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DISCRETIZAC¸A˜O DE EQUAC¸O˜ES DIFERENCIAIS PARCIAIS Te´cnicas de Diferenc¸as Finitas Jose´ Alberto Cuminato Instituto de Cieˆncias Matema´ticas e de Computac¸a˜o Universidade de Sa˜o Paulo – Campus de Sa˜o Carlos Messias Meneguette Junior Faculdade de Cieˆncias e Tecnologia Universidade Estadual Paulista – Presidente Prudente 13 de outubro de 2006 2 Suma´rio 1 Conceitos Fundamentais 7 1.1 Introduc¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.2 Aproximac¸o˜es de Derivadas por Diferenc¸as Finitas . . . . . . . . . . . . . . . 9 1.3 Problema de Valor Inicial em Equac¸o˜es Ordina´rias . . . . . . . . . . . . . . . 15 1.3.1 Convergeˆncia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 1.4 Problema de Valor de Fronteira em Equac¸o˜es Ordina´rias . . . . . . . . . . . . 29 1.4.1 Me´todos de Diferenc¸as Finitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 1.5 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 2 Introduc¸a˜o a`s Equac¸o˜es Diferenciais Parciais 45 2.1 Introduc¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 2.2 Classificac¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 2.3 Caracter´ısticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 2.4 Discretizac¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 2.5 Domı´nios Gene´ricos e Transformac¸a˜o de Varia´veis . . . . . . . . . . . . . . . . 53 2.5.1 Transformac¸a˜o de Coordenadas Cartesianas em Polares . . . . . . . . 55 2.5.2 Transformac¸a˜o de Coordenadas Cartesianas em Obl´ıquas . . . . . . . 57 2.5.3 Transformac¸a˜o de Coordenadas Cartesianas em Triangulares . . . . . 60 2.6 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 3 Equac¸o˜es Parabo´licas 69 3.1 Introduc¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 3.2 Me´todos de Diferenc¸as Finitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70 3.3 Problemas Na˜o Lineares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88 3.4 Outros Me´todos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91 3.5 Equac¸o˜es Parabo´licas em Duas Dimenso˜es . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97 3.6 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104 4 Equac¸o˜es El´ıpticas 113 4.1 Introduc¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113 4.2 Me´todos de Diferenc¸as Finitas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114 4.3 Erro de Truncamento Local . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118 4.4 Condic¸o˜es de Fronteira em Domı´nios Gerais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123 4.5 Condic¸a˜o de Fronteria de Neumann . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128 3 4 SUMA´RIO 4.6 Diferenc¸as Finitas em Coordenadas Polares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130 4.7 Me´todos Iterativos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131 4.8 Convergeˆncia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137 4.9 Me´todo dos Gradientes Conjugados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 143 4.10 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 149 5 Equac¸o˜es Hiperbo´licas 157 5.1 Introduc¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157 5.1.1 Equac¸a˜o escalar de advecc¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157 5.1.2 Equac¸a˜o da onda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 181 5.2 Diferenc¸as Finitas para a Equac¸a˜o de Advecc¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . 190 5.3 Diferenc¸as Finitas para a Equac¸a˜o da Onda . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 206 5.4 Me´todos Nume´ricos para Leis de Conservac¸a˜o . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211 5.5 Exerc´ıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 234 SUMA´RIO 5 PREFA´CIO O universo de te´cnicas de soluc¸a˜o nume´rica de equac¸o˜es diferenciais parciais e´ bastante vari- ado e inclue, entre outros, os me´todos de diferenc¸as finitas, volumes finitos, elementos finitos, elementos de contorno, me´todos espectrais e me´todos de colocac¸a˜o. O objetivo deste texto e´ apresentar uma introduc¸a˜o a` soluc¸a˜o nume´rica de equac¸o˜es diferenciais parciais, enfati- zando os principais conceitos com vistas a`s aplicac¸o˜es pra´ticas, utilizando discretizac¸a˜o por diferenc¸as finitas. O conteu´do sera´ desenvolvido atrave´s de exemplos-modelos de equac¸o˜es parabo´licas, el´ıpticas e hiperbo´licas. Pretende-se introduzir de maneira bastante natural os conceitos de estabilidade e convergeˆncia, dependeˆncia da discretizac¸a˜o das condic¸o˜es de fron- teira, condic¸a˜o CFL e me´todo das caracter´ısticas. Incluimos, sempre que poss´ıvel, uma certa dose de teoria e rigor no tratamento desses conceitos sem no entanto relegarmos o lado ex- perimental, especialmente o lado ilustrativo atrave´s de exemplos e gra´ficos. Nosso objetivo e´ o de apresentar uma variedade de te´cnicas de soluc¸a˜o sobre as quais o leitor devera´ adquirir conhecimentos teo´ricos e tambe´m experimental. Por essa raza˜o e´ imprescind´ıvel que o leitor resolva os exerc´ıcios pra´ticos, que envolvem programac¸a˜o em MATLAB. Na literatura e´ bastante popular a ide´ia, especialmente em equac¸o˜es parciais, de que existem tantos me´todos nume´ricos quantos sa˜o os problemas a serem resolvidos. Em geral entretanto, alguns conceitos e te´cnicas fundamentais esta˜o presentes em todos os me´todos. O propo´sito deste texto e´ o de chamar a atenc¸a˜o para esses conceitos esclarecendo-os atrave´s da ana´lise de exemplos. E´ quase sempre poss´ıvel classificar um problema em quatro grandes tipos: Equac¸o˜es Parabo´licas, Equac¸o˜es El´ıpticas, Equac¸o˜es Hiperbo´licas e Problemas do tipo misto. Do ponto de vista dida´tico esta divisa˜o parece ser recomendada para melhor associac¸a˜o entre as te´cnicas nume´ricas e a natureza do problema a ser resolvido. O conteu´do aqui desenvolvido segue essa lo´gica. Este livro foi escrito com o propo´sito de servir como texto ba´sico de disciplinas de ca´lculo nume´rico e matema´tica aplicada ministradas em cursos de graduac¸a˜o de engenharia, matema´tica e a´reas afins em cieˆncias exatas. O material mais avanc¸ado pode ainda servir para cursos introduto´rios de po´s-graduac¸a˜o nas a´reas acima citadas. Para cumprir esse ob- jetivo foi introduzido uma lista bastante completa de exerc´ıcios que envolve desde a fixac¸a˜o dos conceitos ba´sicos ate´ a implementac¸a˜o de projetos pra´ticos em computador. A maioria dos me´todos nume´ricos apresentados foram programados em MATLAB e podem ser utiliza- dos pelo professor para ilustrar os conceitos ministrados em sala de aula. A programac¸a˜o em MATLAB inclue uma interface gra´fica padronizada que permite a soluc¸a˜o de problemas razoavelmente complexos sem a necessidade de um grande esforc¸o de programac¸a˜o por parte do aluno. Isto viabiliza a utilizac¸a˜o de exerc´ıcios pra´ticos para a ilustrac¸a˜o e reconhecimento de conceitos como convergeˆncia, estabilidade, precisa˜o, etc. O conteu´do foi dividido em 5 cap´ıtulos, os dois primeiros apresentando os conceitos ba´sicos de discretizac¸a˜o de problemas de valor inicial e de contorno para equac¸o˜es diferenciais ordina´rias e a teoria elementar das equac¸o˜es diferenciais parciais. Nos outros treˆs cap´ıtulos apresentamos separadamente as te´cnicas de discretizac¸a˜o de cada um dos tipos de equac¸o˜es parabo´licas, hiperbo´licas e el´ıpticas. Todos os cap´ıtulos inclue uma lista bastante extensa de exerc´ıcios, muitos dos quais abordam temas mais avanc¸adosdo que aqueles tratados no texto. Essa atitude tem o propo´sito de estimular o aluno que pretende aprofundar-se nessa a´rea do conhecimento a pesquisar as refereˆnciais e aguc¸ar sua curiosidade. No entanto, 6 SUMA´RIO alertamos os professores que pretendem utilizar o texto como guia de um curso, para o fato de que uma selec¸a˜o dos exerc´ıcios pode ser recomendada para na˜o desestimular os estudantes com problemas muito dif´ıceis. A ordem de apresentac¸a˜o dos exerc´ıcios na˜o segue um crite´rio de dificuldade crescente e sim a ordem dos to´picos no texto. O material deste livro deriva em boa parte de cursos de graduac¸a˜o que os autores teˆm ministrado em suas respectivas unidades de ensino. Agradecimento especial nos e´ devido aos autores da apostila [28], aos alunos do ICMC pela leitura dos originais e o apoio financeiro do Instituto de Cieˆncias Matema´ticas e de Computac¸a˜o - USP Sa˜o Carlos, Faculdade de Cieˆncias e Tecnologia - UNESP Presidente Prudente, CNPq e Pro´-Reitoria de Graduac¸a˜o da USP atrave´s dos Programa SIAE 97 e SIAE 98. Cap´ıtulo 1 Conceitos Fundamentais 1.1 Introduc¸a˜o Um modelo matema´tico e´ uma representac¸a˜o, idealizada e muitas vezes simplificada, da natureza. Quando derivado de maneira criteriosa, sua soluc¸a˜o simula propriedades dos processos naturais envolvidos, tais como velocidade e pressa˜o no escoamento de um fluido, temperatura, humidade, direc¸a˜o dos ventos e precipitac¸a˜o na previsa˜o do tempo, trajeto´ria de um sate´lite artificial, entre outras muitas aplicac¸o˜es. Assim, as soluc¸o˜es das equac¸o˜es de um modelo, devem captar os aspectos relevantes no comportamento do problema modelado, na˜o sendo poss´ıvel, na maioria dos casos, justificar a utilizac¸a˜o de hipo´teses simplificado- ras que modificam a natureza do problema (tal como linearidade) que tornariam poss´ıvel a determinac¸a˜o de uma soluc¸a˜o exata. Em outra palavras, quando estamos resolvendo um problema real, em geral, na˜o e´ poss´ıvel forc¸a´-lo a satisfazer hipo´teses que permitam a obtenc¸a˜o de uma soluc¸a˜o exata. Da´ı a necessidade da procura de soluc¸o˜es nume´ricas, ou aproximadas. A importaˆncia da modelagem matema´tica cresceu muito nos u´ltimos anos porque a ana´lise detalhada de um modelo e suas propriedades, viabilizada pelo avanc¸o tecnolo´gico dos computadores, permite um melhor entendimento do evento modelado e, mais do que isso, permite a simulac¸a˜o de mudanc¸as nos paraˆmetros do modelo e a ana´lise da respec- tiva resposta, que na˜o seriam poss´ıveis na situac¸a˜o real. Por exemplo, no projeto de um carro, alterac¸o˜es na forma resultam em modificac¸o˜es no comportamento aerodinaˆmico, de cuja ana´lise obte´m-se um indicador dos ganhos e/ou perdas em performance; a localizac¸a˜o ideal da asa de um avia˜o em relac¸a˜o ao casco pode ser obtida pela resposta a` simulac¸a˜o matema´tica das equac¸o˜es da aerodinaˆmica, e ate´ a melhor pol´ıtica de vacinac¸a˜o contra doenc¸as transmiss´ıveis, tipo sarampo, pode ser decidida com base em modelos matema´ticos. A economia de tempo gerada por esta maneira de projetar um produto, ou tomar deciso˜es, e´ clara, diminuindo sensivelmente o nu´mero de proto´tipos ou modelos em tamanho reduzido a serem constru´ıdos e ensaiados. No projeto de equipamentos com tecnologia avanc¸ada, a simulac¸a˜o atrave´s da modelagem matema´tica e´ uma ferramenta indispensa´vel a ser utilizada na eliminac¸a˜o de casos triviais ou imposs´ıveis, fornecendo um guia seguro para a selec¸a˜o dos casos a serem ensaiados em modelos de escala reduzida ou para a construc¸a˜o de proto´tipos. Como virtualmente todas as a´reas em matema´tica aplicada, o principal objetivo das 7 8 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS equac¸e˜s diferenciais e´ o de modelar matematicamente eventos da natureza nas mais diversas a´reas de aplicac¸a˜o. Um modelo com va´rias varia´veis independentes envolve necessariamente derivadas com respeito a cada umas dessas varia´veis ou derivadas parciais, sendo portanto denominado uma equac¸a˜o diferencial parcial ou um sistema de equac¸o˜es diferenciais parciais. Resumindo as ide´ias apresentadas acima, o processo de simulac¸a˜o e´ considerado na lit- eratura como sendo constitu´ıdo de treˆs partes nitidamente distintas. A fase de modelagem, isto e´, a construc¸a˜o de um conjunto de equac¸o˜es matema´ticas que reputamos representar os fenoˆmenos e os processos modelados. Uma segunda fase, de soluc¸a˜o desse conjunto de equac¸o˜es, normalmente utilizando te´cnicas de discretizac¸a˜o nume´rica e um computador e finalmente, a fase de interpretac¸a˜o dos resultados face a`s caracter´ısticas do problema origi- nal. Esse e´ um processo complexo que exige do profissional um conjunto bastante amplo de habilidades; como por exemplo: um bom conhecimento de engenharia, que sera´ necessa´rio para os ajustes finos do modelo desprezando complicac¸o˜es que na˜o sa˜o fundamentais, um bom conhecimento de me´todos nume´ricos para selecionar aquele que melhor se adapta ao problema e finalmente um bom faro de detetive para analisar os resultados e interpreta´-los a` luz das restric¸o˜es e caracter´ısticas do problema. Este texto trata exclusivamente da segunda fase desse processo. E´ claro portanto, que a soluc¸a˜o do modelo matema´tico, ou seja, das equac¸o˜es represen- tantes desse modelo, e´ fundamental para a compreensa˜o do fenoˆmeno modelado. Este e´ o papel da discretizac¸a˜o das equac¸o˜es parciais, uma vez que, como ja´ dissemos, uma soluc¸a˜o anal´ıtica nem sempre esta´ dispon´ıvel: ou tem uma forma na˜o pra´tica ou e´ imposs´ıvel de ser obtida. Assim os me´todos nume´ricos sa˜o amplamente usados para a aproximac¸a˜o dessas soluc¸o˜es. A esseˆncia dos me´todos nume´ricos esta´ na representac¸a˜o discreta (finita) do prob- lema que, em geral, e´ originalmente modelado como um cont´ınuo. Essa discretizac¸a˜o e´ que viabiliza o uso dos computadores no tratamento nume´rico das equac¸o˜es diferenciais. Na literatura, especialmente em equac¸o˜es parciais, e´ comum a ide´ia, de que existem tan- tos me´todos nume´ricos quantos sa˜o os problemas a serem resolvidos. Em geral entretanto, algumas te´cnicas e caracter´ısticas fundamentais esta˜o presentes em todos os me´todos. O propo´sito deste texto e´ o de chamar a atenc¸a˜o para esses conceitos definindo-os precisamente e ilustrando-os atrave´s da ana´lise de exemplos. E´ quase sempre poss´ıvel classificar um prob- lema em equac¸o˜es diferenciais em quatro grandes classes: Equac¸o˜es Parabo´licas, Equac¸o˜es El´ıpticas, Equac¸o˜es Hiperbo´licas e Problemas do tipo misto. Do ponto de vista dida´tico esta divisa˜o parece ser recomendada para melhor associac¸a˜o entre as te´cnicas nume´ricas e a natureza do problema a ser resolvido. Seguiremos neste texto essa premissa lo´gica. O objetivo deste texto e´ o de desenvolver uma introduc¸a˜o a` soluc¸a˜o nume´rica de equac¸o˜es diferenciais parciais, enfatizando os principais conceitos com vistas a`s aplicac¸o˜es pra´ticas, atrave´s da discretizac¸a˜o por diferenc¸as finitas. O conteu´do sera´ desenvolvido por meio de exemplos modelos de equac¸o˜es parabo´licas, el´ıpticas e hiperbo´licas. Pretende-se introduzir de maneira bastante natural os conceitos de estabilidade e convergeˆncia, dependeˆncia da discretizac¸a˜o das condic¸o˜es de fronteira, condic¸a˜o CFL e me´todo das caracter´ısticas. Os conceitos fundamentais e as principais dificuldades, bem como a notac¸a˜o e nomen- clatura ba´sicas sera˜o introduzidos o caso de problemas de uma dimensa˜o, ou seja, por meio de equac¸o˜es diferenciais ordina´rias. Na sequeˆncia, sera˜o tratados cada um dos principais tipos de equac¸o˜es parciais. 1.2. APROXIMAC¸O˜ES DE DERIVADAS POR DIFERENC¸AS FINITAS 9 1.2 Aproximac¸o˜es de Derivadas por Diferenc¸as Finitas “A esseˆncia dos me´todos nume´ricos esta´ na discretizac¸a˜o do cont´ınuo. E´ esta discretizac¸a˜o que torna finito o problemae portanto viabiliza sua soluc¸a˜o atrave´s dos computadores [19].” A ide´ia geral do me´todo de diferenc¸as finitas e´ a discretizac¸a˜o do domı´nio e a substi- tuic¸a˜o das derivadas presentes na equac¸a˜o diferencial, por aproximac¸o˜es envolvendo somente valores nume´ricos da func¸a˜o. Na pra´tica substitui-se as derivadas pela raza˜o incremental que converge para o valor da derivada quando o incremento tende a zero. Dizemos enta˜o que o problema foi discretizado. Quando o domı´nio tem mais de uma varia´vel, a ide´ia acima e´ aplicada para cada uma das varia´veis separadamente. Nesta sec¸a˜o trataremos apenas o problema unidimensional, pois isto facilita o entendi- mento. No entanto, a generalizac¸a˜o para outras dimenso˜es pode ser obtida sem muitas dificuldades, como veremos oportunamente. Seja x0 um nu´mero real qualquer, e h um nu´mero positivo. Definimos malha de passo h associada a x0 como o conjunto de pontos xi = x0 ± ih, i = 1, 2, . . . , N. Nos pontos dessa malha sera˜o calculadas aproximac¸o˜es para uma func¸a˜o y(x) e suas derivadas. A ferramenta matema´tica ba´sica no ca´lculo de aproximac¸o˜es para as derivadas e´ a se´rie de Taylor que relaciona valores da func¸a˜o e suas derivadas, num ponto x, com valores dessa mesma func¸a˜o numa vizinhac¸a de x, ou seja, com y(x+ h). Se y(x) tem derivadas ate´ a ordem n+ 1 em x, podemos escrever: y(x+ h) = y(x) + hy′(x) + h2 2! y′′(x) + · · ·+ h n n! y(n)(x) + + hn+1 (n+ 1)! y(n+1)(ξ), x < ξ < x+ h. (1.1) O u´ltimo termo da expressa˜o (1.1) representa o erro da aproximac¸a˜o de y(x + h) pelo polinoˆmio (na varia´vel h) de grau n: Pn(h) = y(x) + y ′(x)h+ y′′(x) 2! h2 + . . .+ y(n)(x) n! hn. Se n = 1 em (1.1) obtemos uma aproximac¸a˜o para a derivada y′(x), conhecida como fo´rmula progressiva, que e´ dada por: y′(x) = y(x+ h)− y(x) h − h 2 y′′(ξ). Utilizaremos a notac¸a˜o: ∆y(x) = y(x+ h)− y(x) para representar a diferenc¸a progressiva de y(x). O termo −hy′′(ξ)/2 representa o erro dessa aproximac¸a˜o. Portanto teremos: 10 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS y′(x) = 1 h ∆y(x)− h 2 y′′(ξ). De modo semelhante, tomando −h em (1.1), ainda com n = 1, obtemos a fo´rmula regressiva que utiliza a diferenc¸a regressiva (∇y(x)) e seu erro, ou seja: y′(x) = y(x)− y(x− h) h + h 2 y′′(ξ) = 1 h ∇y(x) + h 2 y′′(ξ). Tomando n = 2 em (1.1), e reescrevendo (1.1) para h e −h, respectivamente, obtemos y(x+ h) = y(x) + hy′(x) + h2 2! y′′(x) + h3 3! y′′′(ξ1) e y(x− h) = y(x)− hy′(x) + h 2 2! y′′(x) − h 3 3! y′′′(ξ2). Subtraindo a u´ltima expressa˜o da penu´ltima obtemos a fo´rmula centrada ou fo´rmula de diferenc¸as centrais y′(x) = y(x+ h)− y(x− h) 2h − h 2 3! y′′′(ξ) (1.2) onde ξ ∈ (x− h, x+ h) e foi utilizado o teorema do valor intermedia´rio va´lido para func¸o˜es cont´ınuas: 1 2 (y′′′(ξ1) + y′′′(ξ2)) = y′′′(ξ), para algum ξ ∈ [min{ξ1, ξ2},min{ξ1, ξ2}]. A notac¸a˜o utilizada para denotar a diferenc¸a central e´ δhy(x) e a equac¸a˜o (1.2) nos fornece tambe´m o erro dessa fo´rmula, ou seja: y′(x) = 1 2h δhy(x)− h 2 3! y′′′(ξ). Observac¸a˜o 1.2.1 Quando se fizer necessa´rio deixar claro a importaˆncia do passo h para um operador que esta´ sendo utilizado, escreveremos: δh, δ 2 h,∆h,∇h, etc.. Erro e Ordem de Aproximac¸a˜o de Uma Fo´rmula de Diferenc¸a Seja F(x, h) uma fo´rmula de diferenc¸a para aproximac¸a˜o da derivada de ordem q de uma func¸a˜o y(x) com erro E(x, h). Enta˜o: y(q)(x) = F(x, h) + E(x, h). 1.2. APROXIMAC¸O˜ES DE DERIVADAS POR DIFERENC¸AS FINITAS 11 Dizemos que a fo´rmula F(x, h) e´ de ordem p se E(x, h) = hpR(x), ondeR(x) na˜o depende de h. Nesse caso usamos a notac¸a˜o E(x, h) = O(hp). Essa notac¸a˜o significa que limh→0 E(x,h)hp e´ uma constante finita. Por exemplo no caso da fo´rmula centrada temos que: F(x, h) = y(x+ h)− y(x− h) 2h e E(x, h) = −h 2 3! y′′′(ξ). de forma que essa fo´rmula e´ de segunda ordem. Seguindo as mesmas ide´ias podemos estabelecer uma expressa˜o para o ca´lculo aproxima- do da segunda derivada.Tomando n = 3 em (1.1) com h e −h obtemos: y(x+ h) = y(x) + hy′(x) + h2 2! y′′(x) + h3 3! y′′′(x) + h4 4! y(4)(ξ1) e y(x− h) = y(x)− hy′(x) + h 2 2! y′′(x)− h 3 3! y′′′(x) + h4 4! y(4)(ξ2). Somando estas duas u´ltimas expresso˜es e isolando y′′(x) obtemos: y′′(x) = y(x+ h)− 2y(x) + y(x− h) h2 − h 2 12 y(4)(ξ), = 1 h2 δ2h 2 y(x)− h 2 12 y(4)(ξ). onde ξ ∈ (x− h, x+ h). Neste caso, F(x, h) = y(x+ h)− 2y(x) + y(x− h) h2 , E(x, h) = −h 2 12 y(4)(ξ) e a fo´rmula e´ de ordem 2. Observac¸a˜o 1.2.2 O operador δ2h 2 deve ser interpretado como a composic¸a˜o do operador δh 2 com ele mesmo. O leitor deve observar que nessa composic¸a˜o utilizamos o operador δ com passo h2 . Isto e´ feito para evitar a utilizac¸a˜o de pontos muito distantes daquele em que a derivada esta´ sendo aproximada. Observe tambe´m que δ2y(x) = ∆∇y(x), e que utilizaremos as notac¸o˜es simplificadas δ2 = δ2h 2 e δ = δh 2 . Outras expresso˜es podem ser obtidas considerando-se mais pontos. Por exemplo, a com- binac¸a˜o linear y′(x) = c1y(x+ h) + c2y(x) + c3y(x− h) impo˜e, por expansa˜o em se´rie de Taylor em torno de x e por comparac¸a˜o dos termos de mesma ordem em h, as seguintes condic¸o˜es sobre os coeficientes c1, c2 e c3: c1 + c2 + c3 = 0 c1 − c3 = 1h c1 + c3 = erro, 12 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS onde erro = coeficiente multiplicando a segunda derivada. A soluc¸a˜o e´ simples quando c2 = α h , ou seja, c1 = (1− α) 1 2h , c3 = −(1 + α) 1 2h , erro = −α h . Assim y′(x) = 1 2h {(1− α)y(x + h) + 2αy(x) − (1 + α)y(x − h)} − αh 2 y′′(x) − h 2 3! y′′′(x) + 0(h3). Note que apenas α = 0 fornece erro = O(h2), e nesse caso a fo´rmula resultante e´ a fo´rmula centrada. Os casos α = −1 e α = 1 , fornecem, respectivamente, as fo´rmulas progressiva e regressiva. Essa te´cnica permite a construc¸a˜o das mais diversas fo´rmulas. Por exemplo: 2hy′(x) = −3y(x) + 4y(x+ h)− y(x+ 2h) +O(h2). 2hy′(x) = 3y(x)− 4y(x− h) + y(x− 2h) +O(h2). 2hy′(x) = −y(x+ 2h) + 8y(x+ h)− 8y(x− h) + y(x− 2h) +O(h4). O uso de operadores de diferenc¸as finitas e´ muito u´til para se obter aproximac¸o˜es de ordem mais elevada para as derivadas. Com a intenc¸a˜o de ilustrar a importaˆncia dos op- eradores na obtenc¸a˜o de fo´rmulas de diferenc¸as finitas, apresentamos a seguir a derivac¸a˜o de algumas dessas fo´rmulas. Informac¸o˜es mais detalhadas podem ser obtidas, por exemplo, em [Ames 1992] e [31]. Alguns desses operadores mais utilizados no contexto de diferenc¸as finitas sa˜o listados abaixo: Deslocamento Ey(x) = y(x+ h) Derivada Dy(x) = y′(x) Diferenc¸a Centrada δy(x) = y(x+ h2 )− y(x− h2 ) Operador Me´dia µy(x) = 12 (y(x + h 2 ) + y(x− h2 )) Diferenc¸a Progressiva ∆y(x) = y(x+ h)− y(x) = (E − 1)y(x) =⇒ E = 1 +∆. (1.3) Pela fo´rmula de Taylor tem-se Ey(x) = (1 + hD + h2 2 D2 + · · ·)y(x) = ehDy(x) (1.4) logo, formalmente podemos escrever: hD = lnE = ln(1 + ∆). (1.5) 1.2. APROXIMAC¸O˜ES DE DERIVADAS POR DIFERENC¸AS FINITAS 13 Utilizando agora a expansa˜o em se´rie de Taylor da func¸a˜o ln(1+x) = x− 12x2+ 13x3−· · ·, va´lida para |x| < 1, podemos definir o operador ln(1 + ∆) como: ln(1 + ∆)y(x) = (∆− 1 2 ∆2 + 1 3 ∆3 − · · ·)y(x). Assim a equac¸a˜o (1.5) pode ser reescrita na forma: hy′(x) = (∆− 1 2 ∆2 + 1 3 ∆3 − · · ·)y(x) constituindo-se numa fo´rmula que expressa a primeira derivada de uma func¸a˜o em termos de suas diferenc¸as progressivas. Portanto, aproximac¸o˜es de qualquer ordem podem ser obti- das considerando-se na se´rie acima o nu´mero adequado de termos, pagando-se o prec¸o do aumento do nu´mero de pontos envolvidos na fo´rmula.Por exemplo uma aproximac¸a˜o de ordem 2, que utiliza treˆs pontos, e´ obtida considerando-se apenas os 2 primeiros termos da soma. Observe o desenvolvimento abaixo: hy′(x) = ( ∆− 1 2 ∆2 ) y(x) = y(x+ h)− y(x)− 1 2 (y(x+ 2h)− y(x+ h)− y(x+ h) + y(x)) = −1 2 y(x+ 2h) + 2y(x+ h)− 3 2 y(x). que utiliza treˆs pontos, para aproximar a derivada. Outras fo´rmulas que podem ser obtidas pela manipulac¸a˜o de operadores sa˜o: hy′(x+ h) = (∆ + 1 2 ∆2 − 1 6 ∆3 + · · ·)y(x) (1.6) h2y′′(x) = (∆2 −∆3 + 11 12 ∆4 − 5 6 ∆5 + · · ·)y(x) (1.7) h2y′′(x+ h) = (∆2 − 1 12 ∆4 + 1 12 ∆5 + · · ·)y(x) (1.8) hy′(x) = µ(δ − 1 6 δ3 + 1 30 δ5 − · · ·)y(x) (1.9) e h2y′′(x) = (δ2 − 1 12 δ4 + 1 90 δ6 − 1 560 δ8 + · · ·)y(x). (1.10) Observac¸a˜o 1.2.3 E´ importante notar que, na pra´tica, os valores da func¸a˜o efetivamente utilizados numa fo´rmula, para cada ponto da malha, na˜o sera˜o os valores exatos e sim val- ores calculados. Dessa forma ale´m do erro de truncamento dessa fo´rmula estara˜o tambe´m presentes, os erros de arredondamento do computador. Consequentemente, quando aprox- imamos uma equac¸a˜o diferencial, as derivadas sa˜o substitu´ıdas por aproximac¸o˜es como as 14 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS que podem ser deduzidas a partir de (1.6), (1.7), (1.8), (1.9) e (1.10) mas com os valores efetivamente calculados, ou seja, hy′(xi) ≃ yi+1 − yi hy′(xi) ≃ yi − yi−1 2hy′(xi) ≃ yi+1 − yi−1 e h2y′′(xi) ≃ yi+1 − 2yi + yi−1, onde yi e´ uma aproximac¸a˜o de y(xi). Generalizac¸a˜o Para Duas Varia´veis A generalizac¸a˜o para mais de uma varia´vel e´ bastante simples. Como ilustrac¸a˜o vamos tratar o caso de duas varia´veis x e t. Considere uma malha no plano x − t como sendo o conjunto de pontos (xi, tj) = (x0+ ih, t0+ jk), portanto com espac¸amento h em x e k em t. As diferenc¸as finitas ja´ obtidas em uma dimensa˜o podem agora ser utilizadas em cada varia´vel para gerar aproximac¸o˜es para as derivadas parciais de uma func¸a˜o de va´rias varia´veis. Assim, temos as seguintes fo´rmulas: progressiva ut(x, t) = u(x, t+ k)− u(x, t) k − k 2 utt(x, ζ) = 1 k ∆tu(x, t)− k 2 utt(x, ζ) (t < ζ < t+ k) (1.11) regressiva ut(x, t) = u(x, t)− u(x, t− k) k + k 2 utt(x, ζ) = 1 k ∇tu(x, t) + k 2 utt(x, ζ), (t− k < ζ < t) (1.12) central ux(x, t) = u(x+ h, t)− u(x− h, t) 2h − h 2 6 uxxx(ξ, t) = 1 2h δxu(x, t)− h 2 6 uxxx(ξ, t), (x − h < ξ < x+ h) uxx(x, t) = u(x+ h, t)− 2u(x, t) + u(x− h, t) h2 − h 2 12 uxxxx(ξ, t) = 1 h2 δ2xu(x, t)− h2 12 uxxxx(ξ, t), (x− h < ξ < x+ h) (1.13) 1.3. PROBLEMA DE VALOR INICIAL EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 15 utt(x, t) = u(x, t+ k)− 2u(x, t) + u(x, t− k) k2 − k 2 12 utttt(x, ζ) = 1 k2 δ2t u(x, t)− k2 12 utttt(x, ζ), (t− h < ζ < t+ h) uxt(x, t) = u(x+ h, t+ k)− u(x+ h, t− k)− u(x− h, t+ k) + u(x− h, t− k) 4hk − h 2 6 uxxxt(ξ1, ζ1)− k 2 6 uxttt(ξ2,ζ2) x− h < ξ1,ξ2 < x+ h, e t− k < ζ1,ζ2 < t+ k, onde denotamos por ut(x, t) a derivada parcial da func¸a˜o u com relac¸a˜o a t e por ∆tu(x, t) a diferenc¸a progressiva de u na varia´vel t. 1.3 Problema de Valor Inicial em Equac¸o˜es Ordina´rias Uma equac¸a˜o diferencial na qual a varia´vel dependente e´ func¸a˜o de apenas uma varia´vel, e´ dita equac¸a˜o diferencial ordina´ria. Se mais de uma varia´vel independente esta´ presente enta˜o teremos uma equac¸a˜o diferencial parcial, como ja´ haviamos dito oportunamente. A teoria das equac¸o˜es parciais e´ consideravelmente mais complexa do que a das equac¸o˜es ordina´rias. Essa observac¸a˜o e´ um tanto mais verdadeira no contexto do tratamento nume´rico, uma vez que a presenc¸a de um nu´mero maior de varia´veis introduz maior chance de erro. O tema principal deste texto e´ o estudo das equac¸o˜es parciais, no entanto, por razo˜es dida´ticas, os conceitos fundamentais sera˜o apresentados no contexto das equac¸o˜es diferenciais ordina´rias. Um problema de valor inicial (PVI) e´ um problema de evoluc¸a˜o, no qual a informac¸a˜o inicial (conhecida), e´ propagada para o interior do domı´nio pela equac¸a˜o diferencial. Matematicamente, o mais simples dos problemas de valor inicial pode ser apresentado na forma: y′ = f(x, y) (1.14) y(a) = α, onde f : IR2 → IR e´ uma func¸a˜o cont´ınua. A func¸a˜o y = y(x) (x ≥ a) e´ a soluc¸a˜o e α e´ o valor inicial em a. Equac¸o˜es ordina´rias de ordem mais alta podem sempre ser transformadas nessa forma, desde que estejamos preparados para admitir que y seja um vetor. Por exemplo, a equac¸a˜o de segunda ordem, y′′ = f(x, y, y′) (1.15) y(a) = α, y′(a) = β, com soluc¸a˜o y(x) e os valores iniciais α e β dados no ponto a, pode ser reescrita na forma vetorial fazendo: y′ = v, y(a) = α v′ = f(x, y, v), v(a) = β. 16 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS Considerando Y = ( y v ) e γ = ( α β ) o problema acima transforma-se na equac¸a˜o vetorial de primeira ordem Y ′ = F (x, Y ), Y (a) = γ onde F (x, Y ) = ( v f(x, y, v) ) . Um ponto fundamental na resoluc¸a˜o de uma equac¸a˜o diferencial, diz respeito a` existeˆncia e unicidade de soluc¸o˜es. Por princ´ıpio, so´ tem sentido a soluc¸a˜o nume´rica de um problema quando este tem soluc¸a˜o. Pode-se ainda argumentar que para determinarmos a soluc¸a˜o nume´rica de um problema esta deveria ser u´nica, pois caso contra´rio o processo nume´rico poderia ficar indeciso sobre qual soluc¸a˜o perseguir. No caso de um problema de valor inicial de equac¸o˜es ordina´rias esta dificuldade esta´ bem resolvida. Vamos supor que a func¸a˜o f(x, y) satisfaz as seguintes condic¸o˜es: 1. f : E → IRn e´ cont´ınua, onde E = {(x, y), x ∈ [a, b], y ∈ IRn}; 2. existe uma constante L tal que para todo x ∈ [a, b] e quaisquer dois vetores y e y∗ em IRn |f(x, y)− f(x, y∗)| ≤ L|y − y∗|. (1.16) Neste caso dizemos que a func¸a˜o f satisfaz a condic¸a˜o de Lipschitz na varia´vel y. Teorema 1.1 (Existeˆncia e Unicidade-Teorema de Picard) Seja f(x, y) satisfazendo as condic¸o˜es acima e seja α um vetor dado. Enta˜o, existe exatamente uma func¸a˜o y(x) com as seguintes propriedades: i) y = y(x) e´ cont´ınua e diferencia´vel para x em [a, b]; ii) y′(x) = f(x, y(x)), x ∈ [a, b]; iii) y(a) = α. Para a prova ver [Coddington 1955]. Exemplos de Me´todos Nume´ricos Euler em 1768, usando diferenc¸as progressivas, desenvolveu uma aproximac¸a˜o para (1.14), que posteriormente descobriu-se tratar-se de um me´todo nume´rico pertencente a` classe dos me´todos de passo mu´ltiplo. Esse me´todo e´ hoje conhecido como Me´todo de Euler. Sua deduc¸a˜o segue os passos abaixo, acompanhe: O intervalo [a, b] e´ dividido em N partes iguais, cada uma de comprimento h, formando um conjunto discreto, com x0 = a e xN = b, Rh = {xi = a+ ih, i = 0, 1, 2, . . . , N}. Aqui h = (b − a)/N . Sejam yi ≈ y(xi) aproximac¸o˜es para y(xi), i = 1, 2, . . .N e y0 = α. Em cada um dos pontos x0, x1, . . . , xN−1, aproximamos a equac¸a˜o diferencial (1.14) por 1.3. PROBLEMA DE VALOR INICIAL EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 17 ∆yi = yi+1 − yi h = f(xi, yi), i = 0, 1, . . . , N − 1 ou, yi+1 − yi = hf(xi, yi), i = 0, 1, . . . , N − 1. Este e´ o me´todo de Euler que e´ um me´todo expl´ıcito. Note que o valor de yi+1 e´ calculado explicitamente em func¸a˜o de yi, mesmo quando a func¸a˜o f e´ na˜o linear. Se no lugar de ∆ fosse usado ∇ ter´ıamos a versa˜o impl´ıcita do Me´todo de Euler: ∇yi = yi − yi−1 h = f(xi, yi), i = 1, . . . , N ou, yi+1 − yi = hf(xi+1, yi+1), i = 0, 1, . . . , N − 1. (1.17) Note que no caso em que f e´ na˜o linear, a equac¸a˜o (1.17) define o vetor yi+1 implicitamente e portanto seu ca´lculo exige a utilizac¸a˜o de me´todos para a soluc¸a˜o de sistemas de equac¸o˜es alge´bricas na˜o lineares, como por exemplo, o me´todo das aproximac¸o˜essucessivas ou o me´todo de Newton. Observe tambe´m que a equac¸a˜o diferencial no processo de discretizac¸a˜o, foi substitu´ıda por uma outra equac¸a˜o chamada equac¸a˜o de diferenc¸as que tem sua pro´pria soluc¸a˜o inde- pendente daquela da equac¸a˜o diferencial. Assim o me´todo nume´rico sera´ considerado eficaz se a soluc¸a˜o da equac¸a˜o de diferenc¸as tiver comportamento similar ao da soluc¸a˜o da equac¸a˜o diferencial. Para mais informac¸o˜es sobre equac¸o˜es de diferenc¸as, ver [18]. Exemplo 1.3.1 Considere o PVI, y′ = −y + x y(0) = 1 (1.18) cuja soluc¸a˜o exata e´ y(x) = x− 1 + 2e−x, de onde obtemos: y(0.1) = 0.9097 y(0.3) = 0.7816 y(0.5) = 0.7131 y(0.7) = 0.6932 y(0.9) = 0.7131 y(0.2) = 0.8375 y(0.4) = 0.7406 y(0.6) = 0.6976 y(0.8) = 0.6986 y(1.0) = 0.7357. A func¸a˜o f e´ dada por: f(x, y) = −y+ x e, portanto o me´todo de Euler expl´ıcito toma a forma: yi+1 = yi + h(−yi + xi). Tomando h = 0.2, encontraremos uma soluc¸a˜o aproximada em [0, 1] resolvendo a equac¸a˜o de diferenc¸as: yi+1 = yi − 0.2yi + 0.2xi ou seja yi+1 = 0.8yi + 0.2xi, cuja soluc¸a˜o para n = 1, 2, . . . , 5 e´: y0 = 1.0 = y(0.0) (condic¸a˜o inicial) y1 = 0.8y0 + 0.2x0 = 0.8000 ≃ y(0.2) y2 = 0.8y1 + 0.2x1 = 0.6800 ≃ y(0.4) y3 = 0.8y2 + 0.2x2 = 0.6240 ≃ y(0.6) y4 = 0.8y3 + 0.2x3 = 0.6192 ≃ y(0.8) y5 = 0.8y4 + 0.2x4 = 0.6554 ≃ y(1.0). 18 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS Tomando h = 0.1, obtemos um problema semelhante, mas com 10 valores de y para serem calculados. Um procedimento ana´logo produz as aproximac¸o˜es: y1 = 0.9000 y3 = 0.7580 y5 = 0.6810 y7 = 0.6570 y9 = 0.6748 y2 = 0.8200 y4 = 0.7122 y6 = 0.6629 y8 = 0.6609 y10 = 0.6974. Note que quando h = 0.1 calculamos a aproximac¸a˜o em um nu´mero maior de pontos e portanto devemos tomar o cuidado de comparar as aproximac¸o˜es para h = 0.2 e h = 0.1 nos mesmos pontos, por exemplo a aproximac¸a˜o y1 obtida com h = 0.2 deve ser comparada com a aproximac¸a˜o y2 do passo h = 0.1 e assim por diante. Vemos assim que a soluc¸a˜o obtida com h = 0.1 e´ melhor que aquela para h = 0.2, isto ocorre porque a equac¸a˜o de diferenc¸as para h = 0.1 representa a equac¸a˜o diferencial de maneira mais fiel do que para h = 0.2. O me´todo de Euler impl´ıcito para o problema (1.18) e´ dado pela equac¸a˜o de diferenc¸as: yi+1 = yi + h(−yi+1 + xi+1), donde yi+1 = 1 1+h (yi + hxi+1) fornece os seguintes valores para h = 0.1, y1 = 0.9182 y3 = 0.8026 y5 = 0.7418 y7 = 0.7263 y9 = 0.7482 y2 = 0.8529 y4 = 0.7660 y6 = 0.7289 y8 = 0.7330 y10 = 0.7711. A figura 1.1 ilustra o comportamento dos me´todos de Euler expl´ıcito e impl´ıcito compara- dos com a soluc¸a˜o exata. Observamos que o me´todo expl´ıcito erra por falta, ja´ o impl´ıcito o faz por excesso. E´ natural, portanto, considerarmos a combinac¸a˜o linear desses dois me´todos, com o ob- jetivo de que os erros se cancelem e possamos obter uma melhor aproximac¸a˜o. Por exemplo, uma combinac¸a˜o linear e´ a me´dia aritme´tica, que fornece o Me´todo dos Trape´zios, tambe´m conhecido como Regra dos Trape´zios: yi+1 − yi = h 2 (f(xi, yi) + f(xi+1, yi+1)), i = 0, 1, . . . , N − 1. tambe´m impl´ıcito e que, para o PVI em questa˜o, produz: y1 = 0.9095 y3 = 0.7816 y5 = 0.7130 y7 = 0.6926 y9 = 0.7125 y2 = 0.8372 y4 = 0.7402 y6 = 0.6970 y8 = 0.6981 y10 = 0.7351. O me´todo dos trape´zios e´ claramente mais preciso que ambos os me´todos anteriores, conforme pode ser observado na figura 1.2. 1.3.1 Convergeˆncia Seja y(xn) a soluc¸a˜o exata do PVI (1.14) no ponto xn e yn uma aproximac¸a˜o obtida por um me´todo nume´rico para essa soluc¸a˜o. Definic¸a˜o 1.1 O erro global no ponto xn e´ definido por: en = y(xn)− yn. 1.3. PROBLEMA DE VALOR INICIAL EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 19 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 0.4 0.6 0.8 1 1.2 * Euler Implicito x Solucao Exata + Euler Explicito x y Figura 1.1: Soluc¸a˜o do problema (1.18) pelos me´todos de Euler Expl´ıcito e Impl´ıcito com h = 0.1 A ana´lise do erro global nos permite estabelecer a convergeˆncia de um me´todo. Esta e´ uma propriedade muito deseja´vel para um me´todo nume´rico, pois ela ira´ nos garantir que ao refinarmos a malha o resultado nume´rico se torna mais pro´ximo do resultado exato. A definic¸a˜o formal de convergeˆncia e´ a seguinte: Definic¸a˜o 1.2 Dizemos que um me´todo nume´rico e´ convergente se o erro global en converge para zero quando n tende para infinito de maneira que o ponto xn permanec¸a fixo. Isto quer dizer que a convergeˆncia esta´ sendo analisada no ponto xn = a+nh e para que este ponto permanec¸a fixo, a quantidade nh deve permanecer fixa, portanto se n tende para infinito necessariamente h deve tender a zero, ou seja, a malha esta´ sendo refinada para cada novo valor de n da sequeˆncia. E´ poss´ıvel verificar a convergeˆncia de um me´todo nume´rico diretamente a partir de sua definic¸a˜o, como faremos a seguir para o me´todo dos trape´zios. No entanto esta e´ uma maneira muito trabalhosa e e´ enta˜o prefer´ıvel fazeˆ-lo indiretamente utilizando os conceitos de consisteˆncia e zero-estabilidade. Ana´lise da convergeˆncia do me´todo dos trape´zios A equac¸a˜o de diferenc¸as para o me´todo dos trape´zios e´: yn+1 = yn + h 2 [f(xn, yn) + f(xn+1, yn+1)] 20 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 0.4 0.6 0.8 1 1.2 x Solucao Exata + Regra dos Trapezios x y Figura 1.2: Soluc¸a˜o do problema (1.18) pelo me´todo dos trape´zios com h = 0.1 e a equac¸a˜o de diferenc¸as para a soluc¸a˜o exata, utilizando a se´rie de Taylor e´: y(xn+1) = y(xn) + h 2 [f(xn, y(xn)) + f(xn+1, y(xn+1))]− h 3 12 y′′′(ξ). Subtraindo a primeira equac¸a˜o da segunda obtemos a seguinte relac¸a˜o para o erro global en: en+1 = en + h 2 [f(xn, y(xn))− f(xn, yn) + f(xn+1, y(xn+1))− f(xn+1, yn+1)]− h 3 12 y′′′(ξ). Tomando o valor absoluto e utilizando a condic¸a˜o de Lipschitz de f , equac¸a˜o (1.16), obtemos a desigualdade: |en+1| ≤ |en|+ h 2 (L|en|+ L|en+1|) + h 3 12 |y′′′(ξ)|. Supondo agora que |y′′′(x)| e´ limitada por 12M no intervalo de interesse, a desigualdade acima transforma-se em: (1− hL 2 )|en+1| ≤ (1 + hL 2 )|en|+ h3M. Admitindo que h seja suficientemente pequeno de forma que (1−hL2 ) > 0, podemos reescrever 1.3. PROBLEMA DE VALOR INICIAL EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 21 a expressa˜o acima como: |en+1| ≤ ( 1 + hL2 1− hL2 ) |en|+ h 3M 1− hL2 . E´ poss´ıvel mostrar por induc¸a˜o sobre n (ver exerc´ıcio (1.8)) que a soluc¸a˜o ξn da equac¸a˜o de diferenc¸as ξn+1 = Aξn +B, com A = 1 + hL2 1− hL2 e B = h3M 1− hL2 (1.19) domina o erro |en|, isto e´ |en| ≤ ξn. A soluc¸a˜o geral de (1.19) e´: ξn = h2M L [( 1 + hL2 1− hL2 )n − 1 ] . (1.20) Reescrevendo o termo 1+hL2 na forma 1−hL2 +hL, substituindo no quociente entre pareˆnteses da expressa˜o (1.20) e simplificando os fatores comuns, esse quociente transforma-se em: 1 + h ( L 1− hL2 ) . Utilizando agora o fato que 1 + x ≤ ex para x ≥ 0, podemos escrever:( 1 + hL2 1− hL2 )n = ( 1 + h ( L 1− hL2 ))n ≤ enh ( L 1−hL 2 ) e portanto a expressa˜o (1.20) transforma-se na desigualdade: ξn ≤ h 2M L ( e nh ( L 1−hL 2 ) − 1 ) . Lembrando que xn = a+ nh e portanto nh = xn − a a expressa˜o acima torna-se: ξn ≤ h 2M L ( e (xn−a) ( L 1−hL 2 ) − 1 ) . Como |en| ≤ ξn obtemos o resultado final na forma: |en| ≤ h 2M L ( e (xn−a) ( L 1−hL 2 ) − 1 ) . (1.21) 22 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS Tomando n tendendo para infinito, ou equivalentemente h tendendo para zero, vemos que |en| tende para zero com ordem O(h2), pois o termo entre pareˆnteses tende para eL(x−a)−1 quando h → 0, onde x (fixo) e´ o ponto onde estamos analisando a convergeˆncia. Agora, o termo eL(x−a) − 1 e´ limitadoindependentemente de h, o que demonstra a convergeˆncia da regra dos trape´zios. Exemplo 1.3.2 Apresentamos a seguir um exemplo ilustrando o fato de que o limitante para o erro global obtido em (1.21) e´ em geral bastante conservador. Consideremos o PVI: y′ = −2y, y(0) = 1 , 0 ≤ x ≤ 1. cuja soluc¸a˜o e´: y(x) = e−2x. Resolvendo esse problema pela regra dos trape´zios com h = 0.1 e com h = 0.01 obtemos os seguintes valores para o erro global ma´ximo: emax = 0.00123160912 no primeiro caso e emax = 0.0000122631795 no segundo. Por outro lado, cal- culando o limitante do erro global atrave´s da fo´rmula (1.21), obtemos os valores 0.005727606 e 0.00005727606 respectivamente para h = 0.1 e h = 0.01. Comparando esses valores, vemos que o limitante e´ 5 vezes o erro verdadeiro. Note que o conceito de convergeˆncia aqui definido na˜o e´ de aplicac¸a˜o pra´tica direta, pois para calcular o erro global precisamos da soluc¸a˜o exata que na˜o esta´ dispon´ıvel. Portanto para testar na pra´tica a convergeˆncia de um me´todo nume´rico, resolve-se o problema para va´rios valores decrescentes de h e observa-se se a sequeˆncia assim obtida esta´ se aproxi- mando de algum valor fixado, ou seja testa-se, de maneira emp´ırica, se essa sequeˆncia e´ de Cauchy e portanto convergente. No entanto, o fato da sequeˆncia ser convergente na˜o implica que ela converge para um limite que e´ a soluc¸a˜o da equac¸a˜o diferencial. Assim, algumas questo˜es pra´ticas relacionadas ao conceito de convergeˆncia merecem ser salientadas, como por exemplo: • Havendo convergeˆncia no sentido pra´tico, a soluc¸a˜o nume´rica obtida representa a soluc¸a˜o do problema? • A discretizac¸a˜o nume´rica introduz alguma caracter´ıstica (“ru´ıdo”) que na˜o esta´ pre- sente na equac¸a˜o original? Neste caso e´ este ru´ıdo controla´vel ou na˜o? • Qua˜o ra´pida e´ a convergeˆncia? As respostas a essas perguntas esta˜o associadas aos conceitos de Consisteˆncia, Zero Estabilidade e Ordem de Convergeˆncia que estudaremos logo a seguir. Consisteˆncia Parece natural admitir-se que a soluc¸a˜o nume´rica aproxime a soluc¸a˜o teo´rica do problema em estudo. No entanto, este na˜o e´ sempre o caso pois a equac¸a˜o de diferenc¸as tem vida pro´pria e portanto sua pro´pria soluc¸a˜o, que na˜o necessariamente guarda relac¸a˜o alguma com a soluc¸a˜o do problema original, a menos que assim seja explicitamente exigido desta equac¸a˜o de diferenc¸as. Essa propriedade, chamada consisteˆncia, e´ imposta a` equac¸a˜o de diferenc¸as e “amarra-a” a` equac¸a˜o diferencial. Inversamente, a soluc¸a˜o do problema cont´ınuo na˜o e´, em geral, soluc¸a˜o da equac¸a˜o de diferenc¸as e o erro cometido ao substituirmos a soluc¸a˜o exata na equac¸a˜o de diferenc¸as e´ chamado de erro de truncamento local. Se o erro de truncamento 1.3. PROBLEMA DE VALOR INICIAL EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 23 local e´ de O(hp), com p ≥ 1 dizemos que esse me´todo tem ordem de consisteˆncia p, ou simplesmente que esse me´todo e´ de ordem p. O erro de truncamento local pode tambe´m ser interpretado como o erro cometido ao calcularmos a soluc¸a˜o num ponto xi+1 sem levar em considerac¸a˜o os erros dos passos ante- riores, isto e´, levando em conta somente o erro cometido no passo atual. Para o me´todo de Euler, suponha que ate´ o ponto xi todos os ca´lculos foram executados exatamente e que o valor em xi+1 devera´ ser aproximado atrave´s do me´todo nume´rico. Essa aproximac¸a˜o tera´ enta˜o erro de truncamento local τi+1, dado por: y(xi+1)− y(xi) h = f(xi, y(xi)) + τi+1 m y′(xi)− h 2 y′′(ξ) = f(xi, y(xi)) + τi+1 Podemos interpretar ainda o erro de truncamento local como aquele erro introduzido ao substituirmos a equac¸a˜o diferencial por uma equac¸a˜o de diferenc¸as. Portanto, para o me´todo de Euler com h → 0 a equac¸a˜o de diferenc¸as aproxima-se da equac¸a˜o diferencial com erro de truncamento local τi+1 = −h2 y′′(ξ), ou seja, com ordem O(h). Dizemos que o me´todo de Euler e´ consistente de ordem 1. Analogamente, o me´todo dos trape´zios e´ consistente de ordem 2, porque o seu erro e´ O(h2). O erro global e´ formado pela acumulac¸a˜o dos erros de truncamento local a cada passo juntamente com os erros de arredondamento. Portanto a ordem de consisteˆncia de um me´todo esta´ relacionada com sua ordem de convergeˆncia. Essa ordem e´ um indicativo da velocidade com que se da´ a convergeˆncia. Assim um me´todo com erro O(h2) deve convergir mais rapidamente que outro com erro O(h). Isso significa, pelo menos teoricamente, que para o mesmo tamanho de passo h um me´todo com ordem mais alta produz aproximac¸o˜es mais precisas. Zero Estabilidade E´ poss´ıvel melhorar a ordem de consisteˆncia de um me´todo simplesmente aumentando-se a quantidade de informac¸o˜es nas quais esse me´todo esta´ baseado. Por exemplo a fo´rmula do ponto me´dio que utiliza 3 pontos, yi+1 − yi−1 = 2hf(xi, yi), i = 1, 2, . . . , N − 1 ou equivalentemente, yi+2 − yi = 2hf(xi+1, yi+1), i = 0, 1, . . . , N − 2 tem ordem de consisteˆncia 2, e a fo´rmula impl´ıcita 3yi+2 − 4yi+1 + yi = 2hf(xi+2, yi+2), i = 0, 1, . . . , N − 2. (1.22) tambe´m tem ordem de consisteˆncia 2. No entanto, como veremos, ao aumentarmos a quantidade de informac¸a˜o utilizada au- mentamos tambe´m a possibilidade de algo dar errado. Na argumentac¸a˜o abaixo, tentare- mos convencer o leitor da necessidade de uma ana´lise mais detalhada das propriedades das 24 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS equac¸o˜es de diferenc¸as com o objetivo de esclarecer onde e como esse “algo” pode dar er- rado. Acompanhe a ana´lise dos exemplos acima, onde estamos aproximando uma equac¸a˜o diferencial de primeira ordem por uma equac¸a˜o de diferenc¸as de segunda ordem, ou seja, uma equac¸a˜o que relaciona 3 valores consecutivos. Similarmente a`s equac¸o˜es diferenciais, uma soluc¸a˜o da equac¸a˜o de diferenc¸as de segunda ordem e´ uma combinac¸a˜o linear de duas soluc¸o˜es ba´sicas. De forma que, enquanto a equac¸a˜o diferencial tem apenas uma soluc¸a˜o ba´sica (no caso em que y ∈ IR) a equac¸a˜o de diferenc¸as tem duas distintas. Assim, essas duas soluc¸o˜es na˜o podem convergir para a soluc¸a˜o do problema, ao mesmo tempo. A soluc¸a˜o que na˜o converge para a soluc¸a˜o exata e´ denominada soluc¸a˜o espu´ria a` qual na˜o e´ permitido crescer de maneira ilimitada, sob pena de inviabiliziar a aplicac¸a˜o do me´todo. O efeito das soluc¸o˜es espu´rias na soluc¸a˜o nume´rica e´, comumente, o aparecimento de oscilac¸o˜es. Quando o me´todo e´ razoa´vel essas oscilac¸o˜es decrescem com a evoluc¸a˜o, o que significa que as soluc¸o˜es espu´rias decaem para zero a` medida que i cresce. Um primeiro teste para esta condic¸a˜o de decaimento e´ feito para o caso em que f(x, y) = 0, impondo que a soluc¸a˜o do me´todo deva oscilar em torno de uma constante. Se o me´todo e´ razoa´vel, as oscilac¸o˜es se dissipam e o me´todo e´ dito ser zero-esta´vel; caso contra´rio as oscilac¸o˜es sa˜o amplificadas prejudicando a convergeˆncia. Definic¸a˜o 1.3 A condic¸a˜o necessa´ria para um me´todo ser zero-esta´vel e´ que as soluc¸o˜es ba´sicas da equac¸a˜o de diferenc¸as associada, considerando f(x, y) = 0, sejam limitadas. As soluc¸o˜es ba´sicas da equac¸a˜o de diferenc¸as sa˜o dadas pelas ra´ızes do polinoˆmio caracte- r´ıstico a ela associado. Por exemplo, a fo´rmula do ponto me´dio, yi+2−yi = 0 tem polinoˆmio caracter´ıstico ρ(z) = z2 − 1 = 0, cujas ra´ızes sa˜o 1 e −1, e as soluc¸o˜es ba´sicas, ϕ e ψ, dadas por ϕn = (1) n e ψn = (−1)n, n = 1, 2, . . . Ja´ a fo´rmula 3yi+2−4yi+1+yi = 0 tem polinoˆmio caracter´ıstico ρ(z) = 3z2 − 4z + 1 = 0, cujas ra´ızes sa˜o 1 e 13 , e as soluc¸o˜es ba´sicas, ϕ e ψ, dadas por ϕn = (1) n e ψn = ( 1 3 ) n, n = 1, 2, . . .. Note que o comportamento dos dois me´todos e´ distinto; enquanto a fo´rmula do ponto me´dio conserva a amplitude das oscilac¸o˜es, a fo´rmula (1.22) amortece-as. Como em nenhum dos dois casos,as oscilac¸o˜es sa˜o amplificadas, isto e´, nenhuma das soluc¸o˜es ba´sicas cresce, ambos os me´todos sa˜o zero-esta´veis. As condic¸o˜es: consisteˆncia e zero-estabilidade sa˜o necessa´rias e suficientes para a con- vergeˆncia de um me´todo [20]. Teorema 1.2 (Equivaleˆncia de Lax) No contexto de problema de valor inicial para equac¸o˜es ordina´rias, um me´todo baseado em diferenc¸as finitas e´ convergente se e somente se ele e´ consistente e zero-esta´vel. E´ importante notar entretanto, que no caso de equac¸o˜es parciais, apesar de existir de- terminada analogia, os resultados na˜o sa˜o suficientemente abrangentes, ou seja, sa˜o va´lidos somente em alguns casos particulares. O teorema acima garante a convergeˆncia, mas na˜o especifica a ordem de convergeˆncia. Como regra, pode-se dizer que a ordem de convergeˆncia e´ a mesma da consisteˆncia. Estabilidade Os conceitos estudados ate´ aqui dizem respeito a h → 0. No entanto, quanto menor o valor de h, tanto maior sera´ o nu´mero de ca´lculos que devera˜o ser efetuados para produzir 1.3. PROBLEMA DE VALOR INICIAL EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 25 uma soluc¸a˜o aproximada em determinado ponto x, fixado. Isto pode levar a um acu´mulo, na˜o controlado, de erros e nesse caso dizemos que esse me´todo e´ na˜o esta´vel ou insta´vel. A estabilidade (h fixo) e´ muito importante para problemas que exigem um nu´mero muito grande de aplicac¸o˜es repetidas de um me´todo para obter a soluc¸a˜o em um dado intervalo. Como em geral na˜o e´ poss´ıvel predizer o nu´mero de passos necessa´rios para obtenc¸a˜o da soluc¸a˜o, e´ aconselha´vel que, por precauc¸a˜o, tenhamos um controle do comportamento do erro, isto e´, um controle da propagac¸a˜o do erro. Na verdade, a escolha do tamanho h da malha esta´ intimamente ligada a` estabilidade do me´todo, e e´ o paraˆmetro atrave´s do qual e´ poss´ıvel exercer esse controle. Podemos interpretar um me´todo nume´rico como uma ma´quina de produzir nu´meros a partir de dados iniciais. Como esses dados iniciais conte´m sempre erro (de arredondamento do computador por exemplo), se essa ma´quina tiver o defeito de amplifica´-los, em pouco tempo o crescimento do erro dominara´ a soluc¸a˜o produzida pela ma´quina e esta perdera´ seu significado. Vamos ilustrar essas ide´ias pela ana´lise, em paralelo, de dois me´todos nume´ricos. Considere os me´todos do ponto me´dio e do trape´zio yi+2 − yi = 2hf(xi+1, yi+1), i = 0, 1, . . . , N − 2 (1.23) yi+1 − yi = h 2 (f(xi, yi) + f(xi+1, yi+1)), i = 0, 1, . . . , N − 1. (1.24) Substituindo a soluc¸a˜o exata nas expresso˜es (1.23-1.24) e considerando a definic¸a˜o de erro de truncamento local obtemos: y(xi+2)− y(xi) = 2hf(xi+1, y(xi+1)) + τi+2, i = 0, 1, . . . , N − 2 (1.25) y(xi+1)− y(xi) = h 2 (f(xi, y(xi)) + f(xi+1, y(xi+1))) + τi+1, i = 0, 1, . . . , N − 1. (1.26) Considerando o erro global ei = y(xi)−yi podemos analisar seu comportamento derivando uma equac¸a˜o que o represente. Na verdade, o erro global esta´ intimamente relacionado com o erro de truncamento local, e em geral satisfaz uma equac¸a˜o de diferenc¸as obtida a partir da expressa˜o do me´todo nume´rico. Por exemplo, subtraindo (1.25) de (1.23), tem-se, para o me´todo do ponto me´dio: ei+2 − ei = 2h(f(xi+1, y(xi+1))− f(xi+1, yi+1)) + τi+2 = 2hfy(xi+1, ζ)ei+1 + τi+2, i = 0, 1, . . . , N − 2. (1.27) Aqui foi usado o teorema do valor me´dio e a notac¸a˜o ∂f/∂y = fy. Analogamente, no caso do me´todo do Trape´zio, subtraindo-se (1.26) de (1.24) obte´m-se: ei+1 − ei = h 2 (fy(xi, ζ1)ei + fy(xi+1, ζ2)ei+1) + τi+1, i = 0, 1, . . . , N − 1. (1.28) As equac¸o˜es (1.27)-(1.28) sa˜o aquelas que determinam o erro global como func¸a˜o do erro de trucamento local para os exemplos da regra do ponto me´dio e trape´zios. Dessas considerac¸o˜es derivamos a motivac¸a˜o para o uso de uma equac¸a˜o teste para a verificac¸a˜o da estabilidade. As equac¸o˜es (1.27) e (1.28) sugerem que o erro deve satisfazer 26 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS uma equac¸a˜o do tipo e′ = λe+ g, onde λ = 2hfy(xi+1, ζ) em (1.27) e λ tem uma expressa˜o um pouco mais complicada no caso (1.28). Obviamente λ na˜o sera´ sempre constante, mas essas expresso˜es nos motivam a definir a estabilidade, baseada no problema teste y′ = λy, pois nesse caso, assumindo que o erro de truncamento local satisfaz τi = T , as equac¸o˜es (1.27) e (1.28) se transformam, respectivamente, em: ei+2 = 2hλei+1 + ei + T (1.29) ei+1 = ei + hλ 2 (ei+1 + ei) + T que podem ser solucionadas, permitindo uma ana´lise detalhada do seu comportamento. Essa ana´lise e´ feita para cada me´todo em separado, assim, por exemplo, no caso da regra do ponto me´dio, como (1.29) e´ uma equac¸a˜o para o erro global, deseja-se que suas soluc¸o˜es sejam decrescentes para que na˜o haja acu´mulo desse erro. Como ja´ sabemos as soluc¸o˜es sera˜o combinac¸o˜es lineares de (ξ1) n e (ξ2) n onde ξ1 e ξ2 sa˜o as duas ra´ızes do polinoˆmio π(r, hλ) = r2−2hλr−1 = 0, que e´ chamado de polinoˆmio de estabilidade da regra do ponto me´dio. Portanto para que o erro seja decrescente precisamos impor a condic¸a˜o de que as ra´ızes ξ1 e ξ2 tenham mo´dulo menor que 1. Observe que essas ra´ızes sa˜o func¸o˜es de hλ e portanto a regia˜o do plano complexo h¯ = hλ para a qual essas ra´ızes esta˜o no disco unita´rio e´ chamada de regia˜o de estabilidade absoluta do me´todo. O estudo da estabilidade esta´ relacionado com o crescimento ou na˜o do erro global quando o nu´mero de aplicac¸o˜es do me´todo nume´rico aumenta, mantendo-se o passo h fixo. Para simplificar a ana´lise, a estabilidade e´ verificada por meio da aplicac¸a˜o do me´todo a` equac¸a˜o teste y′ = λy. Note que isso significa consideramos T = 0 em (1.29, termo que na˜o influencia no crescimento de ei. A seguir apresentamos uma breve ana´lise da estabilidade para os me´todos mais populares. • Euler expl´ıcito ei+1 − ei = hλei ⇒ ei+1 = (1 + hλ)ei ⇒ estabilidade para −2 ≤ hλ ≤ 0. Este me´todo e´ enta˜o condicionalmente esta´vel. • Euler impl´ıcito ei+1 − ei = hλei+1 ⇒ ei+1 = 1(1−hλ)ei ⇒ estabilidade para hλ ≤ 0. Este me´todo e´ considerado absolutamente esta´vel. • Trape´zio ei+1 − ei = hλ2 (ei+1 + ei) ⇒ ei+1 = (1+hλ 2 ) (1−hλ 2 ) ei ⇒ estabilidade para hλ ≤ 0. Este me´todo e´ considerado absolutamente esta´vel. • Ponto me´dio ei+2 − 2hλei+1 − ei = 0 ⇒ as ra´ızes sa˜o: ζ1,2 = hλ ± √ 1 + (hλ)2 e teremos estabilidade para | ζ1,2 |< 1. • Fo´rmula 3(1 + 2λh)ei+2 − 4ei+1 + ei = 0⇒ as ra´ızes sa˜o: ζ1,2 = 2± √ 1−6hλ 3+6hλ e teremos estabilidade para | ζ1,2 |< 1. Observac¸a˜o 1.3.1 Um me´todo absolutamente esta´vel permite qualquer tamanho de passo h, enquanto um condicionalmente esta´vel impo˜e restric¸a˜o ao passo h. Observac¸a˜o 1.3.2 Para -hλ crescente, o me´todo de Euler impl´ıcito apresenta amorteci- mento e o do Trape´zio apresenta oscilac¸a˜o, pois o fator de amplificac¸a˜o do me´todo de Euler 1.3. PROBLEMA DE VALOR INICIAL EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 27 impl´ıcito e´ (1 − hλ)−1 → 0 e o do trape´zio e´ (1+hλ2 ) (1−hλ 2 ) → −1 quando −hλ → ∞. Portanto, esses me´todos sa˜o mais indicados, respectivamente, para problemas que apresentam soluc¸a˜o com decaimento e para problemas com soluc¸a˜o perio´dica. No contexto das equac¸o˜es parciais, um me´todo similar ao de Euler impl´ıcito seria adequado para equac¸o˜es parabo´licas e um similar ao Trape´zio, mais adequado para equac¸o˜es hiperbo´licas (na forma de conservac¸a˜o). Em resumo, nesta sec¸a˜o apresentamos os principais conceitos e delineamos as maiores dificuldades dos me´todos nume´ricos e quais as ferramentas para diagnostica´-las. Na pra´tica pore´m, podem acontecer dificuldades extras que sa˜o inerentes ao problema. Nesse caso, me´todos esta´veis gerais podem na˜o ser robustos o suficiente para fazer frente ao problema e e´ recomenda´vel a construc¸a˜o de me´todos especiais, produzidos sob encomenda, que levemem conta a natureza do problema. Exemplos Nesta sec¸a˜o apresentamos exemplos nume´ricos ilustrando o efeito pra´tico de cada um dos conceitos de consisteˆncia, zero-estabilidade e estabilidade. Seja o PVI: y′ = 4x √ y, y(0) = 1, 0 ≤ x ≤ 2. cuja soluc¸a˜o exata e´ y(x) = (1 + x2)2. Consideremos primeiramente a soluc¸a˜o desse PVI pelo seguinte me´todo expl´ıcito de 2 passos: yn+2 = yn+1 + h 3 (3fn+1 − 2fn) (1.30) que e´ zero-esta´vel, mas na˜o e´ consistente, como pode ser facilmente testado, ver exerc´ıcio (1.10). Ilustrac¸a˜o da Consisteˆncia x |Erro| |Erro| |Erro| h = 0.1 h = 0.05 h = 0.025 0 0 0 0 0.1 0 5.07E-03 8.82E-03 0.2 2.11E-02 3.61E-02 4.50E-02 0.3 7.21E-02 9.76E-02 1.12E-01 0.4 1.57E-01 1.95E-01 2.15E-01 0.5 2.85E-01 3.34E-01 3.61E-01 ... ... ... ... 2.0 1.82E+01 1.89E+01 1.92E+01 Como o me´todo e´ de dois passos necessitamos duas condic¸o˜es iniciais para comec¸ar o processo de ca´lculo, tomamos y0 = 1 e y1 = y(h) = (1 + h 2)2. Note que quando o passo diminui o erro em y(2) aumenta mas na˜o de maneira explosiva. A sequeˆncia de soluc¸o˜es nume´ricas converge para uma func¸a˜o y(x) a` medida que h→ 0, mas como o me´todo na˜o e´ consistente, essa func¸a˜o na˜o e´ soluc¸a˜o do PVI dado, e sim de um outro problema. 28 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS Nosso pro´ximo exemplo ilustra as consequeˆncias desastrosas da falta da zero-estabilidade. Seja o me´todo nume´rico expl´ıcito de dois passos: yn+2 = (1 + a)yn+1 − ayn + h 2 ((3− a)fn+1 − (1 + a)fn) (1.31) Veja o exerc´ıcio (1.10) para concluir que esse me´todo e´ zero-esta´vel para a = 0, mas na˜o o e´ quando a = −5. Assim: Ilustrac¸a˜o da Zero-Estabilidade x |Erro| |Erro| |Erro| |Erro| |Erro| |Erro| a = 0 a = −5 a = 0 a = −5 a = 0 a = −5 h = 0.1 h = 0.1 h = 0.05 h = 0.05 h = 0.025 h = 0.025 0 0 0 0 0 0 0 0.1 0 0 5.63E-05 2.50E-05 2.23E-05 2.8E-05 0.2 9.00E-04 4.00E-04 3.61E-04 4.42E-04 1.09E-04 1.65E-02 0.3 2.85E-03 1.14E-03 9.38E-04 1.03E-02 2.64E-04 1.01E+02 0.4 5.97E-0.3 6.73E-3 1.82E-03 2.50E-01 4.95E-04 6.29E+3 0.5 1.04E-02 3.04E-02 3.05E-03 5.99E+00 8.17E-04 3.93E+6 ... ... ... ... ... ... ... 2.0 3.67E-01 6.96E+08 9.63E-02 5.46E+21 4.26E-02 3.41E+48 Observe que no caso a = 0 ao refinarmos a malha as aproximac¸o˜es produzidas ficam mel- hores, mas o mesmo na˜o acontece com a = −5. No primeiro caso o me´todo e´ convergente e no segundo na˜o. Finalmente vamos exemplificar o efeito da estabilidade absoluta no comportamento da soluc¸a˜o nume´rica de longo prazo. Para isso consideremos o PVI y′ = −10(y− 1)2 y(0) = 2 cuja soluc¸a˜o exata e´ y(x) = 1+1/(1+ 10x). Resolvemos esse problema utilizando o me´todo de Simpson yn+2 − yn = h 3 (fn+2 + 4fn+1 + fn) com h = 0.1 que e´ impl´ıcito de dois passos, mas na˜o e´ absolutamente esta´vel, veja o exerc´ıcio (1.10). Observe o crescimento do erro ao longo do processo. Ilustrac¸a˜o dos efeitos da estabilidade x 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 |Erro| 2.96E-02 5.64E-02 4.58E-02 9.59E-02 2.68E-01 x 3.0 3.5 4.0 4.8 4.9 |Erro| 1.28E-01 3.02E-01 1.73E-01 9.79E-01 Complexo Estamos utilizando a palavra complexo na u´ltima coluna significando que o resultado pro- duzido pelo me´todo de Simpson e´ complexo. Isto ocorre porque, sendo o me´todo de Simpson impl´ıcito, devemos resolver uma equac¸a˜o do segundo grau para determinar a soluc¸a˜o. Essa equac¸a˜o e´ resolvida exatamente, resultando em ra´ızes complexas. Na pra´tica, a resoluc¸a˜o exata, na˜o seria poss´ıvel e ter´ıamos que resolveˆ-la por um me´todo iterativo, que teria se´rios problemas de convergeˆncia, dado que a equac¸a˜o na˜o possui soluc¸a˜o real. 1.4. PROBLEMA DE VALOR DE FRONTEIRA EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 29 1.4 Problema de Valor de Fronteira em Equac¸o˜es Or- dina´rias No problema de valor inicial (PVI), como visto, uma condic¸a˜o inicial se propaga passo a passo. No caso do problema de segunda ordem, foi preciso fixarmos uma condic¸a˜o inicial e tambe´m uma inclinac¸a˜o (a derivada da soluc¸a˜o), ambas no mesmo ponto veja (1.15). Para um problema de valor de fronteira (PVF) em equac¸o˜es ordina´rias e´ preciso fixar valores da soluc¸a˜o em 2 pontos distintos, o que significa que a soluc¸a˜o propaga a condic¸a˜o inicial em x = a, na direc¸a˜o do valor fixado em x = b, e vice-versa. E´ intuitivo que isso nem sempre e´ poss´ıvel, ou seja, a condic¸a˜o de existeˆncia e unicidade de soluc¸a˜o e´ mais complicada nestes casos. Por exemplo, y′′ + π2y = 0, y(0) = 0, y(1) = 1 na˜o tem soluc¸a˜o, y′′ + π2y = 0, y(0) = 0, y(1) = 0 tem infinitas soluc¸o˜es. Um dos PVFs mais simples e de alguma importaˆncia pra´tica pode ser colocado como: Sejam quatro constantes a, b, α e β, com a < b, e uma equac¸a˜o diferencial de segunda ordem y′′ = f(x, y, y′), (1.32) o problema consiste em encontrar uma func¸a˜o y(x) ∈ C2[a, b], satisfazendo (1.32) em a < x < b, e as duas condic¸o˜es de fronteira: y(a) = α y(b) = β. (1.33) Teorema 1.3 (Existeˆncia e Unicidade) Se o PVF (1.32) com as condic¸o˜es de fronteira (1.33) e´ tal que, para −∞ < a < b < ∞, com α e β constantes arbitra´rias; a func¸a˜o f e´ Lipschitziana com relac¸a˜o a`s varia´veis y e y′, fy e´ cont´ınua e satisfaz fy > 0 e ainda fy′ e´ limitada para a ≤ x ≤ b e −∞ < y <∞, enta˜o ele tem soluc¸a˜o u´nica. [4] O problema a ser resolvido pode apresentar dificuldades inerentes se ele for mal condi- cionado. Por exemplo, considere o problema: y′′ + k2y = 2k2x, y(0) = 0, y(1) = 1, cuja soluc¸a˜o geral e´: y(x) = c1 sen kx+ c2cos kx + 2x. Das condic¸o˜es de contorno tem-se c2 = 0 e c1 = −2/ sen k. Para k = π, o problema na˜o tem soluc¸a˜o. Para k = π + ε, ε pequeno, c1 = −2/ sen ε ≃ 2ε−1, ou seja, uma pequena variac¸a˜o nos dados do problema implica em grande variac¸a˜o na soluc¸a˜o que passou a existir. O problema acima constitui um exemplo de um problema mal posto, ou mal condicionado. Note que instabilidade e´ uma dificuldade do me´todo nume´rico, enquanto mal condiciona- mento diz respeito ao problema. A soluc¸a˜o do problema (1.32) pode ser obtida via me´todos para problema de valor inicial, (Me´todo Shooting), que usa a condic¸a˜o dada em x = a e escolhe um valor para a derivada (inclinac¸a˜o) tambe´m em x = a, calcula a soluc¸a˜o ate´ x = b e, de acordo com o resultado, ajusta o valor da derivada em x = a e resolve novamente, repetindo estes passos ate´ que a 30 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS soluc¸a˜o propagando-se a partir de a encontre o valor de fronteira fixado em b. Na˜o vamos detalhar este me´todo aqui, vide [Ames 1992]. Outra abordagem procura resolver o problema, como problema de contorno; o me´todo, didaticamente mais recomendado e´ aquele que utiliza diferenc¸as finitas, o qual detalharemos a seguir. 1.4.1 Me´todos de Diferenc¸as Finitas Consideraremos aqui, Me´todos de Diferenc¸as Finitas para soluc¸a˜o de PVF que na˜o sa˜o baseados na resoluc¸a˜o de problemas de valor inicial. O objetivo e´ fornecer um apanhado geral, enfatizando os conceitos e dificuldades mais frequentes, como e´ o caso da restric¸a˜o do tamanho h da malha e do tratamento da condic¸a˜o de fronteira com derivadas. Seja o PVF y′′(x) − p(x)y′(x)− q(x)y(x) = r(x) y(a) = α, y(b) = β que sera´ rescrito usando-se o operador L, como L[y(x)] ≡ y′′(x) − p(x)y′(x)− q(x)y(x) = r(x), (1.34) y(a) = α, y(b) = β. Impomos a restric¸a˜o q(x) ≥ Q∗ > 0, a ≤ x ≤ b que e´ mais restritiva do que Q∗ ≥ 0 requerida para a prova de existeˆncia e unicidade de soluc¸a˜o . Supomos no que segue, que o PVF objeto de estudo possui uma u´nica soluc¸a˜o com quatro derivadas cont´ınuas em a ≤ x ≤ b. Usaremos uma malha uniforme com h = b−aN+1 e diferenc¸as centradas para aproximar L[y(x)] para obter: Lh[yj ] ≡ yj+1 − 2yj + yj−1 h2 −p(xj)yj+1 − yj−1 2h −q(xj)yj = r(xj), j = 1, 2, . . . , N. (1.35) As condic¸o˜es de fronteira sa˜o substitu´ıdas por: y0 = α, yN+1 = β. (1.36)Multiplicando (1.35) por −h22 , obtemos: −h 2 2 Lh[yj ] ≡ −1 2 {yj+1 − 2yj + yj−1}+ p(xj)h 4 {yj+1 − yj−1}+ q(xj) h2 2 yj = −h 2 2 r(xj), j = 1, 2, . . . , N. Rearranjando os termos de mesmo ı´ndice: −h 2 2 Lh[yj ] ≡ −1 2 { 1 + h 2 p(xj) } yj−1 + { 1 + h2 2 q(xj) } yj 1.4. PROBLEMA DE VALOR DE FRONTEIRA EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 31 −1 2 { 1− h 2 p(xj) } yj+1 = −h 2 2 r(xj), j = 1, 2, . . .N. Fazendo: aj ≡ 1 + h 2 2 q(xj), bj ≡ 1 2 { 1 + h 2 p(xj) } , cj ≡ 1 2 { 1− h 2 p(xj) } , chegamos a` equac¸a˜o −h 2 2 Lh[yj ] ≡ −bjyj−1 + ajyj − cjyj+1 = −h 2 2 r(xj), j = 1, 2, . . .N. que em notac¸a˜o vetorial, juntamente com as condic¸o˜es de fronteira (1.36), pode ser escrita na forma: Ay = r (1.37) onde A ≡ a1 −c1 0 · · · 0 −b2 a2 −c2 · · · 0 ... ... ... ... ... 0 · · · −bN−1 aN−1 −cN−1 0 · · · 0 −bN aN , (1.38) y ≡ y1 y2 ... yN−1 yN e r ≡ − h2 2 r(x1)− 2b1αh2 r(x2) ... r(xN−1) r(xN )− 2cNβh2 . Assim, resolvendo o sistema linear de ordem N (1.37), cuja matriz dos coeficientes, A, e´ tridiagonal, determinamos os valores de yj, j = 1, 2, . . . , N , que desejamos sejam aproximac¸o˜es da soluc¸a˜o exata, y(xj), onde xj = x0 + jh. Tendo constru´ıdo o me´todo, deve-se procurar conhecer a consisteˆncia e convergeˆncia do mesmo. Um ponto novo aqui e´ que deve-se tambe´m cuidar da existeˆncia e unicidade da soluc¸a˜o nume´rica. Se A e´ invers´ıvel tem-se soluc¸a˜o u´nica. Se A for quase singular, o me´todo sera´ na˜o esta´vel. Note que isso pode ocorrer quando h → 0 e a dimensa˜o de A cresce. Quando A e´ quase singular, os elementos de A−1 crescem com o aumento da ordem de A, deteriorando o erro e consequentemente a convergeˆncia. Mais uma vez, estabilidade e consisteˆncia equivalem a convergeˆncia. 32 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS Um crite´rio a ser considerado, e´ criar condic¸o˜es para que A seja diagonalmente domi- nante. Vamos exigir que o espac¸amento h seja ta˜o pequeno que h 2 |p(xj)| ≤ 1, j = 1, 2, . . . , N. (1.39) Enta˜o, segue que |bj|+ |cj | = bj + cj = 1 e aj > 1. Logo, |a1| > |c1|; |aj | > |bj|+ |cj |, j = 2, 3, . . . , N − 1; |aN | > |bN |; e, portanto, a matriz A e´ diagonalmente dominante, por conseguinte invers´ıvel e o problema discreto tem soluc¸a˜o u´nica. Na linguagem dos me´todos nume´ricos para problemas de valor inicial a condic¸a˜o (1.39) representa uma condic¸a˜o de estabilidade. Note que quanto mais acentuada for a dominaˆncia da diagonal de A, mais esta´vel sera´ o me´todo. A soluc¸a˜o de (1.37) pode, assim, ser obtida por simples fatorac¸a˜o de A (Gauss, por exemplo). Sendo A diagonalmente dominante, a fatorac¸a˜o e´ esta´vel e na˜o e´ necessa´rio pivotamento. E´ claro que isto fornece uma prova da existeˆncia e unicidade da soluc¸a˜o nume´rica de (1.37), desde que (1.39) seja satisfeita. Vamos, agora, estimar o erro na aproximac¸a˜o nume´rica definida em (1.35). O erro de truncamento local e´ obtido substituindo-se a soluc¸a˜o exata na equac¸a˜o (1.35), assim definimos τj , o erro de truncamento local, por: Lh[y(xj)] − r(xj) = τj , j = 1, 2, . . . , N. (1.40) Como y(x) e´ soluc¸a˜o de (1.34) temos, τj = Lh[y(xj)]− L[y(xj)] = y(xj − h)− 2y(xj) + y(xj + h) h2 − p(xj)y(xj + h)− y(xj − h) 2h −q(xj)y(xj)− [y′′(xj)− p(xj)y′(xj)− q(xj)y(xj)] = [ y(xj − h)− 2y(xj) + y(xj + h) h2 − y′′(xj) ] −p(xj) [ y(xj + h)− y(xj − h) 2h − y′(xj) ] , j = 1, 2, . . . , N. (1.41) Supondo que y(4)(x) e´ cont´ınua e usando a expressa˜o do erro nas fo´rmulas centradas obtemos: 1.4. PROBLEMA DE VALOR DE FRONTEIRA EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 33 τj = h2 12 [y(4)(ξj)− 2p(xj)y′′′(ηj)], j = 1, 2, . . . , N, (1.42) onde ξj ,ηj ∈ [xj−1, xj+1]. Assim o erro de truncamento local e´ O(h2) e quando h → 0 o me´todo tende para a equac¸a˜o diferencial com ordem O(h2). Dizemos que o me´todo e´ consistente de ordem 2. A estimativa de erro global e´ obtida do seguinte resultado: Teorema 1.4 Se o espac¸amento h da malha satisfaz (1.39) enta˜o, |y(xj)− yj | ≤ h2 ( M4 + 2P ∗M3 12Q∗ ) , j = 0, 1, . . . , N + 1, onde y(x) e´ a soluc¸a˜o exata de (1.34), yi e´ a soluc¸a˜o calculada de (1.35) e P ∗ ≡ maxx∈[a,b] |p(x)|, M3 ≡ maxx∈[a,b] |y′′′(x)|, M4 ≡ maxx∈[a,b] ∣∣y(4)(x)∣∣. Prova: Sejam ej = y(xj)− yj , j = 0, 1, . . . , N + 1, ve: vetor dos erros ej e vτ : vetor dos erros τj . Subtraindo (1.35) de (1.40) obtemos: Lh[y(xj)]− Lh[yj ] = r(xj)− r(xj) + τj = τj , j = 1, 2, . . . , N. Logo, Lh[y(xj)− yj] = τj , ou Lh[ej ] = τj . Esta u´ltima expressa˜o nos diz que o erro global satisfaz a mesma equac¸a˜o de diferenc¸as que define o me´todo, tendo como lado direito o erro de truncamento local. Multiplicando ambos os membros da expressa˜o acima por −h22 obtemos: −h 2 2 Lh[ej] = −h 2 2 τj , j = 1, 2, . . . , N, (1.43) que utilizando a mesma notac¸a˜o matricial de (1.37) produz, Ave = −h22 vτ , donde segue que ve = −h22 A−1vτ , e mais uma vez observa-se a necessidade dos elementos de A−1 na˜o crescerem (estabilidade). Os vetores ve e vτ sa˜o formados respectivamente pelas compo- nentes do erro global e do erro de truncamento local. Escrevendo individualmente cada equac¸a˜o de (1.43) obtemos −bjej−1 + ajej − cjej+1 = −h 2 2 τj , j = 1, 2, . . . , N. Da´ı, ajej = bjej−1 + cjej+1 − h 2 2 τj , j = 1, 2, . . . , N |ajej | ≤ |bjej−1|+ |cjej+1|+ h 2 2 |τj |, j = 1, 2, . . . , N |ajej | ≤ (|bj |+ |cj |)e+ h 2 2 |τj |, j = 1, 2, . . . , N 34 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS e usando (1.39) |ajej | ≤ e+ h 2 2 τ, onde: e ≡ max 0≤j≤N+1 |ej | e τ ≡ max 1≤j≤N |τj |. Entretanto, tambe´m pela condic¸a˜o (1.39) segue que, |aj | = aj ≥ 1 + h 2 2 Q∗. Logo, ( 1 + h2 2 Q∗ ) |ej| ≤ |ajej | ≤ e+ h 2 2 τ, j = 1, 2, . . . , N. De (1.36) temos e0 = eN+1 = 0. Portanto, a desigualdade acima vale para todo j em 0 ≤ j ≤ N + 1. Assim, conclu´ımos que ( 1 + h2 2 Q∗ ) e ≤ e+ h 2 2 τ ou seja, h2 2 Q∗e ≤ h 2 2 τ. Da´ı, e ≤ 1 Q∗ τ. Finalmente, usando as hipo´teses do teorema em (1.42) encontramos que, |τj | ≤ h 2 12 (M4 + 2P ∗M3) , j = 1, 2, . . . , N. Logo, τ ≤ h 2 12 (M4 + 2P ∗M3) , e portanto, e ≤ h2 ( M4 + 2P ∗M3 12Q∗ ) .2 Do teorema 1.4 vemos que, sob a condic¸a˜o (1.39), a soluc¸a˜o discreta converge para a soluc¸a˜o exata quando h→ 0, e ainda, que o erro e´ O(h2). Muitas vezes, na pra´tica, esta ana´lise e´ dif´ıcil ou imposs´ıvel, calcula-se enta˜o a soluc¸a˜o com va´rios tamanhos de h, observando-se o comportamento das soluc¸o˜es obtidas. Isto permite-nos ter uma ide´ia da convergeˆncia e precisa˜o dos resultados (nu´mero de d´ıgitos fixados) e tambe´m da taxa de convergeˆncia. Por exemplo, se o erro e´ O(h2), recalcular o problema com nova malha de espac¸amento h2 deve resultar na duplicac¸a˜o da precisa˜o. Alguns aspectos interessantes podem ainda ser considerados. Por exemplo: 1.4. PROBLEMA DE VALOR DE FRONTEIRA EM EQUAC¸O˜ES ORDINA´RIAS 35 i. outro tipo de condic¸a˜o de fronteira impo˜e alguma dificuldade? ii. e´ poss´ıvel relaxar a condic¸a˜o (1.39) permitindo o uso de h maior? iii. e´ possivel obter me´todos mais precisos? iv. ocorre alguma dificuldade no caso da equac¸a˜o ser na˜o linear? Vamos tratar de alguns desses aspectos a seguir. Considere que no lugar de y(a) = α em (1.36), a condic¸a˜o dada seja y′(a) + γy(a) = 0. Essa nova condic¸a˜o tem consequeˆncias no sistema (1.37) que passamos a analisar. Uma primeira abordagem e´ tomar uma aproximac¸a˜o progressiva (de ordem O(h)) para a derivada, ou seja, y′(a) ≃ y(a+ h)− y(a) h= y1 − y0 h donde y1 − y0 + hγy0 = 0⇒ y0 = y1 1− hγ que incorporada ao sistema, modifica apenas a primeira equac¸a˜o para (a1 − b1 1− hγ )y1 − c1y2 = − h2 2 r(x0) deixando o restante inalterado. O inconveniente aqui e´ o fato de introduzirmos um erro local de O(h) que deteriora um pouco o resultado final. Uma outra abordagem, que recupera a ordem 2, se da´ pelo uso de uma aproximac¸a˜o central y′(a) ≃ y(a+ h)− y(a− h) 2h = y1 − y−1 2h onde y−1 e´ introduzido artificialmente. Assim, y1 − y−1 + 2hγy0 = 0. Como uma nova inco´gnita foi introduzida, nova equac¸a˜o e´ necessa´ria. Esta pode ser providenciada considerando-se como primeira equac¸a˜o em (1.37), a equac¸a˜o obtida para j = 0 −b0y−1 + a0y0 − c0y1 = −h 2 2 r(x0), que por substituic¸a˜o de y−1 fica (a0 − b02hγ)y0 − (b0 + c0)y1 = −h 2 2 r(x0). 36 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS O sistema (1.37) fica agora com uma equac¸a˜o extra, entrando y0 como inco´gnita. Apesar de pequeno acre´scimo no esforc¸o computacional, o resultado final e´ O(h2), conservando-se a ordem anterior. Com relac¸a˜o a` utilizac¸a˜o de tamanhos de passo maiores, e´ poss´ıvel a construc¸a˜o de um me´todo menos restritivo. Esse me´todo denominado upwind, tem bastante aplicac¸a˜o na pra´tica, principalmente em equac¸o˜es hiperbo´licas e consiste em combinarmos as diferenc¸as progressiva e regressiva conforme o sinal de p(x). Isto reduz a ordem do me´todo, mas a restric¸a˜o sobre h e´ relaxada. Assim, o me´todo upwind e´ baseado na seguinte aproximac¸a˜o para a primeira derivada: y′(xj) ≃ η yj+1 − yj h + (1− η)yj − yj−1 h . (1.44) Portanto para η = 1, 12 e −1 tem-se as aproximac¸o˜es progressiva, central e regressiva, re- spectivamente. Usando (1.44) em (1.35) temos −h 2 2 Lh[yj ] ≡ −1 2 {yj+1 − 2yj + yj−1}+ p(xj)h {η(yj+1 − yj) + (1− η)(yj − yj−1)}+ q(xj) h2 2 yj = −h 2 2 r(xj), j = 1, 2, . . . , N donde −bjyj−1 + ajyj − cjyj+1 = −h 2 2 r(xj), j = 1, 2, . . .N com aj ≡ 1− (1 − 2η)hp(xj)− h2q(xj), bj ≡ 1 2 {1− (1− η)hp(xj)} , cj ≡ 1 2 {1 + hηp(xj)} . No me´todo upwind, η vai assumir valores 0 ou 1 , conforme p(xj) < 0 ou p(xj) > 0, respectivamente. Isso mante´m a dominaˆncia da diagonal de A sem a restric¸a˜o (1.39). A ordem do me´todo diminui um pouco, mas o esforc¸o computacional pode diminuir significa- tivamente, porque a malha pode ser menos fina, ou seja, h pode ser maior. Foi visto anteriormente que e´ poss´ıvel a melhoria da ordem de aproximac¸a˜o, aumentando os pontos na aproximac¸a˜o da derivada. Esta abordagem acarreta um aumento na banda da matriz do sistema e o esforc¸o computacional cresce. Para ilustrar uma outra maneira de se melhorar a ordem, vamos considerar o problema y′′ = f(x, y), y(0) = α y(1) = β. 1.5. EXERCI´CIOS 37 A discretizac¸a˜o convencional fornece: yj+1 − 2yj + yj−1 = h2f(xj , yj) que e´ consistente de ordem O(h2). Como esta˜o envolvidos yj+1, yj e yj−1, pode-se usa´-los para se obter uma aproximac¸a˜o melhor para f(xj , yj) da seguinte maneira: yj+1 − 2yj + yj−1 = h2{c1f(xj−1, yj−1) + c2f(xj , yj) + c3f(xj+1, yj+1)} onde c1, c2 e c3 sa˜o calculados para aumentar a precisa˜o. O me´todo mais conhecido, assim obtido, e´ o me´todo de Numerov yj+1 − 2yj + yj−1 = h 2 12 {f(xj−1, yj−1) + 10f(xj, yj) + f(xj+1, yj+1)} que e´ consistente de ordem O(h4). Quando f e´ na˜o linear e c3 6= 0, esse me´todo requer a soluc¸a˜o de uma equac¸a˜o (ou um sistema) na˜o-linear. Isto pode ser resolvido por iterac¸o˜es sucessivas ou pelo me´todo de Newton, mas claramente o esforc¸o computacional e´ bem maior. Em geral, um problema na˜o-linear de segunda ordem pode ser colocado como y′′ = f(x, y, y′), y(0) = α y(1) = β e a construc¸a˜o do me´todo segue o mesmo procedimento yj+1 − 2yj + yj−1 = h2f(xj , yj , yj+1 − yj−1 2h ), j = 1, 2, . . . , N com a necessidade de soluc¸a˜o de um sistema na˜o linear. 1.5 Exerc´ıcios 1.1 Utilizando propriedades dos operadores e expansa˜o formal em se´rie de poteˆncias das func¸o˜es envolvidas prove as relac¸o˜es abaixo: ∇ = E−1∆, ∆∇ = ∇∆ = ∆−∇ = δ2, µδ = 1 2 (∆ +∇), µ2 = 1 + 1 4 δ2 ∇ = 1− E−1, µ = 1 2 ( E 1 2 + E− 1 2 ) , δ = E 1 2 − E− 12 , 1 = µµ−1 = µ ( 1 + 1 4 δ2 )− 1 2 = µ ( 1− 1 8 δ2 + 3 128 δ4 + · · · ) hD = ln(1 + ∆) = − ln(1−∇) = 2 sinh−1 ( δ 2 ) = 2 ln (√ 1 + 1 4 δ2 + 1 2 δ ) 38 CAPI´TULO 1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS (hD)k = [ln(1 + ∆)] k = ∆k − k 2 ∆k+1 + k(3k + 5) 24 ∆k+2 − k(k + 2)(k + 3) 48 ∆k+3 + · · · (hD)k = (−1)k [ln(1 −∇)]k = ∇k + k 2 ∇k+1 + k(3k + 5) 24 ∇k+2 + k(k + 2)(k + 3) 48 ∇k+3 + · · · hD = 2µ sinh−1 ( δ 2 ) ( 1 + δ 2 4 ) 1 2 = µ [ δ − 1 2 3! δ3 + 12.22 5! δ5 − · · · ] (hD)2n = [ 2 sinh−1 ( δ 2 )]2n = [ δ − 1 2 22.3! δ3 + 12.32 24.5! δ5 − 1 2.32.52 26.7! δ7 + · · · ]2n (hD)2n = µ√ 1 + δ 2 4 [ 2 sinh−1 ( δ 2 )]2n = µ [ δ − 1 2 3! δ3 + 12.22 5! δ5 − · · · ]2n (hD)2n+1 = [ 2 sinh−1 ( δ 2 )]2n+1 = [ δ − 1 24 δ3 + 3 640 δ5 − 5 7168 δ7 + · · · ]2n+1 . Sugesta˜o: Utilize as expanso˜es em se´rie: sinh−1 (x) = ∞∑ k=0 (−1)k (2k)! 22k(k!)2(2k + 1) x2k+1 (1 + x) q = 1 + qx+ q(q − 1) 2! x2 + · · ·+ q(q − 1)(q − 2) · · · (q − k + 1) k! xk + · · · 1.2 Utilizando expansa˜o em se´rie de Taylor de y′(xn+1) e comparando com a expansa˜o de y(xn+1) deduza que: y(xn+1) = y(xn) + h 2 [f(xn, y(xn)) + f(xn+1, y(xn+1))]− h 3 12 y′′′(ξ). 1.3 As relac¸o˜es (1.6-1.10) sa˜o casos especiais das expanso˜es do exerc´ıcio (1.1), prove-as. 1.4 Deduzir a partir da expansa˜o em se´rie de Taylor de y(x), fo´rmulas de ordem 1 e de ordem 2 para aproximar as derivadas y(3)(x) e y(4)(x). 1.5 Mostrar, usando a equac¸a˜o teste y′ = λy, que a regra do ponto me´dio e´ insta´vel. 1.6 a. Construa o me´todo de maior ordem poss´ıvel da forma: a1yi+1 + a2yi + a3yi−1 + a4yi−2 = f(xi, yi) para soluc¸a˜o de um PVI. 1.5. EXERCI´CIOS 39 b. Mostre que esse me´todo na˜o e´ convergente. 1.7 Utilizando MATLAB resolva o PVI abaixo pelo me´todo do ponto me´dio, Euler expl´ıcito, impl´ıcito e regra dos trape´zios, no intervalo [0, 2], usando h = 0.1. y′ = 5y − 1, y(0) = 1.2. Explique o comportamento de cada um desses me´todos a` luz das propriedades discutidas neste cap´ıtulo. Soluc¸a˜o exata: y(x) = exp(5x) + 0.2. 1.8 Mostre por induc¸a˜o sobre n que |en| ≤ ξn onde ξn e´ a soluc¸a˜o da equac¸a˜o (1.19), com ξ0 = |e0|. Prove que (1.20) e´ realmente soluc¸a˜o de (1.19), com ξ0 = 0. A soluc¸a˜o (1.20) e´ va´lida se e somente se A e B forem constantes, no entanto tomamos n → ∞ em (1.21) o que certamente faz com que h → 0 e portanto A e B na˜o sa˜o constantes. Como explicar enta˜o a passagem ao limite em (1.21)? 1.9 Deduza a fo´rmula (1.28). 1.10 Mostre que o me´todo (1.30) e´ zero-esta´vel mas na˜o e´ consistente e que o me´todo (1.31) e´ consistente para todo valor de a; zero-esta´vel e de ordem 2 se a = 0 e zero-insta´vel e de ordem 3 se a = −5. (Veja [20] pa´gina 41). Mostre que o me´todo de Simpson na˜o e´ esta´vel. 1.11 a. Seja o problema de valor de fronteira de segunda ordem definido no intervalo [a, b]: y′′ − q(x)y = r(x) y(a) = y(b) = 0 Determinar os paraˆmetros α2, α1, α0 de modo que o me´todo nume´rico: yi+1 − 2yi + yi−1 h2 − [α2q(xi+1)yi+1 + α1q(xi)yi + α0q(xi−1)yi−1] = α2r(xi+1) + α1r(xi) + α0r(xi−1), i = 1, 2, . . . , N com y0 = yN+1 = 0, e h = b−a N+1 , seja de ordem 4. b. Se q(x) > Q∗ > 0 mostre que a expressa˜o h4(2M + 5N + 5R) 720Q∗ e´ um limitante superior para o erro global do me´todo em (a) onde M e R sa˜o limitantes superiores para a derivada de
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