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01 Fundamentos do ECA

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Tema 001
Fundamentos Doutrinários e Normativos do Direito da Criança e do Adolescente. Direito da Criança e do Adolescente: conceituação. A situação irregular e a Proteção Integral. O Estatuto da Criança e do Adolescente. Direitos Fundamentais.
Tomei por base meu caderno da faculdade.
1. A SITUAÇÃO DA CRIANÇA DO SÉCULO XVII AO XXI
A Carta Régia de 12 de dezembro de 1693 ordenou que as crianças fossem alimentadas pelos bens do Conselho do Reino. A ordem não foi cumprida: a Câmara alegou falta de recursos. A partir de então o esforço para enfrentar o problema das crianças "desvalidas" ou "expostas" ficou a cargo da Igreja Católica e, em especial, dos jesuítas. Durante todo o período colonial e parte do período imperial as crianças continuaram a ser tratadas pela caridade.
Em 1778, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro contribuiu com oitocentos cruzados para as despesas da Santa Casa de Misericórdia. Contudo, a "caridade cristã" era exercida a nível de castigo, já que as crianças eram "frutos do pecado" ("monstros" ou "pródigos", diria um romano) e podiam ser consideradas como uma espécie de "lixo social".
A partir de 1808, com a chegada da Corte Portuguesa ao Brasil, ocorreu uma mudança de mentalidade. Passou-se a exigir um determinado nível de escolarização. Com isso, engendrou-se a idéia de valorização da educação e a necessidade de um tratamento especial para os filhos da classe dominante.
Em 1822, o Brasil deixou de ser colônia. Como nação independente, no entanto, o país manteve-se ligado aos ideais europeus.
Início do período imperial
Por volta de 1830, ganhou força o movimento em prol da higienização da sociedade. Os índices de mortalidade infantil eram altíssimos e as condições de saúde dos adultos bastante precárias. Apesar deste ser o primeiro ato do império em prol da criança, o código criminal (código penal da época do Império) adotado só se preocupou com o menor em duas circunstâncias, a saber: quando o menor fosse autor ou vítima de um delito. As demais circunstâncias a respeito do menor e, em especial, as sociais, o Estado não se interessava, continuando estas a cargo da caridade da igreja. Neste código, cometendo o menor de 14 anos um ato infracional ele estaria sujeito a uma pesquisa do discernimento para aferir sua culpabilidade. Esta pesquisa era realizada de forma discricionária em relação à vida do menor e dos seus pais (só tendo sido revogada em 1923). Em sendo culpável o menor era submetido a uma casa de correção. No caso dos maiores de 14 e menores de 18 que cometeram um ato infracional eram tido como culpáveis, contudo, tinham a sua pena reduzida em 2/3. No caso dos maiores de 18 e menores de 21 que cometeram um ato infracional eram tido como culpáveis, contudo, tinham o atenuante da menoridade penal (este ponto continuou vigorando até a adoção do CC de 2002).
Resumo:
< 14: Pesquisa de discernimento
14 < > 18: Culpável c/ redução 2/3
18 < > 21: Culpável c/ redução 1/3
No dia 28 de setembro de 1871, é decretada a Lei nº 2.040, a Lei do Ventre Livre, ou Lei Rio Branco, assinada pela Princesa Izabel, então na Regência do Império. Todos os filhos de mulher escrava, nascidos a partir da promulgação daquela lei, seriam considerados "libertos", deixariam de ser "coisa" (res). Mas, de fato, as crianças libertas iriam constituir-se num grande fardo social para os senhores, os donos de seus pais.
Em 28 de setembro de 1885, foi a vez da Lei dos Sexagenários, a Lei Dantas, ou ainda a Lei Saraiva/Cotegipe, que declarava livres os escravos maiores de 65 anos.
A partir de 13 de maio de 1888, com a Lei Áurea, abolindo a escravatura, o escravo deixa de ser "coisa" para, pelo menos em tese, ser "pessoa". Essa Lei desencadeou um grande êxodo de negros dos campos para as cidades. O aumento da população urbana veio agravar ainda mais os problemas de moradia, de alimentação e de higiene. As autoridades governamentais investiram recursos no aprimoramento de sua própria classe, enquanto as crianças oriundas das classes inferiores foram excluídas, assim como seus pais. 
1889, Proclamação da República.
A pobreza tem como corolário a não-cidadania e a infância abandonada. Assim, em 1899, foi fundado o Instituto de Proteção e Assistência à Infância do Rio de Janeiro (IPAIRJ), pelo médico Artur Moncorvo Filho, com ajuda financeira de amigos, e tendo por objetivo uma atuação assistencialista junto às camadas pobres da população. Artur Moncorvo procurou sensibilizar as autoridades para uma legislação que levasse em conta o amparo à infância. No entanto, as autoridades governamentais não foram sensibilizadas para estender a população não-cidadã, as medidas que tomavam em relação às crianças das classes dominantes. A criança não-cidadã, no Brasil do século XIX, "é um caso de polícia", sem direito a uma política que a eleve da condição de "coisa" ou "de monstro" ao status de "pessoa" e "ser humano". 
Seja no Código Criminal do Império de 1830, seja no Código Penal de 1890, é cogitada a responsabilidade criminal do menor. Por sua vez, o Código Penal de 1890 ordenava o encaminhamento dos menores entre 9 e 14 anos, que agissem com discernimento, a estabelecimentos disciplinares industriais pelo tempo arbitrado pelo juiz, desde que não ultrapassassem a idade de 17 anos, já que as casas correcionais não existiam na época. Este código não produziu nenhuma alteração significativa em relação do código criminal do Império de 1830. Para não falar que nenhuma alteração de relevo foi produzida ele dispôs que todos os menores de 9 anos são inculpáveis, logo, a partir de então só estariam sujeitos a pesquisa do discernimento os menores entre 9 e 14 anos.
Resumo:
> 9: Não culpável
9 < > 14: Pesquisa de discernimento
14 < > 18: Culpável c/ redução 2/3
18 < > 21: Culpável c/ redução 1/3
Na virada deste século as principais capitais do Brasil (São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador) sofreram um inchaço muito grande em função da inserção do capitalismo. Contudo, o aumento da demanda suplantou em muito o da oferta de empregos, tendo em vista o fim do regime escravocrata (a segunda geração de negros migrou para os grandes centros em busca de emprego) e importação de mão de obra externa. Isto fez com que o abandono e, via conseqüência, o aumento da delinqüência infanto-juvenil nestes grandes centros aumentasse em muito. Associado ao fato de que o Estado era ausente, no que se refere as suas obrigações sociais (só interessando os aspectos jurídicos penais, ou seja, penalizar os culpados), fez surgir os denominados infernos sociais. Como conseqüência deste inferno social temos o grande aumento do número de órfãos.
Para tentar amenizar estes problemas surgiram as roda dos expostos dentro das Santas Casas de Misericórdia (a primeira foi a Fundação Romão Duarte), que buscavam, através da caridade, atender a este grande número de órfãos.
A Criança e a Lei no Brasil do Século XX
Se não existiam casas correcionais no século XIX, o século XX vai construí-las.
No dia 29 de dezembro de 1902, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 947. O seu artigo 1º era incisivo: "Criar uma ou mais colônias correcionais para reabilitação, pelo trabalho e instrução dos mendigos, vadios, vagabundos, capoeiras e menores viciosos que fossem encontrados e como tais julgados no Distrito Federal.". A criança marginalizada, filha da pobreza e da não-cidadania, é vista como uma ameaça à ordem, um vício a ser extirpado, uma doença a ser curada. E, para isso, deve ser encarcerada, corrigida em cárceres ou colônias.
Em 1917, o mesmo Alcindo Guanabara enviou ao Senado Federal projeto de lei que considerava não-criminosos os maiores de 12 anos e menores de 17.
A Lei nº 4.242, de 05 de janeiro de 1921, autorizou o Governo a organizar o Serviço de Assistência e Proteção à Infância Abandonada e Delinqüente. Esta Lei é o marco significativo da legislação menorista antes da promulgação do Código de Menores.
O Decreto Legislativo nº 5.083,de 1 de dezembro de 1923, que regulamentou a Lei nº 4.242, criou o Juízo de Menores do Distrito Federal. Neste momento surgiu a denominada doutrina da situação irregular, tendo vigido até a publicação do Estatuto da Criança e do Adolescente. O grande mérito desta doutrina foi o fato de ser a percussora da preocupação com os aspectos sócio econômicos e morais do menor (a partir desta doutrina o conceito do menor passou a ser todos aqueles das camadas empobrecidas), ou seja, não apenas os aspectos jurídicos penais que eram o alvo das ações do Estado até esta data. Fato também relevante abordado por esta doutrina foi a inimputabilidade do menor de 18 anos, acabando de vez com a pesquisa do discernimento adotado para os menores entre 9 e 14 anos, bem como a proibição do trabalho do menor de 16 anos. Contudo, esta doutrina incorreu no erro de manter a cultura da segregação, por ter se preocupado com os aspectos sócio econômicos dos pais destas crianças. Neste sentido criou a denominada situação irregular que era caracterizada pela aferição subjetiva e arbitrária pelo magistrado do binômio abando e delinqüência, que foi chamado, posteriormente, de ciclo perverso da carrocinha de menores. Neste caso os menores jurisdicionados pelo Estado seriam única e exclusivamente àqueles das camadas empobrecidas. Os demais menores que não pertencentes a esta camada eram denominados de crianças e tratados por varas de família. Logo institucionalizou a dicotomia de que enquanto os menores estavam sujeitos a doutrina da situação irregular, as crianças só se sujeitavam as vara de família.
Em 12 de outubro de 1927, entrou em vigor a primeira Lei de Assistência e Proteção dos Menores com o Decreto nº 17.943, o já citado Código de Menores, o primeiro a vigorar na América Latina.
O Código de Menores retomou, praticamente, todo o conteúdo da Lei nº 4.242, tendo como seu ápice a criação do Serviço de Assistência a Menores, o SAM, de 1941. 
Mas é somente a partir da segunda metade do século XX que a criança vai passar a ser contemplada como um cidadão (ainda que em desenvolvimento) e, como cidadão, um sujeito de Direitos. Em 20 de novembro de 1959, a Assembléia Geral da ONU aprovou, por unanimidade, a Declaração dos Direitos da Criança. Sua grande virtude foi transformar o problema da criança num desafio que implicava uma solução universal: pais e países tinham a obrigação de proteger e educar suas crianças.
Em 1964, a Lei nº 4.513 instituiu a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor, a FUNABEM (órgão executor do Decreto-Lei PN bem que instituiu a Política nacional do bem estar do menor), cuja competência era assim definida no artigo 5º: Art. 5º A Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor tem como objetivo formular e implantar a política nacional do bem-estar do menor, mediante o estudo do problema e planejamento das soluções, a orientação, coordenação e fiscalização das entidades que executam essa política. Sua ação seria terapêutica e preventiva, visando reintegrar os menores marginalizados e a agir sobre os "ambientes marginalizantes". Apesar deste objetivo nobre a FUNABEM continuou aprofundando as mazelas que os menores sofriam.
Na década de 70 passou-se a entender que recuperação de menores deveria ser ato político e, neste sentido, deveria ser reformulada.
Toda esta ação social vai incidir na Lei nº 6.697, de 10 de outubro de 1979 (ainda sob domínio militar), que instituiu o novo Código de Menores. Este Código buscava a integração do menor à sociedade, mas ainda não via a criança como um ser integral.
O movimento diretas já passou a defender alterações neste processo de recuperação de menores, a começar pela inserção dos direitos fundamentais da criança e do adolescente no CRFB de 1988. Esta pressão interna somou-se em muito a pressão internacional no sentido de mudança ao atendimento dos menores e adolescentes (primeiro documento foi a Convenção de Genebra, posteriormente, em 1959, surgiu a Declaração Universal dos Direitos do Homem, etc.). Estas pressões culminaram com a introdução do artigo 227 e 228 da CRFB, conforme veremos a seguir.
A sessão da ONU de 20 de novembro de 1989 aprovou por unanimidade a Convenção sobre os Direitos da Criança (principal documento internacional sobre este tema), que completa o trabalho anterior. A Declaração era uma afirmação de princípios de caráter moral, sem obrigações específicas. Por seu lado, a Convenção tem forma coercitiva e exige uma tomada de decisão por parte de cada Estado que a subscreveu e ratificou, além de incluir mecanismos de controle para verificar o cumprimento de suas disposições. Este documento é tido como de suma importância porque ele versa sobre a proteção integral da criança. A importância deste documento é tanta que a CRFB de 88 tentou sintetizá-lo em seu art. 227. Deve-se também observar que, apesar do grande apelo popular para a redução da menoridade penal, está convenção, em que pese o entendimento minoritário que o art. 228 representa uma cláusula pétrea, é a principal responsável pela não redução visto a possibilidade de embargos econômicos (sanção moral) que poderia causar a sua eventual denúncia pelo nosso Estado, apesar do Brasil adotar o sistema monista (no conflito vige a norma interna).
CRFB, Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.
Por fim, a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que dispôs sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), tentou, pela primeira vez em nossa história, tratar a criança integral, o adolescente em sua totalidade, enfim, o ser humano em desenvolvimento inserido na sociedade.
Resumo
Menor é um lixo social
1830 Império
Código Criminal (pesquisa de discernimento < 14 anos)
Lei do Ventre Livre - 1871
Lei do Sexanenário - 1885
Lei Áurea - 1888
1889 República
Código Criminal (9anos < pesquisa de discernimento < 14 anos)
Roda dos expostos
Juizado de Menores (doutrina da situação irregular) - 1923
Serviço de Assistência ao Menor - 1941
FUNABEM - 1964
Menor é um problema político - 1970
CRFB - 1988
Convenção sobre os direitos da criança - 1989
ECA - 1990
2. UMA VISÃO GERAL DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
A escola de Proteção Integral foi adotada pelo ECA. Para seus seguidores, a criança e o adolescente devem ter seus direitos reconhecidos universalmente. Crianças e adolescentes são definidos como pessoas em desenvolvimento, daí a necessidade de direitos sociais e específicos. 
CRFB, Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado (Coresponsabilidade) assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade (Absoluta Prioridade), o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (Direitos Fundamentais), além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (Proteção Especial). (...) (proteção integral)
Este artigo é tido como a síntese da proteção integral da criança e do adolescente porque ele aborda os seguintes pontos fundamentais:
a ) Coresponsabilidade da família, sociedade e Estado: não mais a responsabilidade dos direitos da criança e dos adolescente cabe somente ao Estado, sendo responsáveis, a partir de então, nos limites de suas atribuições específicas, a família e a sociedade;
b ) Absoluta Prioridade: é admitida com um princípio constitucional. O parágrafo único do art. 4o do ECA conforma este princípio de absoluta prioridade através da lista exemplificativa que ele traz. 
Art. 4o Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
 a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
 b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública (como a criança goza de absoluta prioridade esta, na concorrência com o idoso, teria primazia no atendimento);
 c) preferênciana formulação e na execução das políticas sociais públicas;
 d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude (aplicando o princípio administrativo da razoabilidade pode-se detectar se o administrador público está obedecendo este designo). 
A ação popular é o mecanismo adequado para qualquer um da população buscar a defesa desta garantia de prioridade.
CRFB, Art. 5 LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência; 
c ) Direitos Fundamentais: quando tais direito se confrontam deve-se utilizar os princípio da proporcionalidade e razoabilidade. Deve-se observar que os direitos fundamentais não são só aqueles elencados no 227, mais sim todos os outros afetos as pessoas em desenvolvimento, como, por exemplo, a proteção ao trabalho, conforme o disposto abaixo:
CRFB, Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (...)
XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;
d ) Proteção Especial: é o dever que todos nós temos de colocarmos a salvo toda criança e adolescente de toda a forma de violência contida na última parte do 227.
Para dar uma maior eficácia a este artigo houve a necessidade do ECA, que, por sua vez, é tido como o regimento interno deste artigo.
O ECA está dividido em dois livros.
O Primeiro Livro, Parte Geral, é composto de artigos que tratam dos mecanismos e instrumentos à disposição dos brasileiros para a salvaguarda da integridade física, mental e moral de todas as nossas crianças e adolescentes, além de instrumentos regulamentados da guarda, da tutela e da adoção para aqueles que necessitem de uma família substituta. 
Resumidamente podemos dizer que este livro detalha os direitos fundamentais da criança e do adolescente. É deste detalhamento que nasce a política de atendimento do ECA (art. 86 e seguintes - modus operandi desta política de atendimento - sistema articulado de ações governamentais e não governamentais) que nada mais é do que um sistema de garantia dos direitos fundamentais da criança e do adolescente garantindo que este possa exercer a sua cidadania.
O Segundo Livro, Parte Especial define as diretrizes e as bases da política de atendimento dos Direitos da Criança e do Adolescente em situação de risco social e pessoal. Resumidamente podemos dizer que este livro contem os mecanismo que asseguram os direitos fundamentais detalhados no livro um.
3. A PROTEÇÃO INTEGRAL ÀS PESSOAS EM DESENVOLVIMENTO
Título I
Das Disposições Preliminares
Nesta parte geral do ECA os Artigos 1º, 3º e 4º expressam e consagram, respectivamente, a proteção integral à criança e ao adolescente, colocando-os na condição de sujeitos de direito.
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente. 
Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. 
 Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade. 
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. 
Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com ABSOLUTA PRIORIDADE, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
CRFB, Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com ABSOLUTA PRIORIDADE, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (...)
STJ, MATRÍCULA. ESCOLA PÚBLICA. GEORREFERENCIAMENTO.
A Turma negou provimento ao recurso especial para manter a decisão do tribunal a quo, a qual afastou o critério de georreferenciamento e garantiu o direito de rematrícula da recorrida no estabelecimento público de ensino em que havia concluído o ano letivo. Segundo a Min. Relatora, a regra disposta no art. 53, V, do ECA, que garante à criança e ao adolescente o acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência, não constitui imposição, mas benefício. O referido dispositivo deve ser interpretado de acordo com as peculiaridades de cada caso, ponderando-se qual a solução mais favorável ao aluno: a proximidade da instituição ou a continuidade em escola mais distante, onde o menor, porém, já esteja ambientado. Ressalvou-se que tal concepção não tem o intuito de fazer que o estudante escolha livremente o local em que queira estudar, o que poderia inviabilizar a prestação do serviço. Pretende-se, de acordo com as circunstâncias da demanda ora em exame, buscar o entendimento que melhor se ajuste à real finalidade da lei, qual seja, facilitar o acesso à educação e, com isso, garantir o pleno desenvolvimento da criança. REsp 1.194.905-PR, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 17/8/2010.
ECA, Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: (...)
        V - acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência.
STJ, REMATRÍCULA. POSSIBILIDADE. ESCOLA DIVERSA. RESIDÊNCIA.
O Estado não tem o direito de oferecer ensino público e gratuito próximo à residência do aluno, isso é um dever seu. Logo não pode alegar violação do art. 53, V, da Lei n. 8.069/1990 (ECA), pois a violação do direito não pode ser afirmada pela pessoa que tem o dever de implementá-lo, cabendo apenas ao titular, caso queira, ou ao MP exercer tal prerrogativa. O direito de acesso de ensino próximo à residência do estudante não prevalece sobre o direito do bom desenvolvimento físico e psicológico do menor resultante de sua manutenção na escola, uma vez que lá está acostumado com o ambiente, professores e programa escolar, bem como mantém laço de amizade e afetividade. REsp 1.178.854-PR, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 9/3/2010.
STJ, MATRÍCULA. ESCOLA PÚBLICA.
Discute-se a interpretação dada ao art. 53, I e V, do ECA (Lei n. 8.069/1990), o qual assegura o direito de crianças e adolescentes estudarem em escola pública (gratuita) perto de sua residência. No caso dos autos, por conta do citado artigo, a secretaria de educação estadual impediu a matrícula dos menores na escola que já frequentavam. Ressalta a Min. Relatora que o art. 53, V, do ECA não constitui uma obrigação ou determinação, tal como entendeu o Estado-membro. Trata-se de um benefício; assim, essa regra não pode ser absoluta, o órgão público deve atentar para as peculiaridades de cada caso. Observa que a política de aproximação aluno/escola justifica-se em um país onde os menos favorecidos não têm sequer acesso a transporte satisfatório. Entretanto, às vezes, a manutenção do aluno na escola que frequentava mostra-se mais benéfica ao menor do quetransferi-lo para escola pública próxima a sua residência somente em obediência à regra de aproximação disposta no ECA. Assevera que pensar de modo contrário seria não dar opções de escolha; por outro lado, também não pretende com esse entendimento deixar as escolhas por conta de cada aluno, o que poderia levar à inviabilidade da prestação do serviço pela impossibilidade de organização das escolas estaduais. Então, sempre se deve verificar o caso concreto com suas peculiaridades. Com esse entendimento, a Turma negou provimento ao recurso do Estado-membro. REsp 1.175.445-PR, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 4/3/2010.
 Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende (lista exemplificativa):
 a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
 b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
 c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
 d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. 
Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. (Proteção Especial)
Portanto, ser pessoa, criança, adolescente ou adulto é ser humano, sem qualquer distinção de sexo, idade, credo e raça.
Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento (se existem "países em desenvolvimento", nada mais natural que conciliar criança e adolescentes como "pessoas em desenvolvimento"). 
Esse dispositivo nos traz uma regra de interpretação do ECA. 
4. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Aborda-se aqui o Título II, Dos Direitos Fundamentais, Capítulo I, Do Direito à Vida e à Saúde:
Título II
Dos Direitos Fundamentais
Capítulo I
Do Direito à Vida e à Saúde
Art. 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência. 
Também tem esses direitos o neonato, na forma disposta no Art. 2º, in fine, do CC.
 
CC, Art. 2o A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
Art. 8º É assegurado à gestante, através do Sistema Único de Saúde, o atendimento pré e perinatal. 
 § 1º A gestante será encaminhada aos diferentes níveis de atendimento, segundo critérios médicos específicos, obedecendo-se aos princípios de regionalização e hierarquização do Sistema. 
 § 2º A parturiente será atendida preferencialmente pelo mesmo médico que a acompanhou na fase pré-natal. 
 § 3º Incumbe ao poder público propiciar apoio alimentar à gestante e à nutriz que dele necessitem. 
        § 4o  Incumbe ao poder público proporcionar assistência psicológica à gestante e à mãe, no período pré e pós-natal, inclusive como forma de prevenir ou minorar as consequências do estado puerperal. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) 
        § 5o  A assistência referida no § 4o deste artigo deverá ser também prestada a gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Art. 9º O poder público, as instituições e os empregadores propiciarão condições adequadas ao aleitamento materno, inclusive aos filhos de mães submetidas a medida privativa de liberdade. 
Art. 10. Os hospitais e demais estabelecimentos de atenção à saúde de gestantes, públicos e particulares, são obrigados a: 
 I - manter registro das atividades desenvolvidas, através de prontuários individuais, pelo prazo de dezoito anos; 
 II - identificar o recém-nascido mediante o registro de sua impressão plantar e digital e da impressão digital da mãe, sem prejuízo de outras formas normatizadas pela autoridade administrativa competente; 
 III - proceder a exames visando ao diagnóstico e terapêutica de anormalidades no metabolismo do recém-nascido, bem como prestar orientação aos pais; 
 IV - fornecer declaração de nascimento onde constem necessariamente as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato; 
 V - manter alojamento conjunto, possibilitando ao neonato a permanência junto à mãe. 
Art. 11. É assegurado atendimento médico à criança e ao adolescente, através do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde. 
 § 1º A criança e o adolescente portadores de deficiência receberão atendimento especializado. 
 § 2º Incumbe ao poder público fornecer gratuitamente àqueles que necessitarem os medicamentos, próteses e outros recursos relativos ao tratamento, habilitação ou reabilitação. 
Art. 12. Os estabelecimentos de atendimento à saúde deverão proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsável, nos casos de internação de criança ou adolescente. 
Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais.
O Conselho Tutelar é um órgão de defesa dos direitos, integrado à política pública de proteção à infância, previsto no Artigo 131 do ECA, garantidor da condição de sujeitos de direito da criança e do adolescente.
Art. 131. O Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta Lei. 
        Parágrafo único.  As gestantes ou mães que manifestem interesse em entregar seus filhos para adoção serão obrigatoriamente encaminhadas à Justiça da Infância e da Juventude. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos. 
 Parágrafo único. É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias. 
5. LIBERDADE, RESPEITO, DIGNIDADE
O Capítulo II do ECA trata do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade:
Capítulo II
Do Direito à Liberdade, ao Respeito e à Dignidade
Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis. 
Enquanto o limite da liberdade do adulto está em outro adulto, o limite da liberdade da criança e do adolescente é a própria criança. Enquanto o adulto tem o direito, por exemplo, de ficar na rua se ele não prejudicar outro adulto, a criança não tem tal direito porque irá prejudicá-la, devendo, nessa hipótese, ser recolhida para abrigos.
Art. 16. O direito à LIBERDADE compreende os seguintes aspectos: 
 I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as restrições legais; 
Este inciso mereceu de José Afonso da Silva o entendimento de que "a liberdade assegurada sujeita-se à autorização dos pais ou responsáveis, em consonância com seus critérios de educação ou consciência e significa especial proteção contra constrangimentos abusivos ou cárcere privado".
 II - opinião e expressão; 
CC, Art. 1.740. Incumbe ao tutor, quanto à pessoa do menor:
 I - dirigir-lhe a educação, defendê-loe prestar-lhe alimentos, conforme os seus haveres e condição;
 II - reclamar do juiz que providencie, como houver por bem, quando o menor haja mister correção;
 III - adimplir os demais deveres que normalmente cabem aos pais, ouvida a opinião do menor, se este já contar doze anos de idade.
 III - crença e culto religioso; 
Nesse sentido, a Convenção dos Direitos da Criança assegura a liberdade de professar a própria religião ou crenças, observadas as limitações prescritas pela lei, sem perder de vista a proteção da segurança, da ordem, da moral, da saúde pública ou os direitos e liberdades fundamentais das demais pessoas.
Como o limite da liberdade do menor é o próprio menor, e não o próximo, enquanto que o adulto pode dispor do próprio corpo em cultos religiosos (Exemplo: proibição de transfusão de sangue), o menor não tem o direito de dispor do seu corpo por crença ou culto religioso.
 IV - brincar, praticar esportes e divertir-se; 
A criança como pessoa em desenvolvimento ao brincar constrói símbolos que ajudam-na a crescer valorizando as descobertas, a criatividade e o conhecimento.
A prática esportiva tem uma postura macro no universo da criança e do adolescente, pois ela funciona como instrumento de prevenção e terapia na área da saúde.
E a diversão também está ao lado do lúdico, do esporte, consagrado na Convenção dos Direitos da Criança, quando no artigo 31 expressa que "os Estados-Partes reconhecem o direito da criança ao descanso e ao lazer, ao divertimento e às atividades recreativas próprias da idade, bem como à livre participação na vida cultural e artística".
 V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação; 
 VI - participar da vida política, na forma da lei; 
Cujo alistamento eleitoral e o direito de votar, de escolher os representantes da União, Estado e Município, que dirigirão os destinos do país, dá ao adolescente um período temporal para esta atuação, o compreendido entre os maiores de 16 anos e menores de 18, conforme especificação legal.
 VII - buscar refúgio, auxílio e orientação. 
CRFB, Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado: (...)
§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismo para coibir a violência no âmbito de suas relações. 
CRFB, Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Art. 17. O direito ao RESPEITO consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais. 
Art. 18. É dever de todos velar pela DIGNIDADE da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor. 
A criança e o adolescente não podem ser vitimizados, pois se houver tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor, esta população estará enquadrada na categoria de VÍTIMAS DE DELITO, conforme o preceituado na Declaração Sobre os Princípios Fundamentais de Justiça Para as Vítimas de Delito e do Abuso de Poder, que é textual, assinada em 29.11.1985, emanada do 7º Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento do Delinqüente.
Esse dispositivo criou corresponsabilidade social na garantia da proteção integral da criança e do adolescente.
6. FAMÍLIA, PÁTRIO PODER, PODER FAMILIAR, COMUNIDADE 
Por fim, o Capítulo III do ECA, Do Direito à Convivência Familiar e Comunitária, Seção I, Disposições Gerais:
Anteriormente as famílias viam na FEBEM um lugar que suas crianças poderiam ser educadas bem como jogar para o Estado a responsabilidade com relação a seus filhos. Hoje, com a promulgação da CRFB/88 e com a adoção do ECA, a família passou a assumir a sua cota de responsabilidade, sendo ela a primeira a ser chamada na garantia dos direitos fundamentais da criança e do adolescente. 
Capítulo III
Do Direito à Convivência Familiar e Comunitária
Seção I
Disposições Gerais
Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta (guarda, tutela e adoção), assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes. 
A desestruturação da família seria a fonte de todo o problema da criança e do adolescente. Base da sociedade, a família tem proteção especial do Estado.
CRFB, Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...)
 § 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. 
 § 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. 
        § 1o  Toda criança ou adolescente que estiver inserido em programa de acolhimento familiar ou institucional terá sua situação reavaliada, no máximo, a cada 6 (seis) meses, devendo a autoridade judiciária competente, com base em relatório elaborado por equipe interprofissional ou multidisciplinar, decidir de forma fundamentada pela possibilidade de reintegração familiar ou colocação em família substituta, em quaisquer das modalidades previstas no art. 28 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
        § 2o  A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongará por mais de 2 (dois) anos, salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
        § 3o  A manutenção ou reintegração de criança ou adolescente à sua família terá preferência em relação a qualquer outra providência, caso em que será esta incluída em programas de orientação e auxílio, nos termos do parágrafo único do art. 23, dos incisos I e IV do caput do art. 101 e dos incisos I a IV do caput do art. 129 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009)
Art. 21. O poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009). 
Este artigo, em sua versão originária, falava no pátrio poder. Entretanto, com a Lei nº 12.010 sofreu modificação, no que se refere a esta expressão, pois o Novo Código Civil a denominou de poder familiar.
CC, Art. 1.631. Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro o exercerá com aexclusividade.
Poder Familiar: Conjunto de direitos e deveres impostos aos pais e exercido em igualdade de condições, visando a proteção da pessoa e bens dos filhos menores e não emancipado. Em regra é irrenunciável, intransmissível e inalienável, tendo como detentores exclusivos o pai e a mãe.
Em sede de mudanças, os Artigos 22 a 24 consagram a responsabilidade do exercício do poder familiar.
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais (este dever é a grande inovação do ECA que devido a sua irrenunciabilidade pode acarretar inclusive na perda do poder familiar).Estes são apenas alguns deveres que são impostos aos pais e decorrem do poder familiar. Sendo assim, a lista disposta no artigo supra é exemplificativa.
Se o pai descumprir algum desses deveres denomina-se tal fato de alienação parental.
Temos como exemplo de dever não constante deste artigo o dever de vigilância ou guarda que é o principal responsável pela responsabilização dos pais quanto ao cometimento de atos ilícitos de seus filhos que tenham reflexos patrimoniais. Mesmo que o filho estivesse sob a guarda de uma baba quando do cometimento do ato ilícito não seria ela que responderia pelos danos patrimoniais porque estaríamos diante de um caso de “culpa in eligendo” dos pais.
Art. 23. A falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do poder familiar. (Expressão substituída pela Lei nº 12.010, de 2009)
A Convenção dos Direitos da Criança especifica que a criança só deverá ser separada de seus pais se esta separação legalmente é necessária ao interesse maior da criança, o que também encontra eco no Estatuto da Criança (in latem), onde "o princípio do bem-estar" governa as relações de contato com os filhos.
Anteriormente o Estado intervinha para retirar as crianças das famílias sob o argumento da situação irregular. Contrariamente, hoje o Estado só pode intervir nas famílias para proteger as pessoas que a compõem, conforme o que pode ser concluído do disposto no § 8º do artigo 226 c/c § 4º do artigo 227 da CRFB. 
CRFB, Art. 226. § 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
CRFB, Art. 227. § 4º - A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.
Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
CRFB, Art. 227. § 6º - Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. (proibição do mandamento constitucional de qualquer tipo de discriminação no tocante à origem da filiação)
 Parágrafo único. Não existindo outro motivo que por si só autorize a decretação da medida, a criança ou o adolescente será mantido em sua família de origem, a qual deverá obrigatoriamente ser incluída em programas oficiais de auxílio. 
Art. 24. A perda e a suspensão do pátrio familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações a que alude o art. 22. 
Uma das funções da família, a de socializar construindo identidades, repousa a sua capacidade qualificadora, e sua importância é de tal ordem que para haver a perda do poder familiar só se justificará quando esgotados todos os meios de sanar os conflitos existentes aos interesses do menor, e nem mesmo a desigualdade social ou a pobreza será instrumento avaliatório para a destituição ou a suspensão deste poder.
O Novo Código Civil fala desta temática na Seção III - Da Suspensão e Extinção do Poder Familiar, nos artigos 1.635 a 1.638, quando neste, poderá chegar a perdê-lo.
Seção III
Da Suspensão e Extinção do Poder Familiar
Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar:
 I - pela morte dos pais ou do filho;
 II - pela emancipação, nos termos do art. 5o, parágrafo único;
 III - pela maioridade;
 IV - pela adoção;
 V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.
Art 1.636. O pai ou a mãe que contrai novas núpcias, ou estabelece união estável, não perde, quanto aos filhos do relacionamento anterior, os direitos ao poder familiar, exercendo-os sem qualquer interferência do novo cônjuge ou companheiro.
 Parágrafo único. Igual preceito ao estabelecido neste artigo aplica-se ao pai ou à mãe solteiros que casarem ou estabelecerem união estável.
Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.
 Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.
Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
 I - castigar imoderadamente o filho;
 II - deixar o filho em abandono;
 III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
 IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.
Caderno de Exercícios
1ª Questão
O MP ingressou com ação civil pública contra o Estado do RJ, porque este deixou de oferecer vagas para alunos da primeira série na única escola pública estadual do município de Três Rios, além de descumprir Resolução editada pela Secretaria Estadual de Educação. O Estado defendeu-se alegando que, na partilha de competência entre os entes da Federação, a CF define que é dever do município cuidar da educação infantil em creches e pré-escolas. Além disso, afirma não caber ao Judiciário interferir na política pública de educação, realizada conforme proposta orçamentária. 
Quais os fundamentos jurídicos que poderiam servir de supedâneo para justificar uma sentença de procedência do pedido?
Solução
A prioridade em responder pela educação infantil atribuída pela CRFB aos Municípios não significa exclusiva responsabilidade por esse serviço, de modo que o Estado tem responsabilidade, ainda que subsidiária.
No que se refere a interferência do judiciário, essa é devida porque o princípio da reserva do possível precisa ceder em face do princípio do mínimo existencial, quando esse se refere a direitos fundamentais, como ocorre, por exemplo, a educação fundamental. 
Pelo princípio da prioridade absoluta é obrigação do estado prestar o serviço na forma do Art. 4º, parágrafo único, do ECA. Então se trata de regra vinculada e não de regra discricionária.
“0004728-17.2005.8.19.0063 (2006.001.03394). 1ª Ementa – APELACAO. DES. HENRIQUE DE ANDRADE FIGUEIRA - Julgamento: 03/05/2006 - DECIMA SETIMA CAMARA CIVEL. ACAO CIVIL PUBLICA. ESTABELECIMENTO DE ENSINO ESTADUAL. ENCERRAMENTO DAS ATIVIDADES.
Administrativo. Ação civil pública. Ensino fundamental e educação infantil. Dever do Estado concorrente com os demais entes da federação. Honorários de advogado. Ação civil pública proposta contra ato administrativo que encerrou as atividades escolares patrocinadas pelo Estado do Rio de Janeiro vinculadas à educação infantil e ao ensino fundamental, deixando inúmeras crianças sem acesso à escola pública. O Poder Judiciário não interfere na atividade política do Poder Executivo quando impõe à pessoa jurídica de direito público o dever de cumprir a obrigação constitucional e legal. Haveria interferência na atividade do Poder Executivo se o comando judicial examinasse a discricionariedade atribuída ao administrador. A prioridade em responder pela educação infantil e pelo ensino fundamental atribuída pela Constituição Federal aos Municípios não significa exclusiva responsabilidade por este serviço público, de modo que também o Estado deve, ainda que subsidiariamente, prestar ensino ao mesmo grupo social. Não se justifica encerrar o curso de ensino infantil em escola estadual de determinado bairro ao argumento de não ser esta a função do Estado. Dificuldades de orçamento são insuficientes a obstar o Estado de manter aberta escola de ensino fundamental e educação infantil, pois a lei contém soluções para garantira plena atividade das funções públicas essenciais. Se o Ministério Público integra o pólo ativo e saiu vencedor na lide, não se justifica a condenação do Estado a pagar verba honorária. Recurso parcialmente provido.”
2ª Questão
Vítima de crime de estupro que resultou em gravidez, aforou B, com fundamento no disposto no art. 128, II do Código Penal, pleito judicial com vistas à autorização judicial para interrupção da gravidez. Entrementes, o nascituro, através do curador que lhe fora nomeado a instâncias do Ministério Público, em razão de manifesto conflito de interesses daquele com o de sua genetriz, contrapõe-se ao pedido, forte no direito à vida, constitucionalmente assegurado, e que pretende ver respeitado. Na hipótese de não autorização da interrupção da gravidez, quais os principais fundamentos contidos na Lei 8.069/90 que podem fundamentar a decisão? Justifique.
Solução
O principal fundamento contido na Lei 8.069/90, que pode não autorizar a interrupção da gravidez, é o seu Art. 4º, que define que o direito à vida deve ser garantido com absoluta prioridade. 
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. COMARCA DE SOLEDADE - JUIZADO DA INFÂNCIA E JUVENTUDE. PROCESSO N° 6244-094. NATUREZA: Interrupção Gravidez. REQUERENTE: xxxx. JUIZ PROLATOR: Charles Maciel Bittencourt. DATA: 19/06/2008.
Rh. Vistos. Trata-se de pedido de interrupção de gravidez apresentado por xxx, na condição de genitora de xxx, de 15 anos de idade, sob a alegação de que esta, portadora de retardo mental (fls. 10) foi vítima de estupro. O feito restou distribuído junto à l Vara Judicial desta Comarca, tendo sido indeferido o pedido de urgência (fls. 17). O Ministério Público manifestou-se nas fls. 18-20, opinando tratar-se de matéria de competência do Juizado da Infância e Juventude, bem como pela intimação da autora para que traga laudo médico indicando a possibilidade de realização do aborto. Este Magistrado declinou da competência para o Juizado do Tribunal do Júri (fls. 21-2). A Colega que jurisdiciona o Tribunal Popular declinou da competência para o Juizado da Infância e Juventude (fls. 24-6). Este Juízo firmou sua competência para processamento do feito (fls. 29-30). Sobreveio laudo pericial (fls. 37), e sua complementação (fls. 42), bem como cópia de inquérito policial (fls. 45-84). Oportunizada vista dos autos à parte requerente, esta se manifestou pelo deferimento do pedido (fls. 86). O Ministério Público opinou pela procedência do pedido (f Is. 88-90). 
É o relatório. Decido.
Inicialmente, convém salientar que 6 presente feito somente foi ajuizado em 30.05.2008 (fl. 02), e que, ainda que este Juízo tenha buscado imprimir máxima celeridade ao seu processamento(especialmente considerada a insuficiência de elementos aportados com a inicial), o termo indicado pelo perito para interrupção da gravidez se avizinha (23.06.2008), conforme fls. 37), caso fosse deferido o pedido, o que faz imperiosa a prolação de sentença, sendo que tal providência resta albergada pelo princípio da instrumentalidade das formas, as quais servem apenas para a utilidade do processo, que restará prejudicada se postergado o julgamento. Tecidas tais considerações, passo à análise do mérito. O pedido aforado pela genitora da adolescente xxxx é deveras compreensível e apto a sensibilizar qualquer indivíduo (mesmo operadores do Direito os quais não estão imunes aos preceitos sociais), tanto que a própria legislação infraconstitucional previu a hipótese de abortamento necessário sentimental no ano de 1940 (Código Penal, artigo 128, incisos I e II). Desse modo, o primeiro enfoque a ser analisado diz respeito ao fato de que não se está tratando da hipótese de “aborto necessário” (art. 128, inciso l do Código Penal), c sim, do denominado por alguns, “aborto sentimental” (art. 128, inciso 11 do Código Penal). (....) Logo, diante do cotejo dos direitos em colisão, reitero que deve prevalecer o direito à vida do nascituro, nos termos supra expendidos, até para preservar a humanidade e a solidariedade em relação a este, que poderá, talvez, ter uma vida no seio de outra família, na hipótese dos familiares da gestante não pretenderem a guarda da criança, sendo que aquela (gestante) poderá se restabelecer após o parto, mediante tratamento e assistência médico-psicológica.
3ª Questão
Conceição namorava Alfredo, e dessa convivência nasceu um filho Paulo, que Alfredo não reconheceu como seu, sendo, então, registrado apenas pela mãe. Apesar de muita luta, Conceição não conseguiu vaga em creche para seu filho. Assim sendo, a criança, com apenas 4 meses de idade foi abrigada numa instituição distante, que lhe dificultava as visitas, interrompendo, inclusive, o aleitamento. Tendo em vista que o art. 10, III do ECA e o art. 7º, XXV da CF garantem proteção integral como direito à vida e à saúde, responda fundamentadamente:
a) No caso, a omissão foi da sociedade ou do Estado? 
b) Que autoridade é competente para determinar as medidas de proteção?
Solução
Item A
No caso, a omissão foi tanto do Estado quanto da Sociedade, pois a responsabilidade de proteção é compartilhada, na forma disposta no Art. 4º e 54, IV, da CRFB.
Item B
A autoridade que é competente para determinar as medidas de proteção é o Conselho Tutelar na forma do Art. 136 do ECA.
4ª Questão
CONCURSO PARA JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO DO ESTADO DE MINAS GERAIS - 2008O 
Ministério Público de Minas Gerais instaurou inquérito civil para apurar as razões pelas quais o Município AAA não disponibiliza creche e pré-escola para acolher as crianças situadas na faixa etária de 0 a 6 anos de idade, nas quais a assistência a ser fornecida pelo poder público é essencial para evitar que fiquem material e intelectualmente desprotegidas. A ação civil pública foi aforada com apoio nos arts. 208, IV, e 211, §2º, CF/88, e, ainda, no art. 54, IV, da Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (ECA), segundo o qual é dever do Estado assegurar ¿atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade¿, e o pedido formulado na inicial consistiria em condenar o Município a construir e manter creche e pré-escola no prazo de 12 meses, sob pena de multa. Ao contestar a ação, enfatizou o Município-réu que os preceitos normativos contidos na Constituição Federal e no ECA traduzem normas programáticas, cuja concretização fica sob a discricionariedade do administrador público. Argumentou-se, ainda, que a clássica regra da separação dos poderes (art. 2º, CF/88) deve ser observada, pois não é lícito ao Poder Judiciário interferir na gestão administrativa e determinar que o Poder Executivo priorize esta ou aquela providência em favor da comunidade. Em face dos recursos orçamentários serem finitos, considera que o pedido formulado pelo autor deve ser julgado improcedente.Após regular instrução, na qual se realizou prova pericial que constatou a inexistência de equipamento público destinado ao cumprimento do citado dever, os autos foram conclusos para sentença.Instrução: Profira a decisão, circunscrevendo-se à hipótese descrita, sem necessidade de fazer relatório e dispor sobre sucumbência.
Solução
“Educação Infantil. Atendimento em Creche. Dever Constitucional do Poder Público. A Turma manteve decisão monocrática do Min. Celso de Mello, relator, que dera provimento a recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público do Estado de São Paulo contra acórdão do Tribunal de Justiça do mesmo Estado-membro que, em ação civil pública, afirmara que a matrícula de criança em creche municipal seria ato discricionário da Administração Pública - v. Informativo 407. Tendo em conta que a educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível (CF, art. 208, IV), asseverou-se que essa não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública, nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental. Entendeu-se que os Municípios, atuando prioritariamente,no ensino fundamental e na educação infantil (CF, art. 211, § 2º), não poderão eximir-se do mandamento constitucional disposto no aludido art. 208, IV, cuja eficácia não deve ser comprometida por juízo de simples conveniência ou de mera oportunidade. Por fim, ressaltou-se a possibilidade de o Poder Judiciário, excepcionalmente, determinar a implementação de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sempre que os órgãos estatais competentes descumprirem os encargos políticos-jurídicos, de modo a comprometer, com a sua omissão, a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional. RE 436996 AgR/SP, rel. Min. Celso de Mello, 22.11.2005. (RE-436996)”

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