Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Ronaldo Seroa da Motta - 99 ESTUDO DE CASO 6 PROJETOS FLORESTAIS NA GRÃ-BRETANHA In: Garrod G. E e Willis, K. The environmental economic impact of woodland: a two-stage hedonic price model of the amenity value of forestry in Britain, Applied Economics, vol.24, pp. 715-728, 1992. Analisado por: Ronaldo Serôa da Motta Recurso ambiental: florestas urbanas na Grã-Bretanha Objetivo: análise de custo-benefício Metodologia: Valor estimado Método utilizado valor de uso indireto das amenidades preços hedônicos Interesse empírico: aplicação do método de preços hedônicos com detalhamento da fase de levantamento de dados. utilização dos resultados da valoração para gerar indicadores de política ambiental. 100 - MANUAL PARA VALORAÇÃO ECONÔMICA DE RECURSOS AMBIENTAIS PROJETOS FLORESTAIS NA GRÃ-BRETANHA In: Garrod G. E e Willis, K. The environmental economic impact of woodland: a two-stage hedonic price model of the amenity value of forestry in Britain, Applied Economics, vol.24, pp. 715-728, 1992. OBJETIVOS Este estudo é um dos poucos casos de aplicação do método de preços hedônicos (MPH) com preços de propriedade para valorar benefícios ambientais associados às florestas36. O principal objetivo desta valoração foi o de gerar indicadores de benefícios de amenidades das floresta britânicas, derivados do prazer estético e recreação. O estudo visa, principalmente, instrumentalizar a Comissão Florestal do Reino Unido (CF) no seu planejamento florestal, de forma a maximizar a combinação dos benefícios madeireiros e de amenidades das florestas. Até então, a Comissão havia limitado seus investimentos e programas de fomento florestais com base somente nos benefícios madeireiros. No entanto, o Parlamento deste país recomendou que os benefícios das amenidades fossem também considerados, quando do planejamento do período de rotação e de seleção de espécies. As primeiras estimativas utilizadas destes benefícios de amenidades adotaram o método do custo de viagem, realizados pelos mesmos autores para 15 distritos florestais no país.37 Todavia, esta avaliação foi restrita aos benefícios recreacionais e não permitiu uma análise da correlação de espécies e da idade das árvores, nas medidas de disposição a pagar. Dessa forma, ao adotarem o MPH, os autores esperam gerar indicadores de benefícios que possibilitem orientar o planejamento da composição florestal voltada para a captura dos benefícios de amenidades. RELEVÂNCIA ECOLÓGICA A Comissão Florestal britânica planeja a manutenção e expansão das florestas do País através de fomento e subsídios a governos locais. Estas atividades de reflorestamento são muito importantes para o crescimento do capital natural de florestas no País. No caso das florestas urbanas, os benefícios de amenidades tornam-se fator fundamental para agregar valor às florestas, na medida em que a apropriação deste valor de uso permite que a política florestal garanta uma melhoria de bem-estar, associada à proteção das áreas florestais. Até então a política da CF foi dirigida para espécies coníferas, com maior retorno madereiro e pouca ênfase em folhosas com maior valor ambiental, avaliadas, neste estudo, restritamente no tocante aos fluxos de benefícios relativos a amenidades. RESULTADOS OBTIDOS Por exemplo, os resultados da função de demanda por residências próximas a florestas indicam que um aumento em 1% na área de folhosas, mantendo as outras variáveis nos seus valores médios, aumenta o preço esperado da residência em quase US$ 69,00, enquanto para as coníferas, o mesma variação relativa geraria uma redução de, aproximadamente, US$ 226,00. Estas estimativas, quando incluídas numa análise econômica de diversas formas 36Ver outras referências na bibliografia ao fim do Manual. 37Ver Willis e Garrod (1991). Este estudo baseia-se em valores de DAP dos indivíduos relativos a vários sítios naturais e não específicos a somente um. Ronaldo Seroa da Motta - 101 de combinação de cobertura vegetal, indicam, inequivocamente, uma maior rentabilidade social das florestas com substituição de coníferas por folhosas. Ou seja, os benefícios das amenidades mais que superam as perdas de produção madeireira. Tal processo de valoração viabiliza e justifica gastos governamentais no setor florestal, considerando um espectro maior de benefícios, que refletem preferências individuais dos contribuintes. METODOLOGIA A função hedônica de preços de residência Psr , da qual o preço implícito da amenidade será determinado, foi especificada como: Psr = Psr (FCi, Qi, Si, SEi, Ri) onde FCi é o vetor de características de bens e serviços existentes na área da propriedade i; Qi é o trimestre do ano em que a propriedade foi comprada; Si é o vetor de características da propriedade; SEi é o vetor de variáveis sócio-econômicas do distrito onde a propriedade se localiza; Ri é a região onde a propriedade se localiza. A principal fonte de dados utilizada para Si , Ri e Qi foi obtida junto a uma importante empresa de crédito imobiliário. Desta fonte foram utilizados os registros das transações imobiliárias realizadas para fim de crédito no ano de 1988 para o País como um todo. Cada registro de transação de propriedade foi localizado em um mapa nacional dividido em áreas de 1 km2. As propriedades localizadas em cada área, que continham uma floresta sob responsabilidade da Comissão, foram isoladas e formaram a base de dados da pesquisa. Dessa forma, obteve-se um grupo de mais de 1000 observações com mais de 100 variáveis cada, em 10 regiões distintas no país. Variáveis sócio-econômicas SEi das regiões da amostra foram obtidas de informações censitárias de 1981. As variáveis descritivas FCi das área florestais da Comissão apresentam dados de cobertura vegetal por idade para os seguintes grupos: 1. folhosas que oferecem maior nível de amenidades; 2. pinus; e 3. outras coníferas que permitem maior produção madereira. Embora a base de dados formada na pesquisa pareça ser detalhada, os autores salientam que inúmeras variáveis importantes não puderam ser incluídas, por não estarem disponíveis, tais como: (i) proximidade das propriedades em relação a área florestal; (ii) informações sobre a propriedade, data e área de construção, jardins e acesso a serviços como telefone e gás; (iii) densidade de propriedades na área; e (iv) influência de outras áreas com cobertura florestal fora da jurisdição da CF. Devido a esta última restrição de dados sobre outras florestas, não foi possível analisar os casos de propriedades localizadas em áreas sem qualquer atributo florestal. Assim, a análise concentrou-se em avaliar as variações dos preços implícitos de variações de cobertura vegetal. Mesmo assim, a intercorrelação entre diversos tipos de árvores na cobertura florestal, restringiu a análise às seguintes categorias de árvores: 102 - MANUAL PARA VALORAÇÃO ECONÔMICA DE RECURSOS AMBIENTAIS 1. todas as folhosas; 2. pinus plantados antes de 1920; 3. todas as outras coníferas plantadas após 1940. Conseqüentemente, admitem os autores, os resultados obtidos não podem ser aplicados a todas as áreas florestais da CF. Entretanto, a maior restrição metodológica surge na hipótese adotada no modelo de valoração, que admite um mercado nacional de propriedades contínuo e único para residências rurais em toda Grã-Bretanha. Com isso, reconhecem os autores, supõe-se que todos os compradores possuem informações suficientes para avaliar todas as opções de compra em todo território nacional. Esta hipótese não seria tão restritiva em estudos locais, mas, certamente, o é em estudos com cobertura espacial muito ampla. Por outro lado, os autores lembram que as melhorias de transporte e o crescente mercado de casas de fim-de-semana amplia a preferência do comprador para um mercado nacional. As variáveis FCi foram classificadas como variáveis focus, cuja arobustez dos coeficientes importa nas aplicações para definição de política. As variáveis relativas às outras características locais e da propriedade e a data de compra, que também afetam o preço de propriedade, são classificadas como variáveis livres, mas não importam para definição de política. As outras restantes são denominadas de variáveis duvidosas. A análise dos coeficientes concentrou-se, assim, nas variáveis focus. A forma funcional adotada na função de oportunidade de preços Psr foi a Box-Cox linear. Os resultados desta função indicam, por exemplo, que um aumento em 1% na área de folhosas, mantendo as outras variáveis nos seus valores médios, aumenta o preço esperado da residência em quase US$ 69,00, enquanto para o mesmo aumento relativo das coníferas haveria uma redução de, aproximadamente, US$ 226,0038. Os sinais e a significância das variáveis foram considerados satisfatórios. Para investigar a omissão de variáveis importantes, anteriormente assinaladas, e problemas de multicolinearidade, os autores reestimaram o modelo omitindo as principais variáveis focus. Os resultados demonstraram que os coeficientes variaram muito pouco na média e foram considerados estáveis e robustos. Todavia, os autores constatam que inúmeras variáveis apresentam intercorrelação e, portanto, problemas de multicolinearidade, comuns no MHP, não podem ser descartados neste estudo. Os possíveis viéses não foram, contudo, considerados muito sérios e os resultados foram utilizados na estimativa da função de demanda por residências próximas a áreas florestais. A função de demanda por residências em áreas com cobertura de folhosas foi estimada na seguinte especificação: lnBROAD = a0 + a1ln INCOME + a2lnKIDS + a3lnLARP + a4lnCON + a5lnMENAGE + a6 lnPRICE em que BROAD representa a proporção de área com árvores folhosas na área de 1km2 onde a residência está localizada; INCOME é a renda familiar; KIDS o número de crianças na residência; LARP é a proporção de área com árvores pinus plantadas antes de 1920 na área de 1km2, onde a residência está localizada; CON é a proporção de área com árvores coníferas 38Conversão realizada a taxa de câmbio de libra esterlina para dolar de 1,60. Ronaldo Seroa da Motta - 103 plantadas antes de 1940 na área de 1km2, onde a residência está localizada; MEANAGE é a idade do comprador; e PRICE é o preço implícito anteriormente calculado. TABELA 1 FUNÇÃO DE DEMANDA POR RESIDÊNCIAS PRÓXIMAS A ÁREAS COM COBERTURA DE FOLHOSAS Variáveis Coeficientes (estatística t) ln INCOME 0,8197 (9,47) lnKIDS 0,4687 (4,90) lnCON -0,2763 (-10,45) lnLARP 0,2013 (5,34) lnMEANAGE 0,3214 (2,89) lnPRICE -1,7600 (-17,07) R2 0,3155 R2(ajustado) 0,3114 Observações 1031 Os resultados para esta regressão acima estão apresentados na Tabela 1. Observa-se nesta tabela que os coeficientes são significativos e com sinal esperado, embora com R2 baixo. A elasticidade por áreas com folhosas de 0,82, entretanto, não se altera significativamente com mudanças na especificação das variáveis. RESULTADOS Três cenários foram utilizados para analisar as implicações das estimativas geradas do MPH, a saber. 1. Plantar folhosas em campos abertos. 2. Plantar pinus ao invés de coníferas. 3. Plantar folhosas ao invés de coníferas. Para avaliar o resultados, em termos de viabilidade econômica que considere os benefícios madereiros e de amenidades, os autores calcularam a taxa interna de retorno e o valor presente de cada cenário, apresentadas na Tabela 2 para distintos horizontes de tempo nos quais os benefícios seriam apropriados de acordo com o crescimento da cobertura vegetal. Os resultados da Tabela 2 indicam que amenidades elevam substancialmente a rentabilidade social das florestas. A principal conclusão é que a rentabilidade social das florestas cresce quando folhosas substituem coníferas. Ou seja, os benefícios das amenidades mais que superam as perdas de produção madereira. Este resultado é importante, na medida em que existe atualmente pouco incentivo na expansão desta cobertura vegetal devido ao seu baixo valor comercial. Dessa forma, os autores procuram mostrar que o exercício de valoração realizado permite que a atuação da Comissão Florestal seja revista e considere outros benefícios da florestas como o de amenidades que foram estimadas. 104 - MANUAL PARA VALORAÇÃO ECONÔMICA DE RECURSOS AMBIENTAIS TABELA 2 RENTABILIDADE SOCIAL DAS AMENIDADES E PRODUÇÃO MADEREIRA DE CERTAS FLORESTAS Caso básico - coníferas (Sitka spruce classe 16) TIR (%) 6,6 VPL 1128 cenário 1 - folhosas em campos abertos (oak classe 6) benefícios madeira madeira + a50 madeira + a26 madeira + a16 TIR (%) 3,1 4,4 6,7 11,1 VPL 859 323 786 1955 cenário 2 - pinus ao invés de coníferas (corsican pine, classe 14, substitui sikta spruce) benefícios madeira madeira + a50 madeira + a26 madeira + a16 TIR (%) 6,4 6,7 VPL 912 1277 cenário 3 - folhosas ao invés de coníferas (oak, classe 6 substitui sikta spruce) Benefícios madeira madeira + a50 madeira + a26 madeira + a16 TIR (%) 3,1 6,7 12,4 22,8 VPL 859 1458 6256 11309 Notas: (1) TIR = taxa interna de retorno em %. (2) VPL = valor presente líquido em dólares americanos calculado a 3% a.a e taxa de câmbio da libra esterlina de 1,60. (3) madeira = benefícios em termos de produção de madeira. (4) a16, a26 e a50 = indicam tempo em anos a partir do qual benefícios de amenidades começam a ser capturados. AVALIAÇÃO CRÍTICA Este estudo é bastante elucidativo do potencial de aplicação do método de preços hedônicos na valoração de benefícios florestais. A construção da base de dados é meticulosa e suas imperfeições sempre reconhecidas e apontadas pelos autores. Embora os resultados sejam parciais e possam ser questionados pela restrição da base de dados, permitiram mostrar, com consistência, que a inclusão de valores de uso39 associados a amenidades pode modificar radicalmente uma política de reflorestamento. Todavia, vale ressaltar que esta forte dependência numa base de dados detalhada e os possíveis viéses econométricos apontados neste exercício são considerados a maior restrição a uma aplicação mais ampla do método dos preços hedônicos. 39Talvez, equivocadamente, os autores consideram estas amenidades como valores de não-uso.
Compartilhar