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Aula 05 Ciência Política e Gestão Pública p/ AFC/CGU - Prevenção da Corrupção e Ouvidoria Professor: Rodrigo Barreto - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 1 de 123 AULA 05 SUMÁRIO PÁGINA 1. Pacto federativo e relações intergovernamentais no Brasil. 1 2. Teorias da Democracia 26 3. Políticas Públicas: formação de agenda, formulação e processo decisório, implementação e avaliação. 43 4. Controle, transparência e accountability na execução de políticas públicas. 47 5. Questões comentadas 68 6. Lista de Questões 103 7. Gabarito 123 1. Pacto federativo e relações intergovernamentais no Brasil. Pessoal, nós conversamos sobre federalismo em aula passada, todavia vou fazer uma revisão e aprofundar as características e o histórico do federalismo no Brasil. Primeiramente, lembro que Federação é forma de Estado e não de governo, mas podemos dizer que há um estreito relacionamento entre essa forma estatal e o modo de gestão ou, ainda, entre essa forma estatal e os problemas de governo. O Estado Federal é um fenômeno moderno, que só aparece no século XVIII, não se encontrando na Antiguidade ou na Idade Média. Embora houvesse uniões entre estados nessas épocas, nenhuma delas significou a forma de estado federativa, devido às suas limitações a determinados objetivos, nunca implicando a perda de soberania, em troca de autonomia. Lembro que há autores que entendem que a - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 2 de 123 primeira formação estatal dada a partir de uma união permanente e com objetivos comuns foi a Confederação Helvética, em 1291, quando três cantões aderiram a um pacto de solidariedade e aliança; tal aliança deu origem à organização do Estado da Suíça em 1848. De todo modo, o Estado Federal nasce apenas em 1787, nos Estados Unidos da América. Em 1776 as treze colônias britânicas da América se declaram independente, passando a possuir, cada uma delas, soberania, ou seja, cada uma delas era um Estado. Alguns anos depois, celebraram os Artigos da Confederação, formando um pacto confederativo que visava sobretudo à manutenção da independência. Entretanto, esse pacto foi se mostrando frágil e a união que dele resultava pouco eficaz. Devido a esses problemas, em 1787, os Estados se reuniram em uma convenção na Filadélfia, em que se ausentou apenas o Estado de Rhode Island. Nessa convenção havia duas posições: os que queriam a manutenção, com algumas modificações do pacto confederativo, e os que queriam um novo pacto, comum a todos os Estados, com a formação de um governo a que todos se submetessem. Ou seja, cada Estado cedia sua soberania para um órgão central, responsável pela centralização e unificação, que viria a formar os Estados Unidos da América, passando, a partir de então, a ser autônomos entre si, dentro do pacto federativo. Conforme já vimos, são características básicas do modelo de Estado federativo: (i) a união dos Estados soberanos faz nascer um novo Estado e, consequentemente, aqueles que aderiram à federação perdem a condição de Estados soberanos; (ii) a base jurídica do Estado federativo é uma constituição, não um tratado; (iii) na federação não há direito de secessão; (iv) só o Estado Federal possui soberania e seus entes federativos não; (v) a Constituição fixa as atribuições dos entes federativos; (vi) a cada esfera de competências se atribui renda - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 3 de 123 própria; (vii) os cidadãos do Estado que adere à federação adquirem a cidadania do Estado federal e perdem a anterior. Dito isto, lembro que a formação da federação norte- americana se deu em um movimento centrípeto, ou seja, de fora para dentro, com Estados soberanos cedendo sua soberania em favor de uma aglutinação desta em um só Estado. No Brasil, de outra forma, a federação foi resultante de um modelo centrífugo, de dentro para fora, com um Estado unitário centralizado se descentralizando em favor de vários entes autônomos. Decorre daí a maior autonomia que os estados norte-americanos possuem maior autonomia que os brasileiros. Sobre essa conceituação, também se diz que a formação do federalismo norte-americano se deu por agregação, enquanto que a brasileira se deu por desagregação. Os Estados adotam o modelo federativo quando há uma situação federalista, caracterizada por duas coisas. A primeira é a existência de heterogeneidades numa determinada nação, vinculadas à questão territorial (grande extensão e/ou enorme diversidade física), a diferenças étnicas e/ou linguísticas, a disparidades socioeconômicas, ou então a diversidades culturais e políticas entre as regiões de um país. A segunda condição que leva à escolha do federalismo é a ação política baseada no ideal da unidade na diversidade, capaz de concomitantemente manter unidas e autônomas as partes de um mesmo território. Na verdade, se pararmos para pensar, veremos que as duas condições apontadas acima refletem uma mesma essência que é a existência de diferenças (heterogeneidades e diversidade). Penso que mais correto ainda, do ponto de vista puramente conceitual, seria a existência de diversas nações em um território e a união política - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 4 de 123 baseada o ideal de unidade da diversidade, mantendo unidas e autônomas entes indissociáveis em um mesmo território. Outro ponto importante levantado pelo citado autor é o de que o sucesso das políticas públicas em uma Federação depende da capacidade de se instaurarem mecanismos de controle mútuo e de coordenação entre os níveis de governo. Existem diversas razões que explicam a adoção da forma federativa de Estado. A mais importante, para ele, seria a busca por uma descentralização autônoma ± seja a partir de um Estado unitário seja a partir de uma confederação na qual há vários Estados centralizados -, de modo que as autonomias permaneçam indissociáveis. A federação permitiria a integração de coletividades que apresentem heterogeneidades acentuadas, em seus contextos sociais, em termos étnicos, linguísticos, culturais ou raciais. Dessa maneira, a forma de estado federativa cumpriria a finalidade de permitir que tais coletividades conservem suas diferenças umas em relação às outras, como partes integrantes de um todo federativo, que possui como princípio a indissolubilidade do vínculo. Bastos aponta, como exemplo paradigmático, o caso da Bélgica, pois esta constitui um Estado caracterizado por ampla diversidade entre as comunidades integrantes, que evidenciam marcante distinção em termos culturais e linguísticos; contudo, todas elas, integrantes de um mesmo pacto. Devo lembrar que os constituintes norte-americanos foram fortemente inspirados por Montesquieu, acreditando fervorosamente no princípio de separação dos poderes, de modo que o estado federado foi orientado a partir dele. Desse modo, foielaborado então o chamado sistema de freios e contrapesos, com os três poderes (Executivo, - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 5 de 123 Legislativo e Judiciário), independentes e harmônicos entre si, com mecanismos de controle mútuo, de modo que, em tese, não deveria haver um mais forte do que os demais. Todavia, essa teoria encontrou obstáculos na práxis política, pois arranjos políticos como o presidencialismo de coalizão distorceram a pureza de tal teoria. De toda forma, o federalismo não pode ser compreendido como um fenômeno estático, que observaria sempre o mesmo modelo ideal de formato. O federalismo é um fenômeno dinâmico que vem sofrendo sensíveis alterações desde sua efetivação nos Estados Unidos. A princípio o federalismo dual baseava-se no princípio de não intervencionismo da União; já a teoria do new federalism ou federalismo cooperativo representa a concepção de um Estado mais intervencionista, com o consequente fortalecimento do poder central. No federalismo dual, a separação de atribuições/competências entre os entes federativos é extremamente rígida, não se falando em cooperação ou interpenetração entre os mesmos, como os Estados Unidos em sua origem. Da flexibilização dessa rigidez do modelo dual (clássico), surge o modelo cooperativo, especialmente durante o século XX, com o surgimento do Estado de Bem-Estar, que, mesmo após sua crise, deixaria marcas em várias constituições. Alguns autores advertem para o risco de o federalismo cooperativo transformar-VH� HP� XP� ³IHGHUDOLVPR� GH� IDFKDGD´�� FRP� R� fortalecimento do órgão central em detrimento dos demais entes federativos, de maneira que haveria uma sobreposição da União, ou seja, haveria um federalismo por subordinação. Zimmerman, todavia, ressalta que se por um lado de fato há o risco da negação do federalismo em sua essência, por outro lado o federalismo de cooperação ou cooperativo pode ser verdadeiramente democrático, - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 6 de 123 formado a partir do consentimento geral da nação e não por meio de imposição do órgão central. Antes de falarmos mais a fundo sobre o federalismo no Brasil, gostaria de destacar as teorias sobre a soberania do estado federal que Mi� DSDUHFHUDP� ³PDVFDUDGDV´� HP� TXHVW}HV� H� TXH�� FRQIRUPH� WHQKR� visto, têm suscitado polêmicas entre os alunos no fórum. Vejam o quadro para ficar tranquilo, água na canela... Teorias da soberania do Estado federal Teoria da dupla soberania ou da dupla dimensão da soberania* A soberania do Estado federal é partilhada politicamente pela União e pelos Estados membros, sendo ela limitada pela Constituição. Dessa forma, a soberania não pode ser exercida independentemente por nenhum desses membros, em toda a sua plenitude. A dupla soberania seria exercida tanto internamente, justapondo-se à autonomia, quanto externamente, diante dos demais Estados soberanos. Nem a União nem os Estados membros seriam plenamente soberanos, exercendo apenas parcelas constitucionais de soberania. Teoria da negação da soberania da União Formulada por Jefersson, parte do pressuposto que a soberania não pode ser divida entre entes de natureza distinta, de modo que ela seria exercida não pela União, mas pelos Estados membros, que não alienam nem deslocam sua soberania anterior, apenas celebram uma pacto mútuo no federalismo. - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 7 de 123 Teoria do Estado unitário qualificado Considera a soberania atributo essencial do Estado, de forma que somente a União seria dotada de poder soberano. Os estados- membros seriam apenas províncias descentralizadas que possuem a faculdade de participar da formação da vontade geral. Os estados membros alienam a soberania em favor da União. Teoria da auto- organização do Estado A soberania não é atributo essencial do Estado, mas aspecto do poder por ele exercido. Dessa forma, os Estados podem ser ou não soberanos. Os soberanos têm capacidade de autodeterminação. Como o Estado federal é por característica soberano, os estados membros também não deixam de sê-lo, pois tem constituição própria e gozam de autodeterminação. (*) Segundo a Esaf (APO ± MPOG ± 2010), o Federalismo caracteriza-se pela existência de uma dupla soberania, a qual, por ser uma característica central de Estados federativos, acaba por produzir, por sua vez, diversas consequências para o sistema político e para a produção de políticas públicas como um todo no país. Ou seja, a Esaf banca adotou a dupla soberania especificamente na questão citada. Não creio, todavia, que a Vunesp o fará. Como vocês já sabem, o modelo de formação do federalismo brasileiro se deu em sentido oposto ao norte-americano; enquanto este se deu de fora para dentro, o brasileiro se deu de dentro para - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 8 de 123 fora. A formação do Estado federal no Brasil não se deu a partir de um pacto constitucional entre Estados soberanos, mas a partir de um processo de descentralização do poder central para os estados, que passariam a gozar de autonomia. Do poder centralizado do Império derivavam-se os estados autônomos, descentralizando-se o poder político. Em 1824, com a proclamação da Independência e a outorga da Constituição, o Estado Imperial foi instituído no Brasil, caracterizando- se pela centralização de poder, unitariedade da forma e descentralização administrativa, já que mantinha maior parte das competências e atribuições das províncias existentes; contudo, criando um vínculo mais forte entre essas administrações descentralizadas e o poder central, que era a corte situada no Rio de Janeiro. Segundo Nunes, no processo de implantação da república e do federalismo no Brasil, o processo político não é coincidente com o processo histórico. A Federação no Brasil surge, provisoriamente, com o Decreto nº 1, de 15 de novembro de 1889, que instituía, além da forma federativa de estado, a forma republicana de governo no lugar da forma monárquica de governo. Posteriormente, a consolidação de tais formas viriam que a primeira Constituição Republicana 1891, que HVWDEHOHFLD� HP� VHX� DUWLJR� �� TXH� ³D� QDomR� %UD]LOHLUD� DGRSWD� FRPR� fórma de governo, sob o regimen representativo, a República Federativa proclamada a 15 de novembro de 1889, e constituie-se, por união perpetua e indissoluvel das suas antigas provincias, em Estados 8QLGRV� GR� %UD]LO´�� FRQIRUPH� D� UHGDomR� GR� WH[WR� RULJLQDO�� ,PSRUWD� agora, pessoal, antes de prosseguirmos com a história da estruturação do Estado brasileiro, diferenciarmos as formas de governo, assunto este que ainda não comentei. - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br9 de 123 Primeiramente, um governo pode ter origem de direito ou de fato. O governo de direito é aquele constituído de acordo com a lei vigente, ou seja, é aquele que encontra legitimidade na ordem jurídica existente, não possuindo arbitrariedade dos governantes. Já o governo de fato, ao contrário do de direito, tem como características de sua implementação a fraude e/ou a violência. Neste caso, se encaixam os estados ocupados pelos nazistas durante a Segunda Guerra e as ditaduras da América Latina na segunda metade do século XX. Além disso, os governos podem se desenvolver de maneira legal ou despótica. Presume-se que todo governo legal seja legítimo, reconhecido pela maioria da população. Caso isso não ocorra, o governo será ilegítimo, embora legal, sem consenso da população e, geralmente, mantido pela força das armas. Por óbvio, o governo legal é aquele que se desenvolve obedecendo ao ordenamento jurídico vigente. Já o governo despótico é aquele que conduz conforme as arbitrariedades dos governantes. Por fim, quanto à extensão do poder, os governos podem ser constitucionais ou absolutistas. O governo é constitucional quando se fundamenta e se desenvolve à luz de uma Constituição (Lei maior) que assegure o exercício de três funções distintas (legislativa, executiva e judiciária), além de garantir os direitos do povo. Já o governo absolutista concentra o poder em um só órgão, fundamentando-se na garantia de que as normas do governante devem ser obedecidas pelos governados. As formas de governo também apresentam diversas classificações segundo os pensadores. Vejamos: - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 10 de 123 Classificações das Formas de Governo segundo os pensadores Platão São formas de governo: aristocracia, monarquia, timocracia, oligarquia, democracia e tirania. Para ele as duas primeiras são boas e as demais criticáveis. Para Platão, a aristocracia é boa, pois, no sentido empregado pelo pensador, os poucos que governam seriam aqueles dotados de virtudes. O governo monárquico seria bom, pois o governante pensaria nos seus súditos. A timocracia seria um governo de guerreiros, dotados de coragem, mas sem razão. A Oligarquia seria um governo de alguns sem que houvesse a qualidade da aristocracia, sendo escolhidos pela riqueza. A aristocracia seria elite intelectual e a oligarquia, a econômica. E a democracia teria o problema de entregar o poder a homens que não possuem nem conhecimento nem poder. E a tirania seria baseada na violência. Aristóteles Também considera 6 formas de governo, sendo 3 boas e 3 desvirtuadas. As formas boas visam ao benefício dos governantes, o bem comum; enquanto as más visam apenas aos interesses particulares. São formas boas de governo a monarquia, a aristocracia e a democracia. São formas desvirtuadas a tirania, a oligarquia e a demagogia. Políbio Classificava da mesma forma que Aristóteles, com a diferença de que, para Políbio, as formas de governo se sucediam umas às outras, constituindo um ciclo alternante entre formas boas e más ± essa é a chamada teoria dos ciclos de governo. O ciclo se dá sucessivamente assim: demagogia ĺ monarquia ĺ - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 11 de 123 tirania ĺ aristocracia ĺ oligarquia ĺ democracia ĺ demagogia ĺ �«��� Maquiavel Para ele, monarquia, aristocracia e democracia, enquanto boas formas de governo, eram utopias. Sendo que todos os governos que existiam ou já tinham existido ou eram repúblicas ou principados. Os principados (hereditários ou recém-formados) ou eram monarquias ou tiranias. As repúblicas (não vitalícias e periódicas) poderiam ser democráticas, aristocráticas, timocráticas ou oligárquicas. Para Maquiavel, não há uma boa forma de governo, mas sim forma eficaz, na medida em que atinge a paz (coesão) social. Rousseau Divide as formas de governo em democracia, aristocracia e monarquia. A democracia seria o poder nas mãos do povo ou da maioria dele. A aristocracia implicar o poder executivo exercido por poucos cidadãos. E a monarquia seria a entrega do poder a um só magistrado. Montesquieu Divide as formas de governo em monárquico, republicano ou despótico. O monárquico seria exercido vitaliciamente por um rei, sendo transmitido aos seus descendentes por meio da hereditariedade. O republicano seria o governo em que as decisões caberiam à Assembleia de Cidadão, com eleição de deputados e governantes, que exerceriam o mandato por tempo certo. O e o despótico seria o governo em que o chefe ou o rei exerce o poder de forma autoritária. Kelsen Divide as formas de governo em autocracia e - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 12 de 123 democracia, de maneira que a principal diferença entre elas estaria na liberdade política. Na democracia, os sujeitos são politicamente livres. Na autocracia, os sujeitos não participam das decisões do governo, ficando condicionados às decisões dos governantes. A partir dessa abordagem histórica, fica evidenciado, conforme fazem os autores contemporâneos, que os governos se resumem basicamente a dois modelos fundamentais: a monarquia e a república. E são justamente essas duas formas de governo que os concursos têm trabalhado com frequência. Basicamente, na monarquia o governante exerce o cargo de forma vitalícia e o repassar por meio da hereditariedade; enquanto que na República o governante exerce o cargo de modo eletivo e temporário. A monarquia apresenta três aspectos principais, que são: (i) vitaliciedade, (ii) hereditariedade e (iii) irresponsabilidade. A vitaliciedade significa que o mandato do monarca não tem prazo delimitado, tendo sua duração definida pelo tempo de vida ou pelas condições de saúde dele. A hereditariedade consiste na transmissão do poder ao herdeiro do monarca, segundo sua linha de sucessão. E a irresponsabilidade significa a não necessidade de o monarca explicar, justificar ou fundamentar os seus atos de governo perante o povo ou outro órgão de Estado. O monarca não possui responsabilidade política. Do mesmo modo, a república, ainda segundo Farias Neto, apresenta três características principais que a diferenciam da monarquia. São elas: (i) temporariedade ou periodicidade; (ii) eletividade e (iii) responsabilidade. A periodicidade significa que o - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 13 de 123 governante possui mandato com prazo de duração determinado. O direito de reeleição pode existir, mas deve ficar proibida a possibilidade de infinitas reeleições futuras. A eletividade significa que a eleição do governante é feita pelo povo, não havendo sucessão hereditária. E a responsabilidade significa que o governante é responsável politicamente, já que está constituído em um mandato eletivo popular. A monarquia pode, ainda, ser absoluta ou limitada (de estamentos, constitucional ou parlamentar). É absolutaquando o monarca exerce o poder sem preceitos constitucionais, ilimitadamente. A monarquia é limitada quando o poder central se reparte e admite órgãos autônomos ou submete seu poder às manifestações de soberania nacional. A monarquia limitada pode ser de estamentos (ou de braços), constitucional ou parlamentar. É de estamentos quando o rei descentraliza algumas funções que são delegadas a elementos da nobreza reunidos em cortes ou órgãos semelhantes. É constitucional quando o rei apenas exerce o poder executivo, nos termos de uma constituição escrita, ao lado dos poderes legislativo e judiciário. E é parlamentar quando o rei não exerce sua função de governo, mas, sim, de chefe de Estado, exercendo as atribuições que a Constituição lhe atribuir. Nesse caso, o poder executivo é exercido por um Conselho de Ministros (Gabinete) responsável perante o parlamento, como é, na atualidade, o caso da Inglaterra. A república pode, por sua vez, ser aristocrática ou democrática (direta, indireta ou representativa e semi-direta ou mista). A república aristocrática é a forma de governo de uma classe privilegiada por direitos de nascimento ou de conquista; nesse sentido, a palavra aristoi corresponde a melhores da sociedade. A república aristocrática pode, ainda, ser direta ou indireta, conforme seja o poder exercido - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 14 de 123 diretamente pela classe dominante, em assembleias gerais, ou por delegados eleitos, em assembleias representativas. A república democrática é aquela em que todo o poder emana do povo, podendo ser direta, indireta (representativa) ou semidireta. Na república democrática direta governa a totalidade de cidadãos, deliberando em assembleias populares, como os gregos no antigo Estado ateniense. Na república democrática indireta (representativa) o poder público é exercido por eleitos, com investidura temporária e atribuições predeterminadas. Assim, na república democrática indireta os órgãos componentes, agentes políticos, do Poder Executivo e do Legislativo são eleitos pelo povo, por meio do sufrágio universal. A república democrática semidireta ou mista consiste em uma limitação do poder da assembleia representativa, reservando-se ao pronunciamento direto da assembleia geral dos cidadãos os assuntos de maior relevância, sobretudo os de ordem constitucional. Segundo MaOXI��³D�GHOHJDomR�GH�SRGHUHV��QHVWH�VLVWHPD��p�IHLWD�FRP�DV�GHYLGDV� restrições, de tal sorte que os problemas considerados de vital importância nacional são decididos pelo próprio povo por processos típicos de democracia direta, como o referendo, a iniciativa popular, o YHWR�SRSXODU��HWF´� Bom, pessoal, dito isto, continuemos com a estruturação do Estado brasileiro. Vimos que com a proclamação da independência e a outorga da Constituição de 1824, iniciou-se o Estado imperial brasileiro, unitário e com forte centralização administrativa. Já com o fim do império, foi proclamada a república. De tal modo, o federalismo brasileiro representou uma formação atípica, no qual o modelo federalista norte-americano sofreu inúmeras modificações para se adequar a realidade brasileira de então. Diferentemente do que houve - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 15 de 123 nos Estados Unidos, não houve a formação de um novo Estado a partir de vários outros, na realidade, o Estado deixou de ser unitário e passou a ser federal. Em 15 de novembro de 1889, o Brasil se transformava, como em um passe de mágica, de um império unitário em uma federação. O Decreto de então proclamava as antigas províncias em Estados Soberanos; contudo, essa soberania nunca foi real, sendo apenas de fachada. Essa soberania tinha efeitos meramente simbólicos, visto que tais estados nunca exerceram ou tiveram de fato soberania. Na realidade, mesmo com o Decreto que assegurou o fim do Império, o Brasil continuava um Estado unitário sob o manto do federalismo decretado. O Brasil só passaria a ser uma Federação real com a Constituição de 1891. Esta Constituição, por sinal, não fez menção aos ³(VWDGRV� VREHUDQRV´�GR�'HFUHWR��PDV�GL]LD� TXH� DV�DQWLJDV�SURYtQFLDV� agora estariam reunidas para formar os Estados Unidos do Brasil ± vejam que até o nome é cópia dos norte-americanos. Diante do exposto, fica claro que, até a promulgação dessa nova Carta, os poderes estavam concentrados no governo central, já que o Estado permanecia unitário. Assim, as províncias não abdicaram de sua soberania ± pois simplesmente não a possuíam ± e somente a partir de 1891 é que receberam competências políticas, financeiras e administrativas. As antigas províncias, antes de 1891, não possuíam direitos políticos próprios nem soberania, de forma que nada cederam para a construção do pacto federativo. De forma diversa deu-se o pacto norte-americano, no qual os Estados confederados cederam sua soberania em favor de um novo Estado. Nos Estados Unidos da América, o federalismo significou a criação de um poder até então inexistente; enquanto que no Brasil - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 16 de 123 significou a descentralização do poder político. A passagem do Estado Unitário do Imperialismo brasileiro para o Federalismo Republicano implicou a descentralização do poder político. A Constituição de 1891 caracterizou-se por: (i) federalismo dual (limites de poderes bem definidos entre União e Estados membros); (ii) tripartição de poderes aos moldes de Montesquieu; (iii) forma de governo republicana; (iv) separação entre Estado e Igreja; (v) autonomia aos Estados-membros como Constituições e Leis próprias; (vi) ampliação dos direitos individuais, introduzindo o habeas corpus, a livre manifestação do pensamento, a liberdade de associação, a inviolabilidade do domicílio, entre outros. Sobre a passagem do Estado unitário (Império) para o )HGHUDWLYR��&DUGRVR�DVVHYHUD�TXH�³D passagem do Império à República e a formação de um sistema de poder capaz de articular os interesses dos novos donos da situação no Brasil republicano parecem ter REHGHFLGRV� DQWHV� j�GLQkPLFD�GH�XPD�KLVWyULD� SRXFR� ³SUHFLSLWDGD´�� VH� se quiser fazer uma alusão ao comportamento dos elementos químicos e simultaneamente às regras de astúcia e compromisso características da cultura brasileira, do que ao espetaculoso corte de nós górdios que caracteriza os grandes momentos da passagem do Antigo Regime à era burguesa na França ou, ainda mais drasticamente, a passagem do FDSLWDOLVPR�DR�VRFLDOLVPR´� Em outras palavras, a mudança de Estado unitário para o Federativo obedeceu a uma lógica de precipitação em vez de uma ³UHYROWD´��'HVsa maneira, o sentimento de abandono ao imperialismo já estava sendo formulado gradativamente dentro da sociedade brasileira, sem que tenha havido de fato um corte radical. Em vez de uma revolução repentina de fato, a passagem do imperialismo para o - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 17 de 123federalismo, significou uma vagarosa mudança que aos poucos foi sendo concebida, a partir de modificações nas estruturas sociais e econômicas. Há autores que entendem que essa mudança não representou modificações profundas na sociedade e na política, tendo sido simplesmente, um movimento militar que não teria implicado profundas mudanças sociais e institucionais, no máximo se valendo de mudanças formais. Todavia, Cardoso entende que essa interpretação é equivocada, à medida que a passagem do imperialismo para o federalismo significou alteração tanto do modelo institucional quanto das forças sociais que agora iriam articular o sistema de dominação no Brasil ± as oligarquias, ou seja, significou mais do que mera ³TXDUWHODGD´�� O federalismo implementado com a Constituição de 1891 era praticamente de fachada, pois ele não garantia a mesma autonomia aos entes federados. O período político que se seguiria ficaria marcado pelo domínio de uma oligárquica, principalmente a do eixo SP-MG, que articulavam a chamada política do café com leite e se revezavam no poder. O grupo agroexportador se perpetuou no poder praticamente desde Prudente de Morais até 1930, quando Vargas chega ao poder. Esse período, fortemente marcado pelas oligarquias, ficou conhecido na historiografia como República Velha, na qual as oligarquias assumiam o poder a nível local e regional e, a partir de uma intensa troca de favores, criavam um pacto de compromissos e auxílio mútuo, que chegaram a desembocar no nível federal. Esse sistema criou uma relação de poder oligárquica que permitiu a manutenção das estruturas econômicas e sociais de dominação. - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 18 de 123 No mesmo sentido, Abrúcio aponta que com a Constituição de 1891 as instituições federativas acabaram fortalecendo o Executivo dos Estados, que passava a exercer seu poder político dentro do sistema oligárquico. Havia certo grau de interpenetração entre as esferas, pois os líderes locais se articulavam em favor de um regional e os regionais em favor de um nacional. A definição do líder nacional, ou seja, a definição da eleição nacional passava pelo eixo São Paulo-Minas, que se aliavam com outros Estados importantes, como Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul. Diante de fraudes, violência, falta de fiscalização e o chamado voto de cabresto ± que veremos melhor no tópico Democracia ± a disputa da eleição nacional, conforme Abrúcio, ³UHSHWLD� D� KLVWyULD� DQWL-republicana que vigorava no plano VXEQDFLRQDO´��� A Constituição de 1891 ainda continha um problema relacionado à falta de autonomia municipal, na medida em que aquela dedicava- lhe apenas um artigo. Segundo esta Constituição, os Estados se organizariam de forma que ficasse assegurada a autonomia dos municípios em tudo que respeitasse seu peculiar interesse. A consequência de tal dispositivo foi que cada Estado passaria a ter competência para legislar sobre a organização de seus territórios e municípios, ou seja, a Constituição Estadual determinaria a municipalidade. Com a Constituição de 1891, o município continuou com um grande número de atribuições pertinentes aos interesses locais. Os serviços públicos eram executados diretamente pelo município ou concedidos a particulares, sob o controle da municipalidade. Foi o caso dos seguintes serviços públicos: abastecimento de água potável, gás de iluminação e luz elétrica, linhas de bondes ou de ônibus dentro da - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 19 de 123 cidade, viadutos onde se cobrava a passagem, estradas de ferro subterrâneas, telefones, matadouros, mercados e esgotos. Contudo, a autonomia municipal de então era comprometida com a escolha do prefeito sendo realizada pelo Governador do Estado e pela falta de constitucionalização das receitas tributárias. De todo modo, a situação havia melhorado em relação ao período imperial, principalmente no que diz respeito à administração municipal. A possibilidade do município de incentivar as atividades econômicas melhorou em relação ao período imperial, porque nos assuntos de sua competência, acima assinalados, o município poderia legislar, mesmo que somente no nível da regulamentação ou que suas posturas dependessem de homologação da Assembleia Legislativa. Esta faculdade legislativa possibilitava criar mais facilmente incentivos para o desenvolvimento econômico local. A República Velha se encerra com uma ruptura entre São Paulo e Minas, o que ocorreu tanto por São Paulo ter insistido em eleger o segundo presidente paulista seguido, quebrando a política de revezamento do café com leite, quanto pelo descontentamento dos demais Estados em relação à perpetuação de tal política. Com o descontentamento mineiro e o apoio deste e de outros setores da sociedade, Vargas chega ao poder em 1930. Os mineiros, diante da indicação de mais um candidato paulista ± Júlio Prestes, selaram um acordo com importantes segmentos políticos do Rio Grande do Sul e da Paraíba para lançar candidato próprio à sucessão presidencial, Getúlio Vargas, formando a Aliança Liberal. Contudo, diante do quadro eleitoral fraudulento, a Aliança sai derrotada e grande parte dos deputados federais eleitos não tem seu mandato reconhecido pelo Congresso. Além disso, para piorar a - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 20 de 123 situação, João Pessoa, membro da Aliança e Governador da Paraíba, é assassinado por motivos político. É aí que Vargas, com apoio de setores do Exército e das oligarquias dissidentes, dá início ao movimento de deposição do presidente e em outubro ocorre a Revolução de 1930. Nesse contexto, uma Junta Militar transfere o poder para um Governo Provisório, que o exerceria até a promulgação da Constituição de 1934, que fora motivada por elementos de pressão e contestação de métodos arbitrários empregados pelo governo. Luís Roberto Barroso aponta duas causas principais que implicaram a ruína da República Velha: o domínio das oligarquias e as fraude eleitoral institucionalizada. De acordo com ele, ainda, a crise financeira de 1929, uma pequena burguesia brasileira em ascensão, o Tenentismo, que se colocava contras as oligarquias dirigentes, e o surgimento de uma classe operária descontente em razão do processo de industrialização estimulado pela Primeira Guerra, também são causas desse processo. Se a Constituição de 1934 não representaria grandes alterações no federalismo brasileiro, a de 1937 praticamente o extinguia. Vargas foi empossado para governar de 1934 até 1938, mas, nesse período, um forte antagonismo foi percebido com a direita fascista de um lado e o movimento de esquerda de outro. Diante do crescimento da esquerda e a Intentona Comunista, que pretendia derrubar Vargas e instalar o socialismo no Brasil, o Governo decreta o Estado de Sítio, deflagrando uma forte repressão. Em setembro de 1937, os jornais noticiavam que o Governo havia descoberto um plano comunista para tomada do poder: estava aí o pretexto para que Vargas decretasse um QRYR�JROSH�D�ILP�GH�³VDOYDU´�R�SDtV�FRQWUD�R�FRPXQLVPR�- Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 21 de 123 Daí, Vargas outorga a Constituição de 1937, influenciada por ideais autoritários e fascistas, instalando a ditadura do Estado Novo. Nesse período, houve intensa centralização do poder, de forma que o federalismo ficava abolido, inclusive com a retirada da expressão ³(VWDGRV� 8QLGRV� GR� %UDVLO´� GR� WH[WR� FRQVWLWXFLRQDO�� 2V� (VWDGRV� passariam a ser governador por interventores, perdendo sua autonomia, diante da subordinação ao Executivo Federal. Os órgãos do Estado passavam à subordinação direta ao Presidente da República. Desta forma, a Constituição de 1937 assemelhava o Estado brasileiro mais à forma unitária do que à federalista, significando um retrocesso ponto de vista do pacto federativo. 'H� DFRUGR� FRP� $EU~FLR�� ³R período governado por Getúlio Vargas produziu impactos importantes no federalismo brasileiro, principalmente devido a uma forte centralização de poder no Executivo federal. No plano econômico, fortaleceu-se bastante a intervenção do Estado nos domínios econômico e social, com a constituição do modelo nacional-desenvolvimentiVWD´�� Assim, a Constituição de 1937 e a Era Vargas de modo geral contribuíram para o fortalecimento do Executivo e das burocracias IHGHUDLV�� DOpP� GD� ³HVWUXWXUD� GH� VXSHU-representação dos estados PHQRUHV�QR�&RQJUHVVR�1DFLRQDO´� No dia 30 de outubro de 1945, depois de uma ação militar que depôs o presidente Getúlio Vargas e pôs fim ao Estado Novo, José Linhares, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), assumiu a presidência da República e, no dia 12 de novembro do mesmo ano, assinou decreto convocando eleições para a Assembleia Nacional Constituinte (ANC), a ser realizada em conjunto com a eleição para a presidência da República, anteriormente marcada para o dia 2 de - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 22 de 123 dezembro de 1945. Realizadas as eleições, o general Eurico Gaspar Dutra saiu vitorioso. As regras democráticas eram então devolvidas ao ordenamento pátrio e, com a Constituição de 1946, o federalismo voltava a ser o fundamento político-territorial do país. A Constituição de 1946 reestabelecia o federalismo no Brasil, consubstanciando-se na tripartição de poderes; na autonomia política e administrativa dos municípios; no sufrágio universal; na discriminação da renda da União, dos Estados e dos municípios e no reestabelecimento dos direitos e garantias individuais. Essas disposições tornavam o pacto federativo PDLV� HTXkQLPH�GR�TXH�DQWHULRUPHQWH��6HJXQGR�$EU~FLR�� ³R medo da volta do µ&DIp� FRP� /HLWH¶� IH]� FRP� TXH� DV� RXWUDV� HOLWHV� UHJLRQDLV� reforçassem a sobre-representação dos estados menos desenvolvidos na distribuição de cadeiras na Câmara Federal e, mais intensamente, a sub-UHSUHVHQWDomR�GR�6XGHVWH��SDUWLFXODUPHQWH�GH�6mR�3DXOR´� Jango foi derrubado por um movimento militar que eclodiu em PDUoR�GH�������WHQGR�VLGR�DFXVDGR�GH�HVWDU�D�VHUYLoR�GR�³FRPXQLVPR� LQWHUQDFLRQDO´��,QVWDODYD-se, assim, uma nova ordem revolucionária no país. Os comandantes militares de 1964 impuseram atos de exceção ao Brasil, extinguindo instituições democráticas e grande parte dos direitos e garantias individuais. Em abril de 1964, os militares vitoriosos constituíram o chamado Supremo Comando da Revolução baixavam o Ato Institucional nº 1 com fortes restrições à democracia. Os Atos Institucionais se configuravam com atos de exceção que invalidavam os preceitos FRQVWLWXFLRQDLV��'H�DFRUGR�FRP�6LOYD��³Fomo desdobramento natural de todo governo autoritário que renega o estado de direito, a Junta Militar que ocupava o poder usou o artifício de colocar em recesso - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 23 de 123 compulsório o Congresso Nacional, para usurpar dele o direito de emendar a Constituição. E assim o fez, emendando a Constituição de 1967. A reforma constitucional foi feita para concentrar poderes no presidente da República e retirar poderes do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas, dos governadores de estado, dos municípios e do Poder Judiciário federal e estadual, além de promover uma varredura nos direitos e garantias individuais, sociais e políticas, condicionando o pouco que restou aos interesses da segurança QDFLRQDO��H[SUHVVmR�TXH�IRL�µGRXWULQDOL]DGD¶�SDUD�MXVWLILFDU�TXDOTXHU�DWR� desregrado das autoridades que comandavam governo e o aparelho UHSUHVVRU�GR�(VWDGR´� A Constituição de 1969 acabaria desfigurando o federalismo brasileiro inscrito na Carta anterior, mantendo nele apenas um caráter formal. Isto, porque, a Constituição de 1969 não possuía poderes harmônicos e independentes, já que o Poder Executivo possuía todo o controle institucional sobre os demais poderes. Não havia ainda autonomia real para os Estados, já que as condições de intervenção da União neles foram afrouxadas. Além disso, conforme preleciona Silva, não há como se falar em pacto federativo quando as regras constitucionais são alteradas unilateralmente pelo Poder Executivo da União, sem participação dos demais entes federados e dos demais poderes. Abrúcio chama a esse período, em relação ao pacto federativo, GH� ³XQLRQLVWD� DXWRULWiULR´�� SRLV� FHQWUDOL]D� RV� UHFXUVRV� QDV� PmRV� GR� Governo Federal, aumentando fortemente o controle administrativo da União sobre o governo dos demais entes. O citado autor lembra que, embora tenha havido grande centralização nesse período, o Governo Federal se via obrigado a negociar constantemente com elites locais, como resquício daquele modelo oligárquico. De tal maneira, houve - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 24 de 123 manutenção de várias eleições para cargos de fundamental importância para a carreira dos grupos políticos locais. Em 1983, o então Deputado Federal Dante de Oliveira apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição, propondo, pela primeira vez, em quase 20 anos de ditadura, a eleição direita para Presidente da República ± veremos isso mais a fundo no tópico Democracia. Essa PEC ganhou o apoio popular que se transformou no movimento pró-democracia Diretas Já. Apesar da pressão da sociedade civil, a PEC do Deputado Dante de Oliveira acabou sendo rejeitada. Nesse contexto, o Colégio Eleitoral acabou elegendo, em 1985, pelo voto indireto, um civil, pela primeira vez após mais de 20 anos de ditadura, caracterizando o fim do regime militar. A posse do novo presidente, Tancredo Neves, estava marcada para 15 de fevereiro de 1985, entretanto Tancredo adoeceu na véspera da posse, não vindo a tomá-la. Para comoção do país, Tancredo Neves faleceu e, em abril de 1958, José Sarney assumia a presidência do país. Sarney, então, considerando o compromisso assumido pela Aliança Democrática de Tancredo perante o país, institui uma Comissão Provisória de Estudos Constitucionais, para futura colaboração com a Assembleia Nacional Constituinte (ANC). Contudo, o texto final elaborado por essa Comissãofoi rejeitado por Sarney, tendo em vista, entre outras razões, a opção feita pelo sistema parlamentarista de governo, que diminuiria os poderes do Presidente da República. Buscando-se cumprir o mandamento da Emenda Constitucional n° 26 de 1985, foi determinada a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte (ANC), mesmo sem projeto previamente elaborado. A ANC foi instalada em 1° de janeiro de 1987, sendo que os - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 25 de 123 trabalhos dos constituintes se encerraram após 18 meses. A Constituição Federal de 1988 foi promulgada, em 5 de outubro, redemocratizando o país e trazendo importantes avanços. A CF/88 reestabeleceu e ampliou os princípios do federalismo, as liberdades, os direitos individuais, políticos e sociais consignados na Constituição de 1946. Em relação ao federalismo, sua maior inovação foi a elevação formal do município à categoria de ente federativo propriamente dito. E, além de conferir fortalecimento aos municípios, a CF/88 também fortaleceu os Governadores e as unidades estaduais. De tal modo a CF/88 estabeleceu um modelo raro de federalismo em que há três entes pactuantes: União, Estados e Municípios ± além de, é claro, o Distrito Federal, que tem a peculiaridade de conter a administração regional e local em um só ente. Assim, com a CF/88 podemos observar uma maior autonomia municipal em relação aos períodos anteriores, bem como a descentralização de recursos e atribuições. Apesar disso, segundo $EU~FLR�� ³D descentralização de recursos começou antes mesmo da nova Constituição, no início da década de 80, principalmente via aumento de transferências federais por meio dos fundos de SDUWLFLSDomR´��6HJXQGR�R�DXWRU�FLWDGR��HVVH�TXDGUR�JHUDULD��QR�SHUtRGR� posterior à CF/88, uma proliferação de municípios, com a divisão de unidades já pequenas. Desse modo, coloca o autor que, embora o ápice da descentralização fiscal tenha sido atingido com a CF/88, a municipalização das políticas públicas somente vai se consolidar ao longo dos anos 1990 e em vários ritmos, dependendo da área. - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 26 de 123 2. Teorias da Democracia Tenho certeza de que vocês adoram aqueles inícios de aula em que o professor começa a falar da etimologia grega ou latina das palavras, certo? Só que não. Não vou começar assim, porque isso não vai cair e eu não tenho paciência. A definição de Democracia pode ser dada conforme três matrizes distintas: a clássica, a medieval e a moderna. Segundo a matriz clássica, democracia significa governo do povo, de todos os cidadãos, ou seja, de todos os que possuem direitos de cidadania; lembrando- lhes de que o conceito de cidadania é variável ao longo do tempo e espaço. A matriz medieval concebe duas possibilidades distintas: uma ascendente, pela qual o poder deriva do povo e se torna representativo e outra descendente, pela qual o poder deriva do príncipe e é delegado aos representantes como um ato de um superior para inferiores. 3 E, por fim, a matriz moderna, também chamada de teoria de Maquiavel, segundo a qual as formas históricas de Governo são basicamente duas: a monarquia e a república. De modo que a democracia nada mais seria do que uma espécie ou uma derivação dos princípios republicanos. Durante o século XIX, o debate sobre democracia foi realizado basicamente por meio de uma contraposição entre as doutrinas dominantes na época: o liberalismo e o socialismo. Em relação à concepção liberal de democracia, a liberdade democrática pressupõe - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 27 de 123 a liberdade individual, principalmente no que diz respeito à sua relação diante do Estado, que deve garanti-la. A ideia rousseauniana de democracia direta, próxima à concepção antiga/ clássica de democracia, não se mostrou compatível com as concepções liberais de democracia encontradas em textos de autores como Locke, Constant , Stuart Mill e Tocqueville. Para tais pensadores, a democracia liberal só seria possível caso se realizasse por meio de representantes. A concepção liberal de democracia, a participação no poder político ± o que, aliás, caracteriza a ideia de regime democrático ± se deu ao longo do desenrolar das lutas contra o Estado Absolutista. Mas essas lutas não visavam à participação direta, mas sim que o Estado fosse um garantidor das liberdades civis e políticas, garantido aos indivíduos uma gama de direitos como a vida, a liberdade de expressão, de ir e vir, de imprensa, de reunião, de propriedade, etc. A liberdade de participação política, com o Estado liberal, também é redefinida, compreendendo não necessariamente o direito de todo o povo reunir-se e decidir em Assembleia, mas o direito de escolher os representantes que o farão. Portanto, fica claro que não é verdadeiramente liberal o Estado em que não se reconhece a ideia de soberania popular, em sua acepção ascendente e representativa. E, além disso, o Estado liberal verdadeiro deve fornecer garantias, como, por exemplo, o Habeas Corpus, capazes de manterem tais liberdades. Conforme se coloca no Dicionário de Política, o desenvolvimento da democracia nos regimes representativos se deu basicamente seguindo duas direções: ( i) pelo alargamento gradual - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 28 de 123 do direito de voto, que inicialmente era restrito a uma exígua parte dos cidadãos com base em critérios fundados sobre o censo, a cultura, o sexo, a idade e que depois foram se desenvolvendo e se estabelecendo gradualmente para todos os cidadãos de ambos os sexos a partir de determinada idade (sufrágio universal) ; ( ii) pela multiplicação de órgãos representativos, ou seja, órgãos compostos por representantes eleitos, que em um primeiro momento se limitaram a uma das duas assembleias e depois se estenderam, aos poucos, à outra assembleia, aos órgão de poderes locais e regionais e na passagem de monarquia para república. Em uma ou outra direção, temos que a democracia teve um processo consistente no cumprimento cada vez mais pleno do princípio da soberania popular. Durante seu processo de desenvolvimento, a democracia, segundo o Dicionário de Política, consistiu em um processo mais quantitativo do que qualitativo; de maneira que seu desenvolvimento representou um complemento ao modelo representativo e não sua superação rumo à democracia direta, conforme preconizava Rousseau. Lijphart, sistematizando a tipologia da democracia a partir da cultura política, distinguiu os regime democráticos baseando-se no nível de maior ou menor fragmentação da cultura política em centrífugos ou centrípetos. Combinando a estas características de polarização de um sistema democrático, Lijphart introduziu o conceito do comportamento de coligações (pouco competitivo) ou tornar-se mais competitivo. Essa combinação gerou em sua obra a classificaçãodas democracias em dois tipos: democracia - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 29 de 123 consociativa (representativa) e democracia despolitizada ou majoritária. Lijphart examinou 36 democracias no período de 1945 a 1996 a fim de identificar que arranjo institucional apresenta melhor desempenho. Para responder essa questão, o autor partiu exatamente desses dois grandes modelos de democracia. É importante que vocês tenham a noção de que a democracia majoritária representa o poder político sendo exercido de fator por uma pequena maioria e que a democracia consociativa, apesar de não ser um modelo tão distante da democracia majoritária, representa o poder político nas mãos de uma maioria ampliada, em que o poder político passa a ser compartilhado com outras pequenas maiorias. Por essa razão, se diz que o modelo majoritário é mais combativo e competitivo, enquanto que o modelo consociativo é negociativo e concessivo. O modelo majoritário tem como exemplo original a versão britânica, daí também ser chamado de modelo de Westminster, nome do palácio em que se reúne o Parlamento do Reino Unido. A sua fórmula eleitoral em regra é baseada no voto distrital. Cada membro do corpo legislativo é eleito em um único distrito, por maioria simples. e�R�TXH�RV�LQJOHVHV�FKDPDP�GH�VLVWHPD�³�ILUVW�SDVW� WKH�SRVW�´���TXH�YHP do turfe: o primeiro cavalo a chegar leva todo o prêmio. O voto distrital também favorece a existência do sistema bipartidário, em que dois grandes partidos alternam-se no poder. No caso de sistema bipartidário rigidamente disciplinado, o governo é composto apenas por membros de seu partido. - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 30 de 123 Ocorre que no modelo majoritário, uma maioria acaba excluindo as demais, que se transformam em meras minorias. Essa situação implica graves problemas de representatividade, em razão de essas minorias ficarem excluídas por completo da participação político, estando, então, diante da vontade quase exclusiva da maioria. A vantagem desse modelo é que há níveis melhores de governabilidade, tendo em vista o apoio majoritário, contudo os problemas de representatividade ficam muito evidentes. Em regra, identifica-se o modelo majoritário com uma ampla maioria no Parlamento que coaduna com o governo executivo. Nesse sentido, o Executivo acaba possuindo grande poder de influência dentro do Legislativo, decidindo as leis de um país. No modelo consociativo, em uma situação oposta, o governante precisa buscar consenso entre as diversas forças representadas pelos partidos assentados no legislativo por meio da representação proporcional. Tal modelo visa a um nível maior de compartilhamento do poder político, elevando aquelas minorias não representadas à condição de pequenas ou outras maiorias também representadas. O modelo consociativo possui um nível muito mais satisfatório de representatividade, mas um nível mais problemático de governabilidade, visto que são várias vontade majoritárias disputando a ação política. A democracia consociativa é relacionada ao sistema proporcional com partidos se coligando. A participação política nesse modelo se dá com maior divisão (compartilhamento) do poder político e as minorias possuem seu direito de participação garantido. - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 31 de 123 Significa dizer que, a partir do modelo representativo, diversas parcelas distintas do eleitorado obterão representatividade no governo. Para definir se um país possui democracia majoritária ou consociativa há duas dimensões que devem ser levadas em consideração: a federal-unitária e a executivo-partidária. Colocam- se DV�FDUDFWHUtVWLFDV�GR�SDtV�HP�XPD�³EDODQoD´��GH�PRGR�DEVWUDWR�� claro, e a partir da análise das variáveis, vendo para que lado a balança pende mais, classifica-se o país em ou outro modelo. Vou colocar essas variáveis que podem também ser entendidas como tendências características de cada modelo. Dimensão federal-unitária Democracia Majoritária Democracia Consociativa Centralização e Estado unitário. Descentralização e Estado federativo Poder Legislativo concentrado unicameralmente Poder Legislativo desconcentrado bicameralmente Constituições flexíveis - emendadas por maioria simples. Constituições rígidas - emendadas por quórum especial e mais dificultoso Poder Legislativo decide em última instância o que é ou não constitucional, em relação às leis Poder Judiciário decide em última instância o que é ou não constitucional, em relação às leis - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 32 de 123 (Controle legislativo de constitucionalidade) (Controle judicial de constitucionalidade) Banco Central dependente do Executivo Banco Central independente do Executivo Dimensão executiva-partidária Democracia majoritária Democracia consociativa Poder Executivo concentrado em Gabinetes unipartidários Poder Executivo desconcentrado em coalizões pluripartidárias Executivo predomina sobre Legislativo Relações harmônicas e equilibradas entre os poderes Sistema bipartidário Sistema multipartidário Sistema eleitoral majoritário Sistema eleitoral proporcional Livre concorrência entre grupos distintos Concorrência formada por grupos corporativistas No que concerne ao Brasil, a Constituição de 1824 instituiu os primeiros componentes que possibilitariam o processo eletivo durante o Império no Brasil. Eram eles: (i) criação de uma estrutura em três níveis sem que houvesse autonomia plena de todas (municípios, províncias e governo central), já que o poder era centralizado; (ii) ocupação de cargos por meio de eleições nas três esferas; (iii) regras definidoras do direito ao voto e (iv) adoção de um sistema de eleições indiretas para alguns postos (Câmara dos Deputados, Senado e Assembleias Provinciais) e diretas para outros (Câmaras Municipais e Juízes de Paz). A definição do direito de voto foi estabelecida pela Constituição de 1824, de modo que para participar das eleições era necessário ter - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 33 de 123 ao menos 25 anos, salvo casos de emancipação. Apesar de outras restrições, a mais relevante se dava em relação à obtenção de uma renda mínima anual de 100 mil réis para ser votante, em 1º grau, e de 200 mil para ser eleitor, em segundo grau. No modelo de voto indireto do Império havia dos graus de eleição: no primeiro, havia as eleições SDURTXLDLV� H�� QR� VHJXQGR�� D� ³FDEHoD� GR� GLVWULWR´�� HP� TXH� KDYLD� R� colégio de eleitores. A exigência de renda para a qualificação eleitoral durou durante todo o império. Apesar de a Constituição de 1824 nãoproibir expressamente, as mulheres não votavam durante o Império; já os libertos podiam votar nas eleições de primeiro grau (paroquiais). Na primeira metade do século XIX, o voto secreto ainda não havia sido adotado em nenhum país. De tal modo, votar significava manifestar a preferência em público. Assim, seriam constantes as fraudes eleitorais. As facções locais usavam vários métodos para vencer as eleições: adulteravam a lista de votantes, controlavam a mesa eleitoral, usavam ameaças e violência de capangas, o voto de eleitores fantasmas e a adulteração das atas eleitorais (eleições a bico de pena). Cabe ressaltar que as eleições do Império não geravam um governo propriamente, mas serviam para dar sustentação parlamentar ao Gabinete escolhido pelo Imperador. Dessa maneira, o sistema político imperial era formado de cima para baixo, marcado pela aristocratização da política, simbolizada na instituição do sufrágio censitário, que restringia o exercício dos direitos políticos aos que possuíam maior poder econômico. &RQIRUPH� 6DPSDLR�� ³QR� ,PSpULR�� DV� HOHLo}HV� HUDP� IDEULFDGDV� pelo Gabinete no poder, que usava de todas as armas da fraude, do suborno, da pressão e da violência para obter sempre vitória. Criou-se - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 34 de 123 até a ética de que tudo era permitido ao governo para vencer os SOHLWRV��2�YHUJRQKRVR�SDUD�R�JRYHUQR�HUD�SHUGHU�HOHLo}HV´�� Diante de tal quadro, fica evidente que suposta democracia do Império era puramente formal, incluindo extinções de mandato parlamentar até os dos governadores de províncias pelo quarto poder que então existia: o Poder Moderador, exercido indiscriminadamente pelo Imperador. Em 1889, com a mudança do Império para a República, do Estado Unitário para o Federalismo, os líderes do movimento republicano se viram diante do desafio de reconfigurar as instituições monárquicas. Conforme Nicolau, um dos primeiros decretos do Governo Provisório teve grande impacto sobre o direito de voto no Brasil, abolindo o censo econômico e excluindo os analfabetos do processo eleitoral. A Constituição de 1891 colocava que seria necessário ter mais de 21 anos e ser alfabetizado. Por essa Carta, não tinham direito ao voto os mendigos, os praças e religiosos sujeitos ao voto de obediência. Igualmente à Carta Imperial, não havia necessidade de vedação expressa ao voto para mulheres, tendo em vista que a política era entendida como atividade masculina. Durante a República Velha, as eleições não mudaram muito de caráter em relação ao período anterior, de forma que o processo eleitoral era absolutamente viciado pelas fraudes em larga escala e, salvo poucas exceções, as eleições não eram competitivas. As eleições, mais do que expressar as preferências dos eleitores, serviram para legitimar o controle do governo pelas elites políticas estaduais. A fraude continuava generalizada, ocorrendo em todas as fases do processo eleitoral (alistamento de eleitores, votação, apuração de votos e reconhecimento dos eleitos). Os principais instrumentos de - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 35 de 123 falsificação eleitoral foram o bico de pena, conforme vimos. A eleição a bico de pena consistia na adulteração das atas feitas pela Mesa Eleitoral,que também apurava os votos. De acordo com Vitor Nunes Leal, "inventavam-se nomes, eram ressuscitados os mortos e os ausentes compareciam; na feitura das atas, a pena todo-poderosa dos mesários realizava milagres portentosos". As eleições feitas a bico de pena significam que, com votos descobertos, sem cabine indevassável, o sistema de coação tornava-se completamente legal e habitual, afirmando-VH� FRP� ³EHOH]D� H[FHSFLRQDO´�D�MXULVSUXGrQFLD�SDFtILFD��D�FHUWH]D�GH�TXH�R�JRYHUQR�QmR� perdia eleição. Na República Velha consolidou-se o Coronelismo, que se configurou como um sistema político caracterizado pelo enorme poder FRQFHQWUDGR� QDV� PmRV� GH� XP� SRGHURVR� ORFDO�� R� ³FRURQHO´�� TXH� QD� verdade era algum latifundiário, fazendeiro, senhor de engenho, ou seja, pessoas com grande poder aquisitivo. O coronelismo foi um sistema político marcado pelo autoritarismo por parte dos coronéis e pela subordinação dos trabalhadores e da população. Ressalta-se que os trabalhadores muitas vezes viviam dentro das propriedades dos coronéis, dependendo de favores como dinheiro extra, auxílio para educação dos filhos, socorro na hora da doença, etc. 1DV�SDODYUDV�GH�)DULDV��´R�FRURQHO�DSUHVHQWDYD�XPD�SDWHUQDOLVWD� e clientelista atuação social: ele era o padrinho, o compadre, a pessoa que mandava soltar e prender, arrumando casamentos, promovia festas, acomodando criminosos, dando terras aos agregados que viviam em suas fazendas, protegendo-os da polícia e auxiliando-os em qualquer necessidade, da cura de doenças à redação de uma simples carta. Arrogante, exigia dos submissos uma obediência absoluta, - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 36 de 123 prestação de serviços, participação nos grupos de jagunços para GLVSXWDU�D�OLGHUDQoD�GH�XPD�ORFDOLGDGH�FRP�RXWURV�FRURQpLV´� A relação entre o poder local e o poder regional, isto é, entre os coronéis e as oligarquias, foi elemento essencial para o funcionamento do sistema oligárquico durante a República Velha. A fonte de poder dos coronéis se originava no latifúndio e na liderança de uma vasta clientela de devedores, amigos subordinados e parentes diretos ou indiretos, enlaçados por empregos e favores. Dessa maneira, os coronéis garantiam a chefia política local e/ou regional, além da capacidade de mobilização de correligionários, sobretudo a fim de definir os resultados das eleições. Lembro que uma das primeiras medidas adotadas pelos dirigentes que assumiram o poder em outubro de 1930 foi afastar de seus cargos todos os políticos eleitos durante a República Velha, de PRGR� TXH� R� *RYHUQR� 3URYLVyULR� H[HUFHULD� ³GLVFULFLRQDULDPHQWH´� DV� funções e atribuições dos poderes Legislativo e Executivo até que houvesse reestabelecimento constitucional no país, a partir de nova Constituinte. O Governo Provisório destituiu os governadores dos estados, substituindo-os por interventores e, em cada Estado, esse interventores nomearam interventores locais, nos lugares dos prefeitos. Dessa forma, o Governo Provisório causava uma intensa modificação no sistema político brasileiro. A dissolução do Legislativo em âmbito federal, estadual e municipal, e ainda a ocupação da chefia do Executivo, também nos três níveis, significava, pela primeira vez desde a Constituição de 1824, que todos os postos de poder no país estariam ocupados por políticos não eleitos. Essa situação duraria até - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 37 de 123 novembro de 1933, quando tiveram início os trabalhos da Assembleia Constituinte. Apesar do autoritarismo do Governo e de instabilidade do novo regime político, avanços democráticosocorreram, durante o primeiro período Vargas (1930-1937). Dentre eles, pode-se destacar a criação da Justiça Eleitoral, a instituição do voto feminino e o surgimento do primeiro código eleitoral brasileiro, fatos ocorridos em 1932, ano que também foi marcado pela Revolução Constitucionalista, eclodida em 9 de julho, na cidade de São Paulo. O Código Eleitoral promoveu uma série de mudanças nas instituições eleitorais do país, conforme Nicolau. O citado autor lembra que entre as mudanças evidenciadas pelo novo Código destacam-se: o direito de voto às mulheres, a criação da Justiça Eleitoral, a adoção do voto secreto e da representação proporcional, a exigência de que partidos e candidatos fossem registrados antes do dia da eleição e a obrigatoriedade do alistamento e do voto. A Constituição de 1934 ratificaria tal obrigatoriedade. Com a promulgação da Constituição de 1934, chegava ao fim o chamado governo provisório instaurado com a vitória da Revolução de 1930. A nova Constituição, elaborada por uma Assembleia Nacional Constituinte, introduziu no país uma nova ordem jurídico-política que consagrava a democracia, com a garantia do voto direto e secreto, da pluralidade sindical, da alternância no poder, dos direitos civis e da liberdade de expressão dos cidadãos. Particularmente para as mulheres, a Constituição de 1934 representou uma enorme conquista: pela primeira vez, tornavam-se eleitoras e elegíveis. Mas a Constituição durou pouco. Três anos depois, antes mesmo que a primeira eleição que elegeria o novo presidente se realizasse, Getúlio - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 38 de 123 Vargas deu um golpe para manter-se no poder e instaurou uma ditadura, conhecida como Estado Novo. No entanto, todos os avanços democráticos retrocederiam em 10 de novembro de 1937. Getúlio Vargas, naquela data, instaurou um regime autocrático, outorgando uma nova Constituição e pondo fim à democracia, instituindo o chamado Estado Novo, sobre o qual já conversamos. Com a instituição do Estado Novo foram suspensas as eleições no Brasil (1937-1945), os partidos políticos foram extintos, assim como a Justiça Eleitoral. A Carta de 1937 incluía vários dispositivos semelhantes aos encontrados em constituições de regimes autoritários vigentes na Europa, como as de Portugal, Espanha e Itália. Com o Congresso Nacional fechado e com a decretação de rigorosas leis de censura, Vargas pôde conduzir o país sem que a oposição pudesse se expressar de forma legal. A essência autoritária e centralista da Constituição de 1937 colocava em sintonia com os modelos fascistas de organização político- institucional então em voga em diversas partes do mundo, rompendo com a tradição liberal dos textos constitucionais anteriormente vigentes no país. Sua principal característica era a enorme concentração de poderes nas mãos do chefe do Executivo. Do ponto de vista político-administrativo, seu conteúdo era fortemente centralizador, ficando a cargo do presidente da República a nomeação das autoridades estaduais, os interventores. Aos interventores, por seu turno, cabia nomear as autoridades municipais. Em 1946, uma nova Constituição é promulgada no Brasil, a partir da qual são retomados princípios democráticos e sociais que houveram sido consagrados pela Constituição de 1934 e abolidos pelo Estado- Novo. Com a redemocratização, surgem novos partidos políticos, de - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 39 de 123 caráter nacional, e as eleições para presidente da república voltam a ocorrer de forma direta, com a consagração do sufrágio universal. 'H�DFRUGR�FRP�1HWR��³p�GH�VH�GHVWDFDU��QR�HQWDQWR��TXH��PXLto embora o período instituído com a Constituição de 1946 seja considerado um período democrático, uma grande instabilidade política ainda podia ser verificada no Brasil. Em 1950, o ex-ditador, Getúlio Vargas, é eleito democraticamente, presidente da república. Setores oposicionistas, liderados pela UDN (União Democrática Nacional), partido político que rivalizou com o PTB (Partidos Trabalhista Brasileiro) e o PSD (Partido Social Democrático) durante quase vinte anos, tentam impedir a posse do presidente e, após esta, fazem tudo para o depor. Em meio a uma grande crise política, Getúlio Vargas se suicida, em 24 de agosto de 1954, adiando, em dez anos, o golpe PLOLWDU�TXH�WHUPLQDULD�RFRUUHQGR�HP�����´� A Constituição de 1946, de acordo com Nicolau, manteve a tradição, inaugurada pela Carta de 1981, de voto direto para presidente e vice-presidente da República, mas não adotou o dispositivo que previa a escolha pelo Congresso entre os dois nomes mais votados nos casos em que um dos candidatos não obtivesse maioria absoluta de votos. Foi essa Constituição de 1946 que definiu a forma de escolha do Congresso Nacional que perdura até hoje. Como vocês sabem, em 1964 um golpe de Estado, promovido por militares e setores da elite política, afastou o presidente João Goulart e assumiu o poder no país. Assim, chegava ao fim o regime iniciado em fins de 1945 e que, pela primeira vez na história brasileira, combinava a realização de eleições regulares e competitivas com altas taxas de incorporação de adultos ao processo eleitoral, conforme salienta Nicolau. - Ciência Política para CGU Teoria e exercícios comentados Prof. Rodrigo Barreto ʹ Aula 05 Prof. Rodrigo Barreto www.estrategiaconcursos.com.br 40 de 123 Poucos dias após o golpe, o Comando Supremo da Revolução baixa o Ato Institucional n°1 ± lembram? - que ampliava consideravelmente os poderes do Executivo e reduzia os do Legislativo. Nos dias seguintes, ainda conforme Nicolau, 167 cidadãos tiveram seus direitos políticos cassados, entre eles Jânio Quadros, João Goulart, Miguel Arraes e Leonel Brizola. O regime autoritário iniciado em 1964 caracterizou por: (i) um conjunto de medidas violentas, como a perseguição à oposição; (ii) o casuísmo legislativo; (iii) a singularidade de seu sistema político, em que os presidentes-militares e os governadores eram referendados por eleições legislativas e (iv) extinção do sistema pluripartidário, com imposição do bipartidarismo. Foi no governo Castelo Branco, que governou de 64 a 67, que foram criadas as principais bases do sistema implementado pelo regime militar, quais sejam, extinção dos partidos da República de 1946 e criação de um sistema bipartidário; adoção de eleições indiretas para a escolha do presidente e dos governadores; nomeação dos prefeitos das capitais pelos governadores; adoção de novo Código Eleitoral e criação da primeira lei para regulação dos partidos políticos. Ainda no período Castelo Branco, foi baixado o Ato Institucional nº 2, em 1965, que extinguia as eleições diretas para Presidente e instituía a escolha, indireta, por meio do Congresso Nacional. Nicolau lembra que, para diversos analistas, o bom desempenho da oposição nas eleições de 1965 teria sido o principal motivo para que o governo baixasse o AI-2, menos de um mês depois do pleito. O AI-2 desfez a fértil experiência partidária experimentada no período democrático de 1945 a 1964, extinguindo os partidos políticos e cancelando-lhes o registro. Essa era a segunda
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