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Secretaria de Estado de Educação do Estado de Minas Gerais SEE-MG Professor de Educação Básica – PEB – Nível I Grau A - História Edital SEE Nº. 07/2017, de 27 de dezembro de 2017 DZ153-2017 DADOS DA OBRA Título da obra: Secretaria de Estado de Educação do Estado de Minas Gerais - SEE-MG Cargo: Professor de Educação Básica – PEB – Nível I Grau A - Históra (Baseado no Edital SEE Nº. 07/2017, de 27 de dezembro de 2017) • Conhecimentos Específicos Gestão de Conteúdos Emanuela Amaral de Souza Diagramação Elaine Cristina Igor de Oliveira Camila Lopes Produção Editoral Suelen Domenica Pereira Capa Joel Ferreira dos Santos Editoração Eletrônica Marlene Moreno APRESENTAÇÃO CURSO ONLINE PARABÉNS! ESTE É O PASSAPORTE PARA SUA APROVAÇÃO. A Nova Concursos tem um único propósito: mudar a vida das pessoas. Vamos ajudar você a alcançar o tão desejado cargo público. Nossos livros são elaborados por professores que atuam na área de Concursos Públicos. 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O código encontra-se no verso da capa da apostila. *Utilize sempre os 8 primeiros dígitos. Ex: FV054-17 PASSO 3 Pronto! Você já pode acessar os conteúdos online. SUMÁRIO Conhecimentos Específicos I - HISTÓRIA: os papéis do professor de História e do historiador, diversidade, desigualdades e cidadania .................... 01 II - O ESTUDO DA HISTÓRIA: o valor da memória social e do patrimônio histórico cultural. ................................................... 04 III - O BRASIL NO CONTEXTO MUNDIAL: ...................................................................................................................................................... 07 1- A sociedade brasileira no mundo contemporâneo; ............................................................................................................................ 07 Sociedade e cultura, comunicação e globalização, ................................................................................................................................... 09 Identidade nacional e multiculturalismo, ...................................................................................................................................................... 10 Cultura popular e cultura de massa; ............................................................................................................................................................... 12 O Brasil na nova ordem mundial: formação de blocos políticos e econômicos no final do século XX; .............................. 14 Inserção da economia brasileira na ordem econômica mundial: do mercantilismo ao neoliberalismo, uma visão do pro- cesso; trabalho, ........................................................................................................................................................................................................28 Trabalhador e as relações de produção no Brasil: o processo histórico; trabalho, emprego, empregabilidade. .............. 28 2- Movimentos sociais no Brasil: principais movimentos e sua contribuição para as transformações da sociedade brasi- leira nos diferentes períodos; ............................................................................................................................................................................ 30 Democracia e participação popular; ............................................................................................................................................................... 33 As grandes questões nacionais e seu processo histórico: industrialização, .................................................................................... 37 Urbanização e concentração demográfica, exclusão social, .................................................................................................................. 39 Concentração de renda e violência urbana; ................................................................................................................................................ 42 Populações indígenas, ..........................................................................................................................................................................................42 Questão fundiária e questão ambiental, ....................................................................................................................................................... 43 Educação, saúde, desenvolvimento sustentado; ......................................................................................................................................... 44 A mulher e a família no contexto social; ....................................................................................................................................................... 45 A crise do Estado brasileiro: causas estruturais e conjunturais. ............................................................................................................ 50 IV - HISTÓRIA: tópicos de História geral. ....................................................................................................................................................... 52 V - SINAIS DO TEMPO: a Primeira Guerra Mundial, os regimes totalitários, .................................................................................. 52 A Segunda Guerra Mundial, ............................................................................................................................................................................... 55 A Guerra Fria e a descolonização da Ásia e da África, ............................................................................................................................. 57 Estados Unidos e União Soviética – potências em crise. .........................................................................................................................58 VI - O MUNDO ATUAL: múltiplos conflitos mundiais. ............................................................................................................................... 67 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História I - HISTÓRIA: os papéis do professor de História e do historiador, diversidade, desigualdades e cidadania .................... 01 II - O ESTUDO DA HISTÓRIA: o valor da memória social e do patrimônio histórico cultural. ................................................... 04 III - O BRASIL NO CONTEXTO MUNDIAL: ...................................................................................................................................................... 07 1- A sociedade brasileira no mundo contemporâneo; ............................................................................................................................ 07 Sociedade e cultura, comunicação e globalização, ...................................................................................................................................09 Identidade nacional e multiculturalismo, ...................................................................................................................................................... 10 Cultura popular e cultura de massa; ............................................................................................................................................................... 12 O Brasil na nova ordem mundial: formação de blocos políticos e econômicos no final do século XX; .............................. 14 Inserção da economia brasileira na ordem econômica mundial: do mercantilismo ao neoliberalismo, uma visão do pro- cesso; trabalho, ........................................................................................................................................................................................................28 Trabalhador e as relações de produção no Brasil: o processo histórico; trabalho, emprego, empregabilidade. .............. 28 2- Movimentos sociais no Brasil: principais movimentos e sua contribuição para as transformações da sociedade brasi- leira nos diferentes períodos; ............................................................................................................................................................................ 30 Democracia e participação popular; ............................................................................................................................................................... 33 As grandes questões nacionais e seu processo histórico: industrialização, .................................................................................... 37 Urbanização e concentração demográfica, exclusão social, .................................................................................................................. 39 Concentração de renda e violência urbana; ................................................................................................................................................ 42 Populações indígenas, ..........................................................................................................................................................................................42 Questão fundiária e questão ambiental, ....................................................................................................................................................... 43 Educação, saúde, desenvolvimento sustentado; ......................................................................................................................................... 44 A mulher e a família no contexto social; ....................................................................................................................................................... 45 A crise do Estado brasileiro: causas estruturais e conjunturais. ............................................................................................................ 50 IV - HISTÓRIA: tópicos de História geral. ....................................................................................................................................................... 52 V - SINAIS DO TEMPO: a Primeira Guerra Mundial, os regimes totalitários, .................................................................................. 52 A Segunda Guerra Mundial, ............................................................................................................................................................................... 55 A Guerra Fria e a descolonização da Ásia e da África, ............................................................................................................................. 57 Estados Unidos e União Soviética – potências em crise. ......................................................................................................................... 58 VI - O MUNDO ATUAL: múltiplos conflitos mundiais. ............................................................................................................................... 67 1 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História I - HISTÓRIA: OS PAPÉIS DO PROFESSOR DE HISTÓRIA E DO HISTORIADOR, DIVERSIDADE, DESIGUALDADES E CIDADANIA. A sociedade atual encontra-se em profunda crise que nos remete a pensar nossos valores e atitudes. Nes- se contexto incerto, o papel do professor é fundamental, por isso novos recursos e atitudes didático-pedagógicos necessitam ser pensados. O professor pode ascender à sociedade usando o ensino – nesse caso o ensino de His- tória – como instrumento de luta e transformação social, levando os alunos a uma consciência crítica que supere o senso comum para que possam não somente ver os acontecimentos mas enxergá-los de maneira mais crítica e reflexiva. Nessa perspectiva, entende-se que as crianças, de posse de um saber mais elaborado, poderão ter condi- ções de se protegerem contra a opressão e a exploração das classes dominantes, organizando-se para a constru- ção de uma sociedade melhor, menos excludente e real- mente democrática. Não se pode esperar que uma sociedade mais jus- ta brote naturalmente, mas por meio da educação que caminhe com a prática política do povo. Sendo assim, o professor de História assume um papel, sobretudo po- lítico e social. Professores e professoras de História do ensino fundamental precisam encorajar-se social e poli- ticamente, percebendo as possibilidades da ação social e cultural, na luta pela transformação das estruturas opres- sivas da sociedade brasileira. Para isso, é necessário que conheçam a sociedade em que vivem e atuam em nível social, econômico e cultural de seus alunos e alunas. Os professores do ensino fundamental, principais sujeitos informantes deste trabalho, devem trabalhar a partir da consciência de que não há conhecimento abso- luto, pois tudo está em constante transformação. Dessa forma não há saber nem ignorância absoluta, e sim uma relativização do saber ou da ignorância. Por isso, os pro- fessores de História, não só do ensino fundamental, mas também de todos os níveis, não podem se colocar na posição de seres superiores, que transmitem o conheci- mento a um grupo de ignorantes, mas sim adotar uma postura humilde, daqueles que comunicam um saber re- lativo a outros que são portadores de outros saberes re- lativos. Outra convicção a que os professores de História não podem se furtar é a de não se confundir informação com educação, pois para transmitir informação estão à mão jornais e revistas, televisão e internet. “Confundir in- formação com conhecimento tem sido um dos grandes problemas da nossa educação” (PINSKY, 2008, p. 22). Após o engajamento político e social, professores e professoras de História do ensino fundamental devem acreditar na educação enquanto instrumento de trans- formação da sociedade, e não solução dos problemas, frutos naturais de um processo histórico. É preciso confiar nessas mudanças e esperar o ines- perado, pois, como afirma Morin: “na história temos visto com frequência, infelizmen- te, que o possível se torna impossível e podemos pres- sentir que as mais ricas possibilidades humanas per- manecem ainda impossíveis de se realizar. Mas vimos também que o inesperado torna-se possível e se realiza; vimos com frequência que o improvável se realiza mais do que o provável; saibamos, então, esperar o inespe- rado e trabalhar pelo improvável”. (MORIN, 2001, p. 92) Um professor mal preparado e desmotivado não consegue dar boas aulas nem com o melhor dos livros, ao passo que um bom professor pode até aproveitar-se de um livro falho para corrigir seus erros e desenvolver o bom e velho espírito crítico entre os alunos. Porém, como professores e professoras de história do ensino fundamental se veem frente a essas questões? Que es- paço reservam para discutirsuas funções sociais? Será que no seu dia-a-dia, entre uma escola e outra fazem tal reflexão sobre seu papel social na formação crítica de seus alunos? Os educadores - professores e profes- soras – desenvolvem em seus alunos a noção de que eles também são agentes da História? Que recursos são usados para atingir esses objetivos? Costumeiramente credenciamos características pró- prias de determinado profissional quanto a sua conduta e responsabilidade social. Como profissional da História, quero estabelecer um debate acerca de aspectos que considero essenciais para o historiador: o comprometi- mento com a educação, a leitura e a escrita, e a ética na compreensão de fatos históricos. Como educador, o historiador possui todas as res- ponsabilidades perante uma educação de qualidade, muito mais libertária e inteligente, do que conteudista e disciplinadora. Um ensino que coloca os alunos diante de mestres medíocres conduz à escravidão e à interdi- ção da liberdade de pensar por si mesmo. Ou seja, o grande trunfo do educador é estimular nos estudantes o pensamento e a capacidade de reagir perante as in- certezas do mundo contemporâneo. No entanto, essa proposta educativa não será pos- sível se o historiador não estiver imbuído do espírito da leitura e da escrita. Ele estará sendo falso, mentindo para os estudantes e para si mesmo, exigindo leitura e escrita de seus alunos, sendo que ele próprio não a pratica. O professor de História precisa citar livros, nomes de auto- res, produzir textos a partir de suas próprias pesquisas. 2 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História Essa prática certamente irá estimular os alunos, alimen- tará a autoestima e a confiança do professor, além de tornar a atividade profissional dinâmica e empolgante. A ética profissional traz à tona valores culturais, inte- resses, desavenças, intrigas, sonhos e ilusões que ocor- reram em algum lugar do passado, mas que podem ser perigosos e comprometedores no presente. A escolha do tema deste trabalho está inteiramente relacionada à minha prática como professor de História da 5ª e 6ª séries do ensino fundamental que venho de- senvolvendo há quase três anos. Ao longo dessa breve experiência venho percebendo o pouco envolvimento com a função social que a docência desempenha. Porém antes de falar sobre o papel do professor, especifica- mente o de História, em uma sociedade civil, é neces- sário retomar elementos que se refiram à sua formação. Sua formação não fica restrita apenas à História, en- globa também áreas como Ciências Humanas, Filosofia, Ciências Sociais. De certa forma, a formação desse pro- fissional não se inicia e acaba no curso de graduação, mas deve ser empreendida em uma educação continua- da para o docente garantir uma constante atualização teórica e prática. Com relação ao ensino da História, o historiador Jai- me Pinsky afirma que “Hoje se sabe que estudar Histó- ria, interpretá-la, ensiná-la, não é tão fácil como parecia, um mero instrumento de propaganda ideológica ou re- volução. Porém no lugar da utopia abandonada parece ter ficado vazio”. (PINSKY, 2008, p. 18) A identidade do professor de História varia entre o detentor e transmissor dos conhecimentos, e a do cria- dor de saberes e fazeres tendo em vista que ensinar é antes de tudo fabricar artesanalmente os saberes, tor- nando ensináveis, exercitáveis e possíveis de avaliação no quadro de uma turma, de um ano, de um horário, de um sistema de comunicação e trabalho. A comuni- cação em sala de aula não pode ser a expressão de um ideal, mesmo que ele esteja de acordo com o espírito do tempo, mas uma modalidade de realização do currículo, uma modalidade de exercício do ofício do professor e do aluno. É necessário que o professor conheça ao máximo a realidade de cada um de seus alunos para que possa desenvolver e utilizar ferramentas que reduzam a defa- sagem no aprendizado e o «abismo» que separa profes- sores e alunos. Dentre essas ferramentas, a comunica- ção colabora, de forma acentuada, para que professores e alunos consigam conviver dentro da sala de aula de forma «harmônica». Durante sua formação o contato que professores de História têm com outros campos do conhecimento devem ser utilizados como instrumentos para transformar a coexistência na sala de aula em algo prazeroso. É importante que o professor de História do funda- mental saiba que «Na cultura das sociedades comple- xas, (...) do peso da mídia e da importância das trocas na vida cotidiana, no trabalho, na cidade, na família ou entre o casal. (...) na cultura das novas classes médias, entre as quais a comunicação é um novo credo” (PERRE- NOUD, 2001, p. 59). O credo de que fala se não for utilizado de forma correta, pode causar grandes problemas não só para alunos, mas também para professores. Ou seja, se o alu- no não percebe algo em comum com o professor ou se se sente incomodado, o desinteresse pela disciplina é inevitável. No mundo de hoje, em que tudo muda a toda hora, devido à comunicação e à tecnologia, é necessá- rio que os professores de História estejam sempre pre- parados para ouvir perguntas das mais diferentes for- mas e linguagens. Os alunos têm hoje a sua disposição um manancial enorme no que diz respeito à obtenção da informação. Internet, jornais, TV, trazem consigo as mais variadas informações das mais diferentes culturas. Em uma palavra, a concorrência que os professores de história têm sofrido exige que eles estejam sempre em contato com essas novas linguagens para que possam se comunicar reciprocamente com os alunos. Ensinar História é explicitar aos alunos a razão de ser da disciplina para responder perguntas “inocentes”. Para atender aos anseios dos alunos do ensino fundamental é necessário que professores de História busquem no- vas maneiras de lidar com a disciplina e seu ensino. Não podemos mais nos basear na história positiva. Os profissionais da História devem reorganizar no- vas maneiras de se estudar e ensinar História, fazendo com que o aluno não complete o edifício da História como algo já pronto, mas sim ensinar-lhes a construir seu próprio edifício. O professor de História do ensino fundamental deve ensinar o aluno ou a criança a edificar seu próprio ponto de vista, o que não significa ensinar soluções, nem significa dar explicações sobre como e por que se chegou a um determinado ponto. Ensinar a construir o próprio ponto de vista histórico, significa colaborar para que o aluno construa conceitos e aplique -os nas situações do cotidiano, significa ensinar a so- lucionar, relacionar, interpretar as informações sobre o momento estudado para se chegar a um maior nível de entendimento do mundo. É ainda fornecer aos alunos meios para que possam construir argumentos que per- mitam explicar a si próprios e a outros, de maneira clara e objetiva, um determinado fato histórico. Significa por fim, dar-lhes condições para que possam perceber-se o máximo possível dentro da condição humana. É papel social do professor de História do ensino fundamental munir os alunos de instrumentos para li- bertação. «O respeito à autonomia e à dignidade de cada imperativo ético não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros.» (FREIRE, 1996, p. 59) 3 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História É necessário que o docente em História procure de- senvolver as competências dos alunos para que esses possam acompanhar o ritmo acelerado e as exigências que são impostas pela sociedade. O saber passará pela compreensão aprofundada do conhecimento histórico-geográfico que deverá ser entendido como um estudo cientificamente conduzido sobre a evolução das sociedades, levando à descoberta de que, na História e na vida existem referenciais para cada um encontrar asi próprio, construindo estruturas definidoras de uma identidade pessoal e de uma relação harmoniosa com o mundo que o rodeia. Refletindo sobre a pluralidade de dimensões e ob- jetivos da História e articulando em simultaneidade, não apenas o econômico, o social e o político-institucional, mas também o cultural e o mental, estabelecendo pon- tos de partida para a compreensão da dinâmica histórica como um processo de continuidades e mudanças, rup- turas e permanências, assim como de projeções futuras. Uma proposta para a utilização de recursos didáti- cos: A) O livro didático Os livros didáticos não são somente instrumentos pedagógicas, mas são também apoios de escolhas cul- turais variáveis, verdades a serem transmitidas às gera- ções mais jovens, além de ferramentas de comunicação cujo objetivo está na importância de suas maneiras de transmissão. Nessa perspectiva, os livros, para além de se constituírem em vetores ideológicos, são fontes abundantes, diversificadas e, ao mesmo tempo, comple- tas, visto que cada obra constitui uma unidade própria e coerente, com princípio, meio e fim. Dois aspectos particulares distintos, porém articu- lados, merecem ser destacados quando se intenta ra- diografar os resultados da avaliação do livro didático: a diversidade dessa fonte e a lógica mercadológica que orienta sua produção. Sobre esse assunto: “O livro didá- tico é, antes de tudo, uma mercadoria, um produto de mundo da edição que obedece à evolução das técnicas de fabricação e comercialização pertencentes à lógica do mercado.” (BITTENCOURT, 2001, p. 71) O professor de História do ensino fundamental deve ficar atento aos livros didáticos, pois com a consolida- ção do capitalismo, o livro tornou-se uma mercadoria. A cada início de ano letivo, há uma variedade enorme de exemplares de todas as disciplinas disponíveis no mer- cado. Além disso, vários profissionais estão envolvidos na produção desses livros o que compromete a qualida- de dos conteúdos ali contidos. A esse respeito Chartier diz que: “Façam o que fizerem os autores não escrevem livros, os livros não são de modo algum escritos. São manufaturados por escribas e outros artesãos, por me- cânicos, outros engenheiros e por impressores e outras máquinas (CHARTIER, 1990, p.126). Em decorrência dessa adversidade, na maior parte das vezes, os livros didáticos de História trazem consi- go uma defasagem no que diz respeito aos conteúdos que quase sempre fazem “tábua rasa” do passado. O professor deve ter a consciência de que se não agir com responsabilidade social e política – ou seja, reproduzin- do tais conteúdos – pode transformar-se em um instru- mento de perpetuação da ideologia escolar oficial. B) Os museus Os museus foram se transformando em palco de discussões teóricas e ações práticas quanto ao reco- nhecimento de suas dimensões pedagógica, política e social. É bom lembrar, no entanto, que tais dimensões encontram-se condicionadas a interesses econômicos, políticos e ideológicos das nações e de determinadas classes sociais. O professor de História pode utilizar os museus como recurso didático para que o aluno construa sua criticidade de forma independente. Mas, para isso, é necessário que o professor procure exposições onde a disposição das peças não faça sentido apenas para pes- quisadores e especialistas, é preciso que o docente em História procure museus onde, como afirma Almeida: “o museu permite concretizar mensagens e ideias, enfim, comunicar os resultados da produção de um determina- do conhecimento.” (ALMEIDA, 2001,p. 107) Nessa perspectiva, o professor estará fazendo com que os alunos entrem em contato não somente com a glorificação de sociedades distintas mas também fará com que esse mesmo aluno construa, de forma crítica, seu olhar sobre outras culturas. Partindo desse pressu- posto de que os museus não são imóveis, o professor deve trabalhar a questão da memória como objeto do conhecimento. Além da questão da comunicação e da memória pre- sente nos museus, não podemos deixar de citar as ati- vidades pedagógicas que vários museus desenvolvem a partir de corpo de profissionais que envolvem doutores, mestres, professores, que o professor de História pode e deve aproveitar para trabalhar com seus alunos. É de suma importância que o professor ao visitar um museu procure direcionar a visita para um viés cujo foco seja o desenvolvimento autônomo do aluno. Para que isso ocorra, o docente deve tomar cuidado com alguns pontos de seu planejamento para atingir seus objetivos: 1) definir os objetos da visita; 2) selecionar o museu mais apropriado; 3) ir à instituição com antecedência para se familia- rizar com o espaço; 4) verificar se as atividades educativas do museu adequam-se às propostas da aula, senão, adapta-las; 5) preparar os alunos para a visita; 6) criar formas para dar continuidade à visita na sala de aula. 4 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História Os museus então, como espaços privilegiados de acolhimento, exploração e desenvolvimento de poten- cialidades, são ferramentas poderosas no sentido de contribuir ao equilíbrio dessas tensões que afetam, prin- cipalmente, o jovem, por ser mais sensível e propenso às inúmeras influências e possibilidades de agressões externas. C) O cinema Vivemos na era das imagens. Centenas de canais exibem filmes, documentários, telejornais, e informa- ções que penetram em nossas mentes sem que tenha- mos tempo de filtra-las. Essa quantidade imensa de audiovisuais nos dá a falsa impressão de que estamos informados. Porém, aí reside o perigo, o excesso de tec- nologia ofusca as contradições e ambiguidades transmi- tindo-nos um conhecimento superficial. Ultimamente os professores de História de todos os níveis têm se valido do cinema para poder comple- mentar suas aulas. O cinema pode ajudar e muito no ensino e nas discussões sobre o passado, porém, apesar de toda tecnologia disponível atualmente ser de grande utilidade, é necessário que o professor se apoie tam- bém na leitura e na pesquisa de obras de historiadores profissionais para que se faça a simbiose de recursos e métodos variados para a construção crítica do conheci- mento. O professor deve ter em mente que o cinema é uma tentativa de reconstituição do passado que, na maioria das vezes, não coincide com a visão dos historiadores. “O cinema, assim como o teatro e a ficção, inspi- ra e diverte. Frequentemente, ensina verdades sobre a condição humana. Mas não substitui a História que tenha sido escrita penosamente a partir das melhores análises e evidências disponíveis. Às vezes os cineastas, totalmente imbuídos de seus produtos, proclamam-se historicamente “precisos” ou “fiéis”, e muitos especta- dores os supõem assim. Os espectadores não deveriam endossar tais pretensões nem descarta-las de todo, e sim encara-las como um convite a um aprofundamento posterior.” (CARNES, 1997, p. 10) O docente em História deve tomar muito cuidado ao reproduzir um filme a seus alunos, pois tais produ- ções podem ser utilizadas como veículo de propaganda, doutrinação e “falseamento” do passado por uma série de motivos que agora não vamos adentrar. O papel social do professor de História, ao passar um filme a seus alunos, é fundamental, pois, cabe a ele perceber que os filmes apresentam leituras diferencia- das históricos. Esses filmes podem ser verdadeiras obras de arte em função do grande aparato tecnológico de que dispõem e também de grandes atores e atrizes. A partir do momento da detecção de que o filme não tem compromisso científico com os fatos históricos, o pro- fessor terá condições de, intervir e criar debates, semi- nários, dramatizações, a fim de contribuir no desenvol- vimento intelectual do aluno. Fonte: https://www.webartigos.com/artigos/o--papel-social-do-professor-de-historia-do-ensino- fundamental-na-formacao-critica-do-aluno/9809#i- xzz53t1xcwrH II – O ESTUDO DA HISTÓRIA: O VALOR DA MEMÓRIA SOCIAL E DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO-CULTURAL. A cultura ganha uma nova importância na vida po- lítica e económica contemporânea. O desenvolvimento humano não é compreensível nem realizável sem o re- conhecimento do papel da criação cultural, em ligação estreita com a educação e a formação, com a investiga- ção e a ciência. O que distingue o desenvolvimento e o atraso é a cultura, a qualidade, a exigência - numa pala- vra, a capacidade de aprender. Deixou de fazer sentido a oposição entre políticas públicas centradas no Patri- mónio histórico, por contraponto à criação contempo- rânea. A complementaridade é óbvia e necessária. Basta olharmos os grandes marcos da presença humana ao longo do tempo para percebermos que há sempre uma simbiose de diversas influências, de diversas épocas, li- gando Património material e imaterial, herança e criação. A nova Convenção-Quadro do Conselho da Europa so- bre o Património cultural, assinada em Faro em Outubro de 2005 e já ratificada por Portugal, é um instrumento inovador da maior importância, onde pela primeira vez se reconhece que o Património cultural é uma realidade dinâmica, envolvendo monumentos, tradições e criação contemporânea. Segundo este documento, a diversida- de cultural e o pluralismo têm de ser preservados con- tra a homogeneização e a harmonização. E se falamos de um «património comum europeu», como realidade a preservar, a verdade também é que estamos perante uma construção inédita e original baseada na extensão da dimensão tradicional do Estado de direito, no apelo à diversidade das culturas, no aprofundamento da sobe- rania originária dos Estados-nações, na legitimidade dos Estados e dos povos, na criação de um espaço de segu- rança e de paz com repercussões culturais e numa maior partilha de responsabilidades nos domínios económico e do desenvolvimento durável. Trinta anos depois de ter organizado o Ano Euro- peu do Património Arquitetônico, o Conselho da Europa continua a desempenhar um papel pioneiro na reflexão 5 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História sobre o significado do Património nas nossas socieda- des, em consonância com as preocupações universais da UNESCO, em especial quanto à necessidade de re- tirar consequências efetivas e positivas relativamente à diversidade cultural e ao conceito de Património imate- rial. E a nova Convenção de Faro insere-se na linha das Convenções em vigor - de Granada de 1985, sobre o Património arquitetônico, de La Valetta de 1992, sobre o Património arqueológico, e de Florença de 2000, so- bre a paisagem. Trata-se do culminar de uma reflexão levada a cabo pela comunidade científica e pelo Conse- lho da Europa, desde os anos 70, em matéria de «con- servação integrada» dos bens culturais. Sem retornar a mecanismos de proteção já cobertos pelas Convenções precedentes, o novo texto insiste, como veremos, nas reflexões que ora publicamos, nas funções e no papel do Património. Trata-se de passar da perspectiva de «como pre- servar o Património, segundo que procedimento?», à questão do «por quê e para quem lhe dar valor?». E esta ideia concretizou-se no entendimento segundo o qual o conhecimento e a prática respeitantes ao Património cultural têm a ver, antes do mais, com o direito dos ci- dadãos participarem na vida cultural, de acordo com os princípios do Estado de direito, conforme um conceito mais exigente de direitos e liberdades fundamentais. A Convenção considera, assim, o Património cultural como um valor e um recurso, que tanto serve o desenvolvi- mento humano em geral, como concretiza um modelo de desenvolvimento económico e social assente no uso durável dos recursos, com respeito pela dignidade da pessoa humana. Estamos perante um instrumento de referência, apto a influenciar outros instrumentos jurídicos de âm- bito nacional e internacional. Isto significa que se trata de um documento que, sem duplicar a ação da UNES- CO (designadamente quanto ao conceito de Património imaterial), define objetivos gerais e identifica domínios de ação, bem como direções e pistas em cujo sentido as partes contratantes aceitam progredir, deixando a cada Estado a capacidade de escolha e a autonomia para op- tar pelos meios de realização melhor adaptados à sua organização constitucional, e à sua tradição política e ju- rídica. Estamos, assim, diante de uma Convenção-Qua- dro, que, como veremos, não cria «direitos executórios» diretamente aplicáveis nos países, mas lança um pro- cesso de cooperação entre os Estados, convidando-os à atualização e ao progresso das suas políticas do Patri- mónio em benefício de toda a sociedade. Já a originalidade do conceito de «património co- mum da Europa» tem de ser vista como um elemento dinamizador de uma cidadania aberta. O «valor» surge, assim, no «horizonte da experiência histórica», fora de qualquer uma concepção abstrata. Património comum está, deste modo, na encruzilhada das várias pertenças e no ponto de encontro entre memória, herança e cria- ção. Assim se entende a adopção de um mecanismo de acompanhamento e de balanço da cooperação entre os Estados signatários. Uma base de dados comum e um centro de recursos servirão as administrações num sen- tido de eficiência e de apoio às boas práticas. Indo mais longe do que outros instrumentos jurídicos e políticos e do que outras convenções, o texto visa prevenir ainda os riscos do uso abusivo do Património, desde a mera deterioração a uma má interpretação como «fonte de conflitos» (todos nos lembramos dos exemplos da Pon- te de Mostar e de Dubrovnik). A cultura de paz e o res- peito das diferenças obriga, no fundo, a compreender de maneira nova o Patrimó nio cultural como factor de aproximação, de compreensão e de diálogo. A primeira parte desta obra resulta de uma reflexão pessoal suscitada pelo trabalho conjunto levado a cabo no grupo que foi constituído no Conselho da Europa, e a que tive a honra de presidir, e que propôs ao Conselho de Ministros da Cultura do Conselho da Europa, sob a Presidência portuguesa, a Convenção-Quadro do Con- selho da Europa sobre o valor do Património cultural na sociedade contemporânea, que foi aprovada no dia 27 de Outubro de 2005, na cidade de Faro. Acrescentei outros textos sobre alguns temas de cultura portuguesa, onde procurei ilustrar em concreto a importância da relação entre Património, Herança e Memória. Em Confissões (Livro XI, capítulo XX), Santo Agos- tinho de Hipona identifica três tempos: “Um presente das coisas passadas, um presente das coisas presentes e um presente das coisas futuras. O presente das coisas passadas é a memória, o presente das coisas presen- tes é a vida e o pre sente das coisas futuras é a espera”. Considera, assim, o doutor da Igreja que passado e futu- ro são figuras de linguagem que facilitam determinada referência de um tempo considerado, que já foi ou que virá a ser, mas que não é. A realidade existe apenas no presente, que é o «tempo em movimento». E é a partir deste entendimento que uma concepção atual de Patri- mónio e de cultura deve abranger a compreensão dos três presentes, de modo que a memória seja revivida e respeitada, assumindo a relação que se estabelece entre as pessoas, a sociedade e a herança que recebem e que projetam no futuro. Se virmos bem, todos os testemu- nhos que recebemos correspondem a diversas influên- cias. Uma catedral que chega aos nossos dias apresenta diversos estilos, não apenas pelo tempo que demorou a construir, mas também pelas sucessivas adaptações ou 6 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História melhoramentos que foi sofrendo. O mesmo se digado urbanismo, da literatura, das artes, tantas vezes situa- dos, em períodos de transição, na encruzilhada entre a erudição e a tradição popular, ou resultantes de várias influências e de diversas transições. Afinal, o presente é fugaz, mas é real. O passado é inacessível e já não volta, enquanto a realidade do futu- ro é apenas potencial, já que ainda não podemos tê-la como efetiva, porque é incerta, não apenas no longo prazo, mas em cada momento que vai acontecendo. E é o mesmo Santo Agostinho a afirmar que “o tempo está na mente humana, tendo sido criado com o homem, que espera, considera e recorda” (cap. XXXIII). Esperar, considerar e recordar são componentes de qualquer atitude humana. E, assim, herança e memória têm de ser consideradas pelo valor que contêm, devendo ser defendidas e preservadas em ligação direta com a vida. Não faz sentido encarar a memória como uma realidade congelada ou paralisada no tempo. Daí as cautelas ne- cessárias que é sempre preciso ter. Para defender, pro- teger ou preservar um testemunho arqueológico ou um monumento temos de considerar não só o valor históri- co e patrimonial, mas também a relação que a socieda- de tem com esse elemento. Estamos perante a lembrança presente das coisas passadas, a visão presente das coisas presentes e a es- perança presente das coisas futuras. O contributo fun- damental de Agostinho de Hipona foi, assim, na expres- são de Paul Ricoeur, o de reduzir a extensão do tempo à extensão da alma, e o de ligar essa redução ao corte metodológico, que não cessa de se manifestar no cora- ção do tríplice presente: entre o presente do futuro, o presente do passado e o presente do presente. Deste modo, vê-se nascer e renascer a discordância da própria concordância entre os desígnios da espera, da atenção e da memória. Por isso, Paul Ricoeur fala do «trabalho da memó- ria», que obriga a resistir às pulsões imediatistas e su- perficiais de um patriotismo fechado e cego. A perten- ça saudável e a relação natural com a identidade e a herança obrigam a compreender o amor-próprio, mas também a criar espaço de afirmação e de racionalidade. Perante o risco das atitudes fanáticas, temos de estar de sobreaviso e impedir a criação de condições favoráveis à radicalização, desde a exclusão social até à intolerância cultural. A memória pode ser positiva ou negativa, pode reportar-se a um acontecimento pacífico e unificador, ou a um evento conflitual e violento. Na nossa relação com a História e com o Património cultural somos obrigados a assumir a herança histórica no seu todo, envolvendo os as pectos positivos e negativos. Muitas vezes na His- tória remota tudo se torna mais fácil, porque a memória é mais distante, mas quando se trata de acontecimentos recentes tudo se torna mais difícil. Outras vezes, acon- tecimentos remotos ganham atualidade pela evolução dos circunstancialismos políticos. Lembremo-nos da Se- gunda Guerra Mundial e dos campos de concentração ou, mais recentemente, da guerra dos Balcãs. Em ambos os casos temos acontecimentos marcantes que se pro- jetam nos dias de hoje - ora pela presença das vítimas e seus descendentes diretos ora pela afirmação atual de identidades antigas que não desejam ver ameaçados os seus símbolos próprios. Quando o filósofo francês fala do «luto» está a pensar nos efeitos dramáticos da guer- ra, da intolerância e da violência. E alguns episódios re- centes ligados ao julgamento histórico de quem esteve envolvido nos regimes políticos totalitários ilustram as dificuldades e os riscos de confundir responsabilidade e «caça às bruxas». O «dever de não esquecer» é extensível a todo o legado histórico. A memória do que nos antecedeu deve ser preservada. O valor do Património cultural, material e imaterial, exige a aceitação da verdade dos aconteci- mentos, positivos e negativos, para que possamos ga- nhar em experiência, pelo «trabalho de memória». Mas a verdade tem de ser caldeada com a capacidade de compreender. O «trabalho de memória» exige, por isso, o aceitar que as relações humanas obrigam ao compro- misso. O dever de respeito serve para não esquecer, mas também para tornar o mundo da vida mais humano, ca- paz de compreender que há claros e escuros, há bem e mal, há ações positivas e erros. Uma identidade aberta tem, assim, de ser serena e sem cólera, mas não esque- cida da verdade e da justiça. A obrigação de não esquecer não pode, porém, ser confundida com ressentimento. Daí que tenhamos de compreender a visão presente das coisas presentes, a lembrança presente das coisas passadas e a esperança presente das coisas futuras. O dever de respeitar e de compreender completa, assim, o dever de não esquecer. Por isso, as fontes de conflito centradas na identidade e na memória devem ser superadas: a) pelo culto do rigor historiográfico; b) pela consideração das diferentes perspectivas em presença; c) pelo respeito da comple- xidade e do pluralismo; d) pela partilha de responsabili- dades; e) pela articulação equilibrada entre conservação e criação. O «trabalho de memória» exige o assumir o tempo próprio e os outros tempos, o lugar próprio e o lugar dos outros. Longe das simplificações, estamos perante a exigência de sabermos compreender pondo-nos na posição do outro. Só assim a identidade pode tornar-se 7 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História um fator de ligação e de respeito, de diálogo e de parti- lha, de responsabilidade e de compreensão. E a preser- vação dos lugares de memória e do Património comum apenas poderá ser assegurada se ao ressentimento, à autossatisfação, ao unilateralismo e à absolutização das interpretações soubermos contrapor o respeito, a alte- ridade, o pluralismo e a diversidade do conhecimento. Longe de criar lugares de ninguém, do que se trata é de preservar lugares de hospitalidade e acolhimento para todos. E esta capacidade de acolhimento preserva o diálogo, a consideração mútua, o lugar dos outros e a abertura de horizontes de procura de verdade. (...) Orhan Pamuk, num livro notável sobre Istambul, põe o dedo na ferida deste tema, muito mais difícil do que poderemos supor à primeira vista. «Não me incomoda nem ofende absolutamente nada ver os ocidentais a utilizarem o meu passado e a minha história como fon- te de ‘exotismo’, fazendo desta cidade de Istambul que eles nunca puderam colonizar o tema dos seus escritos, dos seus desenhos, dos seus quadros e dos seus filmes. Com o mesmo entusiasmo, também acho por meu lado exóticos os medos e os sonhos desses viajantes, e acon- tece-me muitas vezes lê-los, não só para me divertir, me informar, ou para ver que forma assume a cidade nos seus pincéis, mas também para me familiarizar com o seu mundo. Por outro lado, as suas imaginações, as suas interrogações, a vontade de expansão dos seus Estados, ou ainda a curiosidade pelo que se encontra para além das suas fronteiras levaram-nos a dirigir-se ao local que se chama ‘a minha casa’» (Istambul-Memórias de uma Cidade, Presença, 2008, p. 285). O escritor assume que este interesse de alguém de fora (Nerval, Flaubert) per- mite entender melhor, por parte de quem habita a ci- dade, a sua importância e o seu significado. E Pamuk confessa o seu interesse pela visão dos ocidentais, que, de algum modo, permite o diálogo entre civilizações e o desenvolvimento da sua capacidade crítica. Ganhamos, pois, quando nos pomos no lugar do outro, até para que o outro possa entender a importância dessa atitude também para ele. E no caso do exemplo que Pamuk dá, já que Flaubert procura descobrir a origem da doença que contraiu, o resultado a que chega (sobre a origem europeia da sífilis) pode destruir algumas ideias feitas sobre o Oriente... Afinal, mais importante do que as sim- plificações, importa entender que a humanidadeé uma só e que as suas diferenças são um fator de enriqueci- mento geral. O presente das coisas passadas é a memória; o pre- sente das coisas presentes é a vida, e o presente das coisas futuras é a espera. A nossa relação com a Cultura apenas pode assim ser entendida a partir da História, das diferenças, da complexidade e do pluralismo, da responsabilidade e da capacidade criadora. Fonte: http://www.snpcultura.org/vol_patrimonio_ heranca_e_memoria.html III – O BRASIL NO CONTEXTO MUNDIAL: 1 A SOCIEDADE BRASILEIRA NO MUNDO CONTEMPORÂNEO; Refletir sobre as referências identitárias remete ime- diatamente ao conflito étnico e a questão das diferenças que o tema da diversidade cultural impõe. Assim, embo- ra a marca do humano, ou melhor, da cultura humana, seja exatamente a diferença dos gêneros, dos sexos, das religiões, das etnias, das identidades e dos direitos, pa- radoxalmente temos que lutar politicamente para que essas diferenças sejam respeitadas no cotidiano e incluí- das no debate político e acadêmico. Os discursos das grandes civilizações historicamen- te têm se pautado pela postura etnocêntrica, ou seja, nós e os outros. Em nome de uma “civilização” e de uma “cultura superior,” o outro, ou seja, aquele que é diferente tem sido qualificado e tratado como bárbaro, fraco, inferior, incapaz, impotente, desprezível etc. Foi precisamente para compreender e explicar esse para- doxo da cultura humana que no século XIX, por oca- sião da globalização moderna decorrente do processo de colonização europeu iniciado por volta do século XV, que surgiu a Antropologia, ciência social cujo objeto de estudo é exatamente a cultura humana e o seu insepará- vel, porque intrínseco a ela, etnocentrismo. No percurso histórico do seu desenvolvimento enquanto ciência ao longo do século XIX, a antropologia tomou como objeto de estudo a relação de conhecimento entre o “Eu” e o “Outro”, calcada no princípio do respeito à alteridade, e construiu uma distinção em relação às outras ciên- cias sociais, qual seja, um olhar fundado na perspectiva teórica do relativismo e na metodologia do trabalho de campo no estudo da cultura. Tomando dados empíricos, a despeito das mobiliza- ções e declarações mundiais contra todo tipo de discri- minação, verificamos que atitudes racistas e intolerantes em relação à diversidade não mudaram muito. No Brasil são 50 milhões de pessoas, ou seja, 29%, vivendo abaixo da linha da indigência. O que esses dados podem revelar em relação à questão política da diversidade étnico-cul- tural e das identidades? Tudo. Essa população mundial excluída é composta majoritariamente por pobres de etnias diversas que sofrem vários tipos de discriminação e preconceitos de ordem econômica, política, social, cul- tural, de gênero etc. Portanto, isso remete diretamente à questão da cidadania, dos direitos e da necessidade de políticas públicas de gestão desses conflitos na socieda- de contemporânea. 8 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História No mundo atual, as saídas históricas para estes conflitos foram perspectivas e políticas segregacionistas (África - apartheid), assimilacionistas (Brasil) e multicul- turalistas (Canadá, Austrália e Suécia). Historicamente, das expansões imperiais à era colonial, o desenho até meados do século XX era o modelo das culturas hege- mônicas versus culturas não hegemônicas, que levaram a dois modelos: a segregação e a assimilação. Vemos que, às realidades nacionais em que os conflitos étnicos e culturais já existem estruturalmen- te, acrescentam-se os movimentos maciços de popula- ções que se deslocam no planeta. Assim, o impacto das migrações acirra os conflitos étnico-culturais gerando diásporas modernas (Hall, 2005) que exigem inclusão e discussão na pauta da política mundial. É importante destacar as consequências políticas drásticas da mun- dialização do capital, ligadas diretamente à construção das referências identitárias, a partir do conflito relacio- nado à diversidade étnico-racial. É preciso denunciar e refletir sobre a exclusão de grande contingente humano da participação democrática do direito de se expressar na própria língua, da educação, saúde, habitação, em- prego e representação política. O multiculturalismo, via de regra, é apresenta- do como saída política correta e adequada para esses problemas. Entretanto, percebemos alguns problemas de ordem político-ideológica nesse discurso. Vejamos, multiculturalismo remete a duas questões de imediato, qual sejam, o fato de que a diversidade existe e de que é uma questão política. Assim, podemos abordar o con- ceito em termos de: 1- A abordagem demográfica (descritiva) - apresen- ta os vários segmentos étnicos; 2- A abordagem programática (política) - progra- mas e iniciativas políticas para gerir a diversidade étni- co-cultural; 3- A abordagem ideológica (normativa) - visa ga- rantir o respeito mútuo baseado no princípio de que a riqueza do mundo reside no diálogo entre as diversida- des. 4- A abordagem ideológica (crítica) - com a qual concordamos, aponta para o fato de que reconhecer as diferenças pela diferença, é extremamente perigoso por dois motivos: não permite a percepção histórica da ori- gem da diferença e desloca a questão do conflito para o relativismo cultural. Partindo dessa premissa, percebemos como indício importante para a compreensão da sociedade brasilei- ra, a identificação da violência simbólica e as diversas representações no imaginário social dos diversos tipos de discriminação: sexual, de gênero, racial, etc. Inclusive e principalmente as vividas e também as praticadas por todos nós. Partimos do pressuposto de que a atitude de identificar, discutir e reconhecer a contradição e o conflito constitutivo do humano aproxima afetivamente o pesquisador do seu objeto de estudo e possibilita o trabalho daquilo que nos afeta e pode permitir o reco- nhecimento do preconceito e discriminação, como pri- meiro passo para uma possível crítica e transformação, embora isso não seja garantia de mudança de atitude. No caso do Brasil, não podemos abordar o tema das referências identitárias sem discutir o racismo em relação aos negros. Não só a partir da perspectiva his- tórica, mas também no plano afetivo ou do imaginário, e nesse sentido, a Teoria da Psicanálise é extremamente importante, principalmente a concepção lacaniana dos registros no plano do real (que é diferente de realida- de), do simbólico e do imaginário (Lacan, 1998). Cabe ressaltar que esses registros se expressam em planos de análise que só se separam para efeito didático. Nesta perspectiva, o racismo no Brasil pode ser enfocado a partir da dialética desses registros no plano de análise. No registro do real, impera a miscigenação étnica visí- vel empiricamente. No registro da realidade, que é uma construção sociocultural elaborada a partir das fantasias que estruturam o real, podemos identificar a prevalên- cia da negação do racismo e o desconforto disfarçado em relação à mestiçagem étnica entre negros, índios e brancos, na formação da sociedade brasileira. Dessa forma, no Brasil, a mistura aparece na cor, entretanto no registro do imaginário que ordena os sentimentos e estrutura o real, o que comanda é a jus- taposição, a hierarquia que reforça o racismo, ou seja, lá na fantasia, o que comanda os desejos em relação ao sentimento racista, é a justaposição. Não há mistura, os preconceitos estão presentes e arraigados. No plano do simbólico, lugar da representação das fantasias, a justa- posição hierárquica e autoritária aparece camuflada na aparência de mistura nas diversas formas de expressão estética e artística da realidade brasileira, ou seja, na li- teratura, na poesia, no cinema, na música, na pintura, na escultura e nas diversas mídias.Diante do exposto, podemos inferir que, se a teo- ria da circularidade de Bakthin (1987) e Ginzbrug (1987), destaca o processo pelo qual as ideias de culturas dis- tintas circulam e se interpenetram de forma dialética, é preciso destacar também que no Brasil, por exemplo, 9 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História esse processo de influência múltipla entre a cultura he- gemônica e não hegemônica, provoca como efeito a justaposição hierárquica e autoritária das ideias/senti- mentos no plano do imaginário social (Berlinck, 2000). A identidade é uma construção social e cultural, portanto histórica. E nesse sentido, é ingenuidade ou cinismo sustentar qualquer tipo de neutralidade políti- co afetiva. Daí nossa crítica à postura alicerçada numa neutralidade científica ou fundada no relativismo cultu- ral, que ainda tem pautado a atitude dos antropólogos contemporâneos, marcada pela ausência de uma inter- venção ética ou política face aos conflitos advindos do contato com a diversidade cultural, em nome de uma postura de tudo relativizar. Fonte: http://profludfuzzisocial.blogspot.com. br/2013/12/a-sociedade-brasileira-contemporanea-e. html SOCIEDADE E CULTURA, COMUNICAÇÃO E GLOBALIZAÇÃO, O espaço geográfico encontra-se repleto de ele- mentos próprios do processo de globalização, como as antenas de TV e celular, os meios de transporte cada vez mais modernizados, os cabos de fibra óptica, as redes (que nem sempre são visíveis, mas se fazem presentes no espaço), entre outros elementos. Isso também acontece com a cultura. O espaço geo- gráfico constrói suas bases em inúmeros campos e con- figurações (economia, política, sociedade, educação), de modo que a cultura encontra-se plenamente inserida nesse contexto. Assim, observam-se as transformações das paisagens que variam do natural ao cultural, carre- gando ambientes constitutivos de todas as sociedades capitalistas, mas com elementos culturais locais ou re- gionais, que denotam a singularidade dos lugares. Mas como podemos compreender o comportamen- to e as transformações da cultura na era da globaliza- ção? Como elas se expressam em um espaço social cada vez mais interligado com o global? É possível dizer que estamos passando por uma padronização cultural? Com a Globalização, ampliaram-se as facilidades de comunicação e, consequentemente, a transmissão dos valores culturais. Assim, observa-se que as diferen- tes culturas e os diferentes costumes podem se inte- ragir sem a necessidade de uma integração territorial. Entretanto, observa-se também que esse processo não se dissemina de forma igualitária, de modo que alguns centros economicamente dominantes transmitem em maior número os seus elementos culturais. Um exemplo disso é a chamada Indústria cultural, termo criado por sociólogos no início do século XX, mas que se mantém atual. Essa indústria é capaz de gerar e controlar os padrões de comportamento e os costumes das pessoas, como as roupas, os padrões de etiqueta e comportamento, as atividades de lazer que exercem etc. Por esse motivo, muito se fala em uma homogenei- zação das culturas, isto é, a padronização dos modos de ser e agir dos indivíduos com base em uma refe- rência dominante, fazendo sucumbir os valores locais e tradicionais. Nesse sentido, muitos acusam o processo de globalização de ser um sistema perverso, uma vez que ele não se democratiza inteiramente e só atinge os setores economicamente dominantes do mundo e das sociedades. Por outro lado, à medida que os sistemas de comu- nicação, informação e transporte vão elevando a sua ca- pacidade de disseminação, observamos também a pos- sibilidade dos costumes e valores locais se interporem aos elementos globais. Isso ocorre a partir do momento em que comunidades tradicionais ou culturas regionais conseguem disseminar e divulgar para além de suas fronteiras as suas características. Com base nessas con- cepções, há quem diga que a Globalização, na verdade, promove uma heterogeneização cultural. Por fim, é necessário observar que há uma hierar- quia nos sistemas de comunicação. Apesar do advento da internet e da possibilidade de expressão por parte de inúmeras pessoas, ainda algumas formas de pensamen- to e ideias socialmente dominantes sobrepõem-se às demais, através do uso preferencial sobre os elementos midiáticos, a exemplo do que ocorre com filmes e se- riados, geralmente mantidos sob um padrão e influen- ciando os estereótipos comportamentais. Nesse senti- do, muitos são os que afirmam que, na verdade, o que ocorre é uma hegemonização cultural na globalização. Mas antes de tirarmos uma conclusão definitiva sobre os elementos culturais e suas transformações na mundialização das sociedades, é necessário estarmos sempre atentos aos eventos e informações, sempre com a preocupação de compreender e assimilar os fatores modernos da sociedade, sem negar ou sobrepor os va- lores tradicionais dela constitutivos. Fonte: http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/geo- grafia/cultura-globalizacao.htm 10 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História IDENTIDADE NACIONAL E MULTICULTURALISMO O multiculturalismo pode ser visto como um sin- toma de transformações sociais básicas, ocorridas na segunda metade do século XX, no mundo todo pós- segunda guerra mundial. Pode ser visto também como uma ideologia, a do politicamente correto, ou como as- piração, desejo coletivo de uma sociedade mais justa e igualitária no respeito às diferenças. Consequência de múltiplas misturas raciais e culturais provocadas pelo in- cremento das migrações em escala planetária, pelo de- senvolvimento dos estudos antropológicos, do próprio direito e da linguística, além das outras ciências sociais e humanas, o multiculturalismo é, antes de mais nada, um questionamento de fronteiras de todo o tipo, principal- mente da monoculturalidade e, com esta, de um con- ceito de nação nela baseado. Visto como militância, o multiculturalismo implica em reivindicações e conquis- tas por parte das chamadas minorias. Reivindicações e conquistas muito concretas: legais, políticas, sociais e econômicas. Para a maior parte dos governos, grupos ou indi- víduos que não conseguem administrar a diferença e aceitá-la como constitutiva da nacionalidade, ela tem de estar contida no espaço privado, em guetos, com maior ou menor repressão, porque é considerada um risco à identidade e à unidade nacionais. Mas não há como ne- gar que, cada vez mais, as identidades são plurais e as nações sempre se compuseram na diferença, mais ou menos escamoteada por uma homogeneização forçada, em grande parte artificial. O multiculturalismo é hoje um fenômeno mundial (estima-se que apenas 10 a 15% das nações no mun- do sejam etnicamente homogêneas). Costuma, porém, ser considerado um fenômeno inicialmente típico dos Estados Unidos, porque este país tem especificidades que são favoráveis à sua eclosão. Essa especificidade é “histórica, demográfica e institucional”. Mas, outros paí- ses que não necessariamente têm as mesmas condições - as quais, segundo Andrea Semprini, em Multicultura- lismo (EDUSC, com tradução de Laureano Pelegrin), são: a existência de instituições democráticas, de uma eco- nomia pós-industrial em via de globalização e de uma população heterogênea - também apresentam esse fe- nômeno. Entre esses, Canadá, Austrália, México e Brasil, especialmente devido à presença de “minorias nacionais autóctones” por longo tempo discriminadas. Canadá e Austrália têm sido apontados como exemplares, devi- do a algumas conquistas fundamentais e relativamente recentes. Mesmo na Europa, nos lembra Semprini, há minorias que hoje reivindicam seu reconhecimento e, às vezes, como no caso dos Bascos na Espanha, de forma violenta. Conflitos e contradições tambémse encontram na França e na Alemanha. De acordo com Semprini, na França, o caso do véu islâmico fala por si só e, na Ale- manha, a discussão interminável sobre a integração dos turcos e o direito à dupla nacionalidade volta sempre, mesmo que, hoje, disfarçada no que o partido demo- crata cristão vem chamando de Leitkultur - definido por uns como cultura de referência alemã, à qual os imi- grantes deveriam se adaptar (como defendeu, levantan- do polêmica, Friedrich Merz, presidente do CDU-CSU, em outubro de 2000), e por outros, mais radicalmente, como cultura dominante. Os estudos sobre a situação nos Estados Unidos mostram um descompasso entre os discursos e as prá- ticas, o risco de se utilizarem as bandeiras multicultura- listas como forma de segregação em guetos dos incô- modos diferentes e reivindicantes. O multiculturalismo, assim, vira paliativo. Isso é compreensível sobretudo no quadro histórico em que se deu, desde o século passa- do, o tratamento da imigração nesse país, através do chamado melting pot de alguns e do desmantelamento das identidades de outros, considerados inassimiláveis. Essa situação se arrasta até o presente, ainda que camu- flada (Maria Helena, eu substitui disfarçada por camufla- da, porque a nota introduzida acima traz uma constru- ção muito parecida com esta). Deve-se reconhecer, porém, que a chamada Ação Afirmativa, defendida por uns e atacada por outros, pa- rece ter conseguido, apesar de todos os seus limites, algumas conquistas que, hoje, ameaçam se perder, con- forme nos explica Angela Gillian, em “Um ataque contra a ação afirmativa nos Estados Unidos - Um ensaio para o Brasil”, que integra o volume Multiculturalismo e ra- cismo: Uma comparação Brasil-Estados Unidos (editora Paralelo 15, organização de Jessé Souza). No caso dos índios que resistiram ao grande mas- sacre, a defesa dos princípios e ações multiculturais tem levado a uma retomada da visibilidade da herança indígena, provocando uma revisão crítica do passado, tentativas de reparação e, da parte de muitos cidadãos, a busca e reconhecimento de suas origens direta ou indiretamente ligadas a essa herança étnica e cultural. Mas o sonho americano da democracia, com igualdade de oportunidades e de direitos, desmentia-se e volta e meia torna a desmentir-se no apartheid dos negros e dos latinoamericanos. Um caso recente - noticiado pelo Jornal da Tarde, em 16/11/00 (“Herbert viveu o ‘sonho americano’. Agora, vai para albergue no Brás”), e pela Folha de S.Paulo, no dia 20 do mesmo mês (“Brasileiro deportado recebe duas propostas de trabalho em SP”) - mostrou como é difícil a um jovem brasileiro integrar- se na sociedade norte-americana, mesmo que para lá 11 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História tenha sido levado bebê, por pais adotivos que eram cidadãos do país. O jovem João Herbert, hoje com 22 anos, foi deportado por ter-se envolvido com drogas, como ocorre com muitos jovens em todo o mundo nes- sa idade. De volta ao Brasil, sem saber português e sem conhecer ninguém aqui, Herbert passa a identificar-se como brasileiro, já que, excluído do paraíso que para ele se transformou subitamente em inferno, adota o crité- rio: “a gente é o que nasce”. Cuidadoso na crítica ao sis- tema norte-americano, não deixa de acusar: “Eles tratam os latino-americanos de forma diferente”. Aliás, sobre a diáspora brasileira e as deportações, uma matéria publicada na revista Época, em 13/11/00, intitulada “Sagas inglórias”, evidencia quão fechadas para as pessoas são as fronteiras abertas para as merca- dorias, contradição para a qual um crítico agudo como Chomsky não cessa de apontar (A minoria próspera e a multidão inquieta, editora da UNB). Segundo a reporta- gem da revista Época, o número de brasileiros depor- tados no ano 2.000 foi de 1.359 pessoas contra 177 no ano de 1999. Todos sentindo-se roubados de sua iden- tidade, como seres de um lugar onde é cada vez mais difícil ser. Andrea Semprini nos explica que “se as causas das controvérsias multiculturais vão longe na história dos Estados Unidos, somente nos últimos dez ou quinze anos esta problemática tem-se tornado objeto de vivo debate social e político.” E ele coloca a questão que se põe para todos nós: “Por que agora? Por que o multi- culturalismo, de repente, tornou-se assunto da moda e objeto de polêmicas tão violentas?” (Multiculturalismo) Sua resposta passa por uma análise das transforma- ções por que passou e passa a sociedade norte-ameri- cana, sobretudo a partir dos anos 60, quando se proces- sa o movimento pelos direitos civis, contra a segregação racial. Como em muitos outros lugares do mundo, são dos anos 60 que sopram os ventos da abertura multi- cultural, do reconhecimento dos direitos das chamadas minorias e da luta pelos seus direitos. Mas entre a integração formal dos negros, latino-a- mericanos e índios (mas também mulheres, homosse- xuais e outros grupos sistematicamente discriminados) na sociedade do bem-estar e da democracia e a inte- gração real, muitos senões atrapalharam e continuam atrapalhando, pois a população branca, em grande par- te conservadora de uma cultura de longa data racista e segregacionista, não aceita isso com tanta facilidade. Por outro lado, o alargamento da base social com a as- similação, mesmo que mais teórica do que prática, mas facultada legalmente, dos antes inassimiláveis, provoca uma reconfiguração do quadro econômico e social do país. Parte da classe média cai do paraíso e parte menor reforça sua posição nele pela concentração da renda. Aumentam os níveis de pobreza e se repete um outro tipo de apartheid: pelo menos 20% da população fica à margem do sonho americano, inacessível para eles. Em consequência, os conflitos das minorias não se dão apenas com a maioria, mas entre elas próprias, transformadas umas para as outras em bode expiatório de sua exclusão social. Esse é apenas um dos desafios que o mundo global e multicultural enfrenta hoje com melhores ou piores condições de manter a paz entre os diferentes que tentam conviver num mesmo território. Os teóricos do Multiculturalismo costumam opô-lo à Modernidade, a cujo discurso homogeneizador se contrapõem o pluralismo, o hibridismo, a intercultura- lidade e os discursos e valores de fronteira. Faz parte dessa crítica à Modernidade, a crítica à noção homoge- neizadora de nação e de identidade nacional. Em troca, fala-se da nação como um constructo, como uma inven- ção com base em mitos, cuja narrativa silencia fraturas e contradições. Mas há quem considere que, na América Latina, nem as nações são homogêneas nem a modernidade é linear, mas palco de múltiplas temporalidades que nun- ca foi possível disfarçar de todo. E as reflexões menos simplificadoras sustentam que a identidade, uma vez inventada e incutida por gerações e gerações, tem uma positividade para o bem e para o mal, servindo tanto para justificar a violência contra outras nações como para defender as mais fracas - econômica, política e militarmente - contra as mais poderosas. Ou seja, essas reflexões, com as quais me identifico, reconhecem que as identidades são históricas e relacionais, mas ainda identidades. Elas também reconsideram como fator en- riquecedor o múltiplo e cada vez mais múltiplo perten- cimento dos indivíduos, suas ambivalências, as identida- des ambíguas que se combinam: continental, nacional, regional, local, de idade, de gênero, étnica, profissional e de classe. A diversidade cultural e étnica é vista como desafio para a identidade da nação, mas também como fator de enriquecimento e abertura de novas e múltiplas possibilidades. Um pensamento dicotômico, muito presente em nossos dias e contraditório a toda a vontade de liberda- de e relativismo, opõe sistematicamente a classe social à etniae à cultura, mas há também quem volte a conside- rá-la com o devido peso. Refiro-me àqueles estudiosos que não querem esquecer o grande apartheid do globo que nesta América do Sul se faz triste realidade quoti- diana: entre quem tem para viver e até para esbanjar e quem mal tem para sobreviver. Quem não esquece o pa- pel da classe, tampouco esquece que a queda do muro de Berlim não significou a queda de todas as barreiras que permitisse aos cidadãos do mundo ir e vir livremen- te e que as alianças econômicas dos grandes têm como contraponto, paralelamente, as barreiras à imigração. A 12 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História globalização resolveu e resolve sempre quem interessa importar e quem é preciso deportar. Para uma estudiosa de literatura como eu, interessa pensar um pouco mais o problema do multiculturalismo na educação e nos estudos da linguagem (caberia aqui mencionar o esforço do politicamente correto de “puri- ficação da língua” que, muitas vezes, reforça a tendência de os indivíduos se contentarem apenas com a refor- mulação do discurso em lugar da realidade), da crítica e da produção de manuais escolares, com atenção ao modo como são aí representadas as chamadas minorias (negros, índios, mulheres, homossexuais, entre outras) e às novas disciplinas e/ou áreas de pesquisa introduzidas nos cursos de humanidades nas universidades do mun- do inteiro: sobre literatura e cultura negra, sobre mitos e narrativas indígenas, sobre mulheres ou, mais recente- mente, sobre gêneros, entre outros. Um aspecto que me parece importantíssimo é o da patrulhagem ideológica na língua, na literatura, no cine- ma e em outras manifestações culturais que, em nome de uma ética igualitária de respeito ao outro e à sua au- to-estima, na verdade o encaram de modo condescen- dente, infantilizando-o, inibindo sua capacidade de luta e defesa pelo que realmente interessa. Nesse mundo da ética do politicamente correto, faz-se silêncio sobre cer- tos valores básicos para a convivência plena do indiví- duo consigo mesmo e com os outros, com a natureza e com a sociedade, entre esses o direito à e o gosto pela beleza das coisas bonitas que se fazem sem pressa, de- vagar, como querem os índios de Darcy Ribeiro. A busca de normas e códigos perfeitos, da lingua- gem ao comportamento, sufoca toda espontaneidade, das relações amorosas à arte. O recurso aos tribunais é usado para tudo. Banalizam-se as relações humanas; banaliza-se a Justiça. Casos como o ocorrido em 2000, de um menino suíço acusado de abuso sexual nos Esta- dos Unidos, entre outros tantos, mostram a “penetração do discurso jurídico na esfera privada”, que concorre para o duplo distanciamento do indivíduo, em relação a si mesmo e em relação aos outros. Essa sociedade, ao mesmo tempo puritana e hipócrita, ameaça tornar cada homem e cada mulher em um monstruoso “super-ego”. Como estudiosa da literatura e apreciadora das artes, confesso que me preocupo, porque sem “ego” e sem “id” não há arte, nem literatura. Não é ocasional o fato de o debate multicultural nos Estados Unidos ter lugar nos departamentos de literatu- ra e estudos étnicos e não nos de sociologia ou filosofia, porque a literatura sempre deixou dialogar a contradi- ção e tematizou os estereótipos. Mas se a policiarmos, engessaremos o que ela tem de criativo e que possibi- litou isso. Fala-se de uma crise da modernidade, presa de suas próprias promessas, que não consegue cumprir quando mais gente quer entrar no paraíso. Fala-se em mudança do paradigma político para o ético, em revi- goramento de outros - do econômico, cultural, étnico, nacionalista, religioso -, mas não se fala no paradigma estético. Por que razão o paradigma estético não é mais tema das Humanidades? Porque os ricos têm vergonha do belo? Porque os pobres o acham supérfluo? Porque ele tende a banalizar-se no utile e porque é este que vende? Mas isso nada tem de novo. Fonte: http://celpcyro.org.br/joomla/index.php?op- tion=com_content&view=article&Itemid=0&id=754 CULTURA POPULAR E CULTURA DE MASSA ; A cultura, pela definição clássica de Edward B. Ty- lor, que é considerado o pai do conceito moderno de cultura, diz que a cultura é “aquele todo complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, a lei, os costumes e todos os outros hábitos e capacidades adquiridos pelo homem como membro da sociedade”. A cultura de massa é aquela considerada, por uma maioria, sem valor cultural real. Ela é veiculada nos meios de comunicação de massa e é apreciada por ela. É preciso entender que massa não é uma definição de classe social, e sim uma forma de se referir a maioria da população. Essa cultura é produto da indústria cultural. A indústria cultural produz conteúdo para ser con- sumido, não se prende a técnicas. É produto do capi- talismo e feita para ser comercializada. Theodoro W. Adorno, filósofo alemão da Escola de Frankfurt, é defen- sor da ideia de que a cultura de massa é imposta pelos meios de comunicação de massa à população, que ape- nas absorve aquilo. Já a cultura erudita é aquela considerada superior, normalmente apreciada por um público com maior acú- mulo de capital e seu acesso é restrito a quem possui o necessário para usufruir dela. A cultura erudita está muitas vezes ligada a museus e obras de arte, óperas e espetáculos de teatro com preços elevados. Existem projetos que levam esse tipo de cultura até as massas, colocando a preços baixos, ou de forma gratuita, con- certos de música clássica e projetos culturais. Como o acesso a esse tipo de cultura fica restrito a um grupo pequeno, ela fica ligada ao poder econô- mico e é considerada superior. Essa consideração pode acabar tornando-se preconceituosa e desmerecendo as outras formas de cultura. O erudito é tudo aquilo que 13 CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS Professor de Educação Básica - História demanda estudo muito estudo, mas não se deve pensar que uma expressão cultural popular como o hip-hop, por exemplo, é pior que uma música clássica. A cultura popular é qualquer estilo musical e de dança, crença, literatura, costumes, artesanatos e outras formas de expressão que é transmitida por um povo, por gerações e geralmente de forma oral. Como por exemplo a literatura de cordel dos nordestinos, ou a culinária do povo baiano, são algumas das formas de cultura popular que resiste ao tempo. Essa cultura não é produzida após muitos estudos, mas é aprendida de forma simples, em casa, com a con- vivência da pessoa nesse meio. Ela está ligada à tradição e não é ensinada nas escolas. A cultura popular é muito contemporânea, pois ela resiste ao tempo e raramente se modifica. Essa cultura vem do povo, não é imposta por uma indústria cultural ou por uma elite. Por exemplo, o car- naval é uma festa da cultura popular brasileira, o frevo é uma cultura brasileira, mas é muito mais expressiva no norte do país. Ela representa a diferença de cada povo, desde o micro até o macro. Fonte: https://www.portaleducacao.com.br/conteu- do/artigos/educacao/cultura-de-massa-cultura-popu- lar/48831 A Cultura de Massa (ou “cultura pop”) é o produ- to realizado pela Indústria Cultural. Tem o intuito de atingir a massa social, considerando “massa” em seu sentido de coesão e opacidade. Portanto, cultura de massas é o meio e o fim pelo qual se submetem as mais variadas expressões culturais a um ideal comum e homogêneo. A cultura de massas tem a propriedade de absorver os antagonismos e transcender distinções sociais, étni- cas, sexuais, etárias, etc., transformando-os em produtos para o consumo num mundo de consumidores livres. Cultura de Massa e Indústria Cultural A cultura de massas está intimamente ligada ao ad- vento da modernidade. No século XIX, esse termo foi utilizado para
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