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O DIREITO PENAL DO INIMIGO E A APLICAÇÃO DO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO

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O DIREITO PENAL DO INIMIGO E A APLICAÇÃO DO REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO
Pedro Lucas Cardoso Casas Novas (CPD: 015230)
1. INTRODUÇÃO
Este artigo se propõe a analisar a teoria doDireito Penal do Inimigo (DPI) e o Regime Disciplinar Diferenciado (RDD),descrevendo o contexto histórico no qual surgiram, apresentando seus conceitos e características, bem como as posições doutrinárias a respeito da influência do Direito Penal do Inimigo no RDD e as críticas sobre a sua aplicação no Direito Penal brasileiro.
Por isso, serão expostas as principais ideias do precursor do DPI, bem como sua visão de Direito Penal, que é separado segundo ele em dois tipos, o direito penal do cidadão e o direito penal do inimigo. Serão expostas também as visões de diversos doutrinadores sobre o tema, inclusive sobre a inserção do DPI na legislação brasileira, que nos últimos anos foi influenciada por essa teoria.
Ao retratar o Regime Disciplinar Diferenciado,será descrito a forma como se originou e o motivo de sua criação, que relaciona-se com a necessidade do isolamento dos líderes de organizações criminosas, devido a um cenário descrito como caos nos presídios, somados a falta de mecanismos opressivos do Estado. Além disso, serão descritas as características desse regime, como por exemplo a duração máxima de 360 dias, recolhimento em cela individual e direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol.
O direito penal do inimigo tem uma estreita relação com o Regime Disciplinar Diferenciado, sendo que este pode ser dito como um produto daquele, isso porque o DPI tem como um de seus objetivos a criação de leis mais severas. Ambos também visam enrijecer as sanções aos ditos inimigos, minimizando suasgarantias e isolando-os dos demais presos. Tudo isso com um caráter preventivo, pois esse tipo de criminoso não pode ser tratado apenas pelo que fez e sim pelo que pode fazer futuramente (visão prospectiva).
Tendo como base uma visão ampla dos dois institutos, serão explanadas as diversas opiniões de doutrinadores sobre o tema, sendo que a grande maioria deles acredita que a aplicação do RDD é medida inconstitucional e violadora dosprincípios basilares do nosso Estado democrático de Direito. Outra parte defende a medida adotada, dizendo ser esta essencial para assegurar a segurança da sociedade.
2. TEORIA DO DIREITO PENAL DO INIMIGO
A Teoria do Direito Penal do Inimigo (DPI) foi desenvolvida na segunda metade da década de 90 pelo professor alemão Gunter Jakobs, que assim a intitula para traçar uma distinção com outra tendência também existente no Direito Penal, o Direito Penal do cidadão.
Para Jakobs, existem esses dois tipos de direito penal, o direito penal do cidadão e o direito penal do inimigo. Todo mundo nasce na condição de cidadão e, mesmo após praticar um crime grave, reincidir no mesmo crime ou viver do crime – habitualidade delituosa – ele ainda não deixa necessariamente de ser considerado cidadão. Isso faz do Direito Penal do cidadão um direitogarantista, que respeita as garantias e direitos expressos na Constituição Federal.
Segundo a teoria de Jakobs, o indivíduo só passa a ser considerado inimigo quando se associa com alguma organização criminosa ou terrorista, pois segundo ele, esses indivíduos, ao fazerem essa escolha, decidiram se afastar do Direito por tempo prolongado e não dão garantia de que vão continuar fiel a norma e por isso não merecem ser tratados como cidadãos e sim como inimigos do Estado.
Dessa forma, como a natureza dossujeitos (inimigo e cidadão) é distinta, não é coerente dar o mesmo tratamento para ambos, como expõe Jakobs:
(….) quem por princípio se conduz de modo desviado, não oferece garantia de um comportamento pessoal. Por isso, não pode ser tratado como cidadão, mas deve ser combatido como inimigo. Esta guerra tem lugar com um legítimo direito dos cidadãos, em seu direito à segurança; mas diferentemente da pena, não é Direito também a respeito daquele que é apenado; ao contrário, o inimigo é excluído.
Destarte, podemos citar o entendimento do doutrinadorJésus-MariaSilva Sánchez, que diz existirem 3 velocidades para o Direito Penal, denominado de Processo de Expansão do Direito Penal. A primeira velocidade pode ser representada pelo Direito Penal do Cidadão, já que diz respeito aoDireito Penal liberal clássico, garantista, com total cumprimento de todos os preceitos de direitos fundamentais, usando preferencialmente da pena privativa de liberdade.
O direito penal de segunda velocidade admite uma substituição das penas privativas de liberdade por penas alternativas, demonstrando uma maior maleabilidade das medidas punitivas do Estado, nela, algumas garantias poderiam ser afastadas com o objetivo de agilizar a aplicação da lei penal.No Brasil, começou aser introduzido com a Reforma Penal de 1984 e se consolidou com a edição da Lei dos Juizados Especiais (Lei n. 9.099/95).
Por fim, Sánchez apresenta a terceira velocidade do direito penal, que representauma velocidade híbrida, ou seja, com a finalidade de aplicar penas privativas de liberdade (primeira velocidade) e com uma minimização das garantias necessárias a esse fim (segunda velocidade). E é por isso que oDireito Penal do Inimigo está inserido nessa velocidade, tendo como bom exemplo aLei dos Crimes Hediondos, que aumentou consideravelmente a pena de vários delitos, tentou extinguir algumas prerrogativas processuais, dificultou a progressão de regime e impôs o cumprimento da pena em regime inicialmente fechado (crimes hediondos).
Sánchez chega a conceituar o “inimigo”, dizendo:
O Inimigo é um indivíduo que, mediante seu comportamento, sua ocupação profissional ou, principalmente mediante sua vinculação a uma organização abandonou o Direito de modo supostamente duradouro e não somente de maneira incidental. Em todo caso, é alguém que não garante mínima segurança cognitiva de seu comportamento pessoal e manifesta esse déficit por meio de sua conduta […] Se a característica do “inimigo” é o abandono duradouro do Direito é a ausência da mínima segurançacognitiva em sua conduta, então seria plausível que o modo de afrontá-lo fosse com o emprego de meios de asseguramento cognitivo desprovido da natureza de penas.
2.1. BASE FILOSÓFICA
Gunter Jakobs teve influência de pensadores que, embora com pensamentosdiferentes, tinham uma fundamentação contratualista do Estado, ou seja, por concordarem que a sociedade surge de um contrato. Pode-se citar nomes como Rosseau, Kant e Hobbes.
Rosseau prega que qualquer pessoa que ataque os direitos sociais encontra-se emguerra com o Estado e deixa de fazer parte dele, pois o contrato social éum pacto legítimo pautado na alienação total da vontade particular como condição de igualdade entre todos, instituída na lei.
Por outro lado, Hobbes defende que, em um primeiro momento, o delinquente mantenha sua posição como cidadão, no entanto, caso o criminosorescinda a submissão – rebelião – que tem para o Estado, ele retrocede para o estado de natureza, que para Hobbes é um estado de guerra e anarquia por não ter a presença deum estado autoritário. Dessa forma, os indivíduos que incorrem em tal delito não são castigados como meros cidadãos mas sim como inimigos do Estado.
Para Kant, o Estado deve ser republicano e não absolutista como dizia Hobbes, devendo ser pautado em princípios como a igualdade dos homens e liberdade de cada membro da sociedade, limitada pela lei. Para ele, o contrato em questão é de origem moral, podendo qualquer pessoa obrigar outra a entrar em uma constituição cidadã.
2.2. CARACTERÍSTICAS
Segundo Jakobs, o Direito Penal do Inimigo é um direito prospectivo, diferentemente do direito retrospectivo (Direito Penal do Cidadão), que é mais comum na sociedade, visando o passado, fundamentando-se na culpabilidade do indivíduo. Por isso, o Direito Penal do Inimigo tem sua visão voltada para o futuro e tem como fundamento a periculosidade do indivíduo, ou seja, ele não é punido pelo que ele fez ou deixou de fazer necessariamente, podendo ser punidopelo que ele pode vir a fazer. Em outras palavras, o inimigo é aquele sujeito de comportamento imprevisível dentro dessa teoria. Assim, Jakobs disserta:
(….) a punibilidade se adianta um grande trecho, até o âmbito dapreparação, e a pena se dirige a assegurarfatos futuros, não a sanção de fatoscometidos
No DireitoPenal do Inimigo, as penas previstas são também desproporcionadamente altas e ocorre um aumento da utilização de medidas de segurança. Um exemplo, já citado anteriormente, de como as penas no Brasil têm sido objeto de aumento é a Lei dos Crimes Hediondos.
Segundo o autor da teoria, o Direito Penal do Inimigo ajuda na incriminação de atos preparatórios assim como atos executórios, como por exemplo a punição por formação de quadrilha para a prática de crime hediondo (ato preparatório) se torna mais severa doque a punição por tentativa de homicídio simples (pressupõe ato executório). Outra característica desse instituto é a supressão ou relativação de garantias processuais que até então não acontecia.
Essa teoria também tem como pilar a criação de leis severas direcionadasaos ditos “inimigos” (terroristas, traficantes, grupos organizados, dentre outros). O Regime Disciplinar Diferenciado, que será o próximo objeto de estudo no presente artigo, é um exemplo da influência da teoria do direito penal do inimigo no Brasil, porém de uma forma mais branda do que a teoria prevê. Existe apenas uma influência pois o DPI não é permitido no Brasil, tendo oExcelso Pretório se manifestado contrário à adoção do Direito Penal do Inimigo no Brasil, como mostra o seguinte acórdão:
Estipulação do cumprimento da pena em regime inicialmente fechado — Fundamentação baseada apenas nos aspectos inerentes ao tipo penal, no reconhecimento da gravidade objetiva do delito e na formulação de juízo negativo em torno da reprovabilidade da conduta delituosa — Constrangimento ilegal caracterizado — Pedido deferido. O discurso judicial, que se apoia, exclusivamente, no reconhecimento da gravidade objetiva do crime — e que se cinge, para efeito de exacerbação punitiva, a tópicos sentenciais meramente retóricos, eivados de pura generalidade, destituídos de qualquer fundamentação substancial e reveladores de linguagem típica dos partidários do ‘direito penal simbólico’ ou, até mesmo, do ‘direito penal do inimigo’ —, culmina por infringir os princípios liberais consagrados pela ordem democrática na qual se estrutura o Estado de Direito, expondo, com esse comportamento (em tudo colidente com os parâmetros delineados na Súmula 719/STF), uma visão autoritária e nulificadora do regime das liberdades públicas em nosso País. Precedentes. (HC 85.531, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 22-3-05, DJ de 14-11-07).
3. REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO
3.1. HISTÓRICO
Apesar de ter sua origem no estado de São Paulo com a Resolução 26/2001, oRegime Disciplinar Diferenciado (RDD) foi instituído no dia 1º de dezembro de 2003, pela Câmara dos Deputados, com a transformação do projeto de lei 5.073/01 na lei do RDD (Lei 10.792) e é dito porJulio Fabbrine Mirabete ser:
(....) um novo regime de disciplina carcerária especial, com maior grau de isolamento e restrições de contato com o mundo exterior.
A sua criação foi impulsionada desde fatores como a iniciativa do presidente Fernando Henrique Cardoso, que criou o projeto de lei 5.073/01, visando alterar os dispositivos da Lei de Execução Penal (Lei 7.210/84) e do Código de Processo Penal, o assassinato de dois juízes corregedores da Vara de Execuções,conhecidos por seu tratamento severo para com o concedimento de benefícios para os presos eamegarrebelião ocorrida no início de 2001, em São Paulo, quando 29 unidades prisionais rebelaram-se simultaneamente por ordem de chefes de facções criminosas exaradas dentro dos próprios presídios.
3.2. CARACTERÍSTICAS
O surgimento do Regime Disciplinar Diferenciado trouxe mudanças na legislação brasileira, dentre elas podemos citar o novo texto dado ao artigo 52 da Lei de Execução Penal (LEP), que além de prever as hipóteses de inclusão nesse regime, elencou suas características.
O Art.52 da LEP (Lei 7.210/84) dispõe:
A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório, ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com asseguintescaracterísticas:
I- duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada;
II- recolhimento em cela individual;
III- visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas;
IV- o preso terá direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol.
§ 1oO regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ouestrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade.
§ 2oEstará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando.
Como visto no presente artigo, pode-se afirmar que o RDD é a espécie mais drástica de sanção disciplinar, tendo em vista a restrição, como de nenhuma outra espécie, da liberdade de locomoção do preso e alguns dos seus direitos, podendoser aplicado tanto ao preso condenadoquanto ao provisório, bastando que ele esteja inserido em uma das condições de aplicação do RDD, ou seja, para ser inserido nesse regime, o preso tem que estar necessariamente cumprindo pena e se encaixar nas hipóteses de inclusão no regime.
O rigor dessaforma de sanção é tanto que, no caso da duração máxima de trezentos e sessenta dias nesse regime, o STF já deu a entender que não háilegalidade na permanência do preso – no referido caso, Fernandinho Beira-Mar – no regime, desde que fundamentada pelo juízo de orgiem. Em outras palavras, caso o indivíduo constitua uma ameaça latente para o Estado, o período de duração em presídio federal poderá ser estendido por período indeterminado.
Outro fator crucial para a inserção do preso no RDD é o prévio e fundamentado despacho do juiz da execução componente, feito mediante requerimento circunstanciado, elaborado pelo diretor do estabelecimento ou outra autoridade administrativa. Essa decisão judicial sobre inclusão do preso no regime será precedida de manifestaçãodo Ministério Público e da defesa, sendo prolatada em até 15 dias.(Art.54 caput e §1º e §2º)
Para reforçar ainda mais o tom de severidade do RDD e combater a criminalidade organizada, a Lei 7.210/84 ainda trata em seu art.3º que:
Os estabelecimentos penitenciários disporão de aparelho detector de metais, aos quais devem se submeter todos que queiram ter acesso ao referido estabelecimento, ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública.
Exposto também no art.52 da LEP, o preso pode ser incluído no RDD por medida cautelar, no prazo de 10 dias, nas hipóteses de fundadas suspeitas de envolvimento ou participação em organizações criminosas ou de representar ele alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou para a sociedade.
4. DIREITOPENAL DO INIMIGO E A APLICAÇÃO DO RDD NA EXECUÇÃO PENAL
4.1. RELAÇÃO DO DIREITO PENAL DO INIMIGO COM O RDD
Bruno Seligman de Menezes já afirmou metaforicamente em sua obra que o Regime Disciplinar Diferenciado é o “Direito Penal do Inimigo Brasileiro”,em contraposição,a doutrina de Ricardo Alves Bento e Patrícia Stucchi Bentodiz que o RDD:
trata-se única e exclusivamente de uma necessária adequação da resposta legislativo-criminal em face do evento que gera a tranquilidade social
No entanto, o quenão se pode negar é a estrita relação existente entre oDireito Penal do Inimigo e o Regime Disciplinar Diferenciado, haja vista uma distinção visível dos presos que cumprem pena fora do RDD, que na teoriaainda são considerados cidadãos que ainda fazem parte do Estado e os que cumprem pena no RDD, ditos como ameaça iminente a segurança da sociedade, como por exemplo os líderes de facções criminosas (Ex.: Fernandinho Beira-Mar). Portanto, somente é aplicado o RDD àquele indivíduo em que recaiam fundadas suspeitas sobre participação em organizações criminosas, sendo esse criminoso de alta periculosidade separado dos criminosos “comuns”.
4.2. ARGUMENTOS CONTRA A APLICAÇÃO DO RDD
Muitas críticas são feitas sobre a influência dessa teoria (Direito Penal do Inimigo) na legislação penal brasileira, expressada principalmente no RDD. Segundo os críticos, esse tipo de sanção é desumano e vai contra os principais preceitos constitucionais, até por considerarem o inimigo como um objeto e não como um cidadão, aplicarempenas desproporcionais, indo contra a dignidade da pessoa humana, o contraditório e a ampla defesa e até contra o próprio Estado de Direito.
O argumento da inconstitucionalidade do Regime Disciplinar Diferenciado pode ser baseado noart.5º, III da Constituição Federal de 1988, que dispõe queninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante, além do Art.1º declarar a dignidade da pessoa humana como Fundamento da República Federativa do Brasil.
Paulo César Busato, em sua obra sobre o RDD como produto do Direito Penal do Inimigo, critica veementemente:
O fato de que apareça uma alteração daLei de ExecuçõesPenaiscom características pouco garantistas tem raízes que vão muito além da intenção de controlar a disciplina dentro do cárcere e representam, isto sim, a obediência a um modelo político-criminal violador não só dos direitos fundamentais do homem (em especial do homem que cumpre pena), mas também capaz de prescindir da própria consideração do criminoso como ser humano e inclusive capaz de substituir um modelo de Direito penal de fato por um modelo de Direito Penal de autor.
Carlos Weis também assevera:
Este tipo de regime, conforme diversos estudos relatam, promove a destruição emocional, física e psicológica do preso que, submetido ao isolamento prolongado, pode apresentar depressão, desespero,ansiedade, raiva, alucinações, claustrofobia, e a médio prazo, psicoses e distúrbios afetivos graves. O projeto, ao prever isolamento de trezentos e sessenta dias, certamente causará nas pessoas a ele submetidas a deterioração de suas faculdades mentais, podendo-se dizer que o RDD, não contribui para o objetivo da recuperação social do condenado e, na prática, importa a produção deliberada de alienados mentais.
4.3. ARGUMENTOS A FAVOR DA APLICAÇÃO DO RDD
		
Em contrapartida às críticas acerca da aplicação do Regime Disciplinar Diferenciado, doutrinadores como Guilherme de Souza Nucci e oJuiz José Paulo Baltazar Junior são a favor de sua aplicação, negando qualquer inconstitucionalidade do regime, influenciado pela polêmica teoria do DPI. Esses doutrinadores alegam que a segurança da sociedade prepondera em relação a integridade do preso, além da impossibilidade de dar ao criminoso de grande periculosidade o mesmo tratamento dado a um criminoso comum, sendo preciso uma forma diferenciada de tratamento.
Diferentemente da maioria dos doutrinadores, grande parte da jurisprudência tem reconhecido a constitucionalidade do RDD, dizendo que os institutos constitucionais, como de todas as normas do nosso ordenamento jurídico, não são absolutos, podendo haver ponderação de princípios e ser usado o princípio da proporcionalidade.
Nucci, ao falar sobre o tema, argumenta os pontos favoráveis à aplicação do regime:
Diante das características deste regime, em especial, do isolamento imposto ao preso durante 22 horas por dia, situação que pode perdurar por ate 360 dias, há argumentos no sentido de ser essa prática uma pena cruel. Pensamos, entretanto, que não se combate o crime organizado, com o mesmo tratamento destinado ao delinquente comum. Se todos os dispositivos do Código Penal e da LEP fossem fielmente cumpridos, há muitos anos, pelo Poder Executivo, certamente o crime não estaria, hoje, organizado de modo que não haveria necessidade de regimes como o estabelecido pelo art. 52 da LEP. Proclamar a inconstitucionalidade do regime, fechando os olhos aos imundos cárceres aos quais estão lançados muitos presos no Brasil, é com a devida vênia, uma imensa contradição. Constitui situação muito pior ser inserido em uma cela coletiva repleta de condenados perigosos, do que ser colocado em cela individual,longe da violência de qualquer espécie, com maishigiene, além de não se submeter a nenhum tipo de assédio de outros criminosos. Há presídios brasileiros, onde não existe o RDD, mas presos matam outros, rebeliões são uma atividade constante, fugas ocorrema todo o momento, a violência sexual não é contida e condenados contraem doenças gravíssimas. Pensamos ser essa situação mais seria e penosa que o RDD. Por isso, o instituto tornou-se uma alternativa viável para conter o avanço da criminalidade incontrolada, constituindo meio adequado para o momento vivido pela sociedade brasileira. Em lugar de combater, idealmente, o RDD, pensamos ser mais ajustado defender, por todas as formas possíveis, o fiel cumprimento às leis penais e de execução penal, buscando implementar, na prática, os regimes fechado, semiaberto e aberto, que, em muitos lugares, constituem simples quimeras.
5. CONCLUSÃO
Diante do exposto, pode-se concluir que o Direito Penal do Inimigo foi desenvolvido com o objetivo de separar criminosos denaturezas distintas e aplicar sanções, baseadas na periculosidade do indivíduo e não em sua culpabilidade, de forma severa e pouco garantista aos ditos inimigos do Estado. Essa teoria rendeu muitas críticas no Brasil, principalmente no “produto” da teoriano país, o Regime Disciplinar Diferenciado, criado para reprimir líderes de facções criminosas, reduzindo garantias e aumentando o rigor da sanção.
As principais críticas dos doutrinadores são pautadas em proteção dos direitos dos presos, que são excluídosda condição de ser humano e passam a ser tratados apenas como ameaças que devem ser reprimidas. Em contrapartida, outros defendem a permanência do RDD no Direito Penal brasileiro, tendo em vista o bem maior em jogo que é a segurança da sociedade que, segundo eles, prepondera sobre as garantias do preso.
6. REFERÊNCIAS
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BRASIL. Superior Tribunal Federal."Habeas corpus" - inexistência de direito subjetivo a regime de cumprimento penal mais brando – possibilidade de imposição de regime mais gravoso – réu primário e de bons antecedentes, condenado a pena não superior a 08 (oito) anos (cp, art.33,§ 2º, b)- estipulação do cumprimento da pena em regime inicialmente fechado – fundamentação baseada apenas nos aspectos inerentes ao tipo penal, no reconhecimento da gravidade objetiva do delito e naformulação de juízo negativo em torno da reprovabilidade da conduta delituosa – constrangimento ilegal caracterizado – pedido deferido. HC 85531 SP. Izaque Dantas da Silva PGE-SP – Patrícia Helena Massa Arzabe (Assistência Judiciária).Relator Celso de Mello. Acórdão , 22/03/2005. DJe-142 DIVULG 13-11-2007 PUBLIC 14-11-2007 DJ 14-11-2007 PP-00067 EMENT VOL-02299-01 PP-00198. A Turma, por votação unânime, deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.
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