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A TERRITORIALIDADE DA ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES DE LEITE INDEPENDENTES DE SANTA ISABEL DO RIO PRETO, SEDIADA EM VALENÇA, RJ.

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE GEOGRAFIA
A TERRITORIALIDADE DA ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES DE LEITE INDEPENDENTES DE SANTA ISABEL DO RIO PRETO, SEDIADA EM VALENÇA, RJ.
BRUNO MILÁN CARNEIRO DE ALBUQUERQUE
RIO DE JANEIRO
2014
UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO DE GEOGRAFIA
A TERRITORIALIDADE DA ASSOCIAÇÃO DOS PRODUTORES DE LEITE INDEPENDENTES DE SANTA ISABEL DO RIO PRETO, SEDIADA EM VALENÇA, RJ.
BRUNO MILÁN CARNEIRO DE ALBUQUERQUE
MONOGRAFIA SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DO
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA DA UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO COMO REQUISITO PARCIAL PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE (LICENCIATURA E BACHARELADO) EM GEOGRAFIA.
 Orientação do professor doutor Gláucio José Marafon
RIO DE JANEIRO
2014
Dedico este TCC a minha amada e inseparável esposa, 
companheira e luz da minha vida, pois graças a ela, 
a minha vida acadêmica tornou-se um sonho possível.
AGRADECIMENTOS:
Agradeço abaixo cronologicamente nos dois momentos da minha prolongada graduação.
Meu carinho pela professora doutora Aureanice Mello por me orientar no primeiro momento da graduação e ao me receber quando voltei para o segundo momento desta.
Minha eterna gratidão à professora Elizabeth França e ao professor Nilton Abranches por toda a ajuda, incentivo e orientação no meu retorno para a graduação, a minha vida. 
Minha eterna gratidão também ao meu orientador professor doutor Gláucio Marafon, pela oportunidade da bolsa do NEGEF, do qual tenho orgulho de fazer parte e que foi fundamental para nortear minha trajetória atual dentro da Geografia, em especial à descoberta da Geografia Agrária em minha vida.
Aos meus colegas bolsistas negefianos Amanda Rocha, Caroline Xavier, Eduardo Mattos, Gabriel Mendes, Gustavo Brito, Lucas Trindade, Marcelo Azevedo, Pedro Lucas, Daniel Martorelli pelos debates teóricos ao meu camarada Phelipe Gonçalves por toda a ajuda técnica e idéias.
Um especial agradecimento á querida amiga Raíra Cezário que me ajudou com os mapas.
Aos meus colegas pós-graduandos em Geografia Agrária pela UERJ, que também freqüentam o NEGEF, Rogério Seabra com suas esclarecedoras orientações sobre o conceito geográfico de escala, á Aline Silveira, Wanderson Rebello e Arthur Andrade pela paciência de suas co-orientações e incentivos na construção deste TCC lembrando também das conversas com Marcos Lima, Andréa Acioly, Humberto Queiroz e Silvam Borborema.
Sou muito agradecido pelos incentivos à minha vida acadêmica dos professores Mônica Sampaio e Ulisses Fernandes na Geografia, Ligia Leite na Educação, Fábio Tadeu Santana do CAP UERJ e do meu grande amigo professor contratado pela UERJ, Ricardo Luigi.
Tenho que agradecer a paciência e ajuda inestimável dos funcionários do IGEOG Emerson Freitas, que se tornou um grande amigo, Jurema Ávila, Andréia Queiroz e Leonardo Bretas.
Finalmente agradeço a solicitude dos senhores Paulo Fernando Correa da Silva, Eduardo Silva e ao secretário Danilo da APLISI em oportunizar a minha pesquisa e ter boa vontade em me ajudar com as informações necessárias. 
E a existência da magnífica Universidade Estadual do Rio de Janeiro que amarei para sempre.
"Se você gosta da UERJ, sofre de Uerjfilia 
e se você não gosta da UERJ, sofre de Uerjfobia."
(Professor  Doutor  João Baptista  Ferreira de  Mello)
SUMÁRIO
RESUMO...........................................................................................................................08
ABSTRACT.......................................................................................................................09
LISTA DE FIGURAS........................................................................................................10 
LISTA DE TABELAS.......................................................................................................11 
LISTA DE REDUÇÕES....................................................................................................12 
INTRODUÇÃO.................................................................................................................13
CAPÍTULO 1 - A Formação do território da APLISI.......................................................20
CAPITULO 2 - O território da APLISI e suas territorialidades........................................36
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................53
REFERÊNCIAS.................................................................................................................57
ANEXO A - Informações oficiais sobre a APLISI............................................................60 
RESUMO
Através da pesquisa de campo e baseando-se em leitura teórica sobre os conceitos de território e territorialidade, busca-se delimitar o território controlado pela Associação dos Produtores de Leite Independentes de Santa Isabel (APLISI) conformado pelas redes geográficas horizontais estabelecidas entre os produtores associados estabelecidos em sete municípios nos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais e as transformações sócio-econômicas decorrentes destes processos territoriais, relacionando com a territorialização da produção leiteira passada e atual dentro da região de atuação da APLISI. A questão norteadora desta pesquisa é saber qual é a territorialidade no embate dos interesses dos produtores primários de leite na sua inserção produtiva nas etapas no CAI leiteiro, associados à APLISI, investigando as interações geográficas verticais e horizontais no lugar e território que são estabelecidos no espaço geográfico e a definição do que são os territórios material e subjetivo no substrato material onde se operam essas interações geográficas dos produtores. 
Palavras-Chave: APLISI; Valença; Territorialidade; Território, Produção de leite.
ABSTRACT
Through field research and based on theoretical reading about the concepts of territory and territoriality, we seek to define controlled by the Association of Independent Milk Producers of Santa Isabel (APLISI) territory formed by the horizontal geographical networks established between the associated producers established in seven municipalities in the states of Rio de Janeiro and Minas Gerais and socio-economic changes resulting from these territorial processes, relating to the territorialization of past and current milk production within the region of operation of APLISI. The guiding question of this research is to know what is the territoriality in the clash of interests of primary producers of milk in their productive involvement in the steps in the dairy CAI, associated with APLISI investigating the vertical and horizontal interactions in place and geographic territory that are set in space and the geographical definition of the territories that are subjective in materials and substrate materials which operate these geographical interactions of producers.
Key-Words: APLISI; Valença; Territorialidade; Território; Produção de leite;
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Ilustração da Microrregião fluminense de Barra do Piraí..................................................13 
Figura 2 – Mapa dos sete (7) municípios do RJ e MG com 49 associados (APLISI)........................14
Figura 3 - Ilustração da microrregião mineira de Andrelândia..........................................................18 
Figura 4 - Ilustração da Microrregião fluminense do Vale do Paraíba...............................................19 
Figura 5 – Território e Lugar da APLISI conformados pelos municípios produtores.......................38
Figura 6 - Mapa dos fluxos entre os fixos políticos administrativosno território da APLISI...........41
Figura 7 – Gráfico da Evolução anual da produção de leite da APLISI entre 2011 e 2014..............45
Figura 8 - Foto do Tanque de Resfriamento na fazenda Córrego da Serra........................................51
Figura 9 – Foto da Ordenha mecânica na fazenda Córrego da Serra ................................................52
Figura 10 - Ilustração do distrito de Santa Isabel do Rio Preto..........................................................62
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Produção em estabelecimentos agropecuários de leite no Brasil de 1960 a 2006..........30
Tabela 2 – Produção em estabelecimentos agropecuários de leite na região SE de 1960 a 2006.....31
Tabela 3 – Posição produtiva da mesorregião sul fluminense e de Valença....................................32
Tabela 4 - Evolução da produção leiteira no estado do Rio de Janeiro entre 1974 e 2009..............33
Tabela 5 - Percentual da produção de leite da APLISI nos municípios em que se encontra............41
Tabela 6 - Número da produção de leite da APLISI no ano de 2013...............................................45
LISTA DE REDUÇÕES
ABAG – Associação Brasileira do Agronegócio.
APLISI – Associação dos Produtores Independentes de Santa Isabel.
CAI – Complexo Agro Industrial.
CAPIL – Cooperativa Agropecuária de Itaperuna ltda.
CBT – Contagem Bacteriana Total. 
CCPL – Cooperativa Central dos Produtores de Leite.
CCS – Contagem de Células Somáticas. 
CEPEA – Centro de pesquisas econômicas da ESALQ.
CNIEL - Centre National Interprofessionnel de l'Economie Laitière.
ESALQ - Escola Superior de Agricultura Luiz Queiroz. 
GPS – Global Positioning Sistem.
HTST - Alta temperatura em curto tempo 
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
LBR – Lácteos Brasil S/A.
MG – Minas Gerais.
NEGEF – Núcleo de Estudos Geográficos do Espaço Fluminense.
OCB – RJ - Federação e Organização das Cooperativas Brasileiras do Estado do RJ. 
RJ – Rio de Janeiro.
SESCOOP -RJ – Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo do RJ.
TCC – Trabalho de Conclusão de Curso.
UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro.
USP – Universidade de São Paulo.
 
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INTRODUÇÃO
 Em uma preparação de seminário sobre a geografia da produção de leite no estado do Rio de Janeiro, para a matéria de Geografia Agrária do Brasil, surgiu o tema desta pesquisa de TCC de graduação. A matéria citada acima foi ministrada pelo Prof. Dr. Gláucio José Marafon, que é o orientador desta pesquisa, do Instituto de Geografia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ, campus Maracanã na capital deste estado. A APLISI (Associação dos Produtores de Leite Independentes de Santa Isabel) despontou na pesquisa sobre as cooperativas e associações existentes no contexto atual da produção leiteira no estado do Rio de Janeiro por sua receptividade para este trabalho onde foi investigado seu recorte territorial material e imaterial sobre o substrato material em que ela se situa.
 A sede da APLISI está localizada em Santa Isabel do Rio Preto (Figura 10 no Anexo), terceiro distrito do município de Valença que é hoje o maior município produtor de leite do estado do Rio de Janeiro, localizado na microrregião� de Barra do Piraí (Figura 1) no sul do estado do Rio de Janeiro, na bacia leiteira do sul fluminense. A APLISI iniciou suas atividades em 2002 e no presente ano de 2014 se encontra em franco crescimento. 
Figura 1: Ilustração da microrregião fluminense de Barra do Piraí
 
Fonte: Autor Raphael Lorenzeto de Abreu acessado em 8 de Fevereiro de 2014 de http://pt.wikipedia.org
 A APLISI possui quarenta e nove associados localizados nos estados de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, sendo o volume captado da produção de leite pelos seus associados em território mineiro maior que a produção captada pelos seus associados em território fluminense. Os produtores de leite associados da APLISI (Figura 2) estão nos municípios de Barra Mansa, Valença e Barra do Piraí que integram o território do estado do Rio de Janeiro e nos municípios de Passa Vinte, Carvalhos, Andrelândia e Aiuruoca que integram o território do estado de Minas Gerais. As relações que existem entre a APLISI e seus produtores associados e com a indústria compradora de sua produção e também entre os produtores associados em nível individual, provocam transformações econômicas, sociais e políticas, moldando seu território material, subjetivo e simbólico dentro de uma escala geográfica e cartográfica local. 
Figura 2: Mapa dos sete (7) municípios do RJ e MG com 49 associados (APLISI)
Fonte: Mapa elaborado por R.Cezário, graduanda de Geografia na UERJ, em 2014 para esta pesquisa.
 As visitas foram feitas em dois dias à sede da APLISI. Em 25 de Janeiro de 2014 foi entrevistado o Diretor Técnico, Sr. Eduardo Silva, se adquirindo as primeiras informações sobre a APLISI, e em 26 de Fevereiro de 2014 foi realizado um trabalho de campo na fazenda Córrego da Serra de propriedade do diretor comercial, Sr. Paulo Fernando C. da Silva, onde foram conhecidas a produção de leite e a estrutura usada nesta produção e que serviram de parâmetro para o estudo da produção de leite geral da APLISI. 
 Em paralelo, foi entrevistado na entidade SESCOOP-RJ�, localizada na Avenida Presidente Vargas, no centro da cidade do Rio de Janeiro, o seu presidente Marcos Diáz e o Diretor de Agropecuária Marcio Carneiro, no dia 11 de Fevereiro de 2014, onde se obteve informações sobre a história do desenvolvimento das cooperativas no estado do Rio de Janeiro no período entre a década de 1970 até a década de 2000, que acrescentaram sobremaneira o entendimento da atividade do setor lácteo no estado do Rio de Janeiro. 
 A produção de leite no Brasil desenvolveu-se tímida desde o começo da colonização portuguesa e evoluiu devagar com o tempo através de pequenos e médios produtores que até hoje fazem a maior parte da produção leiteira. Esses pequenos e médios produtores, pressionados pelas padronizações industriais sobre seu produto comprado, reuniram-se em Cooperativas e Associações, modelos jurídicos que existem desde a década de 1940. Foi a partir dos anos de 1990 que houve uma evolução sem precedentes nas técnicas de produção (MADANÊLO, 2008), o que originou baseando-se nos exemplos de Marafon (1998) e Mazalli (2000) o conceito de Complexo Agro Industrial do leite, que ficou conhecido como CAI leiteiro. O aumento do consumo de laticínios como queijo e manteiga e posteriormente o consumo do próprio leite, nas principais cidades do sudeste brasileiro, foi o responsável pelo interesse dos investimentos capitalistas progressivos no decorrer do tempo, na construção de fábricas que começaram a captar o leite dos pequenos e médios produtores rurais para a posterior fabricação dos seus derivados. 
 Serviu de fonte de dados aqui o curso sobre “O que é Cooperativismo”, promovido pela SESCOOP-RJ, no dia 19 de Fevereiro de 2014, com duração de quatro horas, cujo objetivo foi o esclarecimento sobre o que é e como se forma uma cooperativa enquanto empresa composta de no mínimo sete pessoas físicas individuais e as diferenças entre Cooperativas e Associações enquanto pessoas jurídicas que podem comprar ou revender produtos e representar produtores. Não se pretende aprofundar a discussão sobre as diferenças entre essas duas formas jurídicas, mas torna-se necessário explicitar que a diferença mais importante entre elas para esta pesquisa, é a de que as Cooperativas são formas jurídicas que legalmente podem comprar e revender produtos e serviços com fins lucrativos e as Associações não podem fazer o mesmo sendo legalmente ligadas a sua finalidade jurídica a atividades sem fins lucrativos.
 Usando como referência as pesquisas de Madanêlo (2008), Braga (2008) na discussão aqui apresentada,as cooperativas e as associações de produtores de leite ficaram pressionadas, e hoje ainda ficam, entre as indústrias de insumos, equipamentos e biotecnologia à montante da agropecuária leiteira e as indústrias transformadoras da matéria prima, nesse caso o leite, que está à jusante desta atividade. Essas indústrias são fruto do desenvolvimento do meio técnico científico informacional das últimas décadas que atua no espaço geográfico comprimindo o tempo das operações produtivas. Concomitantemente o capital reproduz-se mais rapidamente através desse fenômeno geográfico. O capital torna-se cada vez mais fluido, imaterial e move-se com cada vez mais agilidade, transformando os lugares dentro de lógicas geográficas transescalares. Dentro da reprodução capitalista dos lugares que muitas vezes obedece à lógicas globais - fortalecendo o capital transnacional que cada vez mais desarticula economias locais e regionais através de fusões e aquisições, se materializando este processo dentro da cadeia produtiva do leite nas aquisições de muitas empresas com alcances regionais e locais por grupos internacionais com interesses globais - as cooperativas e associações foram instrumentos de adaptação e inserção dos produtores rurais em escala geográfica local ou regional aos interesses capitalistas transescalares sobre o espaço geográfico que até hoje pressionam os preços da produção primária do leite para baixo. 
 Assim, entende-se que o CAI pode conformar um território sobre um substrato material no espaço geográfico sobre seu controle de produção. E através das relações geográficas verticais e horizontais entre seus atores sociais, conformar sua territorialidade, simbolicamente atrelado a valores subjetivos como regras de conduta comercial, comportamental, técnica entre outras, que se tornam as referências de um grupo social com características que pretendem ser homogêneas. Essas características então são identificáveis para o estudo da geografia através dos seus conceitos chave, como Território, Escala e a conseqüente Territorialidade.
 A territorialidade é aqui entendida como o resultado da adaptação das interações espaciais e geográficas dos associados da APLISI e outros fixos que interagem direta ou indiretamente nas suas relações de produção. A análise desta territorialidade e o território em que ela atua como objetivo desta pesquisa apóia-se em autores como Souza (2013), Haesbaert (2004), onde há a teorização de que o território pode ser material ou imaterial, dependendo de como possa ser usado pelos seus atores em suas diversas interações as quais os estudiosos costumam subdividir em econômicas, sociais ou políticas, mas que coexistem na realidade e podem ser apreendidas em uma unidade. O território pode existir sem ser “coisificado”, nas palavras de Souza (2013), mas mesmo assim sem ter a sua existência separada do seu substrato material e pode deixar de existir transformando-se em outro tipo de território, em Haesbaert (2004) desterritorializado e reterritorializado, mantendo-se o mesmo substrato material anterior quando as transformações sociais, econômicas ou políticas acontecem através dos atores que ali estão. 
 A questão norteadora desta pesquisa é saber quais é a territorialidade que existe no embate dos interesses dos produtores associados à APLISI na sua inserção produtiva nas etapas no CAI leiteiro, embora esta pesquisa não contemple as relações envolvidas em um CAI, explicando as relações de produção entre os agentes sociais envolvidos na APLISI, no segmento produtivo leiteiro. Ela está relacionada a um estágio do processo produtivo do CAI, mais propriamente o que Marafon (1998) chama à “montante” ou “antes da porteira” (MACHADO, SOUZA & VALVERDE, 2010) da industrialização do leite, o que é explicado mais adiante. Sendo assim, conduziu-se este estudo objetivando as definições das características singulares que conformam a territorialidade da APLISI, sobre o substrato material no qual está assentada, definindo seu território de ação. Os conceitos de lugar e território são identificáveis também nas análises feitas. 
 Quais são as interações geográficas verticais e horizontais no lugar e território que estão estabelecidos no espaço geográfico e a definição do que são os territórios material e subjetivo no substrato material onde se operam essas interações geográficas dos produtores? Como se conforma o território material e imaterial e as conseqüentes territorialidades dos produtores? Como essas territorialidades ocorrem através das relações de produção que existem e as transformações em escala local que ocorrem quanto às realidades sociais, políticas e econômicas dos seus produtores associados? 
 O tema escolhido se faz justificável, pois apresenta uma demanda de estudos e ações a ser considerada a fim de se investigar melhor os rumos da produção leiteira neste local, o que é de importância estratégica para a produção leiteira fluminense. Quais estão sendo os efeitos sócios espaciais conseqüentes em escalas geográficas no substrato material em que se localizam essas novas territorialidades que estão se formando? E quais questões que essas novas territorialidades trazem no seu bojo para serem elucidadas como, por exemplo, o destino da APLISI que está sendo pressionada para mudança em sua estrutura e que buscam uma nova forma de sobrevivência frente às pressões mercadológicas das indústrias processadoras, causando dualidades e contradições no processo? 
 Em outras palavras, o objetivo geral é a definição da territorialidade da APLISI que é conseqüência da definição do seu território tanto material quanto imaterial com suas interações geográficas horizontais e verticais, investigadas as suas existências, que são objetivos específicos. Essa territorialidade é conformada no substrato material onde estão atuando as relações geográficas sócio-espaciais, investigadas através de diferentes metodologias, como os três trabalhos de campo feitos, leitura e interpretação dos autores teóricos que são citados ao longo deste trabalho científico e pesquisa em mídias impressas e eletrônicas com informações pertinentes ás relações de produção da APLISI. Investiga-se a conformação do território material e imaterial e a conseqüente territorialidade desta através das relações de produção que existem e as transformações em escala local que ocorrem quanto às realidades sociais, políticas e econômicas dos seus produtores associados, entendendo que a APLISI é a controladora das produções de leite de seus associados cujas propriedades estão nos municípios das microrregiões fluminense de Barra do Piraí (Figura 1) e do Vale do Paraíba (Figura 4) e da microrregião mineira de Andrelândia � (Figura 3). 
Figura 3: Ilustração da microrregião mineira de Andrelândia.
	Fonte: Autor Raphael Lorenzeto de Abreu acessado em 8 de Fevereiro de 2014 de http://pt.wikipedia.org	
Figura 4: Ilustração da microrregião fluminense do Vale do Paraíba. 
Fonte: Autor Raphael Lorenzeto de Abreu acessado em 8 de Fevereiro de 2014 de http://pt.wikipedia.org.
 
 Faz-se no primeiro capítulo, a geografia da produção do leite no território de atuação da APLISI nos municípios nos quais os produtores associados estão na recuperação de dados históricos pontuais desde o início da colonização portuguesa na América do Sul, pontuando a metade do século XIX� e o início do século XX, quando a pecuária passou a ser atividade econômica principal, até o momento atual do CAI do leite para contextualizar a produção da APLISI. Baseia-se na leitura de Orlando Valverde (1967) que nas décadas de 1940 a 1960 descreveu o território brasileiro desde o período colonial até os dias de hoje e também dos autores já citados como Souza (2013), Haesbaert (2004) e Saquet (2010) que teorizam sobre os conceitos de Território e Territorialidade, utilizando-se outros autores teóricos pontuais, bem como endereços eletrônicos como o da prefeitura do município de Valença e o do IBGE.No segundo capítulo, procura-se elucidar as interações geográficas que existem entre a APLISI e os produtores associados e a indústria compradora de sua produção, estudando as transformações econômicas, sociais e políticas que essas redes provocam, conformando a territorialidade, em questão no contexto da lógica do complexo agroindustrial do leite em uma escala local se baseando nos autores já supracitados e outras contribuições, identificando quais as transformações espaciais produtivas que foram observadas neste TCC, procura-se apontar tendências para o futuro deste território no contexto atual da cadeia produtiva do leite fluminense em escalas regional e global. 
1 A Formação do Território da Associação dos Produtores de Leite Independentes de Santa Isabel do Rio Preto - APLISI.
 A geografia agrária é um subcampo da ciência geográfica. Na academia, tendências para a dicotomia entre a geografia humana e física influenciam as pesquisas que tendem a ter temas distintos, separando as problemáticas urbanas e rurais. No entanto, a realidade é que as problemáticas surgidas na cidade são comuns ao campo com as suas problemáticas permeando o meio urbano. Em realidade, mudou-se a forma de produção primária dos alimentos através da revolução técnica informacional realizada em fins da década de 1970 com processos revolucionários no campo como a Revolução Verde.
 A revolução técnica informacional através de processos revolucionários de produção que ocorreram no campo transformou as relações produtivas e econômicas na cadeia leiteira ao longo do tempo. Para entenderem-se como estas transformações ocorreram pesquisou-se dados históricos, geografizando-os, para contextualização da produção de leite da APLISI atual. Com este fim, explanar a formação da produção leiteira nos territórios da microrregião de Andrelândia (Figura 3) e da mesorregião sul fluminense atual� nos estados de Minas Gerais e do Rio de Janeiro respectivamente, em um período temporal que se inicia no século XVI até o presente desta pesquisa, mas de forma geral e sem aprofundamentos maiores. Esse exercício envolve uma explicação rápida sobre as origens da pecuária na região escolhida para melhor entendimento das motivações capitalistas que levaram a existência atual da APLISI. Correlaciona-se de forma importante o conceito geográfico de Território. 
 As origens da pecuária leiteira no substrato material onde se situa o território de atuação da APLISI têm raízes na introdução desta atividade a partir do século XVI com o povoamento do litoral do Brasil a partir das culturas de cana de açúcar nas atuais regiões Nordeste e Sudeste do país pelos primeiros colonos portugueses. Os primeiros rebanhos chegaram principalmente na região Nordeste brasileira onde se situava os primeiros núcleos econômicos principais da colônia portuguesa americana, para o trabalho de carga e transporte, o fornecimento de couro, carne e derivados para as populações instaladas e consequentemente o fornecimento de leite embora como produto de consumo secundário. Junto com a exploração do pau-brasil no litoral, estas atividades vão servir para a proteção dos territórios recém descobertos a leste de Tordesilhas (VALVERDE, 1967), pois conforme Barbosa (2002) a colônia americana portuguesa era composta por ilhas econômicas, políticas e sociais. O leite vai ser um produto de consumo tímido doméstico nas fazendas de cana de açúcar que são as principais formações de povoamento dentro da colônia portuguesa e os primeiros núcleos populacionais e urbanos consumirão o excedente desta produção, incentivando posteriormente as fazendas pecuaristas. 
 O conceito de território, dentro da geografia, está ligado ao substrato material que lhe dá forma no espaço geográfico, podendo ser sólido ou imaterial como uma noção subjetiva de um indivíduo ou grupo social (SOUZA. 2013). Todo território material, ou não, está condicionado a existência de seu substrato material. O território conforma condições que são observadas externamente, como situações geográficas que não se revelam em si mesmas (HEIDRICH & HEIDRICH, 2010). As ocupações humanas do substrato material e suas ações refletem o poder das sociedades sobre o espaço geográfico. O território nasce desse poder social que passa a dar significado a ele através da dominação política, econômica ou social ou de todas essas características possivelmente aglutinadas. Normas e leis definidas por instituições oficiais ou aceitas como práticas culturais na sociedade corroboram esta dominação sócio-espacial conformando o território. Compreender o que o território contém e o que o domina é importante para reconhecê-lo como um meio geográfico apropriado. 
 No início da colonização portuguesa na América, o espaço geográfico descoberto era percebido como fragmentado em diversos territórios, pois a ocupação pelos ibéricos era feita através de instalações de pontos de controle espaçados ao longo do litoral para posterior exploração, sem objetivo de povoamento inicial do seu interior. As chamadas benfeitorias foram instaladas com o objetivo de defender a produção extrativista de matérias primas exportadas para a Europa da pirataria de outras nações que também visavam o controle desta exploração. Para os portugueses que colonizaram os territórios que posteriormente viriam a ser o Brasil, portanto, não havia um território único, mas diversos territórios, comandados pelo vice-reino instalado na cidade de Salvador, no território nordeste, que era o mais rico e próspero nos séculos XVI e XVII. A produção agropecuária nos territórios, durante o período colonial, vai se desenvolver em forma de ilhas isoladas, conforme diz Barbosa (2002), "Se apresentava como um arquipélago de regiões mercantis", sem muito contato entre as diferentes regiões produtivas com interesses diferentes como se fossem diversos territórios sem nada em comum. 
 O território está ligado também à noção de territorialidade (SAQUET, 2010). Através das relações que estabelecem os indivíduos no território, formam-se as redes geográficas verticais e horizontais que são as interações entre eles e os fixos no seu território de atuação. Havia diferentes territórios, conformados por interesses econômicos dominantes diferentes, com interações diversas com a metrópole portuguesa. Essas interações geográficas entre os produtores coloniais e Portugal dava-se através das exportações de produtos cultivados de acordo com as necessidades de consumo na Europa, conformando uma interação vertical, ou seja, a produção em uma escala geográfica e cartográfica local obedecia a uma lógica exploratória que atuava em escala geográfica e cartográfica internacional. Com objetivo de uma pequena elucidação geográfica, a territorialidade da colônia era fragmentada, de acordo com o alcance e o tipo de relação que cada região estabelecia com a metrópole ao passo que a territorialidade da metrópole era única e conformada pelas relações de exploração produtiva com as regiões das suas colônias pelo mundo e pelas relações sócio-espaciais com seu mercado consumidor europeu.
 Destarte, com a exploração do litoral brasileiro pela agricultura de exportação de monoculturas, a atividade pecuária vai ser “empurrada” para o interior da colônia, desenvolvendo o povoamento no espaço geográfico, com a criação de entrepostos e cidades, onde o comércio de carnes e derivados e o transporte de carga pelos animais ganham fixos importantes no desenvolvimento econômico colonial. No século XVIII, o principal ponto e fixo geográfico do território português era a nova capital política e administrativa da colônia americana sediada na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, no território leste e que, segundo Gomes (2007), no século XIX, abrigou a família real portuguesa quando se tornou de importância mundial como a capital do império ultramarino português e depois capital do império brasileiro independente de Portugal, atua economicamente como importante ponto consumidor da economia nacional.Com o desenvolvimento da mineração de alto valor na região da província de Minas Gerais, já com importantes fixos urbanos em seu território que controlam a circulação de produtos entre o norte e o sul da colônia, as populações desses núcleos urbanos crescem e a pecuária desenvolvida subjacente a essas áreas de povoamento, expande-se para atender a essas novas populações e inclusive a demanda crescente por esses produtos na região da cidade do Rio de Janeiro com a sua proximidade com as províncias de Minas Gerais e de São Paulo (VALVERDE, 1967).
 No contexto histórico colonial do século XVIII, o território leste da colônia começa a ganhar importância e crescer em influência com o ganho da transferência da capital política e administrativa da colônia e o desenvolvimento da exploração de metais preciosos na província de Minas Gerais. No século XIX com a cidade do Rio de Janeiro alçada a posição de capital do império ultramarino português e do império brasileiro, o território da região leste, contendo os territórios políticos e administrativos paulista, mineiro e fluminense, alcança supremacia econômica, social e política sobre os outros territórios das outras regiões brasileiras. Gera-se uma territorialidade de âmbito nacional a partir do território leste com todas as relações e interações verticais e horizontais com os outros territórios vistos como as regiões geográficas políticas� da nação brasileira que se formou em momento histórico posterior. 
 Como já foi citado acima, o comércio de excedente de leite produzido na atividade pecuária no território colonial português na América, até metade do século XIX, constitui-se de fluxos tímidos, inibindo o hábito de consumo de leite pela maioria da população urbana. Aliado a este fato, a coleta do leite de vaca pelos fazendeiros e sua distribuição muitas vezes feita por escravos de forma precária e sem higiene, fortalecendo negativamente a imagem comercial desse produto. Mas, no período do segundo império, com o aumento da demanda por laticínios pelo crescimento das cidades mineiras e fluminenses, em torno dos fluxos do comércio da mineração, atividade que incentivou o povoamento do território nestas regiões, junto com a lavoura dos cafezais no Vale do Paraíba e interior fluminense e mineiro, o consumo por derivados de leite aumenta principalmente queijos e manteigas (VALVERDE, 1967). 
 O substrato material em que se encontram atualmente os municípios em que estão os produtores de leite associados à APLISI foi povoado ao longo dos caminhos que o café abriu para o transporte da sua produção ao longo do vale do rio Paraíba do Sul, utilizando-se o gado inicialmente e depois as ferrovias, em direção ao mercado externo que usava o porto da então capital do Brasil, a cidade do Rio de Janeiro, para o escoamento da produção deste importante produto de exportação. Isto configurou a conformação inicial das redes de fluxos que havia entre os pontos fixos no território estudado, através deste escoamento da produção do café e posteriormente do leite.
 As ferrovias favoreceram o lugar (SOUZA, 2013) e a história do povoamento do distrito de Santa Isabel do Rio Preto, em Valença, onde está a sede da APLISI, foi diretamente influenciado pela construção dessas estradas de ferro que atraíram atividades econômicas e serviços relacionados com o transporte do café que vinha de Minas Gerais em direção ao Rio de Janeiro�. Por volta de 1870, a produção de café no território fluminense passou pelo esgotamento de seu solo e redução da sua produtividade, principalmente ao longo do Vale do Paraíba, lugar em que estava a maior produção cafeeira no Brasil e que se estende pelos territórios desde o sul até o noroeste da província do Rio de Janeiro e sudoeste da província de Minas Gerais. 
 Dessa decadência da produção cafeeira, a pecuária de leite tornou-se a opção de atividade econômica mais viável no território atual da APLISI e que se tornou muito produtiva no começo do século XX, apesar dos relevos acidentados, íngremes� que dificultam a criação do gado leiteiro com o agravante dos solos já desgastados pelo cultivo dos cafezais e apresentando problemas de erosão, destarte, originou importantes bacias leiteiras em escala nacional.
 Segundo os dados das visitas a APLISI, no território dos seus produtores a pecuária leiteira sempre foi uma atividade tradicional e como foi citado, cresceu depois da derrocada da cultura do café na região. Assim, a atividade ligada aos fluxos econômicos das regiões cafeeiras do vale do Paraíba e mineiras subjacentes, tomou forma na produção de laticínios para os mercados de cidades próximas e para o Rio de Janeiro (VALVERDE, 1967). Os produtores pecuaristas no entorno do vale do Paraíba sempre tiveram poder político e econômico, herdado do ciclo econômico anterior e em alguns momentos chegaram a influir no cenário nacional, corroborando a territorialidade com alcance maior que o local.
 Esses produtores tornaram-se fornecedores de leite para as manufaturas de laticínios nas províncias do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, onde a produção de laticínios é mais tradicional, despontando a província mineira como a maior produtora de leite do país (MADANÊLO, 2008). Essas antigas províncias que hoje são estados foram essencialmente importantes para o desenvolvimento dos fluxos de produção industrial e comercial dos laticínios na economia nacional desde o início dos núcleos urbanos nos seus territórios (VALVERDE, 1967) até recentemente quando estes fluxos de produção da atividade leiteira expandiram-se para outras regiões geográficas do país e continuam atualmente a ganhar mais espaços no território nacional com a implantação de outros fixos, principalmente nas regiões políticas administrativas brasileiras do centro-oeste e norte. 
 Um fixo importante na geografia do leite no Brasil, foi a fundação, em 1888, da primeira fábrica de laticínios do Brasil chamada Companhia de Laticínios da Mantiqueira�, com equipamentos importados da Holanda, Europa, na cidade de nome Palmyra, que hoje é a atual cidade de Santos Dumont, no estado de Minas Gerais. Começou assim a produção de manteiga e queijos e a produção de leite para consumo para atender as cidades das províncias do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, contribuindo para a criação de entrepostos e outras fábricas de laticínios nessas duas províncias. O território material dos produtores de leite nasce com uma diferença em relação aos territórios de produtores de outros produtos. Essa diferença consiste na formação do território dos produtores de leite no substrato material de Minas Gerais, sobretudo, e do Rio de Janeiro em propriedades médias e pequenas em contraste com as grandes propriedades de outras produções espalhadas pelo território nacional. Esta característica territorial das propriedades na produção leiteira será fundamental para o desenvolvimento desta atividade. E apesar desta característica de pequenas e médias propriedades que geram interações horizontais com as indústrias compradoras de suas produções, que por sua vez têm interações horizontais em uma escala quase local com seu mercado consumidor, a territorialidade dos produtores de leite tem alcance nacional. Esse começo da produção da pecuária leiteira em nível de excedente comercial consistente para a demanda das regiões consumidoras das províncias de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, com seus núcleos urbanos em crescimento, define a consolidação da produção desta atividade no século XIX em uma escala macro local (SOUZA, 2013) que alcança importância escalar nacional. 
 No momento histórico do Império do Brasil começou-se o projeto de integração territorial político e econômico com a subordinação dos territórios das regiões que politicamente compunham o país à província do Rio de Janeiro, capital do Império, capitaneado pela atividade cafeeira no território leste brasileiro, com a passagem do trabalho escravo para o trabalho livre e com a mudança na política de terras comodescreve Barbosa (2002)�. Este movimento incentivou a hegemonia da produção leiteira na região leste� sobre as outras regiões do país. 
 No caso do leite, no Brasil, até o início do Século XX, era um produto fabricado sem tratamento adequado para a saúde humana, causando uma série de doenças aos consumidores e prejudicando sua imagem. O transporte dos galões de leite em latão que era feito pelos escravos, depois da abolição da escravatura, passou a ser feito pelas tropas de vaqueiros que o produziam nas periferias dos núcleos urbanos e que comercializavam e entregavam diretamente para o consumidor final nesses núcleos, sempre com um curtíssimo prazo de validade, configurando um processo econômico de alto risco e dispendioso. Consistiu em um circuito de produção bem tímido com o desenvolvimento tecnológico da indústria de laticínios lento até os anos 1940 (ALVES, 2001). Os produtores de leite, usando os escravos como atravessadores para os mercados consumidores, faziam interações geográficas horizontais em escala local conformando um território material de alcance limitado aos seus lugares produtivos de origem, mas que se pretendia ser percebida nacionalmente. Corrobora-se a este dado, a construção econômica da província e estado de Minas Gerais dentro de uma escala nacional ligada á definição de um importante produtor e exportador de leite e derivados, mesmo que materialmente essa produção tivesse alcance, se muito, regional para mercados consumidores relativamente próximos, mas coincidentemente os mais importantes dentro da lógica econômica nacional como as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
 Há uma sucessão de pequenos surtos de desenvolvimento das técnicas na produção leiteira a partir de 1940 (ALVES, 2001) até a década de 1980 (MADANÊLO, 2008), à medida que os investimentos, com ênfase nos investimentos estrangeiros, foram incrementando o circuito produtivo do setor de produtos lácteos brasileiro. Desde 1930, as políticas públicas começaram a visar à substituição de importações de produtos primários industrializados na economia brasileira com uma mudança nos processos e na velocidade dos processos produtivos industriais nos circuitos econômicos nacionais (ALVES, 2001). Foi o começo da transformação da indústria de laticínios que aumentou seu porte tecnológico através de investimentos de capitais estrangeiros (MACHADO, SOUZA & VALVERDE, 2010). Essas políticas públicas traduzem-se em interações verticais na economia por interesses escalares nacionais que demandavam mudanças e adaptações produtivas nas escalas produtivas locais pelo país, com o intuito de atração do capital externo para o desenvolvimento industrial brasileiro. 
 As exigências das normatizações capitanearam adequações técnicas de produção da atividade leiteira para o atendimento legal ao mercado consumidor (ALVES, 2001). Então se atraíram investimentos de capitais externos para a construção de fábricas de laticínios. Esses investimentos também foram atraídos pelas melhorias que o capital estatal começou a implantar (MACHADO, SOUZA & VALVERDE, 2010). Os interesses capitalistas desenvolvem o setor industrial no Brasil, conferindo ao desenvolvimento da cadeia produtiva leiteira, lugar nos circuitos mais altos da economia. Segundo Alves (2001), no ano de 1939, o governo do estado de São Paulo e posteriormente o governo central do país decretam que todo o leite distribuído à população brasileira deveria ser obrigatoriamente pasteurizado, aumentando o nível técnico da produção.
 Nesse momento são definidos os tipos de leite pasteurizado conhecidos pelos tipos A, B e C e em 1940 as garrafas de vidro começaram a possuir fecho inviolável, além de trazer a marca da empresa e a data de validade, com isso, o consumidor passa a ter acesso ao leite com padrão conhecido e maior confiabilidade. Ainda em Alves (2001), após 1940 a pasteurização lenta passa a ser substituída pela pasteurização rápida� que veio facilitar as operações industriais e levou ao aumento da produtividade das empresas e a intervenção do governo no setor, a partir de 1945, modificaria este quadro com o tabelamento do leite iniciado no antigo estado da Guanabara, que durou quase cinqüenta anos e que não estimulou a produção de leite, nem tampouco a regularização do abastecimento e acabou inibindo o desenvolvimento do setor mais uma vez.
 Em 1955 é desenvolvido no Brasil o primeiro caminhão tanque para transporte de leite, com capacidade de 17,5 mil litros, feito de aço inox, revestido com chapas de ferro, porém sem isolamento térmico, mas somente durante a década de 1960 o semi-reboque rodoviário substituiria o vagão de trem e o latão no transporte de leite resfriado, porém, o mesmo desenvolvimento não aconteceu na distribuição do leite pasteurizado pronto para consumo porque sua refrigeração continuou a ser feita com barras de gelo e não havia tecnologia para o uso de refrigeradores, pois o tabelamento rigoroso do governo federal inibiu os investimentos necessários para uma cadeia de frio adequada e prejudicou a qualidade e impediu a extensão do prazo de validade do leite pasteurizado ofertado ao consumidor (ALVES, 2001). Somente a partir do aumento da infra-estrutura nacional em energia elétrica, transportes e investimentos pelas políticas públicas para desenvolver a atrair o capital privado, se inicia uma nova fase para o setor leiteiro que mudou totalmente sua cadeia de produção e importância para a economia do país tanto interna como externa marcada pelo início do aumento em infra-estrutura que possibilitou maior produtividade para o setor leiteiro. 
 Os produtores de leite dos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais, diante destas normatizações da atividade para a venda aos mercados consumidores e da revolução das técnicas de produção com a chegada das empresas de capital transnacional, começaram a se reunir em cooperativas com o intuito de defender seus interesses e garantir que suas produções tivessem condições de sobrevivência dentro do novo cenário industrial que se implantava. Na microrregião fluminense de Itaperuna�, formou-se a CAPIL�, no município de Itaperuna (BRAGA, 2008), uma das mais antigas do estado, enquanto que na microrregião do sul fluminense, formou-se a Cooperativa Barra Mansa, em 27 de Janeiro de 1940. Rivalizam em nível produtivo no estado do Rio de Janeiro, as bacias leiteiras das mesorregiões do noroeste fluminense� e a do sul fluminense devido à proximidade aos mercados consumidores que têm a maior demanda do país nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo e os núcleos urbanos no estado de Minas Gerais (MADANÊLO, 2008). 
 Os investimentos de capitais externos para a construção de fábricas de laticínios foram atraídos por essas melhorias que o capital estatal começou a implantar. Assim destaca Braga (2006, p.98): 
Desde o momento em que houve uma universalização da produção e do consumo, as firmas se tornaram imprescindíveis para compreender o atual estágio de desenvolvimento capitalista. Aliadas aos outros elementos do espaço, as firmas têm conseguido ampliar seu capital (...) O Estado (elemento instituição) tem papel normatizador e seletivo no espaço geográfico. Enquanto ator social é a escala intermediária entre o global e o local. O Estado gerencia conflitos, ora atendendo ás demandas externas do capital, ora atendendo a determinadas demandas sociais (garantindo a reprodução da força de trabalho). (...). Tal cenário implica uma organização espacial singular. 
 Quando através de políticas públicas, investiu-se nas redes geográficas sobre o território estudado, construindo-se a malha rodoviária nacional, investindo-se na infra-estrutura de serviços de fornecimento de luz e telefone pelo país, chegando a integrar lugares que antes estavam distantes dos mercados consumidores nos principais centros urbanos do litoral do país, possibilitou-se que através de investimentos estrangeiros, grandes corporações multinacionais incorporassem várias fábricas nacionais em diversos circuitoseconômicos e integrassem também seus fornecedores de matérias primas rurais em um ajuste técnico de padronizar as demandas “Just in time” às necessidades da produção industrial para, inclusive, atender ao aumento de demanda por produtos industrializados nos grandes centros urbanos (MACHADO, SOUZA & VALVERDE, 2010).
 Entende-se aqui que os territórios de produção dos produtores de leite fluminense e mineiro expandiram-se, pois através da revolução das técnicas de produção do leite e fabricação de seus derivados, a partir dos seus fixos de produção, seus estabelecimentos, se formaram interações verticais com outros fixos mais distantes, novos mercados consumidores, muitos deles indústrias de grande porte nascentes. Deste modo, suas territorialidades também se expandiram com novas relações geográficas horizontais e verticais (SAQUET, 2010) Favoreceram este processo as transformações de infra-estrutura no substrato material (SOUZA. 2013) dos territórios dos produtores de leite fluminenses e mineiros, proporcionando as condições ideais para o salto produtivo em direção a industrialização do modo de ordenhar o leite. Estas transformações nas redes de transportes e comunicações foram por sua vez interações verticais de interesses de escalas nacionais e internacionais com as lógicas e realidades dos produtores em escalas locais, com o intuito de submeter as realidades locais aos interesses transescalares dos investimentos capitalistas.
 Como reflexo deste processo, as cooperativas mais prósperas começaram a adquirir maquinário industrial para a ordenha atendendo as novas normas sanitárias e mercadológicas e para produzir os derivados em grande escala, transformando-se essas cooperativas em pequenas indústrias como no exemplo da Cooperativa Barra Mansa em Barra Mansa, na mesorregião sul fluminense (MADANÊLO, 2008). Algumas outras cooperativas atraíram capital externo para a construção de plantas industriais que consumissem sua produção como ocorreu com a CAPIL em Itaperuna na mesorregião noroeste fluminense que atraiu a indústria estadunidense Fleschman & Royal que ajudou a construir a fábrica de leite Glória na mesma cidade (BRAGA, 2008). Esses processos industrializadores na produção primária da pecuária leiteira fizeram parte da gênese do CAI leiteiro, ou o Complexo Agroindustrial do leite, cujo alcance territorial atual está na escala nacional e global. Coloca-se aqui que a territorialidade das cooperativas destacadas alcançou escalas macrolocais mesmo que seus territórios materiais não tenham deixado as escalas locais (SOUZA, 2013), configurando interações geográficas horizontais com seus produtores cooperativados e com as indústrias compradoras de suas produções mesmo que em alguns momentos do processo de modernização tecnológica da produção, tenha existido interações geográficas verticais com estas indústrias compradoras através das exigências técnicas e normatizações para a comercialização da produção primária do leite.
 Em Mazalli (2000)�, o conceito de Complexo Agroindustrial surgiu como consequência do fenômeno da industrialização dos processos agropastoris que começaram a ocorrer no Brasil a partir dos anos de 1960 principalmente e sendo essa industrialização acompanhada dos interesses capitalistas de investimentos nas técnicas de controle da produção rural agropecuária a fim de inseri-la na lógica do capital industrial, enquanto fornecedora de matérias primas para as indústrias. Para que essa lógica se concretizasse, precisou-se adequar o tempo da produção rural ao tempo da produção industrial, procurando-se adaptar a natureza aos ritmos industriais urbanos para a maximização da produtividade, com a diminuição de entraves produtivos que afetassem o fluxo de fabricação de produtos para a maximização de lucros e assim a submissão da natureza e da produção agropecuária tornou-se prioridade para o capital industrial. 
 O complexo agro industrial formou-se, portanto, da necessidade do capital industrial de controlar as etapas de produção do seu produto, desde o produtor rural até o produto pronto para ser vendido para o consumidor. Este processo foi estabelecido através do desenvolvimento das técnicas científicas de produção que foram desenvolvidas no Brasil como consequência da adequação da produção industrial a várias normatizações que começaram a aparecer desde a década de 1940 quando houve o primeiro surto de industrialização no país que até então era “iminentemente” agrário (ALVES, 2001).
 A Revolução Verde (MAZALLI, 2000) foi um processo no qual a indústria de insumos para a agricultura procurou expandir seu mercado através de biotecnologias que favoreceram o aumento da produtividade das lavouras e posteriormente de toda a cadeia de produtos agropecuários. Constituiu-se em um dos elementos de conformação do CAI e foi o início da transformação mais intensa dos processos agropecuários para que se tornassem etapas do processo industrial iniciando o processo dos complexos agroindustriais, incentivados por créditos baratos por parte de um estado interventor aos grandes produtores rurais e incentivos para algumas culturas mais rentáveis na pauta das exportações atendendo a interesses de mercados internacionais. Esse processo de subordinação da produção rural aos processos das indústrias transformadoras com sua dependência por tecnologia fornecida pelas indústrias de insumos permeou as décadas de 1970 e 1980 (MARAFON, 1998) e permeia ainda hoje tendo como conseqüência o aumento de produtividade da captação do leite de vaca desde a década de 1960 em escala nacional conforme a Tabela 1:
	Tabela 1 - Produção em estabelecimentos agropecuários de leite de vaca no Brasil na série histórica (1960/2006)
	ANO
	PRODUÇÃO
	1960
	3.698.260.000
	1980
	11.596.276.000
	1985
	12.846.432.000
	1995
	20.567.868.000
	2006
	17.931.249.000
Fonte: IBGE - Censos Agropecuários.
 Em uma reação em cadeia em todo o setor lácteo, aos produtores rurais ficaram pressionados pelas indústrias a investirem em tecnologias de produção (C. RIBEIRO. 1999). Portanto, atualmente, os produtores de leite sofrem pressões do mercado consumidor e da indústria transformadora para se modernizarem, mas há diferentes acessos aos créditos bancário ou estatal, conforme o tamanho destes produtores (MADANÊLO, 2008). As cooperativas de produtores de leite foram formadas com o início das normatizações no setor produtivo na década de 1940 (ALVES, 2001) e foram responsáveis pelo início da inserção dos produtores á lógica industrial das primeiras indústrias de laticínios que se instalaram no território fluminense na década de 1960, como por exemplo, a fábrica de leite Glória que se instalou em Itaperuna na mesorregião noroeste fluminense e a fábrica de leite Nestlé que se instalou em Barra Mansa na mesorregião sul fluminense (BRAGA, 2008). Na escala regional, o sudeste brasileiro a partir da década de 1970 tem aumentado a produtividade da captação na ordenha do leite de vaca conforme a Tabela 2 abaixo:
 Tabela 2 - Produção em estabelecimentos agropecuários de leite de vaca na região sudeste série histórica (1960/2006)
	ANO
	PRODUÇÃO
	1970
	3.387.244.000
	1980
	5.922.687.000
	1985
	6.288.424.000
	1995
	7.746.986.000
	2006
	8.089.652.000
Fonte: IBGE - Censos Agropecuários
 A comercialização do leite in natura para as indústrias processadoras estabeleceu-se através da compra das produções individuais pelas cooperativas que vendiam para cooperativas maiores que concentravam as quantidades necessárias de leite para a venda as indústrias compradoras. Segundo Marcos Diáz, presidente da OCB/SESCOOP-RJ, em entrevista realizada no dia 11 de Fevereiro de 2014, as cooperativas de produtores de leite no estado do Rio de Janeiro eram em maior número do que atualmente e suas produções de leite eram compradas na sua maior parte, pelas três maiores cooperativas existentes nas décadas de 1970, 1980 e 1990 que eram a CAPIL no noroeste fluminense(BRAGA, 2008), a Cooperativa Agropecuária de Barra Mansa no sul fluminense (MADANÊLO, 2008) e a CCPL� que atuava na região metropolitana e interior do estado do Rio de Janeiro (C. RIBEIRO, 1999), mas quando a indústria de laticínios internacional Parmalat fixou-se na mesorregião noroeste fluminense em Itaperuna (BRAGA, 2006 e 2008), comprando a então fábrica Glória, o sistema cooperativado fluminense sofre uma transformação. Essa transformação ocorreu quando a Parmalat começou a comprar a produção de leite diretamente dos produtores individuais mais produtivos, enfraquecendo o sistema cooperativado enquanto que cooperativas maiores como a CAPIL e a CCPL passaram a depender diretamente da compra por parte da Parmalat das suas produções. Estreitou-se mais a integração da extração do leite nos produtores ás etapas do processamento de derivados na planta industrial da Parmalat. Ainda segundo Diáz, com a falência da Parmalat em 2003, quase todas as cooperativas de leite do estado do Rio de Janeiro foram prejudicadas e fechadas, pois grandes e médios produtores de leite absorveram pequenos produtores que não conseguiram acompanhar as exigências da Parmalat para a compra das suas produções. A Parmalat absorvia boa parte das produções das cooperativas do estado fluminense. Na mesorregião sul fluminense, a Cooperativa Agropecuária de Barra Mansa polarizava com a Cooperativa Agropecuária de Itaperuna, (CAPIL), que se situa na mesorregião noroeste fluminense, em nível estadual e que vendia para a indústria Parmalat na cadeia produtiva de leite no estado do Rio de Janeiro no início dos anos 2000. 
 A coleta a granel do leite produzido exemplifica esse processo de industrialização da produção primária para atender ao processo das indústrias compradoras que foi tornado compulsório pelas normas reguladoras da produção de derivados de leite. Desde então, a atividade leiteira no estado do Rio de Janeiro vem evoluindo com o aumento da produtividade mesmo com alguns anos de baixa produção conforme a Tabela 3 abaixo.
Tabela 3: Evolução da produção leiteira no estado do Rio de Janeiro entre os anos de 1974 e 2009.
Fonte: IBGE.
 No estado do Rio de Janeiro, desde 2001 o Programa Rio Leite investe em políticas públicas para atrair estas indústrias e incrementar as duas bacias leiteiras� que estão nas mesorregiões sul e noroeste do estado fluminense, embora as cooperativas de produtores de leite passem por dificuldades técnicas e financeiras e tentam se encaixar na nova dinâmica empresarial (MADANÊLO, 2008). A produção no estado, como assinalado na Tabela 3, cresce gradualmente e dados de 2013 comprovam esta tendência como na Tabela 4 a seguir.
Tabela 4 
Fonte: http://economianortefluminense.blogspot.com.br/2013/10/situacao-da-pecuaria-no-estado-do-rio.html acessado em 01 de Março de 2014.
 O modelo de cooperativa de leite, especialmente no estado do Rio de Janeiro, entrou em decadência, pois a maioria dos produtores cooperativados fluminenses e suas Cooperativas, haviam se tornado bastante dependentes da indústria italiana Parmalat que entrou em falência no ano de 2003. Por conta deste episódio, muitos produtores de leite migraram do sistema de cooperativas para sistemas de associações de produtores, como a APLISI. A maioria dos produtores associados à APLISI, pertenceu à antiga Cooperativa Agropecuária de Santa Isabel, que concentrava a produção de leite do município de Valença e de outros municípios vizinhos e que possuiu grande territorialidade. Atualmente encontra-se em reestruturação conforme informações coletadas nas entrevistas feitas aos diretores da APLISI e da OCB. 
 Os fluxos de investimentos na década de 1990 e no início dos anos 2000, no setor de lácteos em escala mundial, denunciaram uma elevação escalar global nas atuações dos fluxos capitalistas no espaço produtivo do leite (MADANÊLO, 2008). Espaços geográficos de produção novos estão se abrindo à especulação dos investimentos globais e que, os explorando, estão transformando esses locais segundo escalas mundiais (MACHADO, SOUZA & VALVERDE, 2010). Como nos diz em um artigo, Benoit Rouyer, chefe de serviços econômicos na organização francesa CNIEL� essa abertura de novos espaços de produção deriva de pressões no mercado mundial de alimentos por causa das pressões de diminuição de consumo nos espaços produtivos dos países centrais que estão afetando as taxas de reprodução capitalista nestes mesmos circuitos produtivos de maneira negativa. Consequentemente as corporações que contam com maior aporte de investimentos capitalistas estão espacializando seus circuitos produtivos para fora de seus espaços territoriais de atuação comercial de origem através de investimentos em novas iniciativas industriais nas economias dos países emergentes, como o Brasil, onde o aumento da demanda por novos alimentos caminha com o aumento da renda da formação de novas classes médias (ROUYER, 2013). 
 No contexto do mercado atual, o leite e seus derivados entram em uma lista seleta de produtos de alta inclusão inédita na dieta de milhões de brasileiros (MACHADO, SOUZA & VALVERDE, 2010). Segundo Valverde (1967), no período temporal do século XVI até a década de 1960, os laticínios foram vistos como produtos insalubres e caros por boa parte da população brasileira. Mas seu consumo aumenta estupendamente ao longo das últimas décadas e esse movimento não tem prazo para acabar (MACHADO, SOUZA & VALVERDE, 2010). Todas as mudanças neoliberais feitas em nossa economia facilitaram as operações dos grandes investidores globais que investem cada vez mais em nossas indústrias de laticínios e trazem outras concorrentes do mercado exterior, em todo o Brasil com a expansão da fronteira da pecuária de leite estando hoje na região norte do país, bem distante de onde começou no centro sul do país (MACHADO, SOUZA & VALVERDE, 2010). Hoje, o estado do Rio de Janeiro ainda é o segundo maior consumidor de produtos lácteos no Brasil com um consumo de 2,5 bilhões de litros de leite� sendo assim eminentemente importador de lácteos, pois a produção interna está em 600 milhões de litros de leite�. 
 No ano de 2014, o estado do Rio de Janeiro conta com quatro indústrias de laticínios de grande porte que são as fábricas Quatá� e Marília em Itaperuna, Nestlé em Três Rios e uma unidade da LBR� em Barra Mansa que não necessariamente compram o leite das cooperativas fluminenses devido ao barateamento dos transportes para outras regiões produtoras de leite, principalmente das do estado de Minas Gerais e da falta da qualidade mínima exigida na produção leiteira fluminense cooperativada que na maior parte é vendida para indústrias de laticínios de menor porte ou pela mesma questão logística dos transportes é comercializada para fábricas em outras regiões.
 Neste contexto, surge a APLISI, no ano de 2002, da reunião de um grupo de produtores de leite do sul fluminense, da região de Santa Isabel do Rio Preto, distrito de Valença, no estado do Rio de Janeiro, oriundos do sistema cooperativo, que buscavam uma nova maneira de responder ás novas condições de mercado que se estabeleceram á falência do sistema de cooperativas de produtores de leite por todo o estado do Rio de Janeiro e ás novas demandas industriais e de consumo que se formaram no cenário nacional. 
2 O território da APLISI 
 As elucidações presentes neste trabalho foram feitas através das visitas à sede da APLISI no distrito de Santa Isabel do Rio Preto, no município de Valença, Rio de Janeiro, através das pesquisas em sites especializados na internet e nas entrevistas á entidade OCB, no centro da cidade do Rio de Janeiro e baseando-se nas leituras dos autores presentes na bibliografia deste TCC. Entrevistando os diretores das entidades descritas acima em visitas de forma direta, surgiram alguns dados que elucidaram as lacunas desta pesquisa, ajudando a solucionar a problemática da pesquisa detalhandoquais e quem são os atores e de que fluxos são compostas as relações que dão as particularidades ao espaço geográfico de produção da APLISI gerando seu território singular na escala geográfica local além das fronteiras da mesorregião sul fluminense e da microrregião de Andrelândia, exibida anteriormente na figura 3.
 Neste capítulo, objetiva-se o detalhamento dos elementos que definem a territorialidade da APLISI aplicando-se o conceito de território ao estudo do substrato material em que esta associação atua e as conseqüentes relações geográficas verticais e horizontais que dela se originam, desde a sua fundação material até o momento do término deste trabalho. Para a discussão sobre esses elementos definidores do território, as teorias sobre este conceito dentro de estudos geográficos fazem-se necessárias. Introduzindo Haesbaert (2004), apreende-se que muitas conexões teóricas com a noção de território, desde a era do império romano até os dias atuais, tiveram contato direto ou indireto. Duas acepções do termo território que podem ser definidas pela acepção de território como material e pela acepção de território como subjetivo. Na acepção de território material, remete-se ao território enquanto um substrato material particular (SOUZA. 2013) onde formas físicas e naturais prevalecem (HAESBAERT, 2004), conformando seus atores em seus fluxos e fixos dentro de seus limites e características físicas como, por exemplo, os territórios definidos em regiões naturais tais como as regiões brasileiras do IBGE ou os diversos territórios políticos administrativos dos municípios, estados e na esfera nacional, do Brasil. Apreende-se deste conceito, no caso da APLISI, que sua sede está na microrregião de Barra do Piraí, exibida anteriormente na figura 1, em Santa Isabel do Rio Preto�, terceiro distrito do município de Valença, no estado do Rio de Janeiro, configurando os elementos de território materializado nas características políticas e administrativas ou se pode constatar também que a APLISI está na Serra da Mantiqueira que conforma um território natural que pertence à unidade geomorfológica dos alinhamentos de cristas do Paraíba do Sul� e que os elementos que ali existem estão sendo influenciados pela sua geografia física. 
 Na acepção de território subjetivo, remete-se ao simbolismo que um substrato material particular (SOUZA. 2013) pode trazer, onde a materialidade que o conforma é a percebida pelos seus agentes que estão usando-o (HAESBAERT, 2004) que formam seus fluxos conforme suas necessidades de uso deste território. Através das redes geográficas horizontais e verticais (SAQUET, 2010) os agentes no território vão conformando a sua territorialidade baseados em controles territoriais econômicos, culturais e sociais, onde esses controles são baseados nas relações de troca dialéticas em diferentes escalas, sempre em constante transformação. Essas territorialidades subjetivas que vão se formando no território, coexistem simultaneamente e são conformadas pelos seus fixos podendo ter significados diversos e operando em diversas escalas e interações por vezes opostas entre si (HAESBAERT, 2004). No caso da APLISI constatou-se que a interação entre os produtores de leite, nos sete municípios em que atua a partir da sua sede em Santa Isabel do Rio Preto, conforma um território específico, demarcado singularmente pelos fixos que são os produtores de leite associados e suas interações entre si e com esta sede transpassando os limites administrativos, naturais ou políticos, uma vez que o território formado conformando a territorialidade estudada permeia sete municípios, dois estados, duas microrregiões fluminenses que são a do Vale do Paraíba, exibida anteriormente na figura 4 na qual está o município de Barra Mansa e a de Barra do Piraí que contém os municípios de Barra do Piraí e de Valença e a microrregião de Andrelândia, exibida anteriormente na figura 3 e que contém os quatro municípios mineiros. Os fixos são representados pelos produtores de leite e outros elementos que apresentam também características diversas das interações de produção de leite, formando fluxos dentro do território formado, sendo parte de outras territorialidades, confirmando as interações sobrepostas que operam em um mesmo território (HAESBAERT, 2004). 
 O geógrafo italiano Giuseppe Dematteis, definiu o conceito de territorialidade conformado através das interações entre os seus elementos. A territorialidade da APLISI se manifesta através das normas impostas nas relações que se fazem entre produtores e a associação ou vice-versa, no território da mesma. Assim define Dematteis sobre “as relações geográficas verticais e horizontais” em Saquet (2010, p.112):
(...) o que denomina de sistema local territorial (Slot): é um conjunto dotado de identidade, sendo que os sujeitos que o compõem são capazes de definir comportamentos coletivos; o local é um nó articulado em redes tendencialmente planetárias, na forma de um acoplamento de relações recíprocas e em unidade (grifos do autor). 
 Lugar é um conceito geográfico que está imbricado com o conceito geográfico de território enquanto lócus da interação entre os elementos no substrato material analisado, corroborando o conceito de “nó” que engendra as redes geográficas, que são as teias de interações verticais e horizontais entre os agentes sócio-espaciais (SOUZA, 2013). 
 Então como entendido acima, a territorialidade de um local ou lugar é regida por esse sistema que Dematteis (SAQUET, 2010) denominou de “Slot” e que define as características particulares das ações e características referentes a todos os elementos neste local ou lugar, os quais se articulam em “nós” entrelaçando as relações e interações horizontais e verticais que se constroem a partir de pontos fixos que produzem os fluxos materiais ou imateriais entre eles, que permeiam o seu local ou lugar de origem e os interligam a outros locais ou lugares, muitos transescalares, denominando-se de redes geográficas essas interações através dos pontos fixos que constroem o local ou o lugar particular. Entende-se em última análise que o local descrito por Dematteis, que pode ser o lugar, também pode ser definido como um substrato material particular (SOUZA, 2013). Este substrato material particular pode ser estudado como um território-rede a partir dos produtores de leite e a APLISI, com todos os elementos materiais ou imateriais conformando suas características dentro do conceito geográfico de território.
 Partindo da premissa que estamos estudando um lugar particular que corresponde a um território particular, justifica-se que este trabalho esteja privilegiando o conceito de território para o estudo da atuação da APLISI no espaço geográfico. Conceituando o território, define-se a territorialidade com as redes geográficas. As redes geográficas podem ser verticais ou horizontais conforme as escalas em que os elementos que as compõem atuam. Os elementos que compõem as redes geográficas são os pontos fixos dentro de um território que interagem entre si através de fluxos que determinam as características das redes geográficas em que estão inseridos. Esses pontos fixos podem ser pessoas, fábricas, fazendas ou qualquer outro elemento que esteja produzindo interações do ponto onde está localizado com outros pontos em outras localizações, dentro ou fora do seu território. Essas interações podem ser de diversas naturezas, desde uma simples troca de produtos até troca de informações de controle e administração no território em que as interações estão inseridas. Quando essas interações se fazem através de elementos localizados em uma mesma escala cartográfica ou em uma mesma escala de processo espacial tal como os processos de produção, econômico, de trabalho, sociais, políticos e outros, conformam as redes geográficas horizontais, como por exemplo, os produtores de leite da APLISI que interagem entre si e com a indústria transformadora que compra a sua produção diária de leite, conformevisualizado na Figura 5 abaixo e que estão em uma mesma escala geográfica e dentro de um mesmo processo produtivo, social, político e econômico. Se essas interações se fizerem através de elementos localizados em diferentes escalas geográficas ou em diferentes escalas de processos espaciais, que são os mesmos já citados, conformarão as redes geográficas verticais citadas em Saquet (2010). O conjunto das interações horizontais e verticais entre os elementos que compõe um espaço geográfico definido vai formar um território e que vai ter a característica de ser flexível (HAESBAERT, 2004), obedecendo às transformações que as redes geográficas vão operar. Cada territorialidade formada pelas redes geográficas é uma mistura dos elementos sociais que as conformam (HAESBAERT, 2004). 
 É importante esclarecer que os conceitos de territorialidade e território em Saquet (2010), que é um autor influenciado pela escola geográfica italiana�, são teorizados como formados por elementos subjetivos que podem ter características singulares coexistindo todo o tempo, interagindo entre si e existindo em diferentes escalas sejam as escalas cartográficas ou as escalas de processos espaciais. O “Slot” teorizado por Dematteis (SAQUET 2010) consiste nas “relações geográficas verticais e horizontais”, que conformam um território desmaterializado. Haesbaert (2004), por sua vez influenciado pela escola geográfica inglesa� esclarece que o território subjetivo é imaterial e formado por relações sociais que dele se apropriam que imbricam no conceito de “território de uso”�, cujo conceito prevê que as interações sociais dentro de um determinado substrato material apropriam-se deste de acordo com a acepção subjetiva, formando os territórios apropriados pela sociedade de acordo com seus interesses e das diferentes atividades que vão definir os usos destes territórios. Souza (2013), por sua vez, resgatando os conceitos geográficos de lugar e território, esclarece que estes dois conceitos estão imbricados e que podem ser apreendidos como materiais ou imateriais, de acordo com as interações sociais que neles se fizerem. Com o intuito de entendimento do arcabouço teórico em que se baseia esse trabalho, essa explicação dos conceitos de território nesses três autores serve de norte para a interpretação dos dados que esta monografia apresenta. 
 
 Figura 5: Território e Lugar da APLISI conformados pelos municípios produtores. Fonte: Autor Albuquerque, B.M.C. através do google maps, acessado em 27 de Fevereiro de 2014.
 Pelos dados coletados em pesquisa de campo, foi entendido que o possível território, visualizado na Figura 5 acima, estabelecido para a APLISI é formado pelas relações de produção que os quarenta e nove produtores de leite associados têm entre si e com a sede da associação na localidade de Santa Isabel do Rio Preto, terceiro distrito do município de Valença, quase na divisa entre os estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais. Em concordância com este formato possível do território subjetivo em questão, pode-se definir que usando os parâmetros políticos e administrativos dos recortes municipais, ele estende-se nos estados do Rio de Janeiro e de Minas Gerais pelos municípios fluminenses de Barra Mansa, Volta Redonda e Valença e pelos municípios mineiros de Andrelândia, Auriuoca, Carvalhos e Passa Vinte. 
Figura 6: Fluxos entre os fixos políticos administrativos na territorialidade da APLISI 
Fonte: Autor Albuquerque, B.M.C. através do google maps, acessado em 27 de Fevereiro de 2014
Tabela 5: Percentual da produção de leite dos produtores associados da APLISI em relação às produções totais dos municípios em que se encontram. 
Fonte: Feito em excel por Albuquerque, B.M.C. de acordo com dados do censo do IBGE do ano de 2013.
 Na Tabela 5 são definidas as percentagens das produções dos produtores em relação aos totais de cada um dos sete municípios estudados. Conforme os dados coletados, o tamanho da produção de leite total ordenhado em número de litros pelos produtores associados no território formado pelos sete municípios em que estão estabelecidos, no ano de 2013 está na ordem de 1% somando-se as sete produções municipais totais. 
 Ainda baseado nos dados coletados na APLISI, esses produtores mantêm fluxos utilizando redes técnicas cientificas informacionais (SANTOS, 2009) onde as informações e a coordenação das atividades são feitas em um espaço de tempo comprimido (HARVEY, 1993), configurando um território com fluxos de informações dinâmicas e atualizadas com as demandas da indústria processadora de leite em escala regional. Estas indústrias processadoras estão conectadas, por sua vez, a outras maiores em escala global. Esta rede geográfica, que se estabelece entre a APLISI e as indústrias transformadoras que compram sua produção, produzem interações de fornecimento com o objetivo de produzir para estas indústrias que agem além da escala local. Formam-se, portanto as relações horizontais entre os produtores de leite e a indústria processadora. Concomitantemente, os produtores têm entre si interações de informação, de comércio, sociais e jurídicas entre si, enquanto associados na APLISI, ordenando seu território conjunto a partir da gestão das suas produções aglutinadas sob um contrato jurídico que determina que a produção local em conjunto seja toda reunida sob o controle da sede. Esta possui a centralidade da produção embora sem a necessidade de reunião material de toda esta produção em um único lugar de estocagem, pois os produtores entregam o leite ordenhado em suas fazendas diretamente á indústria transformadora sendo este um aspecto interessante e singular da interação que a APLISI tem com as indústrias transformadoras que compram a produção de leite de seus associados e que formatam a sua territorialidade na forma de redes individuais produtivas, através de cada produtor, formando-se então os pontos fixos das redes horizontais (SAQUET, 2010). 
 Apreende-se que o conceito de territorialidade é o de um espaço geográfico onde ocorrem relações flexíveis. Este conceito de territorialidade está sendo trabalhado aqui e resgatado dos autores Haesbaert (2004), e Saquet (2010). Esta territorialidade flexível é formatada pelas relações políticas, econômicas e sociais que são estabelecidas pelos agentes territoriais correspondentes. Eles formatam o território em redes geográficas horizontais e verticais (SAQUET, 2010) que são, por natureza, flexíveis. Em Saquet (2010) podemos constatar que as próprias estruturas das redes geográficas que formatam um território, formando a sua territorialidade, são flexíveis e flexibilizantes, pois ao mesmo tempo os fluxos formadores das redes geográficas são resultados e conseqüências de transformações estruturais e conjunturais através dos agentes que as compõem formando seus fixos e fluxos no território. Portanto, esses fluxos das redes geográficas também flexibilizam a territorialidade que as compõem. E as flexibilizações decorrentes deste processo podem levar os fluxos e as redes geográficas a direções diferentes e antagônicas que transformam a territorialidade de diversas formas, gerando novas territorialidades anacrônicas a original.
 Haesbaert (2004)� destaca que o conceito de território pode ser cognato com o conceito de Espaço Geográfico quando entendido como “território usado”, onde trazendo esta idéia de Milton Santos, a idéia de território consiste ser a de um espaço em que encerra as relações econômicas entre os agentes que o usam de forma particular ou coletiva, contrapondo-se ao conceito de território como fonte de recursos naturais ou o conceito de território como um objeto que define os seus atores e formas produtivas que nele existem. 
 Cada produtor associado é um ponto fixo onde se origina os fluxos horizontais em direção aos outros produtores associados, em forma de informações técnicas sobre a produção e outras interações sociais e em direção a sede da APLISI, que tem o papel único de gestora

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