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ERGONOMIA E QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO CONVERSA INICIAL Olá! Bem-vindo à primeira aula de Ergonomia e Qualidade de Vida no Trabalho. Eu sou o professor Luciano José Pires, técnico em mecânica, graduado em Administração, com especialização na área de Logística e em Educação, e Mestrado em Gestão Empresarial pela Universidade Pública de Portugal e Mestrado em Engenharia da Produção pela UFSC. Atuo há mais de 25 anos na área industrial (química, petroquímica, metalúrgica e farmacêutica) com foco em gestão da produção e logística, bem como em projetos de consultoria e treinamento nestas áreas e correlatas. Na área de educação, também venho atuando há mais de quinze anos em cursos de graduação e pós-graduação nas áreas de formação, tendo mais de cinco livros e diversos artigos publicados. Nesta primeira aula você verá a evolução desde os primórdios da ergonomia até chegar ao nosso dias atuais. Conhecerá os aspectos fundamentais que sustentam essa disciplina e ciência nas organizações. Depois, também verificará os campos ou domínios desta ciência, bem como a sua classificação e oportunidades para atuação. A ideia é que ao final desta aula você já tenha uma boa noção do que é e para que serve a ergonomia e sua importância de aplicação para você profissional. CONTEXTUALIZANDO As organizações e, por consequência, nós enquanto profissionais, buscamos o melhor desempenho de nossas práticas visando à sobrevivência no mercado e, sempre que possível, crescimento e, para tal, recorremos a meios, métodos e ferramentas que possam potencializar nossas ações. Neste sentido, a ergonomia surge como ciência que nos fornece esse conjunto de conhecimentos e práticas relativos ao homem, analisando suas capacidades e limitações físicas e psicológicas e, como consequência, a concepção de ferramentas, máquinas e dispositivos a serem utilizados com o máximo de conforto, de segurança e de eficácia. Esta visão será detalhada durante nossa aula. TEMA 1 – EVOLUÇÃO E ADAPTAÇÕES DO CORPO HUMANO Vivemos em um ambiente de profundas e velozes transformações que intensificam a competitividade entre empresas. O aumento da globalização, aliado às mudanças no comportamento do consumidor e presença intensiva de novas e sofisticadas tecnologias de informação e comunicação, impõem às empresas rápida adaptação às mudanças que se apresentam em forma de novos desafios. A industrialização e o desenvolvimento da tecnologia da informação (TI) criaram a dependência de máquinas e favoreceram a cultura da mídia eletrônica, gerando, por consequência, abandono progressivo das atividades físicas, mesmo as básicas, tais como subir escada, andar, levantar, entre outras e, como resultado, temos hoje uma população cada vez mais doente com uma variedade de distúrbios cardio-metabólicos, incluindo a obesidade. Nesses novos e incertos dias, a mudança pode ser vista como um dos principais fatores de sucesso de uma organização e, por consequência, de um profissional. Contudo, em nossa evolução, conforme a figura 1, tivemos milhares de anos para nos desenvolvermos e, gradativamente, nos adaptamos às mudanças necessárias à nossa sobrevivência. Porém, desde a metade do século passado, as mudanças foram e continuam sendo muito mais rápidas e profundas, o que impede a adaptação do nosso corpo às novas exigências, entre elas a do mundo do trabalho. Figura 1 – Evolução humana para uma vida sedentária Fonte: Corsino, 2017. Somado ao aumento das exigências do mundo do trabalho, temos nos tornado cada vez mais sedentários, fator de risco para diversas doenças. A tendência ao sedentarismo aumenta no mundo e já é responsável pelo quarto maior fator de risco de mortalidade, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com estudos do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (2017)1, o sedentarismo, presente em mais de 70% da população brasileira, está relacionado a 54% das mortes por distúrbios cardíacos e a 50% dos derrames fatais. Em comparação ao indivíduo fisicamente ativo, o sedentário tem 40% mais probabilidade de sofrer um infarto. 1 Disponível em: <http://www.idpc.org.br>. Acesso em: 8 mar. 2018. 2 Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/saude/2017/04/obesidade-cresce-60-em-dez-anos-no-brasil>. Acesso em: 8 mar. 2018. 3 Disponível em: <http://www.brasil.gov.br/esporte/2016/08/cerca-de-46-da-populacao-brasileira-e-sedentaria-diz- pesquisa>. Acesso em: 8 mar. 2018. De acordo com os mesmos estudos, o sedentarismo é responsável por pelo menos 21% dos casos de tumores malignos na mama e no cólon, assim como por 27% dos registros de diabetes e 30% das queixas de doenças cardíacas. De acordo com o Ministério da SaúdeOrganização Mundial da Saúde (OMS) como 30 minutos diários de atividades físicas, cinco vezes por semana. O estudo também mostra que chega a 16,4% o índice de sedentarismo no país – percentual de pessoas que não fazem nenhuma atividade física (nem mesmo durante o deslocamento para o trabalho ou na limpeza da casa). 2 (2017), a obesidade no Brasil cresceu 60% em dez anos no Brasil e apenas 14,7% dos brasileiros praticam atividades físicas com regularidade. A prática regular de atividades físicas é definida pela Ainda segundo estudos do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, nos períodos de descanso, os dados indicam que é a televisão o que mais distrai o brasileiro, sendo que 25,8% dos adultos passam pelo menos três horas em frente à TV durante pelo menos cinco dias da semana ou mais. Ainda em relação ao sedentarismo, estudos do Ministério da Saúde3 (2016) verificaram que todos os anos acontecem mais de 400 mil infartos do miocárdio, 500 mil acidentes vasculares e 500 mil hospitalizações por insuficiência cardíaca no Brasil. Os dados também revelam que 35% da população brasileira têm hipertensão, 50% dos adultos estão com sobrepeso, 20% são fumantes e 10% estão diabéticos. Conforme podemos observar, o sedentarismo, ilustrado na figura 2, pode até vir a ameaçar a redução da expectativa de vida, pois segundo estudos, até 2030 a inatividade física pode abreviar em até cinco anos a expectativa de vida, caso seja mantido o ritmo atual. 05 Figura 2 – Sedentarismo e suas consequências Fonte: <http://amauryamaral.com.br/atualidades.asp?abre=1&id=9> Dado a esses e novos desafios, um profissional gestor deverá buscar métodos, ferramentas, bem como meios para promover a eficiência, isto é, fazer certo as coisas – sem erros, sem falhas e com o menor esforço possível - e eficácia – fazer as coisas certas, isto é, as necessárias, adequadas, que gerem melhorias - desses sistemas e, para tal, a análise e incorporação de soluções por meio das pessoas será base de seu sucesso e, também, seu maior desafio. TEMA 2 – ERGONOMIA: HISTÓRICO E EVOLUÇÃO Como visto, as organizações e, por consequência, os profissionais, buscam o melhor desempenho de suas práticas e, para tal, recorrem a meios que possam potencializar suas ações. Entre elas podemos observar o emprego da Ergonomia. Desde a pré-história nossos ancestrais, visando melhorar suas práticas e maior segurança, começaram a utilizar uma pedra adaptada à sua mão, que permitiu a eles menor esforço, potencializar suas características físicas e reduzir seus esforços. Esta prática pode ter dado origem aos demais utensílios empregados para carregar água e lhe servir como armas para defesa e caçar, conforme ilustrados na figura 3. Figura 3 – Ferramentas primitivas de agricultura Fonte: <http://clikaki.com.br/as-primeiras-ferramentas-mecanicas-feitas-pelo-homem> Ainda neste processo evolutivo e adaptativo, o homem vivenciou a invenção da roda, entre 3500 a.C. e 3000 a.C., o que representou um marco importante no processo de se tornarmais eficiente e eficaz, pois esse instrumento lhe permitiu, por meio de um sistema mecânico, o controle do fluxo e a direção da força. Contudo, somente a partir do século XVIII, com a I Revolução Industrial, podemos assistir mudanças drásticas na forma de fazer as coisas por meio de processos industrializados em detrimento dos modelos artesanais. Já no final do século XVIII, Nos Estados Unidos da América começaram a ser realizados os primeiros estudos sistemáticos do homem no trabalho, a partir da administração científica conhecida como Taylorismo e, ao mesmo tempo, na Europa começaram a ser realizadas pesquisas na área da fisiologia do trabalho. A partir da I Guerra Mundial (1914 a 1917), na Inglaterra, psicólogos e fisiologistas foram designados a desenvolver estudos para melhorar e aumentar a produção de armamentos. Neste período foi criada a comissão de saúde dos trabalhadores na indústria de munições. Ainda na Inglaterra, com o fim da guerra, surge o Instituto de Pesquisas sobre Saúde do Trabalhador que desenvolveu os primeiros estudos sobre os aspectos ligados ao trabalho, tais como: postura, carga manual, seleção e treinamento de pessoal, impactos dos fatores ambientais, tais como iluminação e ventilação. Com a II Guerra Mundial (1939 a 1945), dado os equipamentos e armamentos mais complexos e de altos custos, tais como aviões, tanques, radares, submarinos, entre outros, verificou-se a necessidade de ser dada mais atenção às características técnico e organizacionais da situação de trabalho, pois, verificou-se que sob o efeito da tensão e extrema exigência de habilidade dos operadores, aumentava a incidência de erros e acidentes. De acordo com Ilida e Guimarães (2016, p. 9), “tudo isso fez redobrar o esforço de pesquisas para adaptar esses instrumentos bélicos às características e capacidades do operador, melhorando o desempenho e reduzindo a fadiga e os acidentes”. Neste sentido, após a II Guerra, a NASA desenvolveu a primeira cápsula espacial, a partir de estudos antropométricos da população norte-americana e, em 12 de julho de 1949 – a partir de reunião de cientistas, nasce o conceito de ergonomia, isto é (ergo - trabalho) + (nomia – leis) –, sendo que o escopo desta área pode ser resumido em ciência do trabalho. Nos dias atuais a ergonomia se encontra difundida praticamente em todos os países do mundo, tendo eventos de caráter nacional e internacional, bem como, inúmeras instituições de pesquisa e ensino que atuam na área. Já a partir da década de 60, as tarefas e processos passaram a ser redesenhados, face à crescente adoção de sistemas e tecnologias de informação e automação, que geraram novas necessidades de adaptação do ser humano. Como pode ser visto neste breve histórico sobre a ergonomia, desde a sua origem e evolução, podemos relacionar as transformações sociais, econômicas e, sobretudo, tecnológicas no mundo do trabalho, que impõem impor ao homem e às máquinas uma série de adaptações. TEMA 3 – ERGONOMIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES Tratando sobre a aplicação da ergonomia e sua abrangência, Santos (2000) considera que a ergonomia pode ser aplicada em diversos setores e atividades produtivas. O autor retrata que, inicialmente, a sua maior aplicação ocorreu na agricultura, mineração e, principalmente, na indústria. Atualmente a ergonomia tem sido empregada no setor de serviços e, também, na vida diária das pessoas, em suas atividades domésticas e de lazer, conforme práticas a seguir: 3.1 Ergonomia na indústria Empregado nas atividades laborais na indústria, de acordo com Iida e Guimarães (2016), cada trabalhador, em geral, tem uma função e local de trabalho bem definidos, utilizando máquinas e equipamentos. Neste caso, o trabalhador geralmente recebe treinamento e conta com o apoio de outros diversos profissionais. Assim, na indústria a ergonomia pode ser evidenciada e empregada para melhorar as interfaces dos sistemas humanos/tarefas, as condições ambientais de trabalho e as condições organizacionais. 3.2 Ergonomia no setor de serviços Empregada para aperfeiçoar o projeto de sistemas de informação, principalmente em relação ao desenvolvimento de problemas na saúde física, relacionados à anatomia humana muscular e esquelética, que ocorrem devido ao uso prolongado e sob condições ergonômicas inadequadas na interface homem-computador ou sistema informatizado. Nesta área busca-se eliminar ou reduzir os impactos de posturas incorretas e movimentos repetitivos na área de informática. A aplicação ergonômica no setor de serviços é também necessária para a adequação de projetos em sistemas complexos de controle. 3.3 Ergonomia na vida diária Empregada nas concepções de objetos e equipamentos eletrodomésticos que usamos no nosso dia-a-dia, tais como, automóveis, móveis, eletrodomésticos, entre outros. 3.4 Ergonomia: conceitos Face à sua importância, a ergonomia passou a ser foco de pesquisas e atenção. Existem muitas definições de ergonomia e, entre elas, há convergência para o caráter interdisciplinar, isto é, a contribuição de diversas ciências, bem como o objeto de estudo que é a interação entre o ser humano e o trabalho, no sistema humano-máquina-ambiente. Nas definições observa-se, também, preocupação com o relacionamento entre essas interfaces, pois ocorrem trocas de informações e de energia, para gerar o resultado do trabalho. No Brasil, (2012), o Ministério do Trabalho e Previdência Social instituiu a Portaria n. 3.751 em 23/11/90 a qual baixou a Norma Regulamentadora 17, que trata especificamente sobre esta área. Buscando destacar a importância desta área, Wisner (1987, p. 12) entende que “ergonomia é o conjunto de conhecimentos científicos relativos ao homem e necessários para a concepção de ferramentas, máquinas e dispositivos que possam ser utilizados com o máximo de conforto, de segurança e de eficácia”. Ampliando esta visão, Dul & Weerdmeester (2004) entendem que a ergonomia enfoca o homem na busca da adaptação de suas capacidades e limitações físicas e psicológicas em relação à eliminação das condições de insegurança, desconforto, ineficiência e insalubridade. Para Iida e Guimarães (2016) a ergonomia, também chamada de fatores humanos, “é o estudo da adaptação do trabalho ao ser humano”, tendo o trabalho uma acepção ampla, isto é, vai além da execução de tarefas por meio de máquinas ou equipamentos, que podem ser empregados para transformar materiais, mas sim, todas as situações em que ocorre o relacionamento entre o ser humano e uma atividade produtiva, sejam de bens ou serviços. Portanto, além do ambiente físico, a concepção de trabalho envolve aspectos organizacionais. Para a Associação Brasileira de Ergonomia (ABERGO, 2017), em conformidade com a Associação Internacional de Ergonomia – IEA (2000), a definição oficial de ergonomia vai ao encontro de uma abordagem científica que relaciona o entendimento das interações entre os seres humanos e diferentes elementos ou sistemas, e à aplicação de teorias, princípios, dados e métodos a projetos com o objetivo de aperfeiçoar o bem-estar humano e o desempenho global do sistema. Ampliando essa abordagem podemos conceber a ergonomia como um estudo científico que visa à adequação do meio ambiente de trabalho aos sujeitos nele inseridos, através da aplicação das normas de referência aos ambientes físicos avaliados como insalubres e/ou desconfortáveis. A este desempenho global do sistema, nos dias atuais, o desenvolvimento da ergonomia pode ser caracterizado de acordo com quatro níveis de exigências: 1. Exigências tecnológicas: face ao aparecimento de novas técnicas de produção que impõem novas formas de organização do trabalho; 2. Exigências organizacionais: em função da necessidadede uma gestão mais participativa, na qual o trabalho a ser realizado se dá por meio de times e produção enxuta realizada em células que impõem uma maior capacitação e polivalência profissional; 3. Exigências econômicas: em detrimento do aumento da expectativa de uma melhor qualidade e a um custo da produção menor, que impõem novas condicionantes às atividades de trabalho, tais como práticas que buscam o zero defeito, zero desperdício e o zero estoque; 4. Exigências sociais: ligadas à melhoria das condições de trabalho e, também, do meio ambiente. Em face destas e das novas exigências e de acordo com ABERGO (2017), os campos de estudos ou domínios de especialização da ergonomia são: 1. Ergonomia física: neste domínio, os temas relevantes abrangem o estudo da postura no trabalho, manejo de materiais, movimentos repetitivos, distúrbios musculoesqueléticos relacionados ao trabalho, projeto de posto de trabalho, segurança e saúde. Para tal, as características da anatomia humana, antropometria, fisiologia e biomecânica devem ser consideradas. Para Iida e Guimarães (2016), a antropometria se refere às medidas físicas do corpo humano, sendo que até a década de 40, visavam apenas determinar grandezas médias da população, com pesos e estaturas. Os estudos mais recentes passaram a contemplar e determinar as variações e os alcances dos movimentos. 2. Ergonomia organizacional: relativo à otimização dos sistemas sócio técnicos, abrangendo suas estruturas organizacionais, políticas e de processos, principalmente através das comunicações, projeto de trabalho, organização temporal do trabalho, trabalho em grupo, projeto participativo, novos paradigmas do trabalho, trabalho cooperativo, cultura organizacional, organizações em rede e gestão da qualidade. 3. Ergonomia cognitiva: no início a ergonomia se preocupou em desenvolver pesquisas e projetos voltados para os aspectos antropométricos. Com a evolução tecnológica esta voltou seu interesse, também, para o desenvolvimento de sistemas automáticos e informatizados com ênfase na natureza cognitiva do trabalho, ou seja, o trabalho mental ganhou o reconhecimento de importância, tanto quanto o físico. Assim, o domínio cognitivo se relaciona aos processos mentais, tais como percepção, memória, raciocínio e a forma de como afetam as interações entre seres humanos e diferentes elementos de um sistema. Nesta abordagem, busca-se entender e avaliar a carga mental de trabalho, tomada de decisão, desempenho especializado, interação homem computador, estresse e treinamento. Em face à sua abordagem e importância, essa abordagem receberá tratamento especial e complementar na aula 2. Como pode ser verificado nessas definições, exigências e domínios ou campos de estudo que a ergonomia se torna cada vez mais importante, em face à complexidade do ambiente organizacional, cada vez mais global. Temos de, ainda, levar em consideração que este é, em sua maioria capitalista, o que impõem às organizações e, por consequência, aos funcionários, desempenho em forma de redução de custos e aumentos da lucratividade, isto é, eficiência e eficácia. Nesta busca incessante, podem surgir os conflitos, aumento das tensões que pode precarizar os relacionamentos e, desta fragilidade podem surgir ou potencializar os problemas relacionados às limitações físicas e psicológicas. Corroborando com essa visão, Abrahão (2007) compreende que o conceito de variabilidade deve ser central na ergonomia, pois nem os indivíduos e nem as situações de trabalho se apresentam sempre de forma constante. Para o autor, as pessoas, por possuírem características que os diferenciam entre si, tais como aspectos demográficos (gênero, idade e classe social), experiência, formação e estratégias utilizadas, que constituem a variabilidade interindividual vão regular a forma de trabalhar de maneiras diferentes. Ainda segundo o autor, a mesma lógica se aplica em seus atos, pois o indivíduo não se comporta sempre da mesma maneira, mesmo em situações semelhantes, devido a aspectos fisiológicos, como os processos metabólicos, doenças e outras variáveis; cognitivos, como o aprendizado; e o afetivo, como as alterações de humor. Existe então uma variabilidade intra-individual. Ainda na visão Abrahão (2007), as situações de trabalho também não são constantes, pois existe uma gama de variáveis previstas (sazonalidade, dinâmicas da produção) e imprevistas (como flutuações no mercado, problemas envolvendo a matéria-prima, panes nos sistemas de informação, acidentes e incidentes), que compõem o cenário no qual se dá a execução do trabalho. Também há de ser consideradas a evolução e a inserção de novas tecnologias que, também, poderão alterar a natureza do trabalho, gerando assim a necessidade de se compreendê-lo não como um fenômeno estático, mas sim dinâmico, em função das variáveis que o compõem. TEMA 4 – ERGONOMIA: OBJETIVOS, CAMPOS DE ATUAÇÃO E RELAÇÃO COM AS DIFERENTES PROFISSÕES Independentemente da definição que se venha a adotar, em todas elas há a abordagem sistêmica, isto é, o ser humano deve ser visto como um ser complexo e dentro de um sistema organizacional, mais complexo ainda, e deste relacionamento se espera: • Possibilidade de controle da introdução de novas tecnologias nas organizações e sua adaptação às capacidades e habilidades humanas existentes; • Tornar o ambiente de trabalho motivador e aumentar a satisfação pelo trabalho a ser desenvolvido; • A partir das características do trabalho e das pessoas, adaptar o local e as condições de trabalho para um maior e melhor desempenho; • Quando da aquisição de equipamentos, máquinas e tecnologias, definir os requisitos; • Minimizar e/ou eliminar os riscos ocupacionais, a partir da identificação e análise ergonômica; • O conforto e a saúde dos trabalhadores: visando evitar os riscos de acidentes e ocupacionais inerentes às atividades, bem como, para diminuir a fadiga física, mental e/ou psíquica; • Eficácia: relacionada à produtividade e qualidade; Para Iida e Guimarães (2016) existem diversos fatores que influenciam no desenvolvimento da tarefa pelo homem, conforme figura 4, sendo que o objetivo básico da ergonomia é minimizar os fatores que causem consequências nocivas ao homem e, em contrapartida, proporcionar mais segurança e saúde aos trabalhadores. Figura 4 – Fatores que influenciam no desenvolvimento do sistema produtivo Fonte: Adaptado de Iida e Guimarães, 2016. Sob esta ótica, Iida e Guimarães (2016) entendem que a ergonomia visa essencialmente à: • Saúde e segurança: são preservadas quando as exigências do trabalho e do ambiente não ultrapassam as limitações fisiológicas e cognitivas, evitando assim situações de estresse, fadiga, riscos de acidentes e de doenças ocupacionais que podem surgir em longo prazo. • Satisfação: resultado do atendimento das necessidades e expectativas do trabalhador, o que gera sensação de bem-estar e conforto. Para tal, faz-se necessário que o ambiente propicie facilidade de aprendizagem, possibilidade de crescimento pessoal e profissional, ambiente físico e social saudáveis, bem como remuneração justa. Como consequência os trabalhadores são mais produtivos e passam a adotar comportamentos mais seguros. Ampliando a visão dos autores e pesquisadores acima retratados, ainda podemos considerar como objetivos da ergonomia: • Reduzir os impactos das cargas externas (ambiente fora da organização), ajustando as exigências do trabalho às possibilidades do trabalhador; • Adaptar e/ou desenvolver máquinas, equipamentos e instalações visando à eficiência e eficácia, com segurança; • Melhorar os postos de trabalho visando assegurar a redução e/ou eliminação de doenças ocupacionaisligadas à postura incorreta; • Tornar o ambiente físico do posto de trabalho minimamente adequado às necessidades e capacidades físicas do trabalhador; • Assegurar o alcance dos objetivos organizacionais, por meio de um ambiente propício à qualidade de vida no trabalho. • Eficiência e produtividade: medem os resultados gerados em comparação com os recursos que foram empregados e o uso do tempo. Obtidas pelo bom planejamento, organização do trabalho, tecnologia utilizada e capacitação dos trabalhadores que passam a empregar melhor o conhecimento disponível. Contudo, a produtividade deve ser obtida dentro de certos limites, pois, quando submetido um trabalhador a situações extremas, pode implicar em prejuízos à saúde, segurança e satisfação. Assim, os custos adicionais que podem ser gerados para reparar os danos não justificam o aumento do lucro obtido pelo aumento indiscriminado da produtividade. 4.1 Relação da ergonomia com as diferentes profissões e seu campo de atuação De acordo com Iida e Guimarães (2016), a ergonomia inicia-se com o estudo das características dos trabalhadores para posterior projeto do trabalho a ser executado, visando preservar a saúde e o bem-estar do trabalhador. Neste sentido, o ser humano é a base da ergonomia para o projeto do trabalho, adaptando este às características e limitações dos trabalhadores. Isto implica no projeto de máquinas e equipamentos passíveis de operação pela maioria da população, em condições adequadas de trabalho e sem exigir sacrifícios para o trabalhador. Contudo, lembram os autores que a realidade no mundo do trabalho em muitas empresas ainda não atenta para essa prática, isto é, a preocupação é focada em máquinas, equipamentos e softwares, tendo o trabalhador como elemento a ser adaptado. Esta visão não é adequada, pois as pesquisas e estudos comprovam que esta situação produz muita fadiga e, por consequência, baixa produtividade, falhas e aumento de acidentes. Ainda segundo autores, a exceção pode acontecer em situações onde os custos de adaptação sejam muito elevados, justificando assim a seleção de trabalhadores com características especiais, tais como, estatura, capacidade física ou alto nível intelectual. Conforme pode ser verificado, a ergonomia, por se basear em conhecimentos nas ciências do homem, está de forma direta e indiretamente se relacionando com várias áreas de investigação, bem como profissões, das quais podemos destacar: • Engenheiros de produção: cabem a estes profissionais o projeto, a implantação, a operação, a melhoria e a manutenção de sistemas produtivos integrados de bens e serviços, envolvendo homens, materiais, tecnologia, informação e energia. • Médicos do trabalho: podem ajudar na identificação de locais que possam vir a provocar acidentes ou doenças ocupacionais e podem realizar acompanhamento de saúde nos trabalhadores. • Analistas do trabalho: ajudam no estudo dos métodos, tempos e postos de trabalho. • Psicólogos: geralmente envolvidos em seleção e treinamento de pessoal, podem ajudar também na implantação de novos métodos. • Desenhistas industriais: podem ajudar na adaptação de máquinas e equipamentos, projetos de postos de trabalho e sistemas de comunicações. • Educação Física: podem ajudar com técnicas e exercícios de compensação em atividades de trabalho, assim como programas de aptidão física. Outros profissionais também podem vir a auxiliar e contribuir na resolução e/ou minimização dos problemas ergonômicos, tais como profissionais da área de recursos humanos, enfermeiros, entre outros. TEMA 5 – ERGONOMIA: CLASSIFICAÇÃO Para Vidal (2002), conforme figura 5, a ergonomia pode ser classificada conforme as maneiras de se diferenciar e à forma de atacar os problemas, ou abordagem, ou ainda quanto à forma de encaminhar soluções, isto é, as perspectivas e, quanto à forma de agir numa realidade efetiva, ou finalidade propriamente dita. Figura 5 – Classificações da ergonomia Fonte: Adaptado de Vidal, 2002. 5.1 Quanto à abordagem (objeto): ergonomia de produto e produção Iida e Guimarães (2016) estabelecem uma distinção entre os objetos de ação ergonômica, seja uma ergonomia de produto, isto é, voltada para a incorporação de recomendações ergonômicas no projeto de artefatos diversos, seja ergonomia de produção, voltada para o projeto de sistemas de trabalho. Nesta visão, de forma simplista, busca-se estabelecer a distinção do produto da ação ergonômica, que se materializa no projeto de objetos, tais como equipamentos, ferramentas, utensílios, vestuário, mobiliário, entre outros, ou no projeto de situações de trabalho, tais como normas, procedimentos, políticas, ambientes, e demais elementos organizacionais. • Ergonomia de produto: podemos exemplificar essa abordagem por meio da aplicação da ergonomia em produtos que são projetados visando à facilidade de manutenção, no desenvolvimento de hardwares que são concebidos em termos de arquitetura de placas substituíveis, facilitando a reativação rápida de uma unidade em pane, na indústria automobilística pela adoção da fabricação por consórcios modular, isto é... • Ergonomia de produção: nesta abordagem, busca-se o entendimento das condições reais da atividade de produção. Neste sentido, a ergonomia de produto terá facilitado a produção, caso os equipamentos e acessórios forem concebidos dentro da observância de preceitos ergonômicos (layout, proximidade, ilhas de fabricação, sistemas modulares, entre outras facilidades). 5.2 Quanto à perspectiva: ergonomia de concepção e de intervenção Nestas perspectivas, a ação ergonômica se dá por meio de projeto, buscando adequada concepção (prevenção), ou se atua sobre uma realidade (correção) por meio da ergonomia de intervenção. No primeiro caso há menores restrições de ordem prática, enquanto no segundo, as margens de manobras costumam ser extremamente reduzidas. • Ergonomia de concepção: pode ser sintetizada como a elaboração, com base na ergonomia de novos produtos (bens e/ou serviços), processos, métodos de trabalho ou sistemas informatizados. Para tal, podem-se adotar métodos e modelagens de produto ou produção. Exemplo: na elaboração de uma nova sala de controle, uma nova planta ou um novo escritório, normalmente, a demanda é acompanhada da necessidade ou do desejo de que outras mudanças ocorram, tais como a adoção de tecnologia mais moderna, novas rotinas de trabalho, novos processos ou tarefas. • Ergonomia de intervenção: a perspectiva de intervenção visa dar uma resposta a uma demanda do cliente, que deverá ser trabalhada e uma solução deverá ser encaminhada para implementação em uma situação que guardará muitos aspectos comuns com a situação atual. Os métodos de ergonomia de intervenção são os procedimentos básicos da ergonomia: métodos e técnicas de Análise Ergonômica do Trabalho (AET) devidamente combinados com as listas de verificação, métodos alternativos e criativos para responder às situações ou passagens inusitadas e com soluções que incorporem tanto as recomendações do diagnóstico situado como as dos manuais de fatores humanos. O importante na intervenção é chegar à tomada de providências úteis, práticas e aplicadas ao caso. A intervenção de produção não necessariamente significa uma mudança física, mas pode ser um parecer que fundamente uma opinião ou uma atitude. 5.3 Quanto à finalidade: ergonomia de correção, enquadramento, remanejamento e modernização Nestas perspectivas, Vidal (2002) entende que ao atuar no produto (bem e/ou serviço), na produção, na concepção ou intervenção, admite-se quatro finalidades de ação: 1. Pode ser necessária a adoção de padrões e parâmetros previamente estabelecidos a partir especificações,ou ergonomia de enquadramentos. 2. Havendo necessidade de mudança limitada no existente a partir de uma análise inicial, caso de uma ergonomia de correção. 3. Sendo necessárias mudanças mais ou menos amplas do existente, caso de uma ergonomia de remanejamento. 4. Caso o remanejamento se dê num contexto de mudança na base técnica do processo de produção (por exemplo automação), teremos uma ergonomia da modernização. Em cada um destes casos o profissional que está realizando a análise e/ou estudo deverá atentar para as circunstâncias, isto é, os enquadramentos podem estar associados na única forma de ação possível, mas é certamente a de menor efeito no médio prazo. Enquanto as correções se convergem para as alterações que se façam necessárias e/ou obrigatórias no curto prazo. Assim, as melhorias somente se tornarão favoráveis, dependendo de sua forma de condução e, como o profissional vai apresentar seus argumentos sobre as necessidades e/ou vantagens que as mudanças trarão. • Enquadramentos: a ergonomia de enquadramento visa à adequação ou atendimento a uma legislação, norma, padrão, programa ou política organizacional. • Correção: ergonomia de correção significa reconhecer a existência de uma falha ou erro de projeto, de decisão ou de julgamento que deve ser minimizado ou sanado. • Remanejamentos: as práticas da ergonomia de remanejamento são aquelas que são praticadas ou adequadas em situações nas quais a organização está realizando mudanças. Assim, aproveita-se a situação para corrigir defeitos antigos. • Modernização: a ergonomia de modernização vai ao encontro de práticas organizacionais onde as mudanças se convergem de forma ampla e extensa (podendo ser em termos de abrangência e profundidade). Em virtude dos impactos dessa prática radical de mudanças, normalmente são gerados conflitos de interesses entre as pessoas que tentam aprofundar e os que tentam refrear a marcha dos acontecimentos. Ainda de acordo com Vidal (2002), podemos catalogar no mínimo três processos de modernização: 1. Modernização por sofisticação: ocorre quando a estrutura e forma da base técnica é a mesma, assim, moderniza- se a potência e eficácia de componentes, tais como acontece com hardware e softwares. 2. Modernização por especialização genética: dá-se quando um dispositivo dá lugar a dois ou mais dispositivos, cuja aglutinação converge para ganhos. Um exemplo é o desenvolvimento de um equalizador, a partir dos controles de tonalidade de um amplificador comum que permitiram um ganho de qualidade nos sistemas de reprodução sonora. 3. Modernização por aglutinação lógica: é um processo similar ao da especialização genética. Neste os dispositivos são combinados para dar origem a um componente geralmente mais eficiente ou eficaz (mais compacto, mais potente etc.). A ergonomia contribui em cada um desses processos de modernização por meio da integração de relatos, pesquisas, análises e outros resultados. FINALIZANDO Nesta aula primeiramente você aprendeu que no processo de evolução da humanidade as exigências ao nosso corpo aumentaram, contudo, face às tecnologias mudamos nossa atitude e isso vem gerando impactos negativos para nossa saúde. Você conheceu, também, um breve histórico sobre o surgimento (fatores condicionantes) da ergonomia e sua evolução e, por fim, você pode entender a classificação da ergonomia e seus diversos campos de atuação, bem como oportunidades para atuação de diferentes profissionais. ERGONOMIA E QUALIDADE DE VIDA NO TRABALHO CONVERSA INICIAL Face às transformações socioeconômicas e tecnológicas que ocorreram no mundo do trabalho, que alteram a relação do homem com o trabalho de forma radical e que impulsionam a aplicação da automação e da robótica na realização das tarefas e processos, a ergonomia também evoluiu enquanto ciência e maior abrangência em campo de estudo, pois a realização das tarefas passou a requerer o desenvolvimento de aspectos cognitivos, isto é, a aquisição e processamento de informações. Nesta aula abordaremos as bases da ergonomia cognitiva, isto é, campo da ergonomia que trata dos processos sensoriais de captação de sinais (percepção), seu processamento e armazenamento de informações (memória), bem como seu uso no trabalho (tomada de decisões). Para tal, verificaremos a necessidade da ergonomia cognitiva, aspectos e elementos inerentes ao sistema de informação e comunicação, aspectos sensoriais, memória de curta e longa duração. Também entenderemos como surgem falhas de memorização e como estas podem ser evitadas ou corrigidas, por meio do conhecimento dos mecanismos que provocam o seu aparecimento. CONTEXTUALIZANDO A ergonomia cognitiva, enquanto campo ou domínio da ergonomia, ganhou destaque em pesquisas e emprego prático a partir da década de 1980, face ao crescimento do emprego da informática para automação e robotização do trabalho, que possibilitaram a transferência de tarefas repetitivas e que exigiam o uso da força física para as máquinas e direcionando para o homem a programação, manutenção, comando e controle destas. Por consequência, para a operação desses novos sistemas mais complexos, reduz-se o esforço físico e amplia-se o cognitivo. Para tal, a ergonomia passa a estudar e contemplar os aspectos cognitivos das interações entre homem e o sistema de trabalho e suas consequências. TEMA 1 – ERGONOMIA COGNITIVA: HISTÓRICO As necessidades que são impostas à humanidade, bem como os conhecimentos que foram desenvolvidos ao longo da história, ajudam no entendimento dos porquês da evolução da ergonomia que vem se aperfeiçoando, à medida que vai aprimorando e se apropriando de novos conhecimentos (Lida; Guimarães, 2016). A expansão da ergonomia se deu de forma horizontal a partir do momento que outros serviços começaram a se beneficiar dos seus fundamentos, tais como: o setor de serviços (saúde, educação, transporte, lazer e outros) e até mesmo no estudo de trabalhos domésticos. Neste sentido, as pessoas foram favorecidas, pois no desempenhar de suas atividades houve uma redução do esforço físico repetitivo. Contudo, se anteriormente isto se fazia por meio da utilização dos fundamentos da ergonomia, a realização das tarefas passou a requerer o desenvolvimento de aspectos cognitivos, isto é, a aquisição e processamento de informações. Para tal, a ergonomia evoluiu em consequência de transformações socioeconômicas e tecnológicas que ocorreram no mundo do trabalho, alterando a relação do homem com o trabalho de forma radical pelo surgimento da automação e da robótica. Neste sentido, Seleme e Seleme (2008) concordam que os avanços na indústria foram alavancados pela automação da produção, na qual a robótica e a engenharia genética foram acrescentadas ao processo produtivo, o que possibilitou a redução da dependência da mão de obra em detrimento da alta tecnologia. Ainda segundo Seleme e Seleme (2008), a evolução da automação industrial deu origem aos robôs e ao desenvolvimento da tecnologia da informação. Esta iniciada com projetos auxiliados por computador, utilizados para a realização da engenharia simultânea, que permite a redução dos tempos e resolução de problemas de projetos de produtos. Já a manufatura auxiliada por computador possibilitou uma nova modelagem industrial. Neste sentido, os sistemas automáticos mais elaborados e funcionais possibilitam a eficiência e eficácia, ao possibilitar o aumento da produtividade e redução do emprego do trabalho humano. Portanto, o emprego da tecnologia da informação trouxe mais rapidez e precisão, com a melhor utilização dos canais globais de comunicação. Neste sentido, compreender este novo cenário competitivo e preparar as pessoas para essa nova realidadede intensas e profundas mudanças no trabalho, permitindo que todos que o exerçam nele encontrem, em sua diversidade, interesse, deve ser a preocupação do profissional que atue direta ou indiretamente com a ergonomia. Para Guérin et al. (2005), as mudanças e adequações no trabalho, que visam desenvolver uma sensação de conforto ao homem, são importantes para que este possa desenvolvê-lo com interesse e um certo grau de motivação, pois tais fatores acabam interferindo positivamente em seu desempenho. TEMA 2 – ERGONOMIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES Na análise da atividade, busca-se a avaliação da atividade mental do usuário no tratamento da informação, quanto à percepção, à representação mental e raciocínios, ou seja, envolve os domínios do comportamento humano, seus processos mentais de tratamento da informação, que são os domínios da ergonomia cognitiva (Sperandio, 1988). Ainda nesta visão, Abrahão (2005) compreende que a ergonomia cognitiva visa explicitar e articular os processos cognitivos face às situações de resolução de problemas em diferentes níveis de complexidade, conforme ilustrado na figura 1 e, nesse sentido, ela deve contribuir para a construção do referencial teórico e metodológico que permita análise de como o trabalho afeta a cognição humana, e como é, ao mesmo tempo, afetado por ela. Figura 1 – Exemplos de volantes da fórmula 1 Fonte: Pixabay - Markusspiske Na figura 1, podemos observar a evolução da tecnologia empregada no passado e na atualidade. Na atualidade, um volante da fórmula 1 pode reunir mais de 40 funções para serem executadas pelo piloto durante uma corrida há mais de 370 km/hora, enquanto este presta atenção à pista e aos demais competidores. Portanto, no domínio cognitivo, busca-se respostas para as questões relativas aos processos mentais, a partir da avaliação do efeito da sobrecarga mental no trabalho e como esta pode gerar disfunções tais como o estresse e as doenças ocupacionais. Para tal, a tecnologia da informação e da comunicação tem papel central nesse domínio, uma vez que envolve fatores tecnológicos (softwares, hardwares, orgware e peopleware) na forma como a organização lida com os meios de produção, sendo o elemento mais importante a interface homem-máquina (Pacheco et al. 2005). Ampliando essa visão, no entender de Falzon (2007, p. 5), a ergonomia cognitiva "trata dos processos mentais, tais como a percepção, a memória, o raciocínio e as respostas motoras, com relação às interações entre as pessoas e outros componentes de um sistema". Nesta visão, os principais aspectos a ser contemplados por esta área de estudo devem se concentrar em: carga mental, processos de decisão, desempenho especializado, confiabilidade humana, estresse profissional, treinamento, concepção e interação homem/computador. Ainda de acordo com Falzon (2007) os desenvolvimentos tecnológicos introduziram transformações na natureza do trabalho, expressas no surgimento de novas funções humanas que requerem maior componente cognitivo, como as atividades ligadas ao planejamento, diagnóstico, gestão, controle, prevenção e outras, cuja complexidade aumentada requer maior emprego do conhecimento, como a informática, a automação e a robótica. Ao retratar o domínio ou campo de atuação da ergonomia cognitiva, Vidal e Carvalho (2008) recorrem a Montmollin que retrata uma cena que aqui foi adaptada, buscando uma visão mais geral e cada vez mais presente nas cidades brasileiras: Vamos imaginar um policial (trabalhador) diante do painel de um centro integrado de Vigilância por meio de controle de Monitoramento de Segurança. Seu trabalho consiste em monitorar, por meio do sistema de instrumentação, o fluxo de pessoas e automóveis e, se necessário, fazer regulações necessárias, ou seja, acionar os dispositivos adequados por meio do sistema de controle. Como o monitoramento da vigilância não pode parar, ela funciona em turnos de trabalho e, por meio deste centro, evitam-se assaltos, roubos, furtos e até mesmo assassinatos. Assim, o terminal em foco permite monitorar pelas telas de vídeo as situações de riscos e agir por meio de comandos do teclado dos terminais. O nosso trabalhador tem dores nas costas, assim, um profissional com conhecimentos de ergonomia pode ajudar a conceber cadeiras melhor adaptadas à atividade ou propor essa melhoria. O mesmo trabalhador tem dores de cabeça. Novamente entra o nosso profissional que buscará monitores menos ofuscantes. O nosso trabalhador está cansado, pois já está diante do computador há mais de seis horas e ele já tem uma certa idade. O profissional reconhece os efeitos da duração do trabalho sobre o organismo humano. Assim ele ajudará a organizar melhor os turnos e as pausas. Mas isso não é tudo. O trabalhador não está sentado ali, sem fazer nada, ele exerce várias atividades: ele percebe e interpreta as informações que são visualizadas nos monitores e toma decisões a partir de percepções que tem e, por vezes, se comunica (passa informações) para outros colegas que atuam no mesmo centro e em campo. O profissional pode aprender, mediante a análise de sua atividade, muito sobre os raciocínios empregados por este trabalhador. Ele pode, então, ajudar a melhor apresentar as informações nos monitores, a melhor formular os problemas de diagnóstico e de regulação do centro de controle, a conceber uma organização do trabalho mais condizente com as necessidades de períodos calmos dos períodos perturbados (maior número de pessoas nas ruas, parques, entre outros), a estruturar uma formação e treinamentos mais adequados, a estabelecer meios e métodos de comunicação entre as pessoas. Como pode ser verificado neste retrato de uma atividade profissional, o escopo laboral cada vez mais supera a dimensão física ou manual e incorpora trabalho mental. Para tal a ergonomia, ao reconhecer que uma atividade está sendo exercida em situações inadequadas, buscará realizar melhorias e adaptações do ambiente, bem como reconhecer os limites do ser humano para o ajuste adequado, e isto perpassa o estudo ergonômico do ponto de vista cognitivo e, posteriormente, complementado pelas análises do campo físico da atividade. Nesta abordagem, Montmollin (1990) observa diferenças entre a ergonomia cognitiva de componentes humanos e a ergonomia cognitiva da atividade humana, buscando compreender o que causam os erros, acidentes e disfunções. Contribuindo com essa visão, Abrahão (2005) considera que as análises da situação de trabalho permitem perceber a probabilidade de ocorrência de erros e acidentes. Para tal, o foco da ergonomia cognitiva deve convergir para a análise da situação real, visando compreender como se dá a interação do homem com os sistemas, de modo a obter mais eficiência e eficácia de suas ações. Para tal, a ergonomia busca na psicologia cognitiva determinar os modos de acoplagem do sistema cognitivo humano com os automatismos empregados para o ajudar, ou o substituir, visando garantir que a substituição de um pelo outro em situações de urgência possa ocorrer sem incidentes (Falzon, 2007). TEMA 3 – NECESSIDADE DA ERGONOMIA COGNITIVA Ao tratar sobre a necessidade da ergonomia cognitiva, Vidal e Carvalho (2008) entendem que esta deve passar pelas abordagens filosófica, social e tecnológica. A abordagem filosófica reconhece que os processos de trabalho vão além dos aspectos físicos, pois, face ao desenvolvimento das sociedades e da forma de produção, muitas atividades antes relegadas aos esforços físicos por meio de operações manuais convergiram para atividades que envolvem operações de sistemas complexos e, muitas vezes, perigosos. Na abordagem social, Vidal e Carvalho (2008) reconhecem que os trabalhadores realizam em muitas de suas atividadeslaborais o planejamento, análise, controle, gestão, diagnóstico e coordenação e, para tal, há a necessidade de qualificação, sendo que a ergonomia cognitiva nos permite “identificar, com bastante efetividade, em que consiste a qualificação requerida para ocupar uma posição de trabalho numa empresa” (Vidal e Carvalho, 2008, p. 10). Já a abordagem tecnológica exige a necessidade de estudos sobre cognição pela evolução das tarefas profissionais. Dada a necessidade de melhoria da qualidade e produtividade, cada vez mais assistimos à incorporação da programação nos objetos de uso cotidiano, o uso de novas tecnologias e sistemas, bem como, crescente automação. Ainda segundo Vidal e Carvalho (2008) a tecnologia incorporada à vida moderna explica a contribuição da ergonomia: ajudar a entender como operamos e como isso pode projetar os artefatos físicos e, como anexo a estes, o conjunto de suposições de como funcionamos mentalmente juntamente com os recursos técnicos que nelas se baseiam. A esse conjunto o autor adota a terminologia “mentefatos”, isto é, a construção de artefatos adicionados aos dispositivos técnicos e que nos ajudam a usá-los corretamente. Ainda Vidal e Carvalho (2008) retratam vários acidentes: usina nuclear de Three Miles Island (USA – 1979), o caso Therac-25 (Texas/USA – 1987) e a queda do voo 402 (Brasil – 1996 no aeroporto de Congonhas/SP), que podem nos ajudar a entender a necessidade da ergonomia cognitiva e reforçar a importância de estudos neste campo de domínio. Em todos estes acidentes as tecnologias e aparatos exigiram que as tarefas fossem executadas de forma eficiente e eficaz, sendo que estas envolviam processos e operações cognitivas. As perícias dos acidentes apontaram que estes foram ocasionados pela falha do processo cognitivo, isto é, foram ocasionados por falhas de monitoramento, interpretação, tratamento de informações, resolução de problemas e memória. Vidal e Carvalho (2008) lembram que a inovação tecnológica vem cada vez mais requerendo dos trabalhadores crescente exigência cognitiva, e a ergonomia como disciplina busca soluções para este e outros problemas. Para tal, faz-se necessário entender o que acontece com a pessoa em sua atividade laboral, ao operar sistemas mais ou menos complexos e em situações mais ou menos complicadas e conturbadas. TEMA 4 – INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO No senso comum, associamos informação com notícias transmitidas pelos canais ou mídias impressas, tais como jornais, revistas, bem como meios digitais, televisão, rádio, entre outras. Contudo, informação na abordagem técnica e científica deve ser considerada como uma transferência de energia que tenha algum significado em uma dada situação. Assim, diariamente, nós, enquanto seres humanos, ao interagirmos continuadamente com outras pessoas, máquinas, equipamentos e o ambiente, estamos trocando de forma contínua informações entre elementos, nos dois sentidos, ou seja, recebendo e transmitindo informações. Abordando sobre comunicação, Knapik (2008) entende essa como um processo de interação e troca de informações, de transmissão de ideias e sentimentos, seja por meio de palavras ou símbolos que veiculam uma mensagem, ideia ou sinal. A importância da comunicação na visão da ergonomia se dá, em função da complexidade desse elemento, face à possibilidade de existirem barreiras por diferenças na percepção e na forma de pensar das pessoas. Assim, uma mesma comunicação pode ser entendida de maneiras diferentes, o que pode induzir a falhas. Para Robbins (2002) a complexidade da comunicação pode ser explicada pelo conceito de sistemas conforme ilustrado na figura 2. Figura 2 – Processo de comunicação Fonte: Adaptado de Robbins (2002) No processo de comunicação temos os seguintes componentes: Emissor: trata-se da fonte, indivíduo ou processo que está produzindo a mensagem. Codificação: ou código que é empregado para o processo de transformação de uma ideia em mensagem, seja por meio de símbolos, escrita, linguagem humana, sons, entre outros. Meio: ou canal que é empregado pelo emissor para transportar a mensagem Decodificação: é a interpretação a ser dada ou leitura e assimilação do significado da mensagem recebida pelo receptor. Receptor: é o destinatário, processo ou pessoa que recebe a mensagem após decodificá-la. Assim como você pode observar, neste presente momento está havendo, mesmo que de forma inconsciente, uma comunicação entre o autor e você leitor. Eu, enquanto autor (emissor), estou buscando transmitir uma ideia ou mensagem para você leitor (receptor). Para tal, foi empregado um sistema de codificação da mensagem por meio de símbolos (letras) que associadas formam uma escrita. Esta mensagem está fluindo por um meio físico impresso que está sendo decodificado por meio da leitura e interpretação por você receptor. Para que este processo exista ainda temos que associar a este sistema componentes sensoriais que lhe serão apresentados a seguir. Ainda, você pode observar na figura 2 que entre o receptor e emissor há a presença da resposta (feedback). Este componente deve existir para que o emissor possa verificar se a mensagem ou ideia transmitida foi compreendida na sua totalidade ou de acordo com a proposta. Contudo, este sistema não é perfeito pela presença de ruídos. Um ruído, geralmente associado a sinais auditivos, é um conceito amplo que deve ser estendido para qualquer tipo de sinal que pode atrapalhar ou dificultar o processo de comunicação. Assim, uma luva, ao diminuir a sensibilidade, pode se apresentar como um ruído ao dificultar ou atrapalhar a percepção de uma mensagem vinculada ao tato. Um ruído pode ser considerado como um componente subjetivo, isto é, o que pode ser associado a ruídos por uma pessoa, pode ser extremamente agradável para outra. Podemos tomar como exemplo uma música alta que pode atrapalhar ou dificultar a concentração necessária para a percepção de uma mensagem. Em qualquer caso em que o ruído esteja dificultando o processo de comunicação chamamos de mascaramento e cabe à ergonomia cognitiva eliminar ou reduzir mascaramento provocado pelo ruído. Para tal, busca-se aumentar a intensidade do estímulo (sinal), empregar estímulos menos suscetíveis a interferências, ou ainda, uso de sinais redundantes, ou seja, emprega-se duplicidade de estímulos (2 ou + canais) para o mesmo propósito. Esta apresenta vantagens conforme ilustrados no quadro 1. Fonte: Adaptado de Iida e Guimarães 2016 Um bom exemplo prático do uso de sinais redundantes foi empregado nos ônibus. Muitos acidentes aconteceram quando pessoas passavam atrás de um ônibus e, o motorista ao acionar a marcha ré, por não ter a visão traseira acabava por cometer atropelamentos. As pessoas só tinham um sinal luminoso (piscas) que são acionados quando do engate da marcha ré. Atualmente, além do sinal luminoso, foi incorporado nestas máquinas o sinal sonoro. Assim, ao se ter sinais redundantes (luz + som) a percepção da mensagem permite a ação (resposta motora) mais rápida e eficiente. Neste sentido, para uma comunicação eficiente, faz-se necessário saber antecipadamente como o ser humano decodificará a mensagem, quais os meios o atingem e qual será a sua resposta ao estímulo da comunicação. TEMA 5 – ERGONOMIA COGNITIVA E ASPECTOS SENSORIAIS A ergonomia cognitiva ao estudar, principalmente, os sistemas onde há predominância dos aspectos sensoriais (percepção e processamento de informações) e de tomada de decisões. Isso envolve o processo de captação de informações (percepção), armazenamento (memória) e seu uso no trabalho (decisão), conforme ilustrado na figura 3. Figura 3 – Modelo de processamento humano de informações Fonte: Adaptado (IIDA e GUIMARÃES, 2016) Sensação: refere-se aos processos biológicosde captação de um estímulo por meio de energia ambiental, isto é, a energia é captada por células nervosas dos órgãos sensoriais, sob a forma de luz, calor, pressão, movimento e partículas químicas. A energia que foi captada é então convertida em um impulso eletroquímico, que é transmitido ao sistema nervoso central, onde pode ou não ser processado, o que dependerá da percepção. De acordo com Iida e Guimarães (2016), existem quatro variáveis que influem no processo de captação dos estímulos e sua transformação em informação: 1. Modalidade do estímulo: representado por luz, calor, vibrações sonoras; 2. Intensidade do estímulo: deve estar dentro de limites mínimos e máximos. Nós seres humanos não conseguimos captar sons abaixo de 20 Hz (limiar da audição) e nem acima de 20000 Hz (limiar da sensação dolorosa); 012 3. Duração do estímulo: tempo adequado; 4. Localização: espacial. Percepção: é o resultado do processamento do estímulo sensorial, dando-lhe um significado. Nesse processo são empregadas informações que foram armazenadas na memória, convertendo as sensações em significados, relações e julgamentos, ou seja, enquanto a sensação é um fenômeno essencialmente biológico, a percepção envolve processamento, isto é, a percepção está ligada à recepção e reconhecimento de uma informação, comparando-a com uma informação anteriormente armazenada na memória. Assim, a capacidade de percepção está diretamente ligada às experiências anteriores, além de fatores individuais, tais como personalidade, nível de atenção e expectativas. Neste sentido, a mesma sensação pode produzir percepções diferentes em diferentes pessoas, levando-as a diferentes tipos de decisões. Exemplo: no processo de leitura, as letras impressas no papel são convertidas em sensações pelas células fotossensíveis dos olhos. Esses estímulos são conduzidos pelo nervo óptico até o lobo ocipital do cérebro, onde são “decifrados” com o uso da memória. Assim, por exemplo, a percepção da letra “A” está associada à identificação de suas formas e o seu reconhecimento, em comparação com um padrão armazenado na memória. Memorização: no processo de memorização, as informações do ambiente são captadas, interpretadas, filtradas e armazenadas, em três níveis de processamento: 1. Registro sensorial (sensação e percepção): processos biológicos para captação e significado 2. Memória de Curta Duração (MCD): neste nível de processamento há a retenção das informações por períodos de tempo extremamente curtos – em torno de 5 a 30 segundos e a capacidade de retenção, em média é de 7 unidades, podendo variar (7± 2 não relacionadas entre si) - por isso a MCD também é conhecida como memória de trabalho ou de curto prazo. 3. Memória de Longa Duração (MLD): é aquela que retém informações por um período de tempo maior, por isso, também, conhecida por memória de longo prazo. Tem caráter associativo, isto é, as novas informações são melhor fixadas quando se conectam por associações (desenvolvimento de rotas e/ou mapas mentais). 013 O quadro 2 a seguir sintetiza os níveis de processamentos MCD e MLD Quadro 2 - Diferenças entre MCD e MLD Fonte: Adaptado (IIDA e GUIMARÃES, 2016) Outro importante elemento a ser observado, contudo, que não está presente no processo de cognição mas que pode provocar interferência, é o esquecimento. Este é traduzido na incapacidade de recuperar informações memorizadas. Falhas de memorização podem ser evitadas ou corrigidas, por meio do conhecimento dos mecanismos que provocam o seu aparecimento, a saber: biológicos, interferência de novas informações e emocionais. Em relação ao componente biológico, pouco se pode fazer, uma vez que o envelhecimento é um processo natural e irreversível. Contudo, aos componentes vinculados à interferência de novas informações e emocionais, a ergonomia deve atuar no sentido de minimizar ou eliminar suas causas potenciais. A interferência de novas informações no ambiente laboral normalmente apresenta-se nas organizações por falha ou excesso de informações, em decorrência da precariedade do processo de comunicação. De acordo com Iida e Guimarães (2016, p. 484), “em condições de saturação, as pessoas têm capacidade para selecionar (filtrar) aquelas informações e ações consideradas mais importantes para a tarefa em execução ou para as quais os seus sentidos estão mais “ligados””. Já as causas emocionais podem estar vinculadas à organização do trabalho e aos fatores psicossociais de risco no trabalho. Estes fatores têm sido estudados desde os anos 60, principalmente em virtude do advento das novas tecnologias e sistemas de produção, seja em atividades administrativas como industriais. 5.1 Fatores de Risco Psicossocial no Trabalho (FRPT) A urgência de maior produtividade, associada à contínua redução do contingente de trabalhadores, seja pela automação ou por fatores econômicos, associada à pressão do tempo e ao aumento da complexidade das tarefas, além de maiores expectativas sobre redução dos custos e aumento da lucratividade, estão tornando as relações de trabalho precárias, gerando esgotamento profissional, tensão e fadiga, constituindo-se em fatores psicossociais responsáveis por situações de estresse e falta de qualidade de vida relacionadas com o trabalho. Assim, os fatores emocionais associados aos riscos psicossociais interferem no desempenho mais do que fatores físicos. Para Cox e Griffiths (1995) os riscos psicossociais no trabalho podem ser entendidos como “todos aqueles aspectos do desenho e gerenciamento do trabalho e os contextos social e organizacional que têm potencial para causar dano físico ou psicológico”. Neste sentido, os FRPT também podem ser definidos como as características do trabalho que tencionam e levam ao estresse pelas exigências cada vez maiores no trabalho, combinadas, por muitas vezes, com a falta de recursos para a realização das mesmas. Assim, os riscos psicossociais podem ser categorizados em dois tipos: 1. Estressores: face às demandas laborais, aspectos físicos, sociais e organizacionais que requerem manutenção do esforço e estão associados a certos custos fisiológicos e psicológicos, em face da sobrecarga quantitativa, o que pode acarretar em esgotamento e fadiga; 2. Falta de recursos pessoais e laborais: ligados aos aspectos físicos, psicológicos, sociais e organizacionais que são necessários para a realização das tarefas e cumprimento das metas. Estes, existindo em quantidade e qualidade, reduzem as demandas laborais e podem influir no aumento da motivação, face ao estimulo para o crescimento e desenvolvimento pessoal e profissional. Para tal, existem dois tipos de recursos: os pessoais e os laborais. Os primeiros fazem referência às características das pessoas, tais como autoeficácia profissional, enquanto os segundos estão ligados ao nível de autonomia no trabalho, ao feedback sobre as tarefas realizadas, bem como à formação que a organização proporciona ao trabalhador para que este possa executar de forma adequada as tarefas a este designadas e metas associadas. Por outro lado, a existência de demandas e a falta de recursos para que o trabalhador as realize geram consequências negativas para os trabalhadores e para a organização. Também os FRPT afetam os trabalhadores em sua resposta psicológica e às condições do ambiente de trabalho – relacionamento com supervisores e colegas – agravando a saúde e o bem-estar, provocando danos psicológicos no indivíduo e, por consequência, aumento dos níveis de ansiedade e depressão relacionados ao trabalho, aumento do absenteísmo, baixa motivação para o trabalho, irritabilidade, burnout1 e, por consequência, ineficiência organizacional, evidenciadas pelo baixorendimento, aumento do absentismo e acidentes de trabalho. 1 Burnout = ou síndrome de estar queimado pelo trabalho Exemplos de fatores psicossociais de risco no trabalho estão ligados à carreira profissional, à carga e ritmo de trabalho e ao ambiente social e técnico do mesmo que, somados a outros riscos, entre eles o assédio sexual e/ou moral, estresse ocupacional, entre outros devem ser estudados e contemplados pela ergonomia cognitiva, face aos seus impactos negativos a estes também associados. Guimarães (2017) descreve algumas atividades ou tipos de trabalho que expõem o trabalhador aos riscos psicossociais, entre eles: Atividades nas quais os trabalhos exigem pouco controle sobre o trabalhador e nos métodos de trabalho, o que pode provocar falta de motivação pela subutilização da capacidade do indivíduo; Atividades onde o trabalho não faz pleno uso das potencialidades do trabalhador para a execução das tarefas (subcarga laboral); Atividades onde não há tomada de decisões; Atividades em que o trabalho envolve, somente, tarefas repetitivas e monótonas; Atividades onde o trabalho cujas exigências são percebidas como excessivas (sobre carga laboral); Atividades onde o sistema de pagamento está vinculado à execução da tarefa com rapidez ou sem pausas; Atividades nas quais o sistema de trabalho limita as oportunidades para interação social (falta de qualidade de vida no trabalho e fora dele); Atividades nas quais o trabalho exige alto nível de esforço, sem a percepção de contrapartida financeira, de estima ou status ou de recursos, isto é, não há o equilíbrio de recompensa. 5.2 Erros de memorização De acordo com Iida e Guimarães (2016), os erros de memorização são muito frequentes, contudo, estes podem ser evitados ao serem conhecidos os mecanismos que os provocam. Os autores apresentam exemplos de erros na forma de números, contudo, estes também podem ocorrer na forma de palavras ou conceitos: Erros de transposição: ocorre quando dois ou mais dígitos têm as suas posições trocadas. Exemplo: 67843 no lugar de 68743. Erros de substituição: ocorrem quando um conjunto diferente é lembrado no lugar daquele correto. Exemplo: 8163 no lugar de 8465. Erros de repetição: ocorrem quando um algarismo que apareceu anteriormente repete-se indevidamente. Exemplo: 25.7.1975 no lugar de 25.7. 1985. Erros de confusão: ocorrem quando formas ou sons semelhantes são confundidos entre si. Exemplo: 966 no lugar de 996. Erros de omissão: ocorrem quando se esquece um elemento de uma sequência, produzindo um espaço “vago” ou em “branco” entre outros elementos. Exemplo: 675?3 no lugar de 67583. 5.3 Instrução verbal e memorização Nos nossos dias atuais, muitas tarefas dependem da aplicação correta das informações que foram recebidas em um processo de instrução, sejam em treinamentos, capacitações ou por meio de uma explicação verbal. Portanto, faz-se necessária a compreensão de como essas informações foram apresentadas e memorizadas. Tratando sobre esta temática, Iida e Guimarães (2016) fazem quatro recomendações para que as informações memorizadas possam ser corretamente relembradas, para posterior aplicação: Sequência das palavras: a sequência das palavras da instrução deve corresponder à mesma sequência das operações. Exemplo: caso seja necessário remover uma tampa para apertar um parafuso – a instrução correta deve ser – “remova a tampa e aperte o parafuso” e não: “aperte o parafuso após ter removido a tampa”. O certo e o errado: deve ser dada ênfase na instrução apenas a maneira correta de ser realizada a tarefa e, jamais “misturar” o certo com o errado. Caso a instrução seja fornecida na forma correta e na forma errada, ambas serão memorizadas e, quando essas informações forem necessárias para a realização da tarefa, poderá haver confusão para separar o certo do errado. Caso haja formas alternativas de se realizar a tarefa, estas devem ser repassadas depois de algum tempo, após o método-padrão ou básica da tarefa ter sido apreendido, sem riscos de causar confusão entre o certo e o errado. Informações-chave: para recuperar de forma mais eficientemente uma informação armazenada na memória, as primeiras palavras mencionadas devem fornecer as informações-chave. Estas servem para “puxar” a rede neural correspondente. Essa recomendação é aplicada na localização e abertura da “pasta” do assunto (menu) ou, achar o fio da meada. Um exemplo prático dessa recomendação pode ser aplicado da seguinte maneira - o professor, ao abrir os trabalhos de sua aula semanal, quer recapitular um tema importante da aula da semana passada. Para tal, pode fazer isso empregando duas “pastas” possíveis: tema importante; e aula semana passada. Assim pode falar: “Naquela aula da semana passada que tratamos de um tema importante”. Provavelmente os alunos tiveram várias aulas na semana passada e, portanto, pode ser difícil eles localizarem a aula na “pasta” de aulas da semana passada. Assim, a abertura da aula será mais eficiente se for formulada da seguinte forma: “o tema importante que tratamos na aula da semana passada”. Expectativas do receptor: informações que as pessoas já estejam esperando são mais fáceis de serem percebidas. Para tal, podem ser empregadas informações-chave para “ligar” o ouvinte, anunciando o assunto que será apresentado. Isso cria uma expectativa favorável à recepção da informação. Também, recomenda-se que ao mudar de assunto haja esse reforço, deixando clara a nova informação: “agora vamos tratar de [...]”. FINALIZANDO Nesta aula você pode compreender que, em função das transformações socioeconômicas e tecnológicas que ocorreram no mundo do trabalho que alteram a relação do homem com o trabalho de forma radical e que impulsionam a aplicação da automação e da robótica na realização das tarefas e processos, fez com que a ergonomia também evoluísse enquanto ciência e maior abrangência em campo de estudo, pois a realização das tarefas passou a requer o desenvolvimento de aspectos cognitivos, isto é, a aquisição e processamento de informações. Você compreendeu a importância deste campo ou domínio da ergonomia que trata dos processos sensoriais de captação de sinais (percepção), seu processamento e armazenamento de informações (memória), bem como seu uso no trabalho (tomada de decisões). Também compreendeu como se dá o processo de comunicação e seus elementos, aspectos sensoriais, memória de curta e longa duração, bem como surgem falhas de memorização e como estas podem ser evitadas ou corrigidas, por meio do conhecimento dos mecanismos que provocam o seu aparecimento. Postos de Trabalho & Qualidade de Vida no Trabalho Introdução Neste tema vamos falar sobre os postos de trabalho e como eles devem ser dimensionados. Nele, você também verá o que significa ter qualidade de vida no trabalho. Antes de iniciar seus estudos, assista ao vídeo no material on-line. Problematização Você ocupa um cargo de gerente em uma multinacional. Seu principal trabalho é a gestão de pessoas. Faz apenas 3 meses que você assumiu esse cargo, pois o gerente anterior, que não era uma pessoa muito bem quista pelos empregados, foi para outra empresa. Na gestão do seu antecessor, não havia quase nenhuma preocupação com o bem-estar do trabalhador no ambiente laboral, o que diverge bastante da sua proposta como o atual gerente. Você está enfrentando um dilema, pois os funcionários estão bastante desanimados, devido às atitudes do antigo gerente. Eles também não demonstravam confiança em você. CCDD – Centro de Criação e Desenvolvimento Dialógico O que você faria nessa situação? Não responda agora. Vamos voltar ao conteúdo teórico do nosso temae, ao final, retomaremos a nossa história e apresentaremos as possibilidades de solução para o problema. Postos de trabalho Tradicionalmente, segundo Kruger (2007), a preocupação do posto de trabalho está relacionada aos movimentos corporais necessários para a realização de determinada tarefa e o tempo gasto nesses movimentos. O estudo de tempos e movimentos fundamenta-se nos princípios de economia de movimentos, e leva em conta o menor tempo gasto para desempenhar atividades. De acordo com Faria (1984), o estudo do posto de trabalho divide-se em duas situações: 1. Na análise da tarefa a ser executada para identificar e avaliar os aspectos psicofisiológicos pertinentes à atividade; 2. No estudo da natureza e das condições com a finalidade de melhor adaptar o trabalho à natureza do homem. Sob o ponto de vista da ergonomia, conforme Faria (1984), há outras preocupações e considerações: O homem e o posto de trabalho devem estar extremamente integrados, permitindo ao trabalhador executar suas atividades com conforto, eficiência e segurança. A seguir veremos a definição de posto de trabalho! Mas, antes de se aprofundar no assunto, leia o artigo indicado, clicando no link a seguir! http://www.abergo.org.br/revista/index.php/ae/article/view/265/196 Quando vamos projetar um posto de trabalho e você, como futuro especialista em engenharia de produção, precisa saber que o mais importante é pensar na saúde e na segurança do trabalhador. Mas o que é um posto de trabalho especificamente? Saiba a resposta, assistindo ao vídeo no material on-line. Segundo Iida (2005), o posto de trabalho é a configuração física do sistema homem-máquina-ambiente. Já para Faria (1984), o posto de trabalho é a unidade primária operativa, correspondente a cada trabalhador e a sua respectiva tarefa. Considera-se essa unidade como elementar. Para um projeto seguro e confiável, determinadas medidas do corpo humano são mais importantes que outras. Para o correto dimensionamento dos postos há normas nacionais e internacionais que auxiliam esse processo. Internacionalmente destacam-se as International Standardization Organization, conhecidas habitualmente como ISO (IIDA, 2005): No Brasil temos a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) que nos amparam. A NBR 13962 para dimensionamento de cadeiras; a NBR 13966 para mesas de escritório; a NBR 13965 para mesas de informática e a NBR 13961 para armários. Você pode acessar o endereço da ABNT, no ícone a seguir, e conhecer um pouco mais sobre as normas existentes para qualquer tipo de projeto. http://www.abnt.org.br Outra preocupação que devemos ter é com o arranjo físico. Depois que o projeto dos postos de trabalho está pronto, o próximo passo é elaborar o arranjo físico, conhecido também como leiaute (do inglês layout). Para esclarecer vamos, inicialmente à definição. Segundo Iida (2005), arranjo físico é o estudo da distribuição espacial de todos os elementos que formam o posto de trabalho. Os critérios adotados para o posicionamento dos móveis, ferramentas, equipamentos e outros são os seguintes: Importância: o componente mais importante deve permanecer em posição de destaque. Frequência de Uso: componentes usados frequentemente devem ser de fácil alcance e manipulação. Agrupamento Funcional: componentes com funções similares devem ficar agrupados. Sequência de Uso: o primeiro componente a ser usado deve estar na primeira posição e assim sequencialmente. Intensidade de Fluxo: componentes entre os quais há maior intensidade de fluxo devem ficar próximos entre si. Ligações Preferenciais: entre aqueles componentes em que acontecem ligações específicas, deve haver proximidade. Para proteger o trabalhador devem ser levadas em conta algumas regras básicas, conforme afirma Kruger (2007): No texto do ícone a seguir, você encontrará dicas que lhe ajudarão a compreender melhor esse assunto tão complexo. http://www.prpgf.ueg.br/sesmt/conteudo/2238_dicas_de_ergonomia_no_ posto_de_trabalho_ Você sabia que a adaptação individual da superfície de trabalho só pode ser realizada de duas formas? A primeira é regular o plano de trabalho em altura e a segunda é ajustá-lo para as pessoas maiores e mais altas. Se forem ajustadas para as pessoas mais baixas ou de estaturas médias, a chance de erro será grande. É mais simples fazer os ajustes com estrados e apoios para os pés do que adaptar uma plataforma de trabalho para indivíduos grandes. Saiba mais sobre o dimencionamento dos postos de trabalho, assistindo ao vídeo no materiual on-line. Qualidade de vida no trabalho Facilmente relacionamos a qualidade de vida, de modo geral, a uma casa agradável, com um bom sofá para assistirmos nossa programação predileta de televisão. Contudo, esse é um pensamento um tanto quanto simplista, que não aborda a realidade da maioria de nós. Quanto mais o tempo passa, mais nos ocupamos de inúmeras tarefas e sequer pensamos em nossa saúde, na prática de uma atividade física ou em momentos de lazer. Conforme Corrêa (1993), as organizações, as sociedades e os indivíduos são sistemas que se interdependem em vários níveis. A qualidade de vida, tanto influencia quanto é influenciada pelas condições de trabalho da organização. Segundo Almeida et al. (2010), a qualidade de vida engloba a multidisciplinaridade, além de vários conceitos e formas de ciência. Compreender qualidade de vida envolve conhecimento humano, biológico, social, político, econômico, médico e outros mais. Por tratar-se de tema de pesquisas recentes, é muito provável que você encontre várias definições, talvez com sentidos diversos. Vamos dotar a definição da OMS. Se você pesquisar No site da OMS, encontrará a seguinte definição para qualidade de vida: “a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto de cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”. Nesse mesmo endereço supracitado você terá acesso a um questionário elaborado pela OMS e disponível em vários idiomas referente à qualidade de vida. CCDD – Centro de Criação e Desenvolvimento Dialógico Agora que você já sabe o que é qualidade de vida, aprenda no vídeo no material on-line o que é a qualidade de vida no trabalho. E a qualidade de vida no trabalho? Segundo Corrêa (1993), a qualidade de vida no trabalho (QVT) é um fenômeno complexo, com diferentes perspectivas e visões teóricas. A análise da QVT engloba o estudo socioeconômico aprofundado e a compreensão de valores e motivações que levam à qualidade. Dentro deste contexto como é possível melhorar a qualidade de vida no ambiente de trabalho? Com quais sugestões você pode contribuir? A QVT remete a um ambiente em que se trabalha com segurança, higiene, conforto e distribuição igualitária de tarefas, em que tudo funciona perfeitamente bem. Seu principal objetivo, de acordo com Rechziegel e Vanalle (1999), é reformular a estrutura de trabalho, garantindo, assim, mais produtividade e eficácia, e também atender às necessidades básicas do empregado. A Associação Brasileira de Qualidade de Vida (2014) refere-se à QVT como o nível de felicidade ou não com seu próprio desenvolvimento profissional. Para aqueles que gostam de seu desempenho, de suas atividades a QVT é alta e para os que se sentem infelizes a QVT é baixa (ABQV, 2014). Cada um de nós tem uma necessidade específica. Nem sempre o bom para um é bom para o outro. Todavia, conforme Corrêa afirmou em 1993, o que predominava à época na luta por melhor qualidade de vida no trabalho eram as desconfianças mútuas. E hoje, podemos fazer a mesma afirmação? De acordo com a ABQV há alguns fatores básicos para todos
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