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para conhecer morfologia 1

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Prévia do material em texto

SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .....................................................................................................................................7
UMA BREVE INTRODUÇÃO AOS PROBLEMAS CLÁSSICOS DA MORFOLOGIA ..............9
Objetivos gerais do capítulo .......................................................................................................9
1. A noção de palavra...................................................................................................................12
2. Classes de palavras .................................................................................................................15
3. Flexão e derivação ....................................................................................................................20
4. Primeiras conclusões ..............................................................................................................23
•฀ Leituras sugeridas ....................................................................................................................24
•฀ Exercícios ....................................................................................................................................24
O ESTRUTURALISMO DE MATTOSO CAMARA JR. ................................................................27
Objetivos gerais do capítulo ....................................................................................................27
1. A solução do estruturalismo para o primeiro problema levantado:
 a definição de palavra .............................................................................................................31
2. A solução do estruturalismo para o segundo problema:
 as classes de palavras ............................................................................................................37
3. Outros problemas morfológicos ...........................................................................................40
 3.1 A discussão flexão x derivação .....................................................................................40
 3.2 A questão da forma das unidades morfológicas .....................................................54
4. À guisa de conclusão: uma aplicação concreta desses conceitos ...........................59
•฀ Leituras sugeridas ....................................................................................................................61
•฀ Exercícios ....................................................................................................................................61
A MORFOLOGIA BASEADA EM PALAVRAS NA GRAMÁTICA GERATIVA ........................63
Objetivos gerais do capítulo ....................................................................................................63 
1. As palavras na Morfologia baseada em palavras ...........................................................69 
 1.1 A noção tradicional de morfema e seus problemas ...............................................69
 1.2 Sobre teorias morfológicas baseadas em regras ....................................................73
 1.3 A Morfologia Amorfa de Anderson ...............................................................................81
2. Classes de palavras na Morfologia baseada em palavras ..........................................89
3. Flexão e derivação: lugares diferentes na arquitetura gramatical? ..........................90
4. Considerações finais ................................................................................................................97
•฀ Leituras sugeridas ....................................................................................................................98
•฀ Exercícios ....................................................................................................................................99
A MORFOLOGIA DISTRIBUÍDA .................................................................................................... 101
Objetivos gerais do capítulo ................................................................................................. 101 
1. A palavra na Morfologia Distribuída ................................................................................. 107
 1.1 A Morfologia Distribuída – propriedades e listas .................................................. 107
 1.2 A arquitetura da gramática .......................................................................................... 111
 1.3 Uma derivação em Morfologia Distribuída .............................................................. 113
 1.4 Alomorfia e reajustes fonológicos ............................................................................. 121
 1.5 Sobre os problemas da noção de palavra nas teorias lexicalistas
 e o conceito de palavra morfológica na Morfologia Distribuída ....................... 124
2. Classes de palavras na Morfologia Distribuída ............................................................. 131
 2.1 Sobre as raízes acategoriais ....................................................................................... 131
 2.2 Núcleos categorizadores e fases ............................................................................... 135
3. Flexão e derivação ................................................................................................................. 139
4. Considerações finais ............................................................................................................. 142
•฀ Leituras sugeridas ................................................................................................................. 145
•฀ Exercícios ................................................................................................................................. 146
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................. 149
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................................... 155
OS AUTORES ...................................................................................................................................... 159
7
APRESENTAÇÃO
A Morfologia, isto é, os estudos sobre as palavras, suas estruturas, suas 
diferenças e semelhanças, talvez seja a mais antiga das áreas de investigação 
linguística a receber análises sistemáticas, em diversos lugares do planeta.
Há, por exemplo, plaquinhas de barro recuperadas na região da Me-
sopotâmia, escritas por volta de 1600 a.C., que descrevem a estrutura do 
verbo da língua suméria, então falada na região. O árabe conta com estudos 
de Morfologia que datam de cerca de 1200 a.C. O importante gramático 
hindu Pānini dedica boa parte de seus textos, escritos por volta do século 5 
a.C., à morfologia do sânscrito, língua que era falada na época em regiões da 
atual Índia. E toda a tradição gramatical greco-latina é pautada pelo estudo 
da Morfologia, tradição que influenciou diretamente o desenvolvimento das 
nossas gramáticas tradicionais e, em alguma medida, da própria Linguística.
Apesar dessa longa história, o termo “morfologia” como utilizado 
atualmente dentro da Linguística foi cunhado apenas na segunda metade 
do século XIX, e ainda há muita coisa a ser entendida no domínio da Mor-
fologia, o que faz dele um campo de estudos fascinante.
Como em todos os campos do conhecimento humano, há problemas 
clássicos nesse domínio com os quais todos os estudiosos devem se defron-
tar. Por exemplo, embora a noção de palavra seja intuitivamente muito sim-
ples (no sentido de que qualquer falante é capaz de dar um sem-número 
de exemplos de palavras na própria língua), não é nada fácil fornecer uma 
definição desse termo que cubra todas as instâncias de palavra dentrode uma 
mesma língua – sem falar da dificuldade de chegar a uma definição de pa-
lavra que cubra todas as instâncias de palavras nas várias línguas humanas!
PARA CONHECER Morfologia
8
Este nosso livro se preocupou em abordar um conjunto desses problemas 
clássicos da Morfologia e as respostas que diferentes quadros teóricos foram 
dando para eles ao longo dos anos. Os problemas que escolhemos são basica-
mente a definição de palavras, de classes de palavras, o problema de identificar 
e individuar certos processos morfológicos como a flexão e a derivação, e, 
finalmente, a questão da forma que as unidades morfológicas exibem. 
É nossa preocupação também apresentar um panorama do que se tem 
feito em termos de estudos morfológicos no último século. Por isso, em 
cada um dos capítulos que se seguem, uma teoria morfológica será apre-
sentada, com suas respostas para esses problemas clássicos mencionados, 
além de outras particularidades do quadro teórico em discussão. Assim, o 
capítulo “O estruturalismo de Mattoso Camara Jr.” se empenha em mostrar 
que respostas o estruturalismo, na versão defendida por um dos mais im-
portantes linguistas brasileiros – Joaquim Mattoso Camara Jr. – tem para 
as questões mencionadas. 
O capítulo que se segue, intitulado “A Morfologia baseada em pala-
vras na Gramática Gerativa”, tem a preocupação de mostrar as respostas 
que o quadro clássico da Gramática Gerativa pode apresentar, discutindo 
também alguns de seus problemas. Finalmente, o último capítulo, chama-
do “A Morfologia Distribuída”, faz o mesmo percurso de busca de respos-
tas para as questões colocadas, mas agora vai encontrar essas respostas no 
âmbito da teoria da Morfologia Distribuída.
Além de ser pensado como uma introdução relativamente extensa e 
densa em Morfologia, acreditamos que o formato deste livro favorece larga-
mente o exercício do pensamento científico. Apresentamos os problemas e as 
soluções que os diferentes quadros teóricos tentam dar a eles, e procuramos, 
sempre que possível, trazer os fatos do português brasileiro para serem o fiel 
da balança na escolha de diferentes opções que as teorias nos permitem, ar-
gumentando com base nos dados em prol de uma ou outra análise para os fa-
tos. Esse, parece-nos, é justamente o ponto alto deste livro: além de conhecer 
fenômenos e problemas morfológicos, e diferentes repostas para eles, você 
aprenderá como funciona a argumentação científica dentro da Morfologia.
Esperamos que você, leitor, tire todo o proveito que este livro pode 
oferecer!
9
UMA BREVE INTRODUÇÃO 
AOS PROBLEMAS CLÁSSICOS 
DA MORFOLOGIA
Objetivos gerais do capítulo
Neste capítulo, vamos:
 Â examinar certos conceitos veiculados pelos estudos tradicionais de 
Morfologia, mostrando os tipos de problemas que eles escondem em 
suas definições; e
 Â preparar o caminho para a discussão desses mesmos conceitos por ou-
tros tratamentos dados à morfologia das línguas humanas em geral e do 
português em particular.
Os objetivos de cada seção são:
 Â A noção de palavra: apresentaremos um problema clássico da Morfo-
logia, que é a definição do que é uma palavra; mostraremos alguns dos 
problemas que a definição da gramática tradicional enfrenta.
 Â Classes de palavras: abordaremos outro problema clássico, que é o da 
definição das classes de palavras; discutiremos a necessidade da divisão 
das palavras em classes e quais critérios devem nos guiar para assentar 
o seu número; mostraremos alguns dos problemas que as classes de 
palavras, tal qual apresentadas nos estudos tradicionais, suscitam.
 Â Flexão e derivação: examinaremos a questão da diferença entre flexão 
e derivação nos estudos tradicionais, um tema que se revela importante 
para estudos de Morfologia feitos sob outros prismas teóricos.
PARA CONHECER Morfologia
10
Em vista do caráter em geral normati-
vo das gramáticas tradicionais, usare-
mos, ao longo do livro todo, as expres-
sões “gramática(s) normativa(s)” e 
“gramática(s) tradicional(is)” como se 
fossem sinônimos; contudo, estamos 
cientes de que nem tudo nos estudos 
tradicionais tem o aspecto normativo 
como centro, e que a expressão “gra-
mática tradicional” se refere principal-
mente a um conjunto de trabalhos com 
caráter descritivo dentro de uma tradi-
ção de estudos gramaticais.
A Morfologia é uma das 
áreas mais tradicionais dos es-
tudos gramaticais. Seu estudo, 
como o conhecemos, remonta 
às primeiras formulações da 
gramática tradicional pelos gre-
gos, e é sem dúvida a parte mais 
desenvolvida das nossas gramá-
ticas normativas: embora em 
geral haja apenas dois ou três 
capítulos dedicados à formação 
das palavras, na verdade mais de 
dois terços das páginas das gramáticas são dedicadas à Morfologia, quando 
tratam da descrição detalhada das diversas classes de palavras do português.
No entanto, a sua vida longa não garante acuidade para o tratamento 
morfológico tradicional. Examinaremos a seguir uma série de problemas 
morfológicos clássicos que recebem tratamento bastante superficial e inco-
erente nas gramáticas tradicionais e que por isso mesmo devem ser estuda-
dos por outras abordagens que diferem da gramática tradicional porque são 
abordagens de natureza científica, que nos permitirão compreender esses 
problemas, e suas consequências, em toda a sua extensão.
Abordagens científicas
É importante apresentar uma defesa aqui para a ideia de 
que as gramáticas tradicionais não podem ser chamadas de te-
orias científicas, porque falta a elas um conjunto de proprieda-
des definitórias da empreitada científica, do qual escolhemos 
algumas poucas para apresentar a seguir:
(i) As teorias científicas estão comprometidas, antes de mais 
nada, com a descrição dos fatos tal qual se apresentam no 
mundo, fazendo, quando muito, um recorte metodológico 
sobre eles, como, por exemplo, os dados de fala de uma 
certa comunidade. Por sua vez, as gramáticas tradicionais, 
em geral, selecionam os fatos que consideram pertinentes 
11
Uma breve introdução aos problemas clássicos da morfologia
com base no que esperam obter, e assim os dados que 
levam em conta, que a princípio viriam de fontes 
literárias, não consideram jamais as fontes literárias que 
não se comportam como o esperado: Guimarães Rosa, 
por exemplo, é citado com sentenças de Primeiras 
estórias, jamais com trechos de Grande sertão: veredas;
(ii) As teorias científicas desenvolvem uma terminologia 
própria, que muda na medida em que o conhecimento 
sobre o objeto avança e se revela necessário mudar 
termos ou acrescentar outros para tornar a descrição 
dos fatos ou sua explicação mais precisas. A gramática 
tradicional, ao contrário, considera que os termos não 
devem sofrer alterações; em particular, a gramática 
tradicional do português deve seguir a terminologia 
imposta pela Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), 
o que restringe radicalmente sua cobertura;
(iii) As teorias científicas não podem conter contradições 
internas, ou seja, as definições dos termos ou propriedades 
não podem ser contraditas por outras definições de 
termos ou propriedades; na gramática tradicional, 
encontramos contradições como, por exemplo, assumir 
em um momento que o sujeito é um termo essencial da 
oração, mas poucas páginas à frente assumir igualmente 
que existem orações sem sujeito (cf. Cunha e Cintra, 
2001: 122 e 129).
Vamos examinar a definição de palavra e a de classes de palavras que as 
gramáticas tradicionais do português nos fornecem; a seguir, vamos discutir 
um problema que para os estudos tradicionais sequer é um problema, visto 
que é dada como certa a diferença entre processos derivacionais – como 
aquele que cria o adjetivo “lavável” a partir do verbo “lavar” – e processos 
flexionais – comoaquele que dá a forma plural “meninos” para a forma sin-
gular “menino”. Contudo, a fronteira entre esses dois processos está longe de 
ser bem delimitada e, se não por outras razões, pelo menos por isso esse é um 
problema que merece um estudo aprofundado e consistente. 
PARA CONHECER Morfologia
12
1. A NOÇÃO DE PALAVRA
Os estudos tradicionais (por exemplo, aqueles levados a cabo nas 
gramáticas normativas do português) historicamente dedicam bastante 
atenção para a palavra, tema central da área conhecida como Morfologia. 
Esses estudos abordam uma série de problemas interessantes que merecem 
a atenção de qualquer morfólogo. O primeiro desses problemas é: o que é 
uma palavra?
A gramática tradicional (doravante GT) de Cunha e Cintra (2001: 75), 
por exemplo, respondem a essa pergunta do seguinte modo: “Palavra é 
uma unidade maior do que o fonema e menor do que a frase”. 
Essa definição tem a gran-
de vantagem de ser enunciada 
de maneira clara e num primei-
ro momento parece bastante 
boa, porque todos nós, intuiti-
vamente, sabemos que caixa, 
pó ou sofreguidão são palavras 
e, de fato, todas elas são com-
postas por mais de um fonema e nenhuma delas é uma frase (algo que, 
intuitivamente também, sabemos ser composto por várias palavras, como 
o menino saiu chorando).
No entanto, devemos notar de imediato que a definição de frase desses 
mesmos autores é um pouco distinta da nossa definição intuitiva. Para eles, 
frase é a menor unidade comunicativa. Agora é preciso averiguar se, com essa 
nova ideia sobre o que é frase, a definição de palavra continua sendo boa.
Imagine um diálogo como o que está em (1):
(1) A: Onde está a Maria?
 B: Saiu.
É verdade que a resposta de B contém mais elementos do que de fato es-
tão presentes – claramente, é possível inserir ali o pronome “ela” como sujeito 
da sentença, o que daria aos gramáticos a saída de dizer que estamos frente a 
uma estrutura com algum tipo de elipse. Por outro lado, com ou sem elipse, 
também é verdade que o verbo conjugado sozinho é uma resposta adequa-
Se você não lembra desse conceito da 
Fonologia, aconselhamos consultar o 
livro Para conhecer fonética e fonolo-
gia do português brasileiro, de Izabel 
Seara, Vanessa Nunes e Cristiane 
Lazzarotto-Volcão, também publicado 
pela Contexto.
13
Uma breve introdução aos problemas clássicos da morfologia
da. Portanto, não há dúvida de que Saiu, nesse contexto discursivo, funciona 
perfeitamente como uma unidade comunicativa e por isso é uma frase pela 
definição dada. Logo, uma frase pode ser composta por uma única palavra, o 
que já compromete parcialmente a definição de palavra que acabamos de ver.
O problema da definição de palavra dada anteriormente, contudo, é 
ainda mais sério. Embora seja verdade que a maior parte das palavras da 
língua seja constituída por mais de um fonema, também é verdade que 
existem palavras constituídas por um só fonema, como o artigo definido a 
ou o pronome oblíquo átono o ou ainda o verbo ser na 3ª pessoa do singu-
lar do presente do indicativo, que tem a forma é. Aliás, este último caso é 
particularmente interessante porque mostra que uma palavra pode ser for-
mada por um único fonema e se constituir em uma unidade comunicativa 
completa, como vemos no diálogo em (2).
(2) A: A Maria é a aluna mais inteligente da sala?
 B: É! 
Mesmo admitindo que estamos aqui também frente a um caso de elip-
se, se É! é uma resposta adequada nessa interação comunicativa, então 
acabamos de mostrar que uma palavra pode ser constituída por um único 
fonema e ainda assim valer por uma frase (na definição dada). O problema 
pode ser colocado nos seguintes termos: embora a GT estabeleça uma hie-
rarquia com base no tamanho das unidades “frase”, “palavra” e “fonema” 
para definir palavra, o que os fatos da língua nos mostram é que em termos 
de tamanho essas unidades não se distinguem, já que podem ser idênticas, 
isto é, um mesmo elemento da língua pode representar essas diferentes 
unidades. Em (3), temos uma representação visual do problema – (3a) traz 
justamente a equação proposta por Cunha e Cintra (2001), mas em (3b) 
temos a equação que os dados nos dizem ser a realidade da língua: 
(3) a. frase > palavra > fonema
	 b.	“É!”	 =	 é	 =	 /ɛ/
Portanto, a definição de palavra oferecida por esses gramáticos não 
é adequada porque ela não chega a distinguir de outras unidades diversas 
a unidade que supostamente está sendo definida, incluindo as que fazem 
parte da definição. 
PARA CONHECER Morfologia
14
Como se não bastasse, observamos que na língua existem outras uni-
dades intermediárias entre as unidades nomeadas pela GT, que, no caso, se-
riam a frase e a palavra. Entre elas, por exemplo, temos os grupos nominais 
(como a menina de vestido verde) e as expressões idiomáticas (como en-
xugar gelo). Entre palavra e fonema, temos, por exemplo, as sílabas (como 
-ni- em menina ou ver- em verde) e certos formativos morfológicos (como 
des- em desinformado ou -al em laranjal). 
Você deve estar se perguntando se o problema não é dessa gramática 
normativa especificamente; porém, outras gramáticas normativas, como a de 
Carlos Henrique da Rocha Lima, a de Napoleão Mendes de Almeida ou a de 
Paschoal Domingos Cegalla se valem de definições similares a essa, às vezes 
fazendo uso do critério de escrita: identificamos a palavra na escrita porque é 
aquele termo que vem circundado por espaços em branco. Contudo, observe 
que quem escreveu colocando os espaços em branco já tinha que saber o que 
é palavra, certo? E como é que ele sabia disso? E mesmo essa ideia de sepa-
rar as palavras na escrita por espaços é bem recente, porque em tempos de 
economia de papel esse não era um hábito corrente... E, além do mais, o que 
dizer de espaços em branco na fala? Dado que palavras não são unidades só 
da escrita, qualquer critério razoável deve se aplicar também à língua falada.
O problema, claro, não é trivial: embora todos nós tenhamos uma de-
finição intuitiva do que é palavra, isto é, embora sejamos todos capazes de 
dizer o que é uma palavra do português e o que não é, as noções morfológi-
cas tradicionais têm muita dificuldade para definir precisamente esse objeto 
gramatical. Na verdade, as definições das gramáticas tradicionais só nos pa-
recem razoáveis porque nós já sabemos intuitivamente o que são palavras. E 
mesmo assim, há casos em que a nossa intuição bate de frente com o que diz 
a gramática tradicional, como mostram certos usos de termos que em tempos 
anteriores da língua eram apenas partes de palavras, mas que hoje são toma-
dos como palavras independentes (por exemplo, o uso de ex para fazer refe-
rência ao ex-marido ou ao ex-namorado) e também os inúmeros problemas 
de segmentação da escrita que encontramos em textos de crianças e adultos. 
A segmentação do fluxo da fala 
Todos nós nos defrontamos com o problema de identificar 
e isolar as palavras no fluxo da fala durante a nossa primeira 
15
Uma breve introdução aos problemas clássicos da morfologia
infância e conseguimos com algum sucesso separar as palavras 
da língua, apesar de elas aparecerem todas “grudadas” quando 
as pessoas falam ao nosso redor. Há anedotas diversas sobre 
o assunto, como a famosa brincadeira “um bigo, dois bigos”, 
em que a primeira sílaba da palavra umbigo é entendida como 
o artigo indefinido. À parte as anedotas, há problemas de seg-
mentação que persistem pelas mais variadas razões e assim en-
contramos na escrita o problema exatamente contrário ao da 
anedota mencionada: os exemplos clássicos são coisas como 
“(eu) teamo” ou “porisso”. Aqui claramente o falante entende 
como uma palavra única aquilo que a tradição gramatical con-
vencionou tratar como palavras separadas, escritas, portanto, 
com um espaço entre elas: te amo ou por isso.
Vamos retornar várias vezesao problema da definição de palavra ao 
longo deste livro. Veremos que a definição mesma do que é palavra depende 
numa larga medida do quadro teórico em que se está tentando formular essa 
definição, inclusive porque pode acontecer de a unidade “palavra” não ser a 
unidade mais importante para uma dada teoria. Por isso, ligada indiretamente 
ao problema da definição de palavra está a questão de sabermos se os proces-
sos morfológicos se realizam sobre palavras, sobre pedaços de palavras (como 
quer que os chamemos: afixos, radicais etc.), ou se tanto sobre uma coisa quan-
to sobre outra, dependendo de qual processo morfológico está em jogo. 
Notemos que a tradição gramatical não identifica um problema aqui, 
isto é, a gramática tradicional não se questiona sobre se a unidade perti-
nente da Morfologia é mesmo a palavra, mas pode ser que isso faça uma 
grande diferença, a começar pelo fato de palavras supostamente pertence-
rem a alguma classe, como veremos a seguir, uma exigência que não pesa 
sobre os pedaços de palavra.
2. CLASSES DE PALAVRAS
Um segundo problema sobre o qual os estudos tradicionais já se debruça-
ram é o da classificação das palavras, isto é, a divisão das palavras em diferen-
tes grupos segundo certas propriedades da sua interpretação e/ou da sua forma. 
PARA CONHECER Morfologia
16
A princípio, as classes de palavra nos parecem óbvias, intuitivas e necessárias; 
afinal, como viver sem verbos, substantivos, adjetivos, interjeições etc.? 
Como cientistas da linguagem, contudo, a primeira pergunta que de-
vemos fazer é justamente: será que é mesmo necessário dividir as palavras 
em diferentes classes?
No senso comum, quando fazemos uma divisão de coisas em grupos 
distintos é porque reconhecemos que elementos pertencentes a cada um 
desses grupos podem ser necessários em momentos distintos e será mais 
fácil acessar um determinado item se já soubermos de antemão onde (ou 
como) procurá-lo. Essa é a razão, aliás, pela qual organizamos os papéis 
importantes em pastas ou gavetas na nossa casa, as comidas em doces e 
salgadas, os seres vivos em vertebrados e invertebrados etc.
Note que classificar o que quer que seja exige um bom critério; de ou-
tro modo, corremos o risco de não encontrar o que queremos no momento 
da necessidade. Assim, se alguém vai organizar os papéis nas gavetas da 
mesa, convém pensar num bom critério para fazer isso; um critério mal 
pensado para a divisão causa um problema na hora de fazer buscas. Por 
exemplo, adotando um critério de distribuição dos papéis que coloque na 
primeira gaveta os papéis brancos, na segunda os papéis azuis e na terceira 
os papéis amarelos, se a pessoa precisar de uma conta de água para servir 
de comprovante de residência, ou ela se lembra da cor da conta ou precisa 
procurar em todas as gavetas – isso para não mencionar o problema de 
classificar todos os documentos que não têm essas cores ou para classificar 
aqueles que são multicoloridos. Deu para perceber qual é o problema? 
Voltemos à questão de dividir as palavras em classes. Os estudiosos 
têm assumido como indiscutível a necessidade de colocar as palavras em 
diferentes classes, já que elas têm propriedades morfológicas distintas – por 
exemplo, as palavras classificadas como substantivos sempre exibem um 
gênero gramatical (masculino ou feminino), enquanto as classificadas como 
verbo não podem exibir gênero; por outro lado, verbos podem exibir mor-
fologia de tempo e modo, mas substantivos não podem. Adicionalmente, a 
distribuição sintática dessas diferentes classes é distinta: lugares na frase em 
que deve aparecer um verbo não podem ser ocupados por um substantivo, 
como mostra o par em (4) a seguir:
17
Uma breve introdução aos problemas clássicos da morfologia
(4) a. A Maria viu
verbo
 o Pedro na rua.
 b. *A Maria visão
substantivo
 o Pedro na rua.
Como já é praxe em boa parte da literatura linguística, utilizaremos um 
asterisco (*) para indicar uma construção sintática ou uma formação mor-
fológica que é impossível na língua.
Portanto, parece mesmo que alguma classificação das palavras é ne-
cessária. Mas qual é a melhor forma de fazer isso? 
A NGB propõe uma divisão em dez classes:
 1. Substantivo 6. Verbo
 2. Artigo 7. Advérbio
 3. Adjetivo 8. Preposição
 4. Numeral 9. Conjunção
 5. Pronome 10. Interjeição
A primeira pergunta que podemos fazer é: afinal, por que dez classes? 
Por que não sete (que é um número cabalístico) ou nove (que tem quadrado 
perfeito)? Note que historicamente não foram sempre essas as classes de 
palavras postuladas pela gramática tradicional – por exemplo, os particí-
pios verbais já constituíram uma classe independente da dos verbos; tam-
bém é digno de nota o caso das interjeições, uma classe deliberadamente 
criada pelos gramáticos latinos para que o número de classes de palavras 
da gramática latina fosse o mesmo da gramática grega, já que o latim, di-
ferentemente do grego, não possui uma classe de artigos (nas gramáticas 
gregas, as interjeições eram parte da classe dos advérbios). 
Mas a questão principal não é simplesmente sobre o número de clas-
ses. O ponto central na verdade é: que critérios guiam essa classificação? A 
pergunta é particularmente relevante quando examinamos a última classe 
proposta pela GT, a das interjeições – é razoável ter as interjeições como uma 
classe separada? Observe que boa parte das palavras dadas como exemplo 
de interjeições – Atenção!; Corra!; Devagar! – já pertence a alguma outra 
classe – respectivamente substantivo, verbo e advérbio nos exemplos an-
teriores. Além disso, enquanto as outras classes de palavras são “partes do 
discurso”, isto é, são classes gramaticais, as interjeições remetem a situações 
PARA CONHECER Morfologia
18
e falas inseridas nessas situações, o que já seria suficiente para estabelecer 
uma distância considerável entre esta classe e as outras. 
Independentemente de haver uma boa resposta para as questões colo-
cadas, é possível identificar um conjunto de problemas para a classificação 
adotada pela gramática tradicional:
1. Ela não é precisa:
A definição de advérbio para Cunha e Cintra (2001: 541) diz que: 
o advérbio é, fundamentalmente, um modificador do verbo. [...] A essa 
função básica, geral, certos advérbios acrescentam outras que lhe são 
privativas. Assim, os chamados advérbios de intensidade e formas se-
manticamente correlatas podem reforçar o sentido: a) de um adjetivo; 
b) de um advérbio. [...] Saliente-se ainda que alguns advérbios apare-
cem, não raro, modificando toda a oração.
Na página 543 de sua gramática, os autores fornecem a classificação 
dos advérbios da NGB, na qual aparecem os advérbios de dúvida e, dentre 
eles, a forma provavelmente.
Como mostram Mioto et al. (2013), é verdade que provavelmente pode 
modificar (se é que “modificar” é o melhor modo de descrever o que aconte-
ce aqui...) a frase toda, um adjetivo, um outro advérbio e também um verbo:
(5) a. Provavelmente [o João doou os livros para a biblioteca] (e por isso 
os livros não estão mais aqui).
 b. O João doou livros [provavelmente novos] (não velhos) para a bi-
blioteca.
 c. O João doou [provavelmente ontem] (não hoje) os livros para a 
biblioteca.
 d. O João [provavelmente doou] (não vendeu) os livros para a biblioteca.
No entanto, as sentenças em (6) a seguir mostram que essa não é a história 
toda, porque nelas provavelmente está “modificando” um grupo nominal –
o sujeito em (6a), e o objeto em (6b) – e um grupo preposicional em (6c). 
(6) a. [Provavelmente o João] (não a Maria) doou os livros para a biblioteca.
 b. O João doou [provavelmente os livros] (não as revistas) para a biblioteca.
 c. O João doou os livros [provavelmente para a biblioteca] (não 
para o bar).19
Uma breve introdução aos problemas clássicos da morfologia
Portanto, ou advérbios não se definem como querem Cunha e Cintra 
(2001), ou provavelmente não é um advérbio.
2. Ela não é muito útil:
Cunha e Cintra (2001: 177, 379) definem respectivamente substanti-
vo e verbo como: 
(7) a. Substantivo é a palavra com que designamos ou nomeamos os se-
res em geral.
 b. Verbo é uma palavra de forma variável que exprime o que se passa, 
isto é, um acontecimento representado no tempo.
Como já notou Perini (1995), a definição em (7a) exige que saibamos 
o que se quer dizer com “seres”. Para o senso comum, que homem ou 
mesa possam ser concebidos como seres parece indiscutível, mas será que 
viagem, ideal, beleza e nostalgia também podem ser assim concebidos? E 
“representado no tempo”, que aparece em (7b), o que quer dizer? Viajou 
ou encontrará são “acontecimentos representados no tempo” sem muita 
controvérsia; já estava não é muito claro que seja um acontecimento e sem 
dúvida viagem, que não é um verbo, pode ser concebido como um aconte-
cimento representado no tempo...
Ora, é difícil manusear definições se elas dependem de conceitos que não 
dominamos bem e, portanto, a utilidade delas está obviamente em questão.
3. Ela não é homogênea:
Comparando as definições de substantivo e de advérbio, vemos que os 
critérios para definir as classes são díspares: trata-se de um critério semântico-
filosófico no primeiro caso, mas distribucional-funcional no segundo caso.
A conclusão que podemos tirar dessa breve discussão é que essa clas-
sificação deixa muito a desejar, porque tem problemas insolúveis de orga-
nização. Além disso, ela não é morfológica, no sentido de apontar imedia-
tamente para as propriedades tipicamente morfológicas das palavras que 
constituem as diferentes classes... 
Contudo, ao invés de abandonar completamente a ideia de dividir as 
palavras em classes, veremos que as teorias linguísticas modernas desen-
volvem classificações particulares para as palavras fazendo uso de outras 
estratégias e tendo como base critérios bem mais refinados e transparentes.
PARA CONHECER Morfologia
20
3. FLEXÃO E DERIVAÇÃO
Há muitos outros problemas que se colocam para as teorias mais mo-
dernas de Morfologia, mas a verdade é que os estudos tradicionais nem 
sonham com eles. Por exemplo, a gramática tradicional toma como certo 
que existem processos morfológicos distintos como a flexão e a derivação 
(para não falar de composição e outros processos, como a siglagem), mas 
não se detém em fornecer argumentos consistentes em defesa desta posi-
ção. Supõe-se, por exemplo, que a flexão tem propriedades como a obri-
gatoriedade, que a derivação não tem; contudo, não há uma resposta clara 
para a seguinte questão: que propriedades morfológicas cada uma dessas 
operações teria para justificar uma separação entre elas?
Além disso, sabemos que não é muito simples estabelecer a frontei-
ra entre elas – em particular, as fronteiras entre a derivação (sufixal) e a 
flexão, dado que esses processos fazem, ambos, uso de elementos que se 
juntam ao final da palavra.
Um pouco de terminologia
Os estudos tradicionais dão nomes diferentes aos elementos 
que participam das diferentes operações morfológicas. Chamam-
se desinências os elementos que participam de processos flexio-
nais, como a expressão de número nominal plural que vemos em 
as rosas (analisado como a-s rosa-s), ou a expressão de tempo-
modo e número-pessoa nos verbos, como se vê em cantássemos 
(em que -sse- é responsável pela expressão do imperfeito do sub-
juntivo e -mos é que veicula a ideia de 1ª pessoa do plural). Por 
outro lado, a gramática tradicional chama de afixos os elementos 
morfológicos que participam de processos derivacionais, reco-
nhecendo aí duas classes distintas: a de prefixos (caso em que o 
elemento derivacional aparece à esquerda do item que está sendo 
derivado, como em infeliz, analisado com in-feliz) e a de sufixos 
(quando o elemento derivacional aparece à direita do item que está 
sendo derivado, como em felizmente, analisado como feliz-mente).
A gramática tradicional do português também faz uso de 
termos cunhados pelo estruturalismo (como morfema, alomorfe 
etc.), que discutiremos no próximo capítulo, onde receberão a 
definição pertinente e apresentaremos os exemplos relevantes.
21
Uma breve introdução aos problemas clássicos da morfologia
A dificuldade da separação advém principalmente do fato de que não 
existem processos ou propriedades morfofonológicas exclusivas de uma 
ou de outra dessas operações. A título de ilustração, tanto derivação quanto 
flexão fazem uso de sufixos e não há nenhum processo fonológico, por 
exemplo, que possa afetar a derivação que não possa afetar a flexão. Ve-
jamos um exemplo concreto em (8) a seguir. Em (8a), temos um exemplo 
de flexão em que a presença do morfema de plural parece desencadear a 
abertura da vogal no radical; por outro lado, (8b) mostra que esse mesmo 
fenômeno pode acontecer também na derivação:
(8) a. [ô]sso > [ó]ssos
 b. cal[ô]r > cal[ó]rico
Em nenhum dos casos acima o processo é geral e desencadeado em to-
dos os itens que poderiam exibi-lo – por exemplo, moço, que tem uma forma 
fonológica muito similar a de osso, não exibe a abertura da vogal do radical 
na forma plural moços. Isso quer dizer que nós não estamos falando de um 
processo fonológico automático da língua, isto é, um processo que ocorre em 
qualquer circunstância, estando ou não em jogo algum processo morfológi-
co, como é o caso em (9), em que temos a sonorização da fricativa alveolar 
sempre que seguida por uma consoante sonora, sendo um caso de flexão, 
como (9a), com a forma vês do verbo ver, ou de derivação, como em (9b), ou 
um simples encontro de sílabas dentro de uma palavra, como em (9c):
(9) a. (tu) ve[z] dedos, (tu) ve[s] telhas
 b. de[z]ditoso, de[s]temido
 c. de[z]de, de[s]te
Portanto, talvez não haja razões propriamente morfológicas para dis-
tinguir operações como flexão e derivação. Será que outras propriedades 
justificam essa distinção? Seja como for, esse conjunto de observações nos 
leva ao último item da nossa pauta de investigação: o problema da forma 
das unidades em Morfologia.
Há uma questão adicional colocada por exemplos como (9), que é 
exatamente o problema da variação da forma de um dado item dependen-
do, em certos casos, da sua vizinhança. Os estudos tradicionais já se deram 
conta disso, embora não pareçam muito preocupados com o fenômeno. 
Cunha e Cintra (2001), por exemplo, em certo ponto de sua discussão so-
PARA CONHECER Morfologia
22
bre a desinência de plural nominal, chamam a atenção para o fato de que o 
mesmo elemento pode se apresentar sob diferentes formas. O exemplo que 
os autores dão está em (10) a seguir:
(10) a. casa[s]
 b. casa[s] pequenas
 c. casa[z] bonitas
 d. casa[z] amarelas
Esses, contudo, não são os casos mais complicados para tratar, porque 
o fenômeno de mudança de forma aqui corresponde a um processo fono-
lógico automático na língua, e por isso dizemos que ele é fonologicamente 
condicionado. Mais complicado mesmo é quando a distância fonológica é 
grande, e não há outro processo fonológico similar na língua – por exem-
plo, no domínio verbal, aparentemente tanto -o quanto -i são marcas da 1ª 
pessoa do singular, dado o que vemos em (11):
(11) a. canto/vendo/abro
 b. cantei/vendi/abri
A pergunta que se coloca então é: a existência de variação na forma 
dessas desinências, variação essa que não pode ser explicada pela Fonolo-
gia, é um problema da Morfologia? Como ela deve tratá-lo?
Finalmente, podemos nos colocar o problema exatamente contrário: 
será que o fato de existir coincidência na forma de muitos afixos e desinên-
cias, como os que vemos em (12), deve ser tratado como tratamos a coinci-
dência de forma das palavras, isso é, pormeio dos conceitos de homonímia 
ou de polissemia? Ou há outro modo de tratar desse problema? 
(12) a. chaleira, roqueira, amendoeira 
 b. eu cantava, ele cantava
Homonímia e polissemia
Relembrando: estamos diante de polissemia quando 
falamos de uma palavra que possui vários significados rela-
tivamente relacionados entre si – um exemplo clássico são 
as diversas acepções do verbo achar, em frases como Maria 
achou a chave e João acha Maria inteligente. 
23
Uma breve introdução aos problemas clássicos da morfologia
Por outro lado, quando os diversos significados de uma 
palavra não têm qualquer relação entre si, dizemos que estamos 
frente ao fenômeno de homonímia: as palavras em questão têm 
a mesma forma fonológica, mas isso é basicamente uma coinci-
dência – este é o caso de manga (a fruta) e manga (da camisa), 
que diacronicamente provêm de fontes bastante distintas e entra-
ram no português em diferentes momentos da história da língua.
Você pode aprofundar sua compreensão desses concei-
tos consultando o Manual de semântica, de Márcia Cançado, 
publicado também pela Contexto.
Será que podemos falar de homonímia ou polissemia quando estamos 
frente a -eiro em bombeiro e açucareiro? Será que a melhor maneira de tratar 
a coincidência de formas entre cantava (primeira pessoa do singular do preté-
rito imperfeito do modo indicativo) e cantava (terceira pessoa do singular do 
pretérito imperfeito do modo indicativo) é por meio da noção de homonímia?
Evidentemente, muitas dessas questões não se colocam para os estu-
dos tradicionais porque, para o tipo de objetivo que eles têm, que é funda-
mentalmente normativo, a descrição acurada dos fenômenos que de fato 
são atestados pelas línguas em geral e pelo português em particular não é 
necessária e nem muito interessante. Várias dessas questões são colocadas 
por abordagens modernas, que têm outros objetivos – os objetivos da Lin-
guística, que começam por tentar descrever detalhadamente os fenômenos 
das línguas para chegar a fornecer uma explicação para eles. 
Este livro não pretende abordar em profundidade todas essas ques-
tões, mas de qualquer modo aqui e lá tocaremos em algumas delas e vere-
mos que as diferentes teorias linguísticas, por força dos seus pressupostos, 
se veem comprometidas a responder a essa ou àquela questão de maneira 
mais sistemática e abrangente. 
4. PRIMEIRAS CONCLUSÕES
Vimos neste capítulo que há uma série de problemas morfológicos que 
são clássicos, no sentido de que mesmo os estudos tradicionais os abordam. 
O primeiro deles é a definição de palavra; o segundo é a divisão das palavras 
PARA CONHECER Morfologia
24
em classes. Vimos que as gramáticas tradicionais não têm boas soluções para 
esses problemas e nem para outros que enunciamos brevemente na última 
seção, que incluem a distinção entre flexão e derivação, distintas formas para 
o mesmo conteúdo de afixos e desinências, e mesma forma fonológica para 
afixos e desinências que expressam diferentes conteúdos.
Os próximos três capítulos pretendem fornecer as respostas que as 
teorias linguísticas do século XX apresentaram para esses problemas.
Leituras sugeridas
Há uma série de livros de introdução à Linguística que fazem boas 
críticas às abordagens tradicionais, mostrando alguns problemas que elas 
têm. Um que nos parece particularmente bom é o livro de John Lyons, In-
trodução à Linguística teórica. Esse é um livro antigo, nem sempre fácil 
de achar, razão pela qual indicamos também um outro livro de John Lyons, 
que se chama Lingua(gem) e Linguística. 
O livro de Mario Perini, Gramática descritiva do português, dedica 
seus dois primeiros capítulos à tarefa de fazer um estudo crítico dos con-
ceitos da gramática tradicional. Sua leitura é simples e pode ser bastante 
útil para quem começou agora a se aventurar nos estudos da linguagem que 
partem de outra perspectiva que não a prescrição.
Além disso, a própria Contexto já publicou outros estudos na área 
de Morfologia que discutem muitos dos problemas tratados aqui. Veja, 
por exemplo, o trabalho Formação e classes de palavras no português 
do Brasil, de Margarida Basílio, ou o já clássico livro de Maria Carlota 
Rosa, Introdução à morfologia. 
Exercícios
1. Aplique a definição de palavra de Cunha e Cintra (2001) aos itens lin-
guísticos a seguir e diga, para cada um deles, se eles correspondem ou 
não a uma palavra:
 (a) [de plástico] (b) canela (c) [Idade Média] (d) sub-
25
Uma breve introdução aos problemas clássicos da morfologia
2. A gramática tradicional assume que existem dez classes de palavras no 
português. Imagine que você tem que fazer uma teoria na qual apenas 
sete classes seriam admitidas. Que classes você pensa que poderiam 
ser fundidas de modo a fornecer o resultado final de sete classes?
3. As gramáticas tradicionais assumem a existência de dez classes de pa-
lavras no português, mas nas últimas páginas da discussão sobre advér-
bios normalmente surge uma décima primeira classe, algumas vezes 
chamada de “palavras de difícil classificação”, na qual estão palavras 
como eis ou só. 
 (a) Essas palavras têm alguma propriedade que as assemelhe entre si, 
de modo a efetivamente configurar uma classe?
 (b) Se este não é o caso, a que classes essas palavras deveriam pertencer?

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