de algumas noções introdutórias acerca dos 
princípios, mormente no que atine a sua conceituação e relevância no ordenamento 
jurídico pátrio. 
 
30 MAZZUOLI. Valerio de Oliveira. Teoria Geral do controle de convencionalidade no direito brasileiro. 
Revista de Informação Legislativa. Brasília a. 46 n. 181 jan./mar. 2009. p. 2. 
31 MACHADO. Leonardo Marcondes. Resistência crítica e poder punitivo: diálogos em torno da 
audiência de custódia. Porto Alegre: Revista Síntese Direito Penal e Processual Penal, vol. 16, n 
93, ago-set 2015. p. 43. 
21 
 
 
2.4.1 Conceito e relevância de princípio 
 
A definição etimológica de princípio pode ser dada como o primeiro impulso 
gerado a uma coisa, origem ou ainda como regras ou conhecimentos fundamentais 
e gerais.32 
No âmbito jurídico, o conceito de princípio indica uma ordenação, que se 
espalha e alicerça os sistemas de normas, servindo de base para a interpretação e 
aplicação do direito positivo33. 
Assim, é importante destacar que a Constituição Federal de 1988, em seu art. 
1º, prevê quais são os princípios fundamentais do Estado brasileiro, sendo àqueles 
que motivam toda a sua estrutura. Entre eles, será explorado o princípio da 
dignidade da pessoa humana, que conforme apontado se constitui como verdadeiro 
sustentáculo para todo o ordenamento jurídico. 
Isto posto, os demais princípios abordados se encontram no art. 5º, do 
mesmo diploma, que prevê tanto os direitos como as garantias fundamentais, 
havendo uma sucinta diferença entre os dois termos. 
Enquanto direito pode ser compreendido como a consagração na lei de 
valores importantes para a sociedade, as garantias, apesar de também serem 
ligadas a valores, têm aspectos instrumentais34. Ou seja, funcionam como um meio 
de proteção dos aludidos direitos previstos na lei. 
Assim sendo, os princípios, expressos ou implícitos, atuam como garantias 
diretas e imediatas aos cidadãos, funcionando como critérios de interpretação e 
integração do texto constitucional 35 , e consequentemente como garantia da 
preservação dos direitos, consoante exposto. 
 
2.4.2 O princípio da dignidade da pessoa humana 
 
Em harmonia com entendimento demonstrado, o direito internacional e 
nacional tem como base o respeito à dignidade humana. Em vista disso, o princípio 
 
32 BUENO, Silveira. Minidicionário da língua portuguesa. São Paulo: FTD, 2000. p. 624. 
33 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 10. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: 
Forense, 2014. p. 55. 
34 NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Método, 2013. p. 672. 
35 NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Método, 2013. p. 672. 
22 
 
da dignidade da pessoa humana é considerado como “valor constitucional 
supremo”36, encontrando-se expresso no art. 1º, inciso III, da Carta Magna, nos 
termos37: 
 
Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel 
dos Estados, Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado 
Democrático de Direito e tem como fundamento: 
(...) 
III – a dignidade da pessoa humana; 
 
Logo, sendo o Direito Penal a medida mais extrema do Estado para 
regulação de conflitos e aplicação de sanções, deve-se respeitar tal princípio para 
que o poder estatal não perca o seu caráter democrático38. Ou seja, para se ter um 
direito penal democrático, deve haver prevalência das garantias dos direitos do 
cidadão em face do dever punitivo do Estado, de modo que aquelas sejam 
respeitadas frente aos princípios patentes. 
Desse modo, a origem do conceito do princípio aludido é comumente 
incumbida a Immanuel Kant 39 , que defendia que o homem possuía um valor 
intrínseco, que seria a própria dignidade humana. E como portador dela, deveria ser 
tomado como um meio em si mesmo, e não como um fim, por cada pessoa ser única 
e imperiosa. 
Dessa forma, fazendo um conexo com o campo penal, a dignidade da pessoa 
humana – obviamente -, não faz distinção entre homens livres e presos. Ou seja, 
deve ser observada no tratamento dos presos provisórios e definitivos do país, em 
respeito à sua condição humana. 
Assim, como a audiência de custódia é um instrumento aplicado a eles, 
amplia a efetividade desse anseio primordial no quetange à observação das 
legalidades das prisões. 
 
 
 
36 NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Método, 2013. p. 448. 
37 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 
1988. 
38 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 10. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: 
Forense, 2014. p. 56. 
39 KANT, IMMANUEL. Fundamentação da metafísica dos costumes e outros escritos. São Paulo: 
Martin Claret, 2005. p. 59. 
23 
 
2.4.3 O princípio da presunção de inocência 
 
A presunção de inocência, também chamada de não culpabilidade, está 
prevista no art. 5º, da Constituição Federal40, prevendo que nenhuma pessoa será 
considerada culpada até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. 
Bem como o princípio da dignidade humana, também teve como substrato os 
tratados de direitos humanos internacionais, assim como assevera Tourinho Filho: 
 
O princípio remonta o art. 9º. da Declaração dos Direitos do Homem e do 
Cidadão proclamada em Paris em 26-8-1789 e que, por sua vez, deita 
raízes no movimento filosófico- humanitário chamado “Iluminismo”, ou 
Século das Luzes, que teve à frente, dentre outros, o Marques de Beccaria, 
Voltaire e Montesquieu, Rousseau. Foi um movimento de ruptura com a 
mentalidade da época, em que, além das acusações secretas e torturas, o 
acusado era tido com objeto do processo e não tinha nenhuma garantia. 
Dizia Bercaria que “a perda da liberdade sendo já uma pena, esta só deve 
preceder a condenação na estrita medida que a necessidade o exige41. 
 
Isto posto, um dos seus efeitos é de se estabelecer como uma regra de 
tratamento ao sujeito que aparentemente apresenta algum embate com a justiça, 
evitando juízos condenatórios precipitados, a fim de proteger as pessoas contra 
eventuais excessos das autoridades públicas42. 
Assim, também gera efeitos no que tange ao ônus da prova, devendo o 
Ministério Público ou a parte autora provar a culpa do acusado. Ou seja, sua 
inocência é presumida, devendo a parte acusadora comprovar a culpabilidade do 
agente. Em caso de haver alguma dúvida quanto a ela, o magistrado não deve 
incriminá-lo. 
De igual modo, reflete na questão da prisão cautelar, que terão suas 
hipóteses abordadas posteriormente, mas que em razão do princípio abordado, para 
ser empregada tem que se fazer necessária. Ou melhor, a prisão cautelar deve ser 
motivada conforme os requisitos previstos na lei. 
Ademais, essa garantia advém de previsões em documentos internacionais, 
em já mencionados tratados. Como, por exemplo, na Convenção Americana de 
Direitos Humanos, segundo a qual aduz que “Toda pessoa acusada de um delito 
 
40 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 
1988. 
41 FILHO, Fernando da Costa Tourinho. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 
71-72. 
42 ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo. Audiência de custódia: da boa intenção à 
boa técnica. Porto Alegre: FMP, 2016. [E-Book] 
24 
 
tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente 
sua culpabilidade43.” (CADH, art. 8, parágrafo I). 
Sendo assim, o princípio em questão exerce função imprescindível ao exigir 
que toda privação da liberdade, antes do trânsito em julgado de sentença 
condenatória, deva ser motivada, a fim de demonstrar sua natureza cautelar44. 
Com isso, apesar de atualmente se verificar uma tentativa de relativização 
desse princípio àqueles que já se encontram em fase processual45, o enfoque dos 
seus efeitos na presente pesquisa se dará em relação ao agente que é pego em 
estado de flagrância e ao preso provisório. 
 
2.4.4 O princípio do devido processo legal 
 
O principio do devido processo legal encontra-se consagrado no inciso LIV, 
do art. 5º, da Carta Magna, estabelecendo que ninguém será privado de sua 
liberdade ou bens sem o devido processo legal46. 
Isso significa que para a privação de liberdade ou patrimonial ser considerada 
legal, ela deve resultar de um processo sujeito às formalidades adequadas previstas 
na lei, sob pena de nulidade absoluta. Dessa forma, visa garantir a participação no 
processo das partes para a formação do convencimento do juiz para este proceder a 
decisão final almejada. 
Como decorrência desse princípio, surgem duas outras garantias 
processuais, analisadas a seguir. 
 
 
 
 
43 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Convenção americana sobre 
direitos humanos: assinada na Conferência especializada interamericana sobre direitos 
humanos, San José, Costa Rica, em 22 de novembro de 1969. Disponível em: 
<http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/c.convencao>. Acesso em: 10 mar. 2016. 
44 ANDRADE, Mauro Fonseca; ALFLEN, Pablo Rodrigo. Audiência de custódia: da boa intenção à 
boa técnica. Porto Alegre: FMP, 2016. [E-Book] p. 17. 
45 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. STF admite execução da pena após condenação em segunda 
instância. Brasília: STF, 2016. Disponível em: 
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=326754>. Acesso em: 06 out. 
2016. 
46 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 
1988. 
25 
 
2.4.4.1 O princípio do contraditório e da ampla defesa 
 
Segundo aludido, surgem como resultado do princípio do devido processo 
legal, sendo previstos também na Constituição Federal, de acordo com redação do 
art. 5º, inciso LV47: 
 
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados 
em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e 
recursos a ela inerentes. 
 
Entende-se por contraditório o direito da parte contrária em apresentar sua 
defesa contra a acusação que lhe foi feita. Assim, é composta por dois elementos: 
“informação e reação”48, ou seja, somente pelas teses apresentadas pelas partes 
(“informação”) é que o juiz pode formular um veredito. 
Já a ampla defesa se caracteriza como corolário do contraditório (“reação”), 
na medida em que é a possibilidade da parte utilizar de todos os meios legais 
disponíveis para a defesa dos seus direitos. 
Contudo, a doutrina moderna, representada pelo professor italiano Elio 
Fazzalari 49 , formula uma nova conceituação ao processo, caracterizando o 
contraditório não só como o direito de apresentação de resposta, mas também como 
a participação em simétrica paridade de armas dos litigantes. Ou seja, paridade no 
sentido de semelhante tratamento entre as partes, conjugado com iguais 
oportunidades no decorrer do processo. 
Como será visto, a audiência de custódia amplia o contraditório e a ampla 
defesa do preso, na medida em que poderá apresentar pessoalmente seu ponto de 
vista sobre o caso concreto. Assim, a oralidade traz um maior grau de certeza para o 
magistrado desempenhar o seu papel sem possíveis equívocos. 
 
 
 
 
 
 
47 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 
1988. 
48 NOVELINO, Marcelo. Manual de direito constitucional. 8. ed. São Paulo: Método, 2013. p. 701. 
49 FAZZALARI, Elio. Instituições de direito processual. Campinas: Bookseller, 2006. 
26 
 
3. A PRISÃO PROVISÓRIA NO CONTEXTO BRASILEIRO 
 
O presente capítulo tem como finalidade expor as diferentes espécies de 
prisões provisórias, também chamadas de cautelares, existentes no país e os 
requisitos para sua imposição. Isso porque, a audiência de custódia é um 
procedimentoanterior à decretação desse tipo de prisão cautelar e que, portanto, 
tem impacto real sobre sua determinação ou não. 
Sendo assim, cumpre destacar que o conceito de prisão provisória se difere 
do significado de prisão privativa de liberdade. Esta, conforme preceitua Nucci, é 
regulada pelo Código Penal, que estabelece suas espécies, formas de cumprimento 
e regimes aplicáveis ao condenado, sendo resultado de uma condenação criminal. E 
continua, caracterizando aquela, como aplicável enquanto se espera o desfecho da 
instrução criminal, ou seja, antes do trânsito em julgado da sentença50. 
Destarte, a prisão provisória, ao contrário da prisão privativa de liberdade, é 
regulada pelo Código de Processo Penal. Observa-se que a partir da Lei n. 
12.403/2011, a decretação da prisão provisória passou a exigir, além da 
necessidade, a sua imprescindibilidade como garantia do processo. 
Ou seja, a prisão cautelar só poderá ser imposta se, além de verificada sua 
urgência e necessidade, não houver nenhuma outra medida menos drástica para 
salvaguardar a eficácia dos atos do procedimento penal. Conforme Fernando Capez, 
“sem urgência e necessidade, não existe segregação cautelar”51. 
Nesse sentido, seriam os casos em que não se pode aguardar o término do 
processo para privar o agente de sua liberdade, por existir chance de que “tal 
demora permita que ele, solto, continue a praticar crimes, atrapalhe a produção de 
provas ou fuja, impossibilitando a futura execução da pena”52. 
Ante o exposto, há três modalidades de prisão provisória previstas no 
ordenamento, cada qual com seus requisitos e momentos determinados no âmbito 
penal. 
 
 
 
50 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 762. 
51 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 111. 
52 JURUBEBA, Yuri Anderson Pereira. Relatório pesquisa: concretização da audiência de custódia 
no Estado do Tocantins. 2016. 137f. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós Graduação Stricto 
Sensu, Universidade Federal do Tocantins, Palmas, 2016. 
27 
 
3.1 Prisão em flagrante 
 
Preliminarmente, o significado do termo flagrante advém do latim flagrare, que 
significa queimar, arder. Ou seja, em sentido figurado, seria o que está ocorrendo, 
“queimando”. E ainda, nos dizeres de Nucci, é aquela realizada no instante em que 
se está cometendo a infração penal ou quando acaba de produzi-la, tanto em caso 
de crime como de contravenção penal53. 
Ela possui caráter administrativo, assegurando que qualquer pessoa possa 
intervir de imediato o autor da infração, sendo inicialmente formalizada através da 
lavratura do auto de prisão em flagrante pelo respectivo delegado de polícia. 
Posteriormente, é enviado à autoridade judiciária para tomar as iniciativas cabíveis, 
passando a ter caráter jurisdicional. 
Assim, cumpre salientar que a prisão em flagrante perdeu seu caráter de 
prisão provisória, na medida em que o sujeito não permanece preso sob essa 
modalidade durante todo o processo. O que ocorre, é a possibilidade de ser preso 
antes do trânsito em julgado da sentença, mas não de permanecer preso pelo 
estado de flagrância, cabendo a análise do juiz como supracitado54. 
Dessa forma, antes das medidas cabíveis ao magistrado serem informadas, 
faz-se necessário o conhecimento acerca das modalidades de flagrantes presentes 
no ordenamento jurídico brasileiro. 
Tal previsão encontra-se nos artigo 302, do CPP55, que expõe: 
 
Art. 302 – Considera-se em flagrante delito quem: 
I – está cometendo a infração penal; 
II – acaba de cometê-la; 
III – é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer 
pessoa, em situação que faça presumir ser o autor da infração; 
IV – é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis 
que façam presumir ser ele autor da infração. 
 
Dessa forma, pode-se aferir no inciso I, a primeira modalidade de flagrante: o 
flagrante próprio ou perfeito. Este ocorre no momento em que o sujeito está 
realizando os atos executórios da infração penal. No caso, se alguém interferir no 
 
53 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 794. 
54 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 238. 
55 BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Decreto de lei n. 3.689, de 1941/10/03. (8a ed. rev., 
amp. e atual.). São Paulo: Revista dos Tribunais. 
28 
 
prosseguimento da execução, pode resultar em tentativa. Mas, se for crime 
permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, o flagrante servirá apenas 
para impedir o prosseguimento do delito já consumado56. 
Logo, a modalidade do inciso II recebe a mesma nomenclatura, na medida em 
que se caracteriza no instante em que o agente acabou de concluir a prática da 
infração penal, em situação de ficar latente a prática do crime e da autoria57. Ou 
seja, o sujeito continua ligado ao contexto do crime, mesmo com o delito já 
consumado. 
Por outro lado, o inciso III traz o chamado flagrante impróprio ou imperfeito, 
ou ainda, quase-flagrante, que sucede quando o agente conclui a infração penal, 
foge e, ao ser perseguido pela polícia, vítima ou qualquer pessoa do povo, é preso58. 
Verifica-se, portanto, que o autor não é preso em plena atividade da infração, como 
nas espécies anteriores, cabendo uma análise acerca do significado da expressão 
“logo após”. 
A lei utilizou esta expressão para evitar que pessoas inocentes fossem 
perseguidas, pois significa que a perseguição deve se iniciar imediatamente ao 
crime realizado. Nos dizeres de Delmanto Junior 59 , “a perseguição há que ser 
imediata e ininterrupta, não restando ao indigitado autor do delito qualquer momento 
de tranquilidade” 
Assim, enquanto o autor for perseguido, permanecerá o estado de flagrância, 
ficando evidente no artigo que a não há limite para a duração da perseguição, desde 
que tenha tido início logo após a prática do crime. Ademais, cabe ao magistrado a 
análise do caso concreto para se verificar se a prisão em flagrante impróprio foi 
legítima, tendo como base o enunciado da lei. 
Por fim, o inciso IV traz a espécie de flagrante presumido ou ficto, sendo 
aquele em que o agente, embora não tenha sido perseguido após o crime, é 
 
56 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 798. 
57 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 798. 
58 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 798. 
59 DELMANTO JÚNIOR, Roberto. As modalidades de prisão provisória e seu prazo de duração. 
2. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 101. 
29 
 
encontrado portando instrumentos, armas, objetos ou papeis que mostrem, por 
presunção, ser ele o autor da delinquência60. 
Igualmente, a expressão “logo depois” sofre limitação. Apresenta-se como 
uma situação de tempo curto, entendido como algumas horas, admitindo também a 
análise do magistrado em cada caso particular. 
Além das hipóteses demonstradas, tem-se o caso do flagrante preparado ou 
provocado, em que não se admite prisão. Ele é verificado quando o indivíduo é 
induzido à prática de um crime por um agente provocador, configurando crime 
impossível, previsto no artigo 17, do CP61. 
Com base nisso, o entendimento da Súmula 145 do SupremoTribunal 
Federal62 estabelece que “Não há crime quando a preparação do flagrante pela 
polícia torna impossível a sua consumação”. Contudo, apesar de mencionar 
somente a polícia, a provocação também pode partir de um particular. Como reforça 
Nucci, “a armadilha é a mesma, de modo que o delito não tem possibilidade de se 
consumar”63. 
Da mesma maneira, há a situação de flagrante forjado, verificado em situação 
de inserção de prova falsa de crime inexistente. Portanto, não constitui crime, “tendo 
em vista que a pessoa presa jamais pensou ou agiu para compor qualquer trecho da 
infração penal”64. 
Por fim, uma forma considerada legal para autorizar a prisão em flagrante, 
seria o flagrante esperado, que decorre de mera vigilância dos agentes policiais. Ou 
seja, chegando à polícia a notícia de um crime, se deslocam ao local, aguardando 
sua ocorrência, que pode ocorrer ou não. Ocorrendo o fato, será válida a prisão65. 
 
 
 
 
60 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 800. 
61 BRASIL. Código Penal (1940). Decreto de lei n. 2.848, de 1940/07/12. (54a ed.). São Paulo, SP: 
Saraiva. 
62 SÚMULA 145, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 
63 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 801. 
64 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 802. 
65 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 802. 
30 
 
3.1.1 Formalidades da prisão em flagrante 
 
Conforme analisado as possíveis situações de flagrância, o momento crucial é 
o conhecimento das formalidades que devem ser respeitadas para que a prisão em 
flagrante seja considerada legal, para ser posteriormente reconhecida pelo 
respectivo juiz. 
Assim, logo após a prisão, o sujeito é apresentado à autoridade competente - 
em regra, o delegado de polícia -, que preside a lavratura do auto de prisão em 
flagrante, em que serão recolhidos todos os depoimentos das pessoas envolvidas no 
momento da ação. Tal disposição está expressa no artigo 304, do Código de 
Processo Penal66. 
Posteriormente, respeitado os requisitos do artigo supracitado, o artigo 306 do 
mesmo diploma67, traz a necessidade de a prisão ser imediatamente comunicada, 
em um prazo de 24 (vinte e quatro) horas, ao juiz competente, ao Ministério Público 
e à família do preso ou à pessoa por ele determinada. 
Finalmente, sendo observadas tais formalidades, o auto de prisão em 
flagrante é encaminhado ao magistrado que terá três possibilidades, consoante 
artigo 310, do Código de Processo Penal68, com as modificações introduzidas pela 
Lei 12.403/2011: 
 
Art. 310 – Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deve 
fundamentadamente: 
I – relaxar a prisão ilegal; ou 
II – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os 
requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas 
ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou 
III – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. 
Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o 
agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput 
do art. 23 do Decreto-Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, 
poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, 
mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena 
de revogação. 
 
 
66 BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Decreto de lei n. 3.689, de 1941/10/03. 8a ed. rev., 
amp. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 
67 BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Decreto de lei n. 3.689, de 1941/10/03. 8a ed. rev., 
amp. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 
68 BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Decreto de lei n. 3.689, de 1941/10/03. 8a ed. rev., 
amp. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 
31 
 
 Como salienta Nucci, “a anterior redação do art. 310 não fazia referência à 
obrigatoriedade de motivação da decisão judicial, que aprecia o auto de prisão em 
flagrante, adotando um encaminhamento favorável ou desfavorável ao acusado”69. 
Dessa forma, como já explanado neste trabalho, ninguém permanece preso em 
flagrante, devendo o juiz desempenhar alguma dessas medidas previstas no artigo 
supracitado. 
Sendo assim, esse tipo de prisão é uma das que terão maior importância no 
estudo apresentado, na medida em que a audiência de custódia é empregada 
exatamente após sua efetivação, no qual o juiz decidirá entre as medidas possíveis 
em contato direto com o preso, coibindo os desvios judiciais. 
 
3.2 Prisão preventiva 
 
A prisão preventiva é a principal espécie de medida cautelar, havendo a 
restrição da liberdade do indivíduo quando observados os requisitos legais. Deve ser 
adotada como medida excepcional, já que o legislador previu no art. 282, §6º, do 
Código de Processo Penal, que só “será determinada quando não for cabível a sua 
substituição por outra medida cautelar (art. 319)”70. 
Além disso, deve estar presente o binômio do fumus commissi delicti e o 
periculum em libertatis, consoante artigo 312, do mesmo diploma: 
 
Art. 312 - A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem 
pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou 
para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência 
do crime e indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 12.403, 
de 2011)71. 
 
O fumus commissi delicti significa a “fumaça do cometimento do delito”, ou 
seja, a probabilidade de uma infração ser cometida, exposto na parte final do artigo 
quando se prevê a necessidade de prova existencial do crime e indícios suficientes 
de autoria. 
 
69 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 13. ed. rev. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense, 2014. p. 815. 
70 BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Decreto de lei n. 3.689, de 1941/10/03. 8a ed. rev., 
amp. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 
71 BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Decreto de lei n. 3.689, de 1941/10/03. 8a ed. rev., 
amp. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 
32 
 
Já o periculum em libertatis, ou “perigo da liberdade”, é o risco para a 
sociedade na permanência do agente solto, apresentada como perigo à garantia da 
ordem pública, ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou 
necessidade de aplicação da lei penal. 
Caberá ao magistrado analisar se há concretos riscos de fuga do agente, bem 
como de ameaça em prejudicar, de alguma forma, a produção de provas. Dessa 
maneira, fica manifesto a previsão da prisão preventiva como medida 
excepcional/subsidiária, sendo ulteriormente explanada quais seriam as medidas 
cautelares diversas da prisão. 
 
3.3 Prisão temporária 
 
Ao contrário das outras espécies de prisão, a prisão temporária não está 
prevista no Código de Processo Penal, sendo editada pela Medida Provisória n. 111, 
de 24 de novembro de 1989, posteriormente convertida na Lei n. 7960, de 21 de 
dezembro de 1989. 
Assim posto, ela se apresenta como prisão cautelar de natureza processual 
dirigida a possibilitar as investigações de crimes graves, previstos na mesma lei, 
durante o inquérito policial. 
À vista disso, a prisão temporária só pode ser decretada pela autoridade 
judiciária, sob pena de ilegalidade, nas situações previstas pelo art. 1º da Lei 
7.960/8972, quais sejam:Art. 1º - Caberá prisão temporária: 
I- quando imprescindível para as investigações do inquérito policial; 
II- quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos 
necessários ao esclarecimento de sua identidade; 
III- quando houver fundadas razões de acordo com qualquer prova admitida 
na legislação penal, de autoria ou de participação do indiciado nos 
seguintes crimes: (...) 
 
Não é pacífica a interpretação desse dispositivo legal, existindo posições 
diversas sobre a aplicação da prisão temporária. Porém, a mais acolhida é a 
corrente dada por Damásio de Jesus73, quando pontifica que a prisão temporária 
 
72 BRASIL. Dispõe sobre a prisão temporária. Lei 7.960/89, de 21 de dezembro de 1989. 
73 JESUS. Damásio Evangelista de. Código de Processo Penal Anotado. 9. ed., São Paulo: 
Saraiva. p. 643. 
33 
 
somente cabe nos crimes apontados no inciso III, se presentes as condições do 
inciso I ou do inciso II. 
Na mesma vertente é o entendimento de Fernando Capez, quando elucida 
que, para decretar a prisão temporária, o agente deve ser suspeito ou indiciado de 
um dos crimes previstos na Lei, mais “a presença de pelo menos um dos outros dois 
requisitos, evidenciadores do periculum in mora. Sem a presença de um destes dois 
requisitos ou fora do rol taxativo da lei, não se admitirá a prisão provisória”74. 
Dessa forma, continuando as alíneas do inciso III, art. 1º, é cabível nos 
seguintes crimes: homicídio doloso, sequestro ou cárcere privado (com os 
acréscimos operados pela Lei n. 11.106/2005 ao art. 148 do CP), roubo, extorsão, 
estupro, atentado violento ao pudor; rapto violento (art. 219 do CP, revogado pela 
Lei n. 11.106/2005), epidemia com resultado morte, envenenamento de água potável 
ou substância alimentícia, quadrilha ou bando, genocídio, crimes contra o sistema 
financeiro e tráfico de drogas.75 
Enquanto ao prazo, o art. 2º, da Lei da Prisão Provisória, explicita que terá o 
prazo de 05 (cinco) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema 
necessidade e desde que comprovada 76 . Aos crimes acima indicados que são 
considerados crimes hediondos, o prazo será de 30 (trinta) dias, prorrogável por 
igual período, havendo também necessidade de fundamentação, de acordo com 
redação do art. 2º, §4º, da Lei 8.072/199077. 
 Ademais, nos termos do art. 3º, da Lei 7.960/89, os presos temporários 
ficarão obrigatoriamente separados dos demais detentos78. 
 
3.4 Medidas cautelares diversas da prisão 
 
A Lei 12.403/2011 trouxe como uma de suas conquistas a implantação das 
medidas cautelares diversas da prisão, rompendo uma barreira carcerária há muito 
difundida no Brasil, qual seja a da imposição da prisão como forma única de garantia 
da persecução penal. 
 
74 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 311. 
75 BRASIL. Dispõe sobre a prisão temporária. Lei 7.960/89, de 21 de dezembro de 1989. 
76 BRASIL. Dispõe sobre a prisão temporária. Lei 7.960/89, de 21 de dezembro de 1989. 
77 BRASIL. Dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do art. 5º, inciso XLIII, da 
Constituição Federal, e determina outras providências. Lei 8.072/90, de 25 de julho de 1990. 
78 BRASIL. Dispõe sobre a prisão temporária. Lei 7.960/89, de 21 de dezembro de 1989. 
34 
 
Assim, o Código de Processo Penal prevê várias medidas cautelares diversas 
da prisão preventiva, de forma que esta só poderá ser imposta em último caso, 
quando nenhuma delas forem eficientes para afastar a situação de perigo concreto 
proveniente do delito. 
Dispõe o art. 282, do Código de Processo Penal79, que as medidas cautelares 
devem aplicadas de acordo com a: 
 
I- necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a 
instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a 
prática de infrações penais; 
II- adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e 
condições pessoais do indiciado ou acusado. 
 
 
Logo, assim como nas prisões cautelares, qualquer medida de natureza 
cautelar deve estar fundada na real necessidade de garantia do processo, com a 
presença do fumus commissi delicti e do periculum libertatis, se apresentado como a 
maneira mais adequada para tal feito. 
Ou seja, deve ser respeitado o princípio da proporcionalidade, sopesado com 
dois outros requisitos: necessidade e adequação. O primeiro obriga a 
fundamentação de qualquer medida cautelar ao periculum libertatis, não podendo 
ser imposta com base apenas na gravidade da acusação. 
Já o segundo, a adequação, impõe que a medida seja a mais hábil possível 
para a preservação do processo, visualizada quando cabível a prisão preventiva, a 
medida cautelar se mostrar mais hábil para o mesmo fim, devendo esta ser aplicada 
por ser menos onerosa ao agente. 
No mesmo sentido, “se o gravame for mais rigoroso do que o necessário, se 
exceder o que era suficiente para a garantia da persecução penal eficiente, haverá 
violação ao princípio da proporcionalidade”80. 
O rol de medidas cautelares está previsto no art. 319, do Código de Processo 
Penal81, que aduz: 
 
 
79 BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Decreto de lei n. 3.689, de 1941/10/03. 8a ed. rev., 
amp. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 
80 CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 313. 
81 BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Decreto de lei n. 3.689, de 1941/10/03. 8a ed. rev., 
amp. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais. 
 
35 
 
Art. 319 - São medidas cautelares diversas da prisão: (Redação dada pela 
Lei nº 12.403, de 2011). 
I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas 
pelo juiz, para informar e justificar atividades; (Redação dada pela Lei nº 
12.403, de 2011). 
II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por 
circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado 
permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; 
(Redação dada pela Lei nº 
12.403, de 2011). 
III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por 
circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela 
permanecer distante; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). 
IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja 
conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; (Incluído pela 
Lei nº 12.403, de 2011). 
V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o 
investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; (Incluído pela Lei 
nº 12.403, de 2011). 
VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza 
econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para 
a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011). 
VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados 
com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser 
inimputável ou semi-imputável (artigo 26 do Código Penal) e houver risco de 
reiteração; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011). 
VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o 
comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento 
ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; (Incluído pela Lei nº 
12.403, de 2011). 
IX - monitoração eletrônica. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011). 
 
Observa-se que o artigo encartado compreende uma disposição gradativa das 
medidas conforme o seu grau de intensidade, partindo das mais brandas até 
medidas mais contundentes, ampliando as opções do juiz conforme os critériosmencionados. 
Por fim, a prisão preventiva se exprime de caráter subsidiário em relação às 
medidas cautelares diversas da prisão, somente devendo ser aplicada em último 
caso. 
 
3.5 Banalização das prisões provisórias no Brasil 
 
Já se falou neste trabalho sobre as principais prisões processuais cautelares 
e os requisitos para sua prescrição. Entretanto, o que se observa na prática é 
contínuo excesso de aprisionamento, caracterizando a banalização das prisões 
cautelares no país. 
36 
 
Ademais, mesmo com a vigência da Lei 12.403/11, que trouxe alterações no 
Código de Processo Penal colocando, no plano legislativo, a prisão como ultima ratio 
(último instrumento), o número de prisões provisórias não diminuiu. Mesmo com a 
criação de medidas cautelares diversas da prisão, o que se verifica na prática é a 
proeminência da prisão. 
Nesse sentido pode-se dizer que “a lógica judicial permanece vinculada ao 
protagonismo da prisão, que a homologação do flagrante, longe de ser a exceção, 
figura como regra no sistema processual brasileiro”82. 
Nesse contexto, cabe analisar os dados do total de encarcerados atualmente 
no país e de que maneira a consolidação da audiência de custódia pode significar 
um importante fator na diminuição de prisões desnecessárias, igualmente em que 
cenário da cultura brasileira se faz presente, de modo a contribuir para a 
perpetuação de vícios processuais. 
 
3.5.1 A cultura do encarceramento 
 
Como já exposto neste trabalho, a Constituição Federal da República 
Federativa do Brasil de 1.988 representou o marco da redemocratização do país, 
bem como da institucionalização de direitos humanos como parâmetro para todo o 
ordenamento jurídico. 
Paradoxalmente, há um aumento exponencial no número de prisões, tanto as 
provisórias como as definitivas, surgindo o questionamento se ainda estão presentes 
resquícios do estado de exceção que dominou o Brasil no período anterior da 
referida Constituição. 
Ou seja, por um lado tem-se a consolidação legislativa de garantias e direitos 
fundamentais, principalmente de setores vulneráveis da sociedade, por outro ainda 
se permeia um sistema penal repressivo, que exalta a punição no lugar da 
ressocialização. 
É certo que o fenômeno do aumento carcerário não é um acontecimento 
exclusivamente brasileiro, mas no país adquire mais notoriedade, exatamente por se 
ter um sistema pautado em tantas garantias. 
 
82 LOPES JÚNIOR, Aury; PAIVA, Caio. Audiência de custódia. Revista Liberdades. nº 17, set/dez 
2014. Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. 
37 
 
Confirmando essa tendência, o relatório do Infopen (Levantamento Nacional 
de Informações Penitenciárias), de junho de 2014, informou que o número total de 
presos no país era de 607.731 pessoas, colocando o Brasil em quarto lugar 
comparado aos países que mais encarceram, quais sejam Estados Unidos da 
América, China e Rússia83. Foi a primeira vez que o país ultrapassou a marca de 
600 mil presos. 
Outra informação surpreendente advém do Banco Nacional de Mandados de 
Prisão (BNMP), que traz o número de 473.242 mandados de prisão para serem 
cumpridos 84 , fazendo com que a demanda de vagas nas prisões ultrapasse o 
número de um milhão. 
Entretanto, há apenas 376.669 vagas no sistema criminal, escancarando o 
imenso deficit de vagas hoje existentes, somando-se a impressionante taxa de 
aproximadamente 164% de ocupação dos espaços disponíveis85. 
Ainda consoante levantamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 
datado em junho de 2014, 42% desse número de pessoas presas seriam os de 
caráter provisório86. Esse dado demonstra como está presente o que se chama de 
“cultura do encarceramento”, corroborando o paradoxo de que em um Estado 
Democrático de Direito a prisão cautelar é vista ainda como regra. 
Nesse seguimento, expõe Masi87: 
 
A ideia de que a prisão seria a melhor, se não a única, alternativa para 
“combater” crimes de natureza “grave” e evitar sua reiteração nunca deixou 
de permear a atuação dos juízes criminais em geral. Especialmente nos 
casos de prisão em flagrante delito, a concepção de que a situação de 
flagrância prenderia por si só, apesar de legalmente afastada com a reforma 
processual penal de 2011 (Lei 12.403), permanece mais viva do que nunca. 
 
Ou como bem explica Lewandowski88: 
 
83 Levantamento Nacional de informações penitenciarias INFOPEN, jun. de 2014. Disponível em: 
<http://www.justica.gov.br/noticias/mj-divulgara-novo-relatorio-do-infopen-nesta-terca-feira/relatorio-
depen-versao-web.pdf> Acesso em 19 ago. 2016. 
84 BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/bnmp/#relatorios> 
Acesso em 10 ago. 2016. 
85 http://www.justica.gov.br/noticias/mj-divulgara-novo-relatorio-do-infopen-nesta-terca-feira/relatorio-
depen-versao-web.pdf 
86 BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Disponível em: Novo diagnóstico de pessoas presas no 
Brasil, Brasília, jun. 2014. Disponível em: <www.cnj.jus.br/sistema-carcerario-e-execucao-
penal/audiencia-de-custodia/perguntas-frequentes>. Acesso em 10 ago. 2016. 
87 MASI, Carlo Velho. A audiência de custódia frente à cultura do encarceramento. Revista dos 
Tribunais, São Paulo, v. 960, n. 104, 2015. p.113. 
88 LEWANDOWSKI, Ricardo. Audiência de custódia: em busca da autêntica jurisdição de liberdade. 
Revista do Advogado, nº 128, dezembro 2015. p. 94. 
38 
 
 
A “cultura do encarceramento”, tão arraigada entre os atores do sistema de 
justiça, repercute a preocupação de um Estado que responde aos desafios 
da segurança pública mediante a utilização de leis e penas cada vez mais 
severas, disseminando, com isso, ainda mais violência, numa atitude que só 
contribui para aprofundar os conflitos na sociedade, que passa, num 
verdadeiro círculo vicioso, a clamar por medidas cada vez mais repressivas 
contra os delinqüentes eventuais ou reincidentes. 
 
Pode-se concluir que a cultura brasileira no que tange à ideia de justiça se 
encontra muito fortemente atrelada à restrição da liberdade, refletindo na 
mentalidade dos juízes criminais brasileiros. Predomina o discurso da insuficiência 
da aplicação de medidas cautelares, afirmando a tendência feita por Ferrajoli, da 
degeneração do direito penal, transformando-o em um mecanismo somente de 
punição sem critérios de proporcionalidade89. 
Por isso, para que a audiência de custódia resulte na efetivação dos direitos 
humanos e na consequente diminuição do contingente da massa carcerária, faz-se 
necessário que os operadores jurídicos manejem adequadamente o novo recurso, 
aplicando a prisão como exceção, amparado no princípio da proporcionalidade. 
Isso não extirpará todas as mazelas decorrentes da cultura do 
encarceramento, mas já se posiciona como um começo de mudança na forma de se 
distribuir justiça. Como destaca Lewandowski, “muito, inclusive, ainda temos por 
alcançar e até mesmo aprimorar, diante desse choque de mentalidades que se está 
a promover. Certo, apenas, é que acreditamos ter dado um importante passo na 
direção desejada90”. 
 
3.5.1.1 Perfil da população carcerária 
 
Para reforçar a ideia de que o Direito Penal tem sido utilizado para atender às 
expectativas sociais, extrapolando o seu poder punitivo originário, demonstra-se 
basilar o conhecimento do perfil da população carcerária brasileira. 
Isso porque a cultura do encarceramento atinge principalmente as camadas 
sociais mais carentes, contribuindo para sua maior marginalização. Como reforça a 
 
89 FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón: teoria Del garantismo penal.

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