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Direito Civil 2016 1 1 CADERNO SISTEMATIZADO (CERS + LFG + DAMÁSIO) - 2016 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS DE DIREITO CIVIL Quadro Evolutivo É cediço que o direito Romano apresentou as primeiras feições do Direito Civil. No direito Romano a ciência jurídica era dividida em: i) direito civil; ii) direito penal. E era civil tudo o que não era penal. O direito civil era tudo, e quem quer ser tudo talvez não consiga ser rigorosamente nada. Este era o grande problema do direito civil, pois ele englobava todas as matérias que não eram penais. E por conta disto, o direito civil apresentava-se com uma grande feição, apresentando-se dentro do direito civil: o direito do trabalho, o direito processual civil, o direito empresarial, o direito administrativo. Com a presença do absolutismo estatal o direito civil passou a ter correlação com os interesses do rei, por isso o direito administrativo situava-se dentro do campo civil. Toda esta concatenação tem como limite a Revolução Francesa, que tinha por ideais a igualdade, liberdade e fraternidade, haja vista que instaurou uma nova ordem social. A partir deste momento começa a se estruturar o direito civil moderno, isso em 1804. Neste momento surgiu o “Code de France” (Código Napoleônico), que está em vigor até hoje. A finalidade deste código foi retirar o Estado do Direito Civil, concebendo uma engenharia jurídica que preserva-se a propriedade privada, a autonomia privada, era necessário que se garantisse aos particulares o direito de contratar livremente. Foi com o Código da França que se separou pela primeira vez o direito em: público e privado. O direito público era o direito administrativo, ao passo que o direito privado era o direito civil. Napoleão queria garantir à burguesia tudo que se entregou a ele, para derrubar o absolutismo estatal (causou a queda da bastilha). Napoleão garantiu a propriedade privada, a autonomia privada contratual (que se chamava pacta sunt servanda). Napoleão, em outro passo, também garantiu a supremacia do interesse público sobre o privado em matéria de direito público. Se tiver interesse público, prevalece o interesse público, caso contrário, o particular terá autonomia. Devemos lembrar que todo o Código traz consigo certos valores. Quais eram os valores deste Código? O Código da França era: i) Patrimonialista; ii) Individualista. O direito civil construiu-se a partir da referência da propriedade privada e do pacta sunt servanda. Portanto, o direito civil quis garantir a liberdade no campo privado, mas sem violar a supremacia do interesse público sobre o privado. Temos uma grande comparação quase que idílica (figurado) entre um jardim e uma praça. Esta é uma metáfora apresentada pelo grande professor Nelson Saldanha de Pernambuco. Nelson Saldanha compara o público vs. Privado com um jardim e uma praça. A praça é o espaço do público, ao passo quo jardim é o espaço privado. Na praça só posso fazer o que a lei permite. Já no jardim posso fazer tudo, exceto o que a lei proíbe. Direito Civil 2016 2 2 Nas pegadas do Código Civil Francês, surge em 1896 um segundo Código da era moderna, qual seja: Código da Alemanha (“BGB”), que possuía as mesmas diretrizes do Código Francês. No Brasil, a primeira manifestação do direito civil foi em 1824, por meio da Constituição Imperial, que estabeleceu que em 1 (um) ano deveriam ser elaborados um Código Civil e um Código Penal. O Código Criminal do Império foi elaborado em 1832. Quanto ao Código Civil o legislador foi muito lento, sendo que em 1855 o Brasil contratou o Baiano Augusto Teixeira de Freitas para elaborar o primeiro Código Civil brasileiro, que era um homem visionário e acima dos padrões da época, e rapidamente começou os estudos. Teixeira de Freitas então em 1862 apresentou o seu Projeto de Código Civil, que ele humildemente chamou de “esboço de Código Civil”, que tinha quase 7 mil artigos, e tratava de matérias inusitadas, tais como: a proteção do nascituro; revisão judicial de contratos; e divórcio. O Governo nem deu andamento ao projeto de Teixeira de Freitas, afinal era muito evoluído para a época. Teixeira de Freitas enlouqueceu após isso, sendo até mesmo interditado. O esboço de Teixeira de Freitas adotou o “esboço” de Teixeira de Freitas, sendo hoje um dos países mais avançados do mundo em matéria de direito civil. Em abril de 1899 o Brasil contrato Clóvis Bevilaqua, que ensinava direito civil comparado na faculdade de Olinda (afinal o Brasil ainda não tinha um Código Civil). Em 6 meses Bevilaqua entregou o projeto de Código Civil (outubro de 1899). O referido projeto ficou sendo debatido no Congresso até 1936, quando foi aprovado para entrar em vigor em 1917 o Código Civil de 1916. Esse Código elaborado em 1899 só podia receber as influências da referência da época, e, portanto, recebeu direta influência do Código Civil Francês e do Código Civil Alemão, sendo assim, era o Código Civil de 1916 individualista e patrimonialista, e este Código Civil conseguiu com perfeição respirar os ares do público e do privado. Para o nosso Código de 1916 onde estava o direito público não poderia estar o privado, ou seja, não poderíamos ter a um só tempo um “mix” entre público e privado. E naturalmente o Código de 1916, trazendo essa feição entre público e privado, cuidava somente de relações patrimoniais (para garantir a propriedade privada, o pacta sunt servanda). Este Código não admitia interferência do Estado nas relações privadas. Onde estava o Poder Público não poderia estar o particular, pois havia supremacia do público sobre o privado. O saudoso Silvio Rodrigues dava como prova do caráter patrimonialista e individualista do Código Civil de 1916 o instituto da tutela. Tutela é colocação de um menor órfão em uma família substituta. No Código de 1916 a tutela era regida por 24 artigos, sendo que 23 artigos preocupavam-se com o patrimônio dele, e só um cuidava da pessoa, que era do tutor (e não do tutelado). O Código Civil de 1916 preservava a propriedade do tutelado. O Código Civil de 1916 preocupava-se com o ter, com a proteção do patrimônio. Esse Código de 1916 passou a ter um grande problema. O problema era: quando surgir um problema não trabalhado no Código, como ele será dirimido? Passamos ater a denominada legislação de emergência, vale dizer, toda vez que houvesse um problema não previsto no Código edita-se uma lei. Exemplo: quando o Código foi elaborado não existia nenhum condomínio. A partir das décadas de 30 e 40 surgiram os grandes condomínios. Condomínio é direito privado. Eram editadas leis sempre que necessário. E o sistema jurídico de direito civil ficou como? O sistema do direito civil era como se fosse um Direito Civil 2016 3 3 sistema solar. O Código de 1916 era o astro rei, que irradiava luzes aos outros sistemas (microssistemas), por exemplo: Lei de Registros Públicos, lei de inquilinato, Código de Menores, Estatuto da Mulher Casada. Estas leis se submetiam às diretrizes do Código, quais sejam: patrimonialismo e individualismo. Isso assim se manteve até 1988. Durante todo este período tivemos uma afirmação consequencial deste sistema: o Código Civil de 1916 colocou-se em uma posição de proeminência, aceitando-se a ideia de que o Código era a mais alta norma do direito civil, pois nenhuma Constituição Brasileira cuidava de direito civil, afinal o sistema era dividido em público e privado (clivagem). A Constituição era direito público e não se podia falar em direito civil. Quem tratava de direito civil era o Código Civil de 1916. Então, apelidou-se o Código Civil de 1916 de Constituição de Direito Privado, ao passo que a Constituição Federal era uma Carta Política, pois esta tinha o papel de cuidar da organizaçãopolítica-administrativa. Assim, acima do Código Civil não havia nenhuma outra norma. Havia uma subversão hermenêutica, pois o Código Civil arvorava-se em papel constitucional e a Constituição ficou reduzida a uma mera Carta Política, um protocolo de intenções administrativas. O Código Civil de 1916 conseguiu uma proeza: era uma lei ordinária que permaneceu incólume por 6 diferentes Constituições: Constituição da República (1891), Constituição de 1934, Constituição de 1937, Constituição de 1946 (Vargas), Constituição de 1967 (militares) e Constituição de 1969 (militares). Nenhuma dessas Constituições conseguiu alterar aquela matéria de lei ordinária, pois as matérias do Código Civil nunca foram tratadas em sede constitucional, afinal havia clara divisão entre público e privado. Tudo isso é significativamente alterado em 1988, com o advento da CF/88. O direito civil ganha um grande movimento advindo da Itália para o Brasil, denominado de Constitucionalização do direito civil, que tem por fundamento a percepção de que o Código Civil não tinha condições de manter um sistema. De acordo com Orlando Gomes “o Código Civil perdeu sua completude e generalidade”. Somente uma lei superior conseguiria (re)unificar o direito civil (o direito civil já havia sido unificado, mas agora deveria ser reunificado no eixo constitucional, e não mais no eixo do Código). O movimento de constitucionalização do direito civil ou direito civil constitucional nada mais significa do que a interpretação dos clássicos institutos do direito civil conforme a Constituição. Não significa que existam dois direitos civis: um no Código Civil e outro na Constituição! O direito civil é um só. Toda a compreensão do direito civil tem de se dar conforme a Constituição. Portanto, o direito civil se constitucionalizou, e aqueles institutos que só estavam presentes no Código Civil (a exemplo da propriedade, o contrato, a família etc) tem agora previsão na Constituição. A Constituição passou a disciplinar o público e o privado. Daniel Sarmento e Luiz Roberto Barroso entendem que hoje a divisão do direito em público e em privado é meramente acadêmica, pois tanto o público, bem como o privado brotam da Constituição. A Constituição apresenta os pilares da Constituição de um e de outro, consequentemente, a divisão é meramente acadêmica. ATENÇÃO: Cuidado para não confundir Constitucionalização do direito Civil com Publicização do Direito Civil (CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL ≠ PUBLICIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL). Constitucionalização do direito civil = É a compreensão dos institutos do direito civil conforme a Constituição, vale dizer, é a vinculação do tecido normativo Direito Civil 2016 4 4 infraconstitucional às normas constitucionais. Todas as normas infraconstitucionais precisam ser interpretadas conforme a Constituição. Na ADI 4277 há um espetacular exemplo de constitucionalização do direito civil. Discutiu-se nesta ADI se o conceito de união estável poderia alcançar as uniões heteroafetivas e também as homoafetivas. O artigo 1.723 do Código Civil diz assim: A união estável é entre homem e mulher (é heteroafetiva). Contudo, o STF entendeu que de acordo com os valores da Constituição (dignidade humana, solidariedade, liberdade, igualdade) o art. 1.723 do CC tem que ser interpretado que a união estável entre pessoas do mesmo sexo é possível. Publicização (Dirigismo contratual)= é a episódica e casuística intervenção do Estado em uma relação privada para garantir igualdade entre as partes. O Estado percebe que determinadas relações privadas precisa do Estado, justamente para se manter a isonomia entre as partes. Ocorre quando o Estado penetra em uma relação privada visando a isonomia entre as partes. Exemplo: atuação das agências reguladoras, entre as quais algumas vão se imiscuir nas relações com os Planos de Saúde. A Seguradora só pode aumentar a contribuição de acordo com os índices estabelecidos pelo governo. A União penetra em uma relação privada para estabelecer limites. É um claro exemplo de dirigismo contratual. Estes dois movimentos podem estar juntos (Constitucionalização + Publicização), a exemplo do direito do trabalho e direito do consumidor. Este movimento de constitucionalização (de compreensão do direito civil conforme a Constituição) gera preocupação com o ser e não com o ter. Se o Código de 1916 preocupava-se fundamentalmente com a proteção do patrimônio (do ter), a Constituição preocupou-se com “o ser”. A tábua de valores da Constituição Federal (tábua axiológica da CF/88) revela essa preocupação com o “ser”. Quais são os valores da Constituição? Liberdade, Igualdade e solidariedade social. A Constituição estabelece uma espécie de “revival” (ela volta no tempo), pois resgata no tempo a liberdade, a igualdade e a solidariedade como tábua de valores, com o objetivo de se garantir a dignidade da pessoa humana. Esta preocupação com o “ser” faz com que direito adapte-se a isso. E teremos com isso no direito civil um movimento de (re)personalização, sendo que o direito civil passa a se preocupar com a pessoa humana. Não quer dizer que o direito civil deixou de proteger o patrimônio. Continua-se protegendo-se o patrimônio (a propriedade continua privada, o contrato continua submetido ao pacta sunt servanda). Ele apenas agora tem como proteção precípua (fundamental) a dignidade humana. O direito civil antevê uma grande proteção da pessoa humana. Esse movimento inaugura uma nova era denominada de: Direito Civil Mínimo, que significa intervenção mínima do Estado na relação privada. O Estado só deve intervir na relação privada quando for necessário para garantir: dignidade, igualdade, solidariedade e liberdade. Se não há necessidade de preservar estes valores, vale a autonomia das partes (autonomia privada). É esse movimento de Direito Civil Mínimo, que faz com que o Estado intervenha para proteger a pessoa. Direito Civil 2016 5 5 (XL Concurso MP/MP) Dissertação: Em poucas linhas, elabore dissertação, respondendo à seguinte pergunta: “O direito civil está em crise?” Para responder a esta questão temos que passar por todo o histórico do direito civil (Código de 1916 até 2002) e falar sobre o movimento de Constitucionalização. Crise pode ser tomada no sentido de mudança de paradigma, ocasião em que a resposta seria afirmativa. Se a palavra crise for tomada no sentido de extinção, a resposta seria negativa. A Constitucionalização do direito civil teria alterado a estrutura do Direito Civil? RESPOSTA: O direito civil é, foi e será para sempre ramo do direito privado. O direito civil cuida das relações privadas, indiscutivelmente. E a relação privada é propriedade, contrato e família. O que o direito civil sofreu foi uma modificação valorativa e não estruturante (a estrutura é a mesma, mas os valores foram modificados). Se os valores do Código de 1916 eram patrimonialismo e individualismo, a Constituição estabeleceu novos valores (liberdade, igualdade e solidariedade), passamos com isso a ter uma incompatibilidade no sistema. O Código Civil era incompatível com a Constituição. Assim, percebeu-se a necessidade da criação de um novo Código Civil (CC/2002). 1. Código Civil de 2002 e os seus paradigmas (diretrizes): eticidade, operabilidade e socialidade (BOBBIO e da Estrutura à Função) O Código Civil de 2002 veio atender à circunstância de a Constituição ter trazidos novos valores. E assim sendo, o Código Civil de 2002 apresentou 3 valores, quais sejam: a) Eticidade b) Operabilidade c) Socialidade Então, podemos de certo modo dizer que o movimento de constitucionalização exigiu um novo Código com valores diferentes (e não os valores do individualismo e patrimonialismo, pois estes estavam em rota de colisão com a Constituição).Os paradigmas do novo Código permeiam todo o sistema jurídico de direito civil e de direito privado a partir da Constituição. A sistema jurídico do Direito Civil continua assemelhado a um sistema solar. Onde estava antes o Código Civil (em uma posição privilegiada) está hoje a Constituição. A Constituição é o grande astro rei. A Constituição tem preocupação com a dignidade humana. O Código Civil agora é uma das normas do direito privado, ao lado do Código de Defesa do Consumidor, Estatuto da Criança e do Adolescente, Estatuto do Torcedor, Lei de Direitos Autorais, Estatuto do Idoso, etc. Todas essas normas do direito civil submetem- se à Constituição. Por isso que o Código Civil novo precisava de valores que se adaptam-se à dignidade da pessoa humana. Como é que se organiza o direito civil? O Direito Civil divide-se em: a) Parte Geral: onde se estuda os elementos componentes de uma relação jurídica. Toda e qualquer relação jurídica possui: Sujeito (Pessoas), objeto (Bens) e vínculo (Fatos Jurídicos). Direito Civil 2016 6 6 b) Parte Especial: onde se estuda os campos nos quais se projetam as atividades privadas, quais sejam: Trânsito jurídico (= circulação de riquezas. São os Direitos das Obrigações) Ex.: pagamento, cumprimento de contrato, indenização por um prejuízo etc.); titularidade (= propriedade. São os direitos Reais.); afetivas (relações de afeto. Ex.: direito de família. São os direitos de família e sucessões). Obs.: A Parte Geral do Código Civil não estuda as relações privadas, pois estas encontram-se na Parte Especial. A Parte Geral estuda a relação jurídica, e não a relação privada. A parte Geral do Direito Civil tem, portanto, aplicação universal. Exemplo: no direito do trabalho é preciso que o objeto seja lícito; no contrato administrativo é necessário que exista agente capaz. As obrigações (onde se insere o contrato), direitos reais e família precisam ser compreendidos de acordo com os valores da eticidade, operabilidade e socialidade. A eticidade significa compreensão ética de uma relação. Eticidade é um neologismo para dizer que todas as relações privadas precisam ser compreendidas conforme a ética. Ética não se confunde com a moral. Ética é coletiva, é aquilo que se espera de todos (não tem uma conotação moral). Exemplo de eticidade: boa-fé objetiva. Se um dia os contratos foram interpretados pelo pacta sunt servanda (contratou tem que cumprir! Morra, mas cumpra!), agora tem que ser interpretado conforme a ética (boa-fé objetiva – é a ética que se espera das relações contratuais). A socialidade é a compreensão dos institutos do direito civil com uma preocupação com a sua função social. Os institutos do direito civil precisam cumprir uma função social, não podendo o direito civil ter mais uma visão individualista (precisa ter compreensão social). É a função social do contrato, é a função social da propriedade. A operabilidade é a utilização dos institutos do direito civil de forma fácil. A utilização dos institutos não deve ser complexa, não deve ser com apego ao tecnicismo. O direito civil deve ser facilmente compreendido. Aqui serve o exemplo da distinção entre prescrição e decadência, em que o direito civil facilitou a compreensão destes institutos. NORBERTO BOBBIO, em sua obra “Da estrutura à função”, apresentou esses elementos que hoje foram incorporados ao nosso Código Civil, quais sejam: eticidade, socialidade e operabilidade. Na própria Exposição de Motivos do Código Civil escrita por MIGUEL REALE revela-se esses três paradigmas (eticidade, socialidade e operabilidade). 2. Incidência dos Direitos Fundamentais nas relações privadas E aqueles direitos fundamentais tratados na Constituição incidem no Direito Civil (INCIDÊNCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS)? Incorporada esta ideai de constitucionalização do direito Civil (Direito Civil Constitucional), nós passamos a ter um segundo momento de reflexão, que veio por conta de debates doutrinários que terminaram por desembocar no Supremo Tribunal Federal. A discussão gravitou ao redor da seguinte questão: que o direito civil vai ser interpretado Direito Civil 2016 7 7 conforme a Constituição é indiscutível (o contrato, a propriedade e família serão interpretados conforme a Constituição), mas a autonomia privada (a vontade das partes) teria o condão de afastar a incidência dos direitos fundamentais? Poderia A e B celebrar um contrato afastando um direito fundamental constitucional? É a ideia do direito civil mínimo (em que o Estado só deve intervir para respeitar a dignidade). Alguns autores primeiramente disseram que sim. Contudo, posteriormente surgiu a tese da aplicação direta dos direitos fundamentais (= eficácia horizontal dos direitos fundamentais). Esta foi a tese que prevaleceu na doutrina (a exemplo de LUIZ ROBERTO BARROSO, DANIEL SARMENTO, CRISTIANO CHAVES DE FARIA). O STF então foi exortado para discutir a matéria no leading case RE 201.819/RJ (rel. Ministro Gilmar Mendes). Leading case significa caso paradigmático ou caso líder, que é o precedente que inaugura uma orientação sobre determinada matéria. O entendimento do STF, consagrado neste leading case, foi no sentido que os direitos fundamentais não se aplicam somente nas relações verticais (administrador x administrado – de direito público), mas também nas relações horizontais (vinculam também as relações privadas). Era um caso envolvendo uma Associação de Compositores do Rio de Janeiro, e tinha um chato que todos os demais queriam expulsá-lo, o Estatuto da Associação (que é uma relação privada) dizia que para expulsá-lo só bastava colocar em votação. Convocou-se a Assembleia e todos quiseram expulsá-lo. O chato era tão chato, que ele foi para a Justiça exigindo que lhe fosse assegurado o contraditório e ampla defesa. E o STF mandou reintegrá-lo na Associação, dizendo que o Estatuto Associativo não pode afrontar os direitos fundamentais, pois estes vinculam as relações entre particulares. O movimento de constitucionalização do direito civil agregou a eficácia dos direitos fundamentais, vale dizer, os institutos do direito civil devem ser interpretados conforme a Constituição, e nenhuma relação privada pode afrontar os direitos fundamentais (que possuem eficácia horizontal). 3. A aplicação direta dos direitos sociais nas relações privadas (Eficácia horizontal dos direitos sociais). Surge outra questão: Se os direitos fundamentais possuem uma eficácia horizontal, e os direitos sociais dos artigos 6º e 7º da Constituição também possuem eficácia horizontal (ex.: educação)? Alguns constitucionalistas no Brasil deflagraram o debate, e este ganhou fôlego, e hoje prevalece na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que os direitos sociais previstos na CF/88 (artigos 6º e 7º) possuem também eficácia horizontal. Os direitos sociais também têm aplicação direta nas relações entre particulares. Exemplos: STJ, 302 (Súmula): é abusiva (= nula) a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado” (direito à saúde é um direito social, e um contrato não pode limitar o direito à saúde). STJ, 364 (Súmula): o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas (pessoas sozinhas = singles). Embora as pessoas sozinhas não sejam família, elas possuem o direito social à moradia. Moradia é um direito social. Direito Civil 2016 8 8 (MPF/05) Disserte sobre: Constitucionalização e personalização do direito civil. Esboço histórico e fontes. A eficácia privada dos direitos fundamentais. 4. A incidência direta dos tratados e convenções internacionais no âmbito das relações privadas. Controlede convencionalidade do direito Civil (Convencionalização do Direito Civil). Os tratados e convenções internacionais também são vinculativos nas relações privadas? Precisamos primeiramente lembrar do § 3º, artigo 5º da CF/88 (com redação conferida pela EC n. 45). Este dispositivo estabelece que Tratados e Convenções Internacionais que versem sobre direitos humanos, e que seja incorporado por maioria qualificada no Congresso (maioria de 3/5 em 2 turnos de votação), terão status de norma constitucional. Para a boa compreensão do tema, vamos lembrar que o sistema normativo é piramidal. Temos no topo (ápice) a Constituição Federal de 1988, e abaixo encontram-se as normas infraconstitucionais. É a partir desta arquitetura piramidal é que o assunto vai ser resolvido. Os Tratados e Convenções internacionais que versem sobre direitos humanos (requisito material) e que foram aprovados na forma da EC n. 45 (requisito formal) serão incorporados em sede constitucional. Desta feita, como eles têm status constitucional, eles impõem ao tecido infraconstitucional o controle de constitucionalidade. Exemplo: A Convenção de Nova Iorque foi incorporada pelo Decreto Legislativo 186/2008. A Convenção de Nova Iorque trata da proteção da pessoa com deficiência. No nosso país, a proteção de pessoa com deficiência é norma constitucional. Já os Tratados e Convenções Internacionais que não versam sobre direitos humanos (não preenchem o requisito material) serão incorporados em sede infraconstitucional. Entram no sistema como qualquer outra norma infraconstitucional (em patamar de igualdade com o Código Civil, CDC, etc). Exemplo: Convenção de Varsóvia de 1929 trata de transporte aéreo – tem status de norma infraconstitucional, é uma lei como outra qualquer. E se ela é uma lei como outra qualquer, eventual conflito entre a Convenção de Varsóvia e outro dispositivo interno, será resolvido pelo princípio da especialidade da norma. Na referida Convenção há um tabelamento para a companhia aérea que perde a bagagem do passageiro. Contudo, o CDC diz que toda e qualquer indenização por força de relação de consumo deve ser com reparação integral. O STJ entendeu que prevalece o CDC em razão do princípio da especialidade (REsp 169.000/RJ). No que tange aos Tratados e convenções internacionais que versam sobre direitos humanos (preenchem o requisito material), mas não foram aprovados na forma da EC/45 (não preenchem o requisito formal), o STF (no RE 466.343/SP e HC 87.585/TO) entendeu que serão incorporados no intermédio entre a norma Constitucional e a norma infraconstitucional, vale dizer, há uma eficácia supralegal. Não podem ter status constitucional, pois não preencheram o requisito formal. E não merecem ter eficácia infraconstitucional, pois versam sobre direitos humanos. Exemplo: Pacto de San Jose da Costa Rica (Convenção Interamericana de Direitos Humanos). É de 1969. O artigo 7º do referido Pacto estabelece que os países signatários do pacto não admitirão prisão civil por Direito Civil 2016 9 9 dívida, exceto o do devedor de alimentos. O artigo 5º, LXVII da CF/88 estabelece que no Brasil admite-se a prisão por dívida de alimentos e do infiel depositário, na forma da lei. O artigo 652 do Código Civil diz como vai ser preso o depositário infiel (Art. 652. Seja o depósito voluntário ou necessário, o depositário que não o restituir quando exigido será compelido a fazê-lo mediante prisão não excedente a um ano, e ressarcir os prejuízos). O STF editou a súmula vinculante 25, que reza: “é ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”. A súmula 419 do STJ vai mais longe, dizendo que é ilícita a prisão do infiel depositário até mesmo com relação ao depósito judicia. As normas infraconstitucionais submetem-se, portanto, a um controle de convencionalidade. 5. A interpretação das normas do Direito Civil (normas gerais) e a possibilidade de diálogo das fontes (diálogo de conexão ou de complementariedade). Afastamento episódico da prevalência da especialidade. Interpretar o direito civil é interpretar uma norma geral. E sempre que interpretamos uma norma geral, lembramos do princípio da especialidade. De acordo com o princípio da especialidade, norma especial sempre afasta norma geral. Entretanto, devemos perceber que o Código Civil aproximou-se do ideal constitucional. O Código Civil abeirou-se da Constituição, quer respirar os ares dos valores constitucionais. Exatamente por isso, e não raro, o Código Civil traz normas mais especiais e mais protetivas do que as próprias normas encontradas nas leis especiais. Aqui surge o chamado diálogo das fontes (diálogo de conexão ou complementariedade), tese concebida pelo professor alemão ERIK JAIME, e trazida pelo Brasil pela professora CLÁUDIA LIMA MARQUES (Rio Grande do Sul). O diálogo das fontes é a possibilidade de inversão episódica e casuística do princípio da especialidade, vale dizer, é possível aplicar a lei geral no lugar da lei especial sempre que a lei geral mostrar-se mais protetiva para o sujeito de direito a que se pretende proteger. Portanto, é possível aplicar o Código Civil (lei geral) no lugar de uma lei especial, quando o Código Civil for mais protetivo para determinado sujeito de direito. Os dois terrenos mais férteis para aplicação do diálogo das fontes são: o direito do trabalho e o direito do consumidor. O artigo 445, § 1º do Código Civil é mais favorável ao consumidor do que os artigos 26 e 27 do CDC ao estabelecer o prazo para reclamação de vícios redibitórios. Exemplo: Se comprou um produto com defeito (ex. celular), o prazo no CDC é de 30 ou 90 dias (se durável ou não durável), contados da descoberta do vício. Já o artigo 445, § 1º do Código Civil diz que se o vício for de difícil constatação o prazo será de 180 dias se for móvel ou de 1 ano se for imóvel, a partir da constatação. Nestes casos a norma geral é mas protetiva e mais eficiente para o sujeito de direitos, permitindo-se o diálogo das fontes. 6. Interpretação do direito civil: regras e princípios Direito Civil 2016 10 10 Para falar dos mecanismos de interpretação do direito civil devemos falar de DWORKIN, ALEXY, CANOTILHO, BONAVIDES, LUIZ ROBERTO BARROSO, DIRLEY DA CUNHA JÚNIOR. O entendimento é praticamente universal no sentido de que a norma jurídica bifurca-se em dois campos: a) norma-regra; b) norma-princípio. A diferença entre elas não é de hierarquia. Norma-regra: é uma norma de conteúdo fechado e de solução apriorística (= é apriorística por ter grau de abstração reduzido). Norma-princípio: é uma norma de conteúdo aberto e de solução casuística, com elevado grau de abstração. Se houver colisão entre norma-regra e norma-princípio (norma-regra x norma- princípio), a solução deve ser conforme a Constituição, prevalecendo-se a norma constitucional. Se há uma regra constitucional colidindo com um princípio infraconstitucional, prevalece a regra. Se tem regra e tem princípio, supõe-se que as regras são elaboradas a partir dos princípios. As regras têm, portanto, presunção de constitucionalidade. Se a regra for incompatível com o sistema, e não com a regra, daí é caso de controle de constitucionalidade, interpretação conforme a constituição (com ou sem redução de texto) etc. Se houver colisão entre norma-princípio e norma-princípio (norma-princípio x norma-princípio), a solução ocorre por meio da técnica de ponderação de interesses (que veio do direito alemão e desenvolvida no direito norte-americano). É uma técnica que utiliza a proporcionalidade como técnica de solução de conflitos. Ponderação de interesses e proporcionalidade não necessariamente são sinônimos. A proporcionalidade pode apresentar-se como: a)princípio interpretativo (= razoabilidade); b) técnica de solução de conflitos (= ponderação de interesses). Quando a proporcionalidade apresenta-se como princípio interpretativo ela ganha o nome de razoabilidade. Exemplo: Convenção de condomínio que proíbe de modo absoluto a entrada de animais deve ser interpretada de acordo com a proporcionalidade. O STJ entende que animais dóceis podem ingressar. Aqui é a utilização da proporcionalidade como razoabilidade. Quando a proporcionalidade apresenta-se como solução de conflitos entre princípios ela ganha o nome de ponderação de interesses. Dois princípios são colocados em uma balança imaginária para se descobrir qual deles em um caso concreto tem maior densidade. É isso que é a ponderação. A solução é sempre casuística, não importando em exclusão definitiva de um dos princípios conflitantes. Exemplo: STJ, Resp 226.436/PR (relativização da coisa julgada na ação de conhecimento de filho) – a coisa julgada é um princípio constitucional, e o direito à perfilhação também. Aquelas ações julgadas Direito Civil 2016 11 11 improcedentes pelo fato de não terem feito DNA podem ser repropostas agora. Exemplo 2: Súmula 309 do STJ – “o débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que vencerem no curso do processo”. Ponderação é o critério para dirimir conflitos principiológicos, portanto. Se houver colisão entre norma-regra e norma-regra (norma-regra x norma- regra), utiliza-se os clássicos métodos hermenêuticos: I) norma superior afasta inferior; II) norma especial afasta a geral; III) norma posterior afasta a anterior. Uma regra prevalece em relação a outra, sem que esta outra seja eliminada. É preciso atentar-se a uma nova técnica (que vem do direito inglês – common law) de solução da colisão entre norma-regra e norma-regra, qual seja: derrotabilidade (defeseability). Alguns autores, como HUMBERTO ÁVILA, preferem denominar de Superabilidade. Trata-se de uma técnica excepcional de interpretação de regras. A derrotabilidade é a possibilidade de afastamento episódico de uma regra constitucional e válida, mas que se mostra incompatível com o caso concreto. A sua aplicação pode violar os valores que inspiraram a sua própria edição. Exemplo: artigo 1.521 do Código Civil, que trata da proibição do incesto. É proibido casar irmão com irmão. Justifica-se. Contudo, na Espanha dois irmãos descobriram que eram irmãos após 14 anos de casamento, tinham 4 filhos sem qualquer deficiência. O Ministério Público ingressou com ação de anulação de casamento. A regra é válida, mas aplicar esta regra neste caso sacrifica os valores que a inspiraram: preservação do núcleo familiar. Apesar da regra ser boa e válida, ela será derrotada (é a derrotabilidade da regra no caso concreto). Essa derrotabilidade só pode ser pontual (episódica) No STF e no STJ já há precedentes admitindo toda a teoria, mas sem denominar de derrotabildiade. Exemplo: REsp 799.431/MG (reprovação de aluno como nota 7.955 ao invés de nota mínima 8.00 em concurso público. Ele ficou em 1º lugar em todas as primeiras provas, mas no teste físico tirou 7.955). O STJ derrotou a exigência de nota mínima de 8, e aprovou ele com 7.955. Exemplo 2: STF admitiu o sequestro de verbas públicas fora dos casos previstas na regra (RE AgREgRecl. 3034/PB). Direito Civil 2016 12 12 LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO 1 Ponto1 - Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. 1.1 LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO 1.1.1 NOÇÕES GERAIS A LICC, atual LEI DE INTRODUÇÃO ÀS NORMAS DO DIREITO BRASILEIRO (Lei 12376/2010) é uma regra de superdireito ou sobredireito (E. ZITELMANN utiliza o termo, que é assimilado pelo direito hermenêutico). Ou seja, são normas que definem a aplicação de outras normas. As principais funções da Lei são: a) determinar o início da obrigatoriedade das leis (art 1º) ; b) regular a vigência e eficácia das normas jurídicas (art 1º e 2º); c) impor a eficácia geral e abstrata da obrigatoriedade, inadmitindo a ignorância da lei vigente (art.3º); d) traçar os mecanismos de integração da norma legal, para a hipótese de lacuna na norma (art.4º); e) delimitar os critério de hermenêutica, de interpretação da lei (art.5º); f) regulamentar o direito intertemporal (art.6º); g) regulamentar o direito internacional privado no Brasil (art. 7º a 17), abarcando normas relacionadas à pessoa e à família (art.7º e 11), aos bens (art 8º), às obrigações (artigo 9º), à sucessão (art.10), à competência da autoridade judiciária brasileira (art. 12), à prova dos fatos ocorridos em pais estrangeiro (art.13), à prova da legislação de outros países (art. 14), à execução da sentença proferida por juiz estrangeiro (art. 15) à proibição do retorno (art. 16), aos limites da aplicação da lei e atos jurídica de outro pais no Brasil (art. 17) e, finalmente, aos atos civis praticados por autoridade consulares brasileiras praticados no estrangeiro (art. 18 e 19) (CRISTIANO CHAVES – TEORIA GERAL – 7º EDICAO) Recente alteração no texto da LINDB (Lei n° 12.874/2013): Art. 1° Esta Lei dispõe sobre a possibilidade de as autoridades consulares brasileiras celebrarem a separação consensual e o divórcio consensual de brasileiros no exterior, nas hipóteses que especifica. Art. 2° O art. 18 do Decreto-Lei no 4.657, de 4 de setembro de 1942, passa a vigorar acrescido dos seguintes §§ 1o e 2o: “Art. 18. ........................................................................ § 1º As autoridades consulares brasileiras também poderão celebrar a separação consensual e o divórcio consensual de brasileiros, não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, devendo constar da respectiva escritura pública as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento. § 2° É indispensável a assistência de advogado, devidamente constituído, que se dará mediante a subscrição de petição, juntamente com ambas as Direito Civil 2016 13 13 partes, ou com apenas uma delas, caso a outra constitua advogado próprio, não se fazendo necessário que a assinatura do advogado conste da escritura pública.” (NR) Art. 3° Esta Lei entra em vigor após decorridos 120 (cento e vinte) dias de sua publicação oficial. 1.1.2 VALIDADE, VIGÊNCIA, VIGOR E EFICÁCIA DAS NORMAS JURÍDICAS A validade, cuja aferição determinará a sua compatibilidade ou não com o sistema jurídiconormativo, pode ser analisada sob os seguintes aspectos: a) FORMAL (observância das normas referentes ao processo de criação da lei, exemplo: artigo 60, §§ 1º e 2º CF); ou b) MATERIAL (verificação da matéria passível da codificação está sendo observada, exemplos: artigos 21 a 24, CF/88, artigos que estabelecem as matérias que podem ser objeto de regulação e por quem). A VIGÊNCIA é critério puramente temporal da norma. Trata-se do lapso temporal no qual a norma tem força obrigatória, vinculatividade (Rosenvald). O início da vigência, portanto, marca o começo de sua exigibilidade. * “VACATIO LEGIS”: período que medeia entre a publicação e o início de vigência da norma. Tratase de tempo necessário a que o texto normativo se torne efetivamente conhecido, e variará de acordo com a repercussão social da matéria. Assim dispõe o art. 8º da Lei Complementar 95/1998: “A vigência da lei será indicada de forma expressa e de modo a contemplarprazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, reservada a cláusula "entra em vigor na data de sua publicação" para as leis de pequena repercussão”. * “VACATIO LEGIS INDIRETA”: “hipótese em que a lei, além do seu normal período de vacatio legis, em seu próprio corpo, prevê um outro prazo para que determinados dispositivos possam ter aplicação, a exemplo do que ocorreu com os arts. 30 e 32 da Lei nº.10.826 , de 22/12/2003 (Estatuto do Desarmamento)”. A jurisprudência do STJ associa a vacatio legis indireta estipulada no Estatuto do Desarmamento à abolitio criminis temporária de algumas infrações penais (vide REsp 1.311.408-RN). Os atos administrativos, como regra, entram em vigor na data de sua publicação (Decreto 572/1980), não se lhes aplicando a regra prevista a LC 95/1998. As Emendas à CF, em regra, também tem vigência imediata. A lei que altera o processo eleitoral, embora tenha vigência imediata, só se aplica a disputas ocorridas depois de um ano de sua publicação (CF, art. 16). Hipótese de suspensão de eficácia. A EFICÁCIA refere-se à possibilidade de produção concreta de efeitos. A eficácia pode ser classificada pela ineficácia. Por sua vez, pode ser: a) SOCIAL (não se confunde com sua efetiva observância,) e b) TÉCNICA (a possibilidade de produção de efeitos em concreto, EXEMPLO: artigo 7º, I, CF/88, proteção contra a despedida arbitrária que deve ser regulada por Lei Complementar, a eficácia técnica está comprometida). Tércio Sampaio afirma que a eficácia possui graus, que podem ser verificados de acordo com as funções da eficácia no plano da realização normativa. São as funções eficaciais das normas: a) Função de bloqueio – normas punitivas e proibitivas. b) Função de programa – normas que visam à realização de um objetivo do legislador (artigo 218, CF/88). Direito Civil 2016 14 14 c) Função de resguardo – normas que visam a assegurar uma conduta desejada (artigo 5º, XXVII, CF/88). O VIGOR está relacionado à realização efetiva e concreta da norma, está relacionado com o conceito da ULTRATIVIDADE, ou seja, uma norma que não está mais vigente, mas continua a reger todas as relações jurídicas consolidadas em sua vigência. EXEMPLO: alguns artigos do CC/16. 1.1.3 APLICAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS Na aplicação das normas jurídicas o operador depara-se com as seguintes atividades: a INTERPRETAÇÃO e a INTEGRAÇÃO. - INTERPRETAÇÃO A finalidade interpretativa da norma é: a) revelar o sentido da norma e b) fixar o seu alcance. São métodos de interpretação (não são excludentes e nem exclusivas entre si) das normas: 1. Literal ou gramatical – o exame de cada termo isolada e sintaticamente, na maioria das vezes, não é o melhor método; isoladamente nunca satisfaz. 2. Lógico – utilização de raciocínios lógicos indutivos ou dedutivos. 3. Sistemático – análise a partir do ordenamento jurídico no qual a norma se insere, a norma não será verificada isoladamente, será relacionada com o ordenamento jurídico. 4. Histórico – verificação dos antecedentes históricos, verificando as circunstâncias fáticas e jurídicas, até mesmo o processo legislativo. Caio Mário afirma que esse método não existe, o que há é o elemento histórico invocado para coadjuvar o trabalho do intérprete. 5. Finalístico ou teleológico – análise da norma tomando como parâmetro a sua finalidade declarada, adaptando-a às novas exigências sociais; não se analisam somente os aspectos históricos, mas também a própria finalidade. Quanto mais métodos forem aplicados, no exercício da interpretação, melhor resultado será obtido pelo intérprete. Não há hierarquia em relação aos critérios acima, e um não exclui o outro. – INTEGRAÇÃO Quando inexiste lei a ser aplicada diretamente ao caso, deve o magistrado se valer de outras fontes do Direito para encontrar a regra que efetivamente deve disciplinar à relação jurídica sujeita à sua apreciação, ou seja, para aplicar o Direito. A LICC permite a integração na hipótese de lacunas (falta de previsão legal sobre uma matéria), nos termos do artigo 4º (REGRA DE OURO para a integração das leis): Artigo 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Essas são as fontes supletivas do direito, juntamente, com a DOUTRINA, a JURISPRUDÊNCIA e a EQÜIDADE, que são também métodos de integração da norma jurídica. A interpretação pode ocorrer sempre, mesmo que a lei seja clara (isso é um dogma). Já a integração depende da existência de LACUNAS que, por sua vez, podem ser: a. AUTÊNTICAS (PRÓPRIAS) – ocorrem quando o legislador não identificou uma hipótese Direito Civil 2016 15 15 b. NÃO-AUTÊNTICAS (IMPRÓPRIAS) – o legislador previu, mas preferiu não tratar sobre o assunto. EXEMPLO: cabimento de embargos de declaração contra decisão interlocutória. Cabe mencionar classificação utilizada por Maria Helena Diniz: a) Lacuna normativa – ausência total de norma. b) Lacuna ontológica – presença de normas mas sem eficácia social. c) Lacuna axiológica – presença de norma cuja aplicação se mostra injustiça no caso concreto. d) Lacuna de conflito – antinomias. “SILÊNCIO ELOQÜENTE” – o legislador quis excluir a possibilidade, é a possibilidade de se restringir a aplicação da lei com base na LACUNA NÃO-AUTÊNCIA. Exemplo: competência constitucional da Justiça Federal não pode ser ampliada pelo legislador, sob a alegação de tratar-se de lacuna. Tratase de rol taxativo (numerus clausus). Aceita-se a integração das lacunas em razão do princípio que determina que o juiz não pode se eximir de julgar sob tal alegação (“Princípio do non liquet” que, no Direito Romano, permitia ao pretor eximir-se de julgar alegando que o caso não está suficientemente claro). Analogia pode ser dividida em: a. analogia legal – a relação da semelhança toma por base outra lei; b. analogia iuris – a relação de semelhança é estabelecida com base em outro caso concreto Há dificuldade de aplicação dos costumes, já que nosso direito não é costumeiro; a fonte primária, no Brasil, é a lei. Costume pode ser: a. secundum legem – sua eficácia obrigatória é reconhecida pela lei, como nos casos dos arts. 1297, § 1º, 596 e 615 do CC b. praeter legem – tem caráter supletivo, complementar à lei. c. contra legem – de revogação total. Isso é complicado, já que costume é fonte secundária do direito e não pode revogar a lei. Mas existem exemplos que demonstram a aplicação do costume contra lei. Ex.: reconhecimento jurisprudencial da possibilidade de comprovação de contrato por testemunha no caso de venda de gado. Trata-se no máximo de perda da eficácia da lei e não da perda da sua validade (DESUSO) - APLICAÇÃO TEMPORAL DE NORMAS JURÍDICAS O princípio básico dessa matéria é o PRINCÍPIO DA NÃO-RETROATIVIDADE DAS LEIS (Tempus regit actum), ou seja, a idéia de que a lei nova não atinge os fatos anteriores ao início de sua vigência. Em consequência, os fatos anteriores à vigência da lei nova regulam-se não por ela, mas pela lei do tempo em que foram praticados. Porém, podem existir casos que se afastem dessa regra, impondo a retroatividade da lei nova, alcançando fatos pretéritos ou os seus efeitos. Para disciplinar essas hipóteses, a doutrina efetuou uma clássica distinção entre retroatividade máxima, média e mínima (MATOS PEIXOTO), porque a força retroativa da lei não tem sempre a mesma intensidade. RETROATIVIDADE MÁXIMA OU RESTITUTÓRIA OU RESTITUTI VA MÉDIA a lei nova abrange a coisa julgada (sentença irrecorrível) ou os fatos jurídicos consumad os a lei nova atinge os direitos exigíveis mas não realizados antes de sua vigência Direito Civil 2016 1616 Dessa natureza constitucional do princípio da irretroatividade das leis no direito brasileiro surgem importantes consequências, como a aplicação deste a toda e qualquer lei infraconstitucional, sem qualquer distinção entre lei de direito público e lei de direito privado ou entre lei de ordem pública e lei dispositiva. É princípio assente também, com base na natureza constitucional da irretroatividade, que a lei nova não alcança os efeitos futuros dos contratos celebrados anteriormente a ela, e que só atingirá os facta pendentia no que não contrariar DIREITO ADQUIRIDO. DIREITO ADQUIRIDO – direito já definitivamente incorporado ao patrimônio do particular. Posição jurídica já assegurada ao titular em razão do cumprimento dos requisitos previstos em lei vigente ao tempo da ocorrência dos pressupostos fáticos, que não pode ser afetada pela superveniência de norma que modifique as exigências para sua aquisição, mesmo que não exercida no tempo de vigência da norma anterior. Direito adquirido somente tem conteúdo patrimonial. Não existe direito adquirido de caráter personalíssimo. ATO JURÍDICO PERFEITO: ato já consumado ao tempo da lei anterior; ato que cumpriu integralmente as fases do seu ciclo de formação ao tempo da norma revogada, que não pode ser prejudicado pela alteração posterior do parâmetro normativo. Questão fundamental sobre a aplicação temporal das leis reside na REVOGAÇÃO, regulamentado pelo artigo 2º da LICC: A revogação pode ser: 1) Expressa 2) Tácita – o artigo 9º da LC 95/98 não acabou com a hipótese de revogação tácita, porque mesmo que a nova lei não mencione expressamente a revogação dos dispositivos, o ordenamento jurídico não comporta a existência de duas leis antagônicas. PAMPLONA: não é possível esse entendimento, porque significaria a revogação da própria LICC, e a LC 95/98 (mesmo com a redação dada pela LC 107) não revogou a LICC, até porque também não foi expressa na revogação, assim, também não é válida nesse aspecto, porque desobedeceu a sua própria regra. 1) Total = Ab-Rogação 2) Parcial = Derrogação REPRISTINAÇÃO é a restauração da norma revogada pela revogação da norma revogadora. Há vedação de sua existência no ordenamento, por força do §2º do artigo 2º, da LICC. A lei revogada NÃO se restaura pela revogação da lei revogadora, SALVO se a nova lei revogadora disser que ocorre (§3º do artigo 2º). Não se confunde com EFEITO REPRISTINATÓRIO TACITO previsto expressamente no artigo 11,§2º da lei 9868/99. 1.2 PESSOAS FISICAS ou NATURAIS: 1.2.1 PERSONALIDADE A forma como o CC dispõe sobre a pessoa (art. 1º) indica que a característica desta é a possibilidade de ser sujeito de direito. PESSOA É O SER HUMANO OU ENTIDADE COM PERSONALIDADE, APTIDÃO PARA A TITULARIDADE DE DIREITOS E DEVERES. Percebe-se que o conceito de personalidade é construído segundo uma teoria clássica, que a identifica com CAPACIDADE DE DIREITO. Tal noção adequa-se não apenas aos homens, mas também às pessoas jurídicas (ou “entes morais”, nos dizeres de Caio Mário). Personalidade seria, então, o atributo “jurídico” do fato de ser pessoa, uma projeção social da personalidade psíquica. O segundo sentido de personalidade associa- se ao ser humano e traduz-se como valor ético emanado do princípio da dignidade da pessoa humana e da consideração pelo direito civil do ser humano em sua complexidade, relacionando-se a direitos que tocam somente à pessoa natural (direitos da personalidade, segundo parcela da doutrina que exclui a PJ de seu âmbito). Direito Civil 2016 17 17 Muito além da compreensão tradicional de representar aptidão para adquirir direitos e contrair obrigações, a personalidade jurídica, contemporaneamente, é categoria essencialmente relacionada à cláusula de tutela e promoção da dignidade da pessoa humana, pela qual se deve reconhecer ao ser humano, singular e concretamente considerado, um conjunto mínimo de atributos, direitos e garantias sem as quais não será possível a vida com dignidade (o direito à vida compreende, em verdade, o direito a uma vida digna). O conceito de capacidade, embora conexo à noção de personalidade, com esta não se confunde. “Enquanto a personalidade tende ao exercício de relações existenciais, a capacidade diz respeito ao exercício de relações patrimoniais. Exemplificando, ter personalidade é titularizar os direitos da personalidade, enquanto ter capacidade é poder concretizar relações obrigacionais, como o crédito e o débito. Nesse diapasão, exemplificando, uma criança ou adolescente tem personalidade (e, por conseguinte, direito a uma vida digna), mas não tem capacidade. Em sendo assim, poderá manifestar a sua vontade em relação à sua adoção por terceiro, por exemplo, mas não lhe é reconhecido o direito de celebrar um contrato de doação ou de arrendamento. Ou seja, relações existenciais podem ser titularizadas por quem tem personalidade, mesmo que não tenha plena capacidade” (Rosenvald). AQUISIÇÃO DE PERSONALIDADE: nos termos do art. 2º do CC, ocorre com o nascimento com vida, quando há a separação do ventre materno e o ar entra nos pulmões, fazendo com que a pessoa respire (o que é aferível pelo exame de docimasia hidrostática de Galeno). Mesmo que morra em seguida, há aquisição de personalidade e, consequentemente, possibilidade de ser sujeito de direitos que, com a morte, serão transmitidos aos herdeiros. Há divergência acerca da teoria adotada pelo NCC para início da personalidade. NASCITURO: é o ser já concebido, mas que ainda se encontra no ventre materno. A discussão em torno de sua condição jurídica dá-se justamente em razão da delimitação do momento em que se inicia a existência humana, conforme exposto acima. A questão polêmica é que CC afirma que os direitos do nascituro estão a salvo desde a concepção. Ou seja, não são pessoas, mas têm proteção jurídica, ensejando dúvidas sobre o início da personalidade. Várias teorias tentam harmonizar essas regras: (1) NATALISTA (Caio Mário, Serpa Lopes, – despreza a existência da personalidade antes do nascimento com vida (esta, por sua vez, é considerada independentemente de viabilidade ou de forma humana). Assim, o nascituro tem mera expectativa de direito; (2) TEORIA DA PERSONALIDADE CONDICIONAL (Arnold Wald)– a personalidade existe desde a concepção, sob a condição de nascer com vida (condição suspensiva); (3) CONCEPCIONISTA (Bevilaqua, Teixeria de Freitas, Francisco Amaral) – o nascituro tem personalidade jurídica, ele é a pessoa que está por nascer; os direitos que teria, porém, seriam somente os personalíssimos e os da personalidade. Percebemos que aos poucos, a teoria concepcionista vai ganhando mais espaços nos tribunais, inclusive na própria legislação brasileira, a exemplo da lei de alimentos gravídicos (lei 11804/2008), e de recentes decisões do STJ que admitiram o dano moral ao nascituro (RESP 399028-SP) e até mesmo pagamento de DPVAT pela morte de nascituro (noticiário de 15.05.2011). Teoria adotada pelo CC/2002 Segundo Flavio Tartuce1, o Código Civil não deixou clara a corrente que seguiu, pois no seu art. 2º utiliza tanto o termo “nascimento” quanto o termo “concepção”. Contudo, 1 Em artigo: A SITUAÇÃO JURÍDICA DO NASCITURO: UMA PÁGINA A SER VIRADA NO DIREITO BRASI- LEIRO, autor Flávio Tartuce. Direito Civil 2016 18 18 segundo referido autor, a doutrina majoritária e o STJ vem adotando a Teoria Concepcionista ao reconhecer direitos ao nascituro. Nas palavras dele: “Se o art. 2º do Código Civil em vigor deixa dúvidas, a interpretação sistemática do sistema não pode afastar o reconhecimento desses direitos. Por isso, podemos reafirmar que prevalece entre nós a teoria concepcionista.”. * O nascituro pode receber doação e ser beneficiadopor legado ou herança. 1.2.2 CAPACIDADE CAPACIDADE DE DIREITO OU DE GOZO: é a aptidão – em estado potencial – de ser titular de direitos patrimoniais e obrigações, tendo por termo inicial o nascimento e perdurando até a morte. Prevista no art. 1º do CC, atribui-se capacidade de direito também à PJ. O conceito de capacidade de direito se confunde com o de personalidade. A personalidade jurídica é uma aptidão genérica. Toda pessoa tem personalidade, e por consequência toda pessoa tem capacidade, seja um adulto, seja uma criança. Capacidade neste sentido se relacionaria com a personalidade como faces da mesma moeda. CAPACIDADE DE EXERCÍCIO OU DE FATO: é a aptidão para exercer PESSOALMENTE os direitos, de agir juridicamente, por atos próprios ou mediante representante voluntário, praticando atos da vida civil. Diferentemente da capacidade de direito, nem todas as pessoas a possuem. É o caso dos incapazes, cujos atos jurídicos são praticados por meio de representantes ou assistentes. A capacidade de fato é medida de proteção ao incapaz, que, destituído da plenitude de discernimento, necessita de auxílio para a prática dos atos da vida civil (representação ou assistência). A primeira é estática, a segunda, dinâmica. Reunidas as duas, fala-se em CAPACIDADE CIVIL PLENA. Ressalte-se que ambas diferenciam-se da LEGITIMAÇÃO ou LEGITIMIDADE. A legitimação consiste em se averiguar se uma pessoa, perante determinada situação jurídica, tem ou não capacidade para estabelecê-la. Assim é que o cego não pode fazer testamento particular, o juiz não pode comprar bens da hasta que presidir, o tutor não pode adquirir bens do tutelado, irmãos não podem se casar, ainda que dotados de capacidade civil plena. Portanto, a capacidade é a aptidão para a prática em geral dos atos jurídicos, enquanto a legitimidade é específica de determinado ato. INCAPACIDADE: A ausência da capacidade de fato (e não a capacidade de direito, que é genérica) gera a incapacidade civil. Esta incapacidade civil é também desdobrável em: a) Incapacidade civil absoluta (artigo 3º) b) Incapacidade civil relativa (artigo 4º) INCAPACIDADE ABSOLUTA: atinge aqueles listados no art. 3º do CC: Os Incisos II e III do art. 3º do NCC (Inciso II - Os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III - Os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade) foram revogados pela Lei nº 13.146/2015, que Institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) (DOU 7.7.2015, em vigor após 180 dias de sua publicação oficial), a qual Direito Civil 2016 19 19 passou a tratar as hipóteses como incapacidade relativa, nos termos do art. 4º, II e III, do NCC (II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico; III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade). Ademais, o inciso I do art. 3º foi incorporado ao caput, passando-se a prever, como única hipótese de incapacidade civil absoluta, o menor de 16 anos. Menores de 16 anos: presunção de imaturidade. No entanto, conforme previsão de enunciado formulado na III Jornada de Direito Civil do CJF, “a vontade dos absolutamente incapazes, na hipótese do inc. I do art. 3o., é juridicamente relevante na concretização de situações existenciais a eles concernentes, desde que demonstrem discernimento suficiente para tanto.” (importante para o direito de família) Os atos praticados pelos absolutamente incapazes são NULOS, não podendo ser ratificados, pois tal vício não convalesce, podendo o juiz assim declará-los de ofício. Protege-se, entretanto, a boa-fé de terceiros. Os atos civis de seu interesse deverão ser exercidos por seus representantes – pais, tutores ou curadores. Absolutamente incapazes devem ser REPRESENTADOS por quem de direito. * Mesmo em se cuidando de pessoas absolutamente incapazes, a ordem jurídica reconhece a possibilidade de que sua vontade seja considerada, nos casos em que envolvidas escolhas existenciais. CJF, Enunciado 138 – Art. 3º: “A vontade dos absolutamente incapazes, na hipótese do inc. I do art. 3o, é juridicamente relevante na concretização de situações existenciais a eles concernentes, desde que demonstrem discernimento bastante para tanto”. INCAPACIDADE RELATIVA: zona intermediária entre a incapacidade absoluta e a capacidade plena, configurando apenas uma diferença quantitativa. A vontade dos relativamente capazes tem relevância jurídica, o que possibilita sua atuação direta nos atos civis, desde que acompanhados de ASSISTENTE, com algumas exceções (ser mandatário, testemunhar). É causa de anulabilidade dos atos jurídicos. Atinge aqueles arrolados no art. 4º: • I - Maiores de 16 e menores de 18: idade reduzida em relação ao antigo código (16 a 21). Estes incapazes não podem eximir-se de uma obrigação se dolosamente ocultaram sua idade quando inquiridos ou, ainda, declararam-se maiores. Assim, não lhe aproveitam a possibilidade de anulação do ato jurídico, em razão da proteção da boa-fé de terceiro. • II - Os ébrios habituais e os viciados em tóxico (Redação conferida pela Lei nº 13.146/2015, DOU 7.7.2015, em vigor após 180 dias de sua publicação oficial): para tais pessoas, será designado um curador, graduado conforme o comprometimento mental do agente. Se aniquilar a capacidade, e não apenas reduzir, a incapacidade é absoluta. III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade: (Redação conferida pela Lei nº 13.146/2015, DOU 7.7.2015, em vigor após 180 dias de sua publicação oficial): Hipótese antes tratada no art. 3º, como causa de incapacidade civil absoluta. IV - Pródigo: aquele que desordenadamente gasta e destrói o que é seu, reduzindo- Direito Civil 2016 20 20 se à miséria por sua culpa. A restrição da validade de seus atos à anuência de um assistente referese apenas àqueles que importem disposição patrimonial e que extrapolem a mera administração de seus bens. Proteção que encontra fundamento na “teoria do estatuto jurídico do patrimônio mínimo” desenvolvida por Luiz Edison Fachin. Dispõe ainda o parágrafo único do artigo 4º do CC: Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial. (Pablo Stolze Gagliano): A disciplina normativa dos silvícolas está, agora, na legislação especial. A Lei 6.001/73 considera-o, em princípio, “agente absolutamente incapaz, reputando nulos os atos por eles praticados sem a devida representação”. Ressalta a lei, todavia, a hipótese do índio demonstrar discernimento, aliado à inexistência de prejuízo em virtude do ato praticado, pelo que, aí, poderá ser considerado plenamente capaz para os atos da vida civil (...). EMANCIPAÇÃO: Prevista no artigo 5º do CC, é mecanismo que possibilita que o menor relativamente incapaz torne-se plenamente capaz. É, pois, uma antecipação da capacidade de fato (e não da maioridade!). Pode ser de 3 espécies: VOLUNTÁRIA, por ato unilateral dos pais, ou de um deles na falta do outro, sendo ato irrevogável – sempre em benefício do menor. Nesse caso, os pais continuam respondendo pelos atos ilícitos dos filhos. JUDICIAL, concedida pelo juiz, ouvido o tutor, desde que o menor tenha pelo menos 16 anos completos. LEGAL, em decorrência de situação inconciliável com a inaptidão para atos da vida civil, como: 1) casamento (a separação, a viuvez ou mesmo a anulação do casamento, para o cônjuge de boa-fé, não geram retorno à menoridade), inclusive daquele que não tem 16 anos (para evitar imposição de crime ou em caso de gravidez); 2) exercício de cargo ou emprego público efetivo; 3) colação de grau em curso de ensino superior; 4) estabelecimento civil ou comercialou existência de relação de emprego do maior de 16 anos que gerem economia própria. CJF, Enunciado 397 - Art. 5º. A emancipação por concessão dos pais ou por sentença do juiz está sujeita a desconstituição por vício de vontade. EXTINÇÃO DA PERSONALIDADE: Nos termos do artigo 6º, ocorre com a morte, exclusivamente (não há morte civil), evento que se caracteriza pela cessação de toda e qualquer atividade vital do indivíduo (para fins de transplante, considera-se suficiente a morte encefálica). Direito Civil 2016 21 21 1.2.3 MORTE PRESUMIDA Ela pode ser, no entanto, PRESUMIDA, nos casos: a) de ausência, nas ocasiões em que a lei autoriza a abertura da sucessão definitiva (art. 6º), e b) se for extremamente provável a morte para quem estava em perigo de vida e, se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra (art. 7º). Embora aqui se dispense a decretação da ausência, somente poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento. Procede-se mediante JUSTIFICAÇÃO, segundo procedimento estabelecido na Lei de Registros Públicos, a fim de se promover o assento de óbito por meio de provas indiretas. COMORIÊNCIA: no caso de não se poder precisar a ordem cronológica das mortes dos comorientes (pessoas que morreram em uma mesma situação), a lei firmará a presunção de haverem falecido no mesmo instante. Em caso de serem parentes, não sucedem um ao outro, abrindo-se cadeias sucessórias distintas. 1.2.4 AUSÊNCIA É o desaparecimento de uma pessoa de seu domicílio, sem dar notícias do lugar onde se encontra, nem deixar procurador para administrar seus bens, acarretando, por essa razão, dúvida a respeito de sua sobrevivência. Esse estado precisa ser declarado judicialmente. No CC/16, o ausente era considerado absolutamente incapaz, o que não foi repetido pelo NCC, afinal, só por estar desaparecida, a pessoa não deixa de ter capacidade para a vida civil onde esteja. O fato de ter um representante (curador) decorre da impossibilidade de administrar seus bens. No que diz respeito à tutela dos bens, o instituto da ausência é tratado em três etapas: Curadoria do ausente: inicia-se com a petição inicial de qualquer interessado (parentes sucessíveis, sócios, credores, pessoas que têm pretensão contra o ausente) ou do MP. O juiz deverá, em seguida, arrecadar os bens abandonados e nomear curador. Isso ocorrerá, ainda que o ausente tenha deixado procurador, se este não puder ou não quiser exercer o mandato. O curador será, em primeiro lugar, o cônjuge do ausente, desde que não separado judicialmente ou de fato, por mais dois anos. Subsidiariamente, serão nomeados os ascendentes e, em seguida, os descendentes. Não havendo nenhuma dessas pessoas, o juiz escolherá um curador. Este, nomeado, receberá do juiz poderes e obrigações especiais, ficando responsável pela administração e conservação do patrimônio do ausente, pelo que receberá uma gratificação e terá ressarcido o que gastou no exercício da curadoria. É vedado ao curador adquirir bens do ausente. Depois da arrecadação, serão publicados editais de dois em dois meses, durante um ano, para chamar o ausente a retomar seus bens, cessando a curadoria caso reapareça (1), caso compareça seu procurador (2) ou, ainda, haja notícia inequívoca de seu óbito (3). Sucessão provisória: Ocorre após 01 ano da arrecadação ou, caso o ausente tenha deixado procurador, passados 03 anos. Consiste em uma administração (não mero depósito) para preservar os bens do ausente, de modo que não sejam alterados mais do que o necessário, já que o desaparecido pode estar vivo. Depende de pedido dos interessados. Não havendo qualquer dos interessados mencionados, o MP pode requerer a sucessão provisória. A sentença que a determina produz efeitos depois de 180 dias de sua publicação; mas, tão logo transite em julgado, ocorre a abertura do testamento e do inventário, como se o ausente fosse falecido. Não comparecendo herdeiro ou interessado para requerer a abertura do inventário, após 30 dias do trânsito em julgado, a massa de bens do ausente será considerada como herança jacente. Os Direito Civil 2016 22 22 herdeiros que se imitirem na posse dos bens devem prestar garantia pignoratícia ou hipotecária, com exceção do cônjuge, dos ascendentes e dos descendentes. Aqueles que não puderem ter a posse dos bens, por não prestarem a devida garantia, receberão a metade dos rendimentos da cota de seus bens. Cônjuges, ascendentes e descendentes receberão a integralidade dos frutos produzidos pelos bens que administram. Os outros herdeiros, a metade. Reaparecendo o ausente e provado que a ausência foi injustificada e voluntária, ele perderá os frutos em favor do sucessor. Não se poderá alienar os imóveis do ausente. Sucessão definitiva: após 10 anos do trânsito em julgado da sentença que concedeu a abertura da sucessão provisória. Na mesma oportunidade, levantam-se as garantias prestadas. Ela ocorre em menor prazo, caso o ausente tenha 80 anos e esteja sumido há, pelo menos, cinco anos. Após o trânsito em julgado da sentença que concede a sucessão definitiva dos bens, declara-se a morte presumida. Retornando o desaparecido ou algum de seus descendentes ou ascendentes, nos 10 anos seguintes à abertura da sucessão definitiva, receberá os bens nos estado em que se encontrarem, os sub-rogados em seu lugar ou o preço que os herdeiros houverem recebido. Efeitos familiares da ausência: se o ausente deixar filhos menores e outro cônjuge tiver falecido ou não tiver direito de exercer o pátrio poder, eles serão considerados órfãos. Se os pais estiverem ausentes, os menores devem ser postos em tutela. Após a declaração de morte presumida, o casamento resta dissolvido – consequência inovadora, não tratada no ACC nem tampouco admitida anteriormente pela doutrina. 1.2.5 DIREITOS DA PERSONALIDADE Uma das principais inovações do NCC é a existência de um capítulo próprio dos direitos da personalidade. Retrata a mudança axiológica da codificação, de um código agrário e conservador (que só abarcava os direitos subjetivos reais e obrigacionais) para outro que se preocupa substancialmente com o indivíduo, em sintonia com CF/88. Sua localização, no NCC, mostra, ainda, que o ser humano é o protagonista do novo sistema. É o fenômeno da despatrimonialização ou repersonalização do direito privado. Conceito: são aqueles que têm por objeto os atributos físicos, psíquicos e morais da pessoa em si e em suas projeções sociais, com o fim de proteger a essência e a existência do ser humano. A idéia que norteia sua disciplina é a de uma esfera extrapatrimonial do indivíduo, tutelada pela ordem jurídica com respaldo em uma série de valores não redutíveis pecuniariamente, como a vida, a integridade física, a intimidade, a honra etc. Síntese: direitos relacionados aos atributos e prerrogativas considerados essenciais ao pleno desenvolvimento da pessoa humana, em todas as suas dimensões (física, psíquica e intelectual), capazes de individualizar o sujeito e lhe garantir vida digna, mediante uma segura e avançada tutela jurídica. CJF, enunciado 274 – Art. 11. “Os direitos da personalidade, regulados de maneira não-exaustiva pelo Código Civil, são expressões da cláusula geral de tutela da pessoa humana, contida no art. 1º, III, da Constituição (princípio da dignidade da pessoa humana). Em caso de colisão entre eles, como nenhum pode sobrelevar os demais, deve-se aplicar a técnica da ponderação”. Direitos da personalidade vs Liberdade públicas. Os direitos da personalidade situam- se acima do direito positivo, sendo considerados inerentes ao homem; as liberdades públicas, por sua vez, dependem necessariamentede positivação para assim serem consideradas. Quanto ao conteúdo, estas se inserem em categorias transindividuais (econômicas e sociais, por ex.), enquanto aqueles têm caráter individual. Natureza: trata-se de poderes que o homem exerce sobre sua própria pessoa. É um tertium genus de direito subjetivo, de índole fundamental (vide art. 5º, § 2º, e art. 1º, III, da CF). Diga-se, ainda, que o seu objeto não é a própria personalidade, mas sim as Direito Civil 2016 23 23 MANIFESTAÇÕES ESPECIAIS DE SUAS PROJEÇÕES (físicas, psíquicas e morais), consideradas dignas de tutela jurídica, principalmente no sentido de que devem ser resguardadas de qualquer ofensa. Sobre seus fundamentos jurídicos, há duas correntes: a positivista (ou tipificadora), que identifica como direitos da personalidade somente aqueles reconhecidos pelo Estado, que lhes daria força jurídica, não aceitando, assim, a existência de direitos inatos à condição humana. A norma jurídica seria seu único fundamento, pois ética, religião, história, política, ideologia não passam de aspectos de uma mesma realidade. Por sua vez, a corrente jusnaturalista relaciona os direitos da personalidade às faculdades exercitadas naturalmente pelo homem, pois são atributos inerentes à condição humana. Titularidade: por excelência, é do ser humano, mas alcança também os nascituros, que, embora sem personalidade, têm direitos ressalvados desde a concepção. No tocante aos absolutamente incapazes, decidiu recentemente o STJ (Informativo nº 599/2015), que “O absolutamente incapaz, ainda quando impassível de detrimento anímico, pode sofrer dano moral”. As pessoas jurídicas também o são, no que diz respeito ao nome e à imagem, que acabam por atingir os valores societários. A CF não faz distinção entre pessoa natural e pessoa jurídica ao dispor sobre o direito à honra e à imagem, não podendo haver restrição na sua interpretação. A abrangência indistinta também ocorre no inciso V do art. 5º do texto constitucional (indenização por dano moral e à imagem). Assim, apesar de uma concepção originalmente antropocêntrica dos direitos da personalidade, são eles aplicáveis à PJ quanto aos atributos que lhe são reconhecidos (nome e outros sinais distintivos, segredo, criações intelectuais e outros). Tal entendimento já estava consagrado na jurisprudência, por Súmula do STJ (nº 18: “A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”) e agora o NCC põe fim à polêmica, com o art. 52: “Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade”. A corrente doutrinária divergente (Gustavo Tepedino, Cláudia Lima Marques) restringe a titularidade dos direitos da personalidade ao ser humano, por três motivos: (1) a origem de sua positivação está na Constituição Alemã, que dispõe expressamente que “a dignidade da pessoa humana é inviolável”; (2) a lesão a nome de PJ configura um dano patrimonial, não moral, pois ela só tem honra objetiva (externa ao sujeito – consiste no respeito, consideração, apreço) e o prejuízo é unicamente material; (3) estender os direitos da personalidade a ecossistema, animais e PJ significa desmerecê-los, desvalorizá-los. Tal corrente defende que, apesar de serem a pessoa natural e a PJ sujeitos de direito, seus fundamentos são diversos. Ademais, essa extensão não se adapta à trajetória e à função dos direitos da personalidade no ordenamento. CJF, Enunciado 286 – Art. 52. “Os direitos da personalidade são direitos inerentes e essenciais à pessoa humana, decorrentes de sua dignidade, não sendo as pessoas jurídicas titulares de tais direitos”. Características: • Caráter absoluto: são oponíveis erga omnes. A pretensão é que será dirigida a certa(s) pessoa(s). Não quer dizer que são ilimitáveis. Nesse aspecto, eles são relativos, incidindo a razoabilidade, em caso de colisão. • Generalidade (caráter necessário dos dir. da personalidade): são outorgados a todas as pessoas, nunca podem faltar-lhes. Direito Civil 2016 24 24 • Extrapatrimonialidade: ausência de conteúdo patrimonial direto, aferível objetiva- mente, ainda que sua lesão gere efeitos econômicos (dano moral) • Indisponibilidade: decorre de seu caráter essencial. Abrange tanto a INTRANSMISSIBILIDADE (não se admite a cessão do direito de um sujeito para outro) como a IRRENUNCIABILIDADE (ninguém pode dispor de sua vida, sua intimidade, sua imagem). No entanto esta indisponibilidade é relativa, já que o artigo 11 admite restrição voluntaria, desde que atendidas os seguintes requisitos: 1) não pode ser permanente; 2) não pode ser genérico; 3) não pode violar a dignidade do titular Enunciado da jornada de direito civil(dez/2004),: “Art. 11 - Os direitos da personalidade podem sofrer limitações, ainda que não especificamente previstas em lei, não podendo ser exercidos com abuso de direito de seu titular, contrariamente à boa-fé objetiva e aos bons costumes.” • Impenhorabilidade: A ausência de conteúdo econômico impede a penhora. Estes não podem ser penhorados, mas o crédito deles decorrentes sim. Da mesma forma, deve-se admitir a penhora dos créditos da cessão de uso do direito à imagem. • Vitaliciedade: os direito da personalidade se extinguem com a morte . O art. 12, parágrafo único, do NCC prevê o dano reflexo aos direitos da personalidade dos membros da família, em caso de lesão ao que seriam os direitos da personalidade da pessoa morta. A verdade é que não se trata de sucessão, em exceção ao princípio da indisponibilidade, mas de proteção aos direitos da personalidade dos parentes, que são lesados indiretamente. Os legitimados para requerer o dano são, subsidiariamente: cônjuges e descendentes; ascendentes; colaterais. • Imprescritibilidade: não existe prazo para seu exercício, não se extinguindo pelo não-uso. Espécies: Os direitos personalíssimos não são enumeráveis, porém, entre os mais importantes, destacam-se: • VIDA: o mais precioso direito do ser humano. Trata-se de direito à vida e não sobre a vida, de modo que seu titular não pode cercear esse direito. • INTEGRIDADE FÍSICA: sobre esse direito, têm o CC as seguintes disposições: 1. Princípio do consentimento informado (art. 15): o paciente tem direito de sa- ber qual é o tratamento ou a cirurgia recomendada pelo médico e quais são suas conseqüências, para que a opção seja feita com consciência. A responsabilidade do médico, assim, não é só quanto à técnica, mas também quanto à informação. CJF, Enunciado 402: “Art. 14, parágrafo único. O art. 14, parágrafo único, do Código Civil, fundado no consentimento informado, não dispensa o consentimento dos adolescentes para a doação de medula óssea prevista no art. 9º, § 6º, da Lei n. 9.434/1997 por aplicação analógica dos arts. 28, § 2º (alterado pela Lei n. 12.010/2009), e 45, § 2º, do ECA”. CJF, Enunciado 403: “Art. 15. O Direito à inviolabilidade de consciência e de crença, previsto no art. 5º, VI, da Constituição Federal, aplica-se Direito Civil 2016 25 25 também à pessoa que se nega a tratamento médico, inclusive transfusão de sangue, com ou sem risco de morte, em razão do tratamento ou da falta dele, desde que observados os seguintes critérios: a) capacidade civil plena, excluído o suprimento pelo representante ou assistente; b) manifestação de vontade livre, consciente e informada; e c) oposição que diga respeito exclusivamente à própria pessoa do declarante”. CJF, Enunciado 533: “O paciente plenamente capaz poderá deliberar sobre todos os aspectos concernentes a tratamento médico que possa lhe causar risco de vida, seja imediato ou mediato, salvo as situações de emergência ou no curso de procedimentos médicos cirúrgicos que não possam ser interrompidos”. 2. Limites à disposição do corpo: só pode haver a diminuição permanente da
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