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– 1 1. Introdução A questão do preconceito sempre foi muito polê - mica, mas esse debate tornou-se obrigatório e o silêncio sobre o assunto pode ser uma forma de se reproduzir posturas preconceituosas que emergem constantemente nas relações sociais. A Constituição Federal do Brasil de 1988 tornou criminosa qualquer postura de preconceito racial, e grupos de construção de identidade têm-se fortale - cido na luta contra toda expressão de discriminação. Vivemos em um mundo cada vez mais marcado pela diversidade, pelo multiculturalismo e pela convivência entre grupos étnicos diferentes. A construção de uma sociedade mais justa conta com o trabalho de dessegregação e superação das posturas preconceituosas. Assim, políticas de inclusão social contam, sobretudo, com a dissolução dos nós da discriminação que têm origem histórica. 2. Desnaturalizar O senso comum comete o erro de naturalizar comportamentos e aspectos da cultura que, na ver - dade, são resultantes de processos históricos. Em outros termos, a ideologia e o senso comum naturalizam a realidade, escondendo a sua origem temporal e espacial. Assim, acredita-se ser natural a existência de ricos e pobres, ou justifica-se o racismo com base nas próprias diferenças de cor e aspectos físicos dos seres humanos. É um lugar-comum dizer que todos os homens são ambiciosos, tornando a ambição uma verdade universalmente válida, e então se deixa escapar a construção cultural dos sentimentos humanos, como a ambição, o ciúme ou o amor romântico. Desnaturalizar a realidade social significa recusar argumentos que justificam injustiças, e isso se faz pelo resgate dos conteúdos históricos perti nentes. 3. Três Categorias Fundamentais Minoria, em Sociologia, é todo grupo social, racial, cultural ou de nacionalidade, autoconsciente, em procura de melhor status compartilhado do mesmo habitat, economia, ordem política e social com outro grupo (racial, cultural ou de naciona - lidade), que é dominante (ecológica, econômica, política ou socialmente) e que não aceita os membros do primeiro em igualdade de condições. Preconceito é a atitude social que surge em condições de conflito com a finalidade de auxiliar a manutenção do status ameaçado. Estigma é um termo recorrente em Medicina e Biologia, pois se trata de marcas e sinais físicos apa - rentes que restaram de uma doença ou deficiência. Em Sociologia, o termo adquire uma dimensão mais complexa. Uma pessoa carrega um estigma quando, por algum motivo, é portador, em sua história pes - soal, de algo que o pode tornar alvo de preconceito. A diversidade torna-se motivo de discriminação. 4. Texto A violência do estigma e do preconceito à luz da representação social (Mary Rangel) A representação social é uma forma de conheci - mento prático, de senso comum, que circula na sociedade. Esse conhecimento é constituído de con - ceitos e imagens sobre pessoas, papéis, fenômenos do cotidiano. Estigma, Preconceito e Minoria SocialMÓDULO 1 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 11:16 Página 1 As pessoas constroem suas representações nos seus grupos sociais, por meio das conversas, das vi - sões, das crenças que veiculam. Assim, conceitos e imagens vão sendo aceitos, naturalizados, considerados verdadeiros, embora se - jam apenas representações. Muitos dos precon ceitos, dos estigmas, das exclusões de pessoas, decorreram desse processo e dos equívocos que pode gerar. O confronto das representações com a realidade, quando submetido a uma análise crítica e fundamen - tada, pode demonstrar esses equívocos. Quando se discute violência, como fator de ameaça à vida, não se pode omitir ou dispensar a discussão de conceitos que podem gerá-la. Esse, sem dúvida, é o caso dos conceitos de estigma, exclusão, ironia, indiferença, preconceito. A construção, aceitação e divulgação do precon - ceito e do estigma já são, em si, processos violentos, que geram violência. Essa construção é realizada por homens, seres pensantes, capazes de raciocínio e de intenções. É preciso, portanto, compreender melhor o estig - ma e o preconceito. O estigma é uma marca, um rótulo que se atribui a pessoas com certos atributos que se incluem em determinadas classes ou cate - gorias diversas, porém comuns na perspectiva de desqualificação social. Os rótulos dos estigmas decorrem de preconceitos, ou seja, de ideias precon - cebidas, cristalizadas, consolidadas no pensamento, crenças, expectativas socioindividuais. Assim, percorrendo vários campos das ações e relações sociais, os estigmas alcançam tanto os pobres e os meninos de rua como os portadores de HIV, os que apresentam necessidades especiais (físicas, mentais, psicológicas) e os homossexuais. Os preconceitos (portanto, os conceitos prévios ou previamente estabelecidos) antecedem os atributos ou características pessoais a que se referem. Desse modo, os atributos ou características que justificam o estigma são previamente avaliados, com pouca ou nenhuma oportunidade de análise crítica e consciente, que os associe às circunstâncias reais da vida e das relações humanas, sociais. Consequen - temente, o preconceito é inflexível, rígido, imóvel, prejudicial à discussão, ao exame fundamentado e à revisão do que está preconcebido. Os que constroem ou aceitam preconceitos, constroem e aceitam estigmas. Ambos – precon cei tos e estigmas – promovem e naturalizam palavras ou ações violentas. Por conseguinte, essa construção pode ser a origem e o início da violência. Sabe-se que a violência não se define somente no plano físico; apenas a sua visibilidade pode ser maior nesse plano. Essa observação se justifica quando se constata que violências como a ironia, a omissão e a indiferença não recebem, no meio social, os mesmos limites, restrições ou punições que os atos físicos de violência. Entretanto, essas “armas” de repercussão psicológica e emocional são de efeito tão ou mais profundo que o das armas que atingem e ferem o corpo, porque as “armas brancas” da ironia ferem um valor precioso do ser humano: a autoestima. A luta e o remédio contra o preconceito e o estigma encontram-se nas análises críticas e situadas que encaminham novos significados, ou seja, que argumentam e apoiam ressignificações. Dessas ressignificações podem surgir novos conceitos, mais reais, mais consistentes, mais abertos e flexíveis e, portanto, mais humanos. O Ministério da Saúde promoveu, durante o ano de 2003, uma série de encontros para a discussão da violência e da saúde no Centro Cultural de Saúde, sediado no Rio de Janeiro. A questão da violência baseada em estigmas e preconceitos foi um dos temas debatidos. Esses encontros, como o da “Sociedade Viva” realizado em agosto de 2003 no referido centro, são oportu ni dades expressivas, relevantes, para as ressignifi cações que se fazem necessárias, prementes, para os avanços da vida, da convivência e da consciência social. As novas ressignificações por uma vida, uma convivência e uma consciência social mais inclu sivas requerem, sobretudo, atitudes que assumam um dos valores mais expressivos dos tempos contem - porâneos: a aceitação da pluralidade e, portanto, das diferenças, das especificidades, das singularidades. Mais uma vez recorrendo à análise crítica e fundamentada, que aproxima visões e consciências das circunstâncias reais da vida, observa-se que cada indivíduo é singular, é diferente, é único em suas características; respeitá-lo, qualificá-lo, acolhê-lo, não é uma concessão, mas sim um direito; esse direito é social, é político, é de cidadania. 2 – 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 2 – 3 1. Leia o texto abaixo e relacione-o com o item 2 da aula, intitulado Desnaturalizar. Assim, os conceitos e imagens vão sendo aceitos, naturalizados, considerados verdadeiros, embora sejam apenas representações. Muitos dos precon - ceitos, dos estigmas e das exclusões de pessoas decorreram desse processo e dos equívocos que pode gerar. (M. Rangel) RESOLUÇÃO: A ideologia e o senso comum naturalizam a realidade, escondendo a origem histórica e culturaldela. Assim, desnaturalizar a realidade social significa recusar argumentos que justificam as injustiças, e isso se faz pelo resgate dos conteúdos históricos pertinentes. 2. Sobre o texto de M. Rangel, julgue as afirma tivas a seguir, colocando V para as verdadeiras e F para as falsas. I. Representação social é o contrário de senso comum. ( ) II. O preconceito é uma expressão de violência. ( ) III. A ironia, omissão e indiferença são armas de repercussão emocional com efeitos mais suaves se comparados com aqueles provocados por armas que ferem o corpo. ( ) IV. O preconceito corrói a autoestima do sujeito, o que pode promover um efeito desastroso para a sua história pessoal. Resposta: F V F V 3. Por que a autora (Rangel) afirma que o pre - conceito é inflexível? RESOLUÇÃO: Porque os atributos ou características que justificam o estigma são previamente avaliados, com pouca ou nenhuma oportunidade de análise crítica e consciente que os associe às circunstâncias reais da vida e das relações humanas, sociais. 4. O que a autora pretende afirmar ao empregar a palavra “ressignificações”? RESOLUÇÃO: Das ressignificações podem surgir novos conceitos, mais reais, consistentes, abertos e flexíveis e, portanto, mais humanos. Novas ressignificações por uma vida e uma consciência social mais inclusivas requerem atitudes que assumam a aceitação da pluralidade e, portanto, das diferenças, das especificidades e das singularidades. Exercícios Propostos 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 3 A criatividade só pode ter origem na diferença. (Yiehudi Menuhin – um dos maiores violinistas da história) 1. Introdução A ideia de raça surgiu aproximadamente no sé - culo XVIII, antecedida por vagas noções de des - cendência formuladas na Bíblia. Raça, portanto, é uma categoria construída há pouco tempo e não tem muita relação com a natureza humana, mas com interpretações acerca da diversidade. No século XIX, o referencial teórico dos homens era baseado no conceito de progresso, evolução e civilização e acreditava-se que esses conceitos fossem verdades universais e naturais. Assim, a desigualdade humana também deveria ter uma origem natural e a noção de raça tornou-se uma explicação biológica para a diversidade cultural e humana. A sociedade brasileira, fortemente miscigenada, tem características de uma sociedade “racializada”, ou seja, em que a questão das raças ainda está muito presente e colocá-la em debate é tarefa necessária, sem a qual não se constituirá um país mais justo e melhor. Vê-se, no Brasil e no mundo, que o cotidiano está repleto de atitudes preconceituosas e racistas e que, muitas vezes, são encaradas com certa naturalidade. Considerando que o nosso país traz uma herança escravocrata em sua história recente, tais números revelam que a questão racial não está solucionada e escondê-la significa compactuar com a situação e contribuir para reproduzi-la. Os negros e pardos, no Brasil, são menos da metade da população, mas 64% dos pobres e 69% dos indigentes são negros. Com o mesmo nível de formação de um branco, o trabalhador negro ganha 53,99% a menos. A mulher negra recebe um salário 49,47% menor do que o de uma branca. 27% dos estudantes da população negra, entre 11 e 14 anos, estão entre o 6º e o 9º ano, enquanto, entre os bran - cos, o índice é de 44%. A taxa de analfabetismo é três vezes maior entre os negros. Uma visão científica e rigorosa não permite naturalizar tais dados, ou seja, faz-se necessário perceber que tal situação resulta de um processo histórico e que urge a adoção de políticas e posturas capazes de alterar esse quadro. A diversidade étnica e cultural enriquece a existência humana. 2. Conceito de Etnia e Cultura Brasi leira (Roque de Barros Laraia – antropólogo) Falar em etnia brasileira é uma forma de sim - plificação, pois o Brasil foi historicamente cons - tituído a partir da fusão de muitas etnias. Mas o que é uma etnia? Em primeiro lugar, o conceito de etnia é diferente do conceito de raça. Enquanto o que caracteriza a etnia são fatores culturais, como tra - dição, língua e identidade, o que distingue raça são fatores biológicos como a cor da pele, o formato da cabeça, o tipo de cabelo etc. Assim, os membros de uma etnia compartilham de valores culturais próprios e se comunicam por meio de uma língua que é também própria. As pessoas que constituem essa população se identificam e são reconhecidas pelos outros como membros da etnia. Faz parte de nosso jargão histórico dizer que o Brasil foi formado por três raças, omitindo muitas vezes o fato de ser ele um país pluriétnico. Esta multiplicidade étnica já existia muito antes da chegada de Cabral. As populações indígenas, de origem asiática, eram compostas de centenas de etnias, o que significava uma enorme diversidade linguística e cultural. Ainda hoje existem mais de duzentas etnias indígenas. 4 – Raça, Etnia e RacismoMÓDULO 2 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 4 Por outro lado, todo o mundo sabe que as populações de origem africana que vieram para o Brasil pertenciam a inúmeras etnias portadoras de costumes, crenças e idiomas diferentes que muito contribuíram para a formação da cultura brasileira. No entanto, hoje, é muito difícil falar em uma etnia afro, tendo em vista que o intenso processo de acul - turação praticamente extinguiu as línguas de origem africana – embora muitas de suas palavras se tenham incorporado ao idioma nacional – e também fez desaparecer as identidades étnicas originais. Finalmente, a população branca também não é originária de uma mesma etnia. Os primeiros colo - nizadores vieram de Portugal, mas, a partir da segunda metade do século XIX, o País foi palco de um grande processo imigratório, e muitos dos imi - grantes europeus que aqui chegaram se identificavam muito mais por meio de suas identidades étnicas do que nacionais. Basta lembrar, como exemplo, que, quando a imigração italiana se iniciou no Brasil, a Itália mal tinha completado a sua unificação como Estado-Nação. No início do século XX, um novo contingente de etnias asiáticas chegou ao Brasil. Esta grande diversidade étnica que constituiu o País, longe de ser um problema, resultou em uma riqueza cultural que se expressa por intermédio das artes – da música principalmente –, da culinária, das crenças, do próprio modo de ser dos brasileiros etc. O mais importante fator de unidade nacional foi a língua, este português falado no Brasil, diferente do de Portugal, porque se formou pela adição de pa lavras originárias das muitas etnias que compõem o País. O Brasil é um país marcado pela miscigenação. 3. Texto: Racismo (Ana Sofia Ribeiro Durão) O racismo é a tendência do pensamento, ou do modo de pensar, em dar grande importância à noção da existência de raças humanas distintas e superiores umas às outras. Trata-se da convicção de que alguns indivíduos e sua relação entre características físicas hereditárias e determinados traços de caráter e inteligência ou manifestações culturais são superiores a outros. O racismo não é uma teoria científica, mas um conjunto de opiniões preconcebidas cuja principal função é valorizar as diferenças biológicas entre os seres humanos – alguns acreditam ser superiores aos outros de acordo com sua matriz racial. A crença da existência de raças superiores e inferiores foi utilizada muitas vezes para justificar a escravidão, o domínio de determinados povos por outros e os genocídios que ocorreram durante toda a história da humanidade. Os racistas definem raça como um grupo de pessoas que têm a mesma ascendência. Diferenciam as raças com base em características físicas como a cor da pele e o aspecto do cabelo. Investigações re - centes provam que a “raça” é um conceito inven tado. A noção de “raça” não possui nenhum funda - mento biológico. A palavra “racismo” é igualmente usada para descrever um comportamento abusivo ou agressivo para com os membros de uma “raça inferior”. O racismo reveste-se de várias formas nos di - versos países, consoante a sua história,cultura e ou - tros fatores sociais. Uma forma relativamente recen te de racismo, por vezes denominada “dife renciação étnica ou cultural”, defende que todas as raças e culturas são iguais, mas não se deviam misturar, a fim de conservar a sua originalidade. Não há nenhuma prova científica da existência de raças diferentes. A Biologia só identificou uma raça: a raça humana. A importância que o homem dá à cor da pele do seu semelhante é deveras preocupante. Na realidade, em muitos casos a diferença da cor da pele é uma barreira muito mais determinante para a comunicação entre as pessoas do que a própria diferença linguística, isto pode ser considerado um fenômeno antinatural, uma vez que não vemos na natureza os animais minimamente preocupados com as diferenças de pelagem ou penas. – 5 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 5 A diferença de cor entre as pessoas tem uma explicação científica para a qual o homem não con - tribui minimamente: a maior ou menor concentração de melanina da pele, que torna a pele da pessoa mais o menos escura. O racismo começa quando a diferença, real ou imaginária, é usada para justificar uma agressão. Uma agressão que assenta na incapacidade para compreender o outro, para aceitar as diferenças e para se empenhar no diálogo. (Mário Soares – antigo presidente de Portugal) O conceito de raça não é natural; ao contrário, trata-se de uma construção humana. Legislação que proíbe as discriminações no exercício de direitos, por motivos baseados na raça, cor, nacionalidade ou origem étnica: Lei nº 134/99, de 28 de agosto; Decreto-Lei nº 111/2000, de 4 de julho. 6 – Exercícios Propostos 1. Com base nas leituras desta aula, julgue as proposições abaixo, colocando V para as verdadeiras e F para as falsas. I. Raça e etnia são sinônimas e fazem referência à diversidade das espécies humanas. ( ) II. Raça é uma categoria consistente e científica para explicar a natureza humana. ( ) III. Segundo muitos biólogos, há uma única raça: a raça humana. ( ) IV. O Brasil possui índices sociais que revelam que os afrodescendentes são portadores de um estigma social. ( ) Resposta: F F V V 2. Afirma-se que o Brasil é um país formado por três raças, mas, segundo o professor Roque Laraia, o Brasil já era um país pluriétnico antes mesmo do seu descobrimento. Teça um comentário com base no texto de Laraia. RESOLUÇÃO: O autor não leva em consideração a categoria raça, mas a etnia, que faz referência à cultura e não aos aspectos biológicos. Os grupos indígenas brasileiros são de diversas etnias, assim como os brancos e negros. Para Laraia, a diversidade étnica do nosso país resultou numa grande riqueza do tecido cultural, particularmente na formação da língua nacional. 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 11:16 Página 6 3. Segundo o texto de Ana S. Durão, existe uma tendência hoje de se afirmar que todas as raças são iguais, mas que não deveriam se misturar, para permitir a preservação das raças originais. O que a autora pensa sobre tal tendência? Justifique. RESOLUÇÃO: Segundo a autora, a proposta é in coerente, pois não existe nenhuma prova científica que sustenta a categoria de raça original ou raça pura. 4. Elabore uma reflexão pessoal relacionando a ideia de diferenças e igualdade. RESOLUÇÃO: Espera-se que o aluno compreenda que a construção de uma sociedade mais justa, marcada pela equidade, deve saber incorporar as diferenças culturais, biológicas e existenciais, por exemplo. – 7 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 7 8 – 1. Introdução O cidadão e as instituições em geral possuem deveres e obrigações para com a sociedade. Nos últi - mos anos, tem crescido a consciência e o trabalho em torno da responsabilidade social por parte das empresas de capital privado. O desenvolvimento da ciência ecológica contri - buiu para aumentar a preocupação com o meio ambiente. Certas atividades industriais ou a implan - tação de uma fábrica podem provocar um impacto sobre atividades econômicas das populações locais. Assim, seria um exemplo de responsabilidade social se a fábrica desenvolvesse um projeto para minimi zar tais impactos, criando alternativas de sobrevi vência das pessoas que viviam e trabalhavam no local antes das instalações fabris, e se esforçasse para estabelecer um novo cenário no local. A empresa passa a se preocupar com os impactos sociais e naturais, desenvolvendo projetos para compensar os prejuízos. Assim, podemos afirmar que o chamado desenvolvimento sustentável é um aspecto da responsabilidade social. Uma empresa poderá patrocinar e desenvolver programas de inclusão social, educação e qualifica ção, bem como incentivar um esporte ou outra área cultural. Responsabilidade social empresarial é a forma de gestão ética que tem a organização com suas partes interessadas, com o objetivo de minimizar impactos negativos no meio ambiente e na comunidade local. A ideia é estabelecer um canal de diálogo entre as partes interessadas e envolvidas, com a percepção clara de que todos ganham, inclusive os empresários, investindo recursos com preocupações sociais e ambientais. Mãos Terra EUVI Marketing. Sustentabilidade é a conciliação entre progresso e proteção ambiental. 2. Texto Sociologia da empresa e responsabilidade social das empresas (Ana Maria Kirschner – socióloga) Até os anos 1980, as ciências sociais não se apro - ximavam muito das empresas, seja para tomá-las como objeto de estudo, seja para tentar intervir sobre o mundo social das empresas. Em meados da década de 1980, esta situação se reverte. A sociedade passa a interpelar a empresa, que aparece mais na mídia, agora de forma mais favorável, não mais apontada apenas como o lócus onde se dá a ex ploração do trabalho pelo capital. Nos anos 1990, associações e fóruns empresariais, assim como empresários, isoladamente discutem a função social da empresa e a sua responsabilidade social. A noção de responsabilidade social da empresa está na moda na linguagem empresarial e da administração, porém ainda não tem um substrato conceitual, dando margem, portanto, a muitos equívocos. Esta imprecisão é tão mais séria porque estamos vivendo uma época em que a sociedade interpela as empresas e simultaneamente os empre - sários sentem necessidade de melhorar sua imagem pública promovendo debates sobre ações sociais e intervindo de fato no social. (...) As empresas têm um triplo projeto: realizar um produto, obter lucro e assegurar a coerência dos indivíduos que as compõem. Se a empresa falhar em um destes pontos, sua existência fica comprometida. Segundo Michel Liu, a empresa deve ser consi derada como um sistema aberto, pois conjuga as noções de autonomia e dependência em relação aos ambientes em que se insere. As trocas com o meio são necessárias e contínuas. Liu utiliza o conceito de fronteira seletiva para analisar a relação empresa- sociedade: se por um lado a empresa sofre diferentes tipos de constran gimentos do meio em que atua – econômicos, técnicos, políticos, culturais, entre outros –, ela devolve à sociedade algo diferente daquilo que recebe. Seus funcionários são pessoas que trazem as mais distintas culturas e formações e, juntas, devem dar sua parte para que a empresa realize seu triplo projeto. Em outras palavras, os membros de uma empresa formam um coletivo que Responsabilidade SocialMÓDULO 3 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 11:16 Página 8 – 9 apresenta uma identidade e uma cultura próprias. Isto se dá porque a empresa é criadora do social, no sentido daquilo que une os indivíduos e constitui uma sociedade. Atualmente já dispomos de instrumento para conhecer a força e a coesão das estruturas sociais. É o modelo SIC, desenvolvido pelo sociólogo de empresa Renaud Sainsaulieu, com base na análise de milhares de empresas. Este modelo permite conhecer as regulações sociais observadas entre estruturas, interação e cultura. O modelo da sociologia de empresa – SIC – possibilita identificar os atores e as situações que eles estão vivendo e conhecer as relaçõesentre os atores. Pela ótica da Sociologia, as empresas são construções sociais no sentido clássico do termo, e questões como eficiência, competitividade e qualida - de podem ser vistas com base no papel social que cabe às empresas assumir em tempos de globalização e reformas para o mercado. A empresa contemporânea não se limita a gerir e manter recursos econômicos, técnicos e humanos, como foi o caso até alguns anos atrás. Hoje, a in - venção e desenvolvimento de novos recursos se im - põem como exigência de sobrevivência econômica. Uma das chaves para resolver este problema é a qualidade da estrutura social das relações humanas de trabalho, pois esta é uma das fontes cruciais de criatividade. Ao contrário do que sugeriria uma abordagem que visse na empresa um agente passivo ante a socie - dade em que está inserida, não se trata de uma adaptação mecânica da empresa às imposições econômicas e técnicas que vêm de fora: os atores no seio da organização têm sempre escolhas possíveis; eles constroem uma organização cujo resultado é sancionado pelo exterior. (...) A Sociologia da Empresa vai além dos modelos que definem o espaço fabril como espaço de relações antagô nicas de classe. A empresa tem uma função identificadora na sociedade e constitui, portanto, verdadeira instituição social: ela instaura um conjunto de relações sociais e culturais e produz, assim, identidades novas. Nela se desenvolvem relações de oposições e de alianças e o ator vivencia as relações de trabalho de forma interativa e estratégica. A Sociologia da Empresa rompe com os modelos que interpretam as estratégias dos atores apenas em termos das oportunidades de poder, que omitem da análise a função dos valores e lógicas coletivas que permeiam as práticas sociais. A mobilização dos recursos humanos para fins econômicos depende não só das capacidades pro - fissionais, mas também das regulações das relações sociais de produção, para suscitar a complemen ta ri da - de das ações coletivas, a solidariedade, a comu nicação e a criatividade no seio do sistema social. As práticas econômicas devem levar em consideração o aspecto socioambiental. Glossário: Desenvolvimento sustentável: conceito que propõe uma conciliação entre desenvolvimento econômico e proteção ambiental. 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 9 10 – 1. Leia o texto de Ana Maria Kirschner e julgue as proposições abaixo. Coloque V para as verdadeiras e F para as falsas. I. De acordo com a autora, hoje a empresa tem apenas dois grandes objetivos: realizar um produto e obter lucro. ( ) II. Empresários isoladamente discutem a função social da empresa e a sua responsabilidade so cial, motivados, em parte, pela necessidade de melho - rar a imagem pública de suas empresas. ( ) III. A Sociologia da Empresa incorpora a função dos valores e lógicas coletivas que permeiam as práticas sociais. ( ) Resposta: F V V 2. Por que a autora Kirschner afirma que a empresa é criadora do social? E o que isso significa? RESOLUÇÃO: A empresa é criadora do social porque uma instituição une e organiza os indivíduos e constitui uma sociedade. Isso significa que os membros de uma empresa formam um coletivo que apresenta uma identidade e uma cultura próprias. Investir em responsabilidade social fortalece a coesão e permite conhecer as relações entre os atores e sua cultura. 3. “Ao contrário do que sugeriria uma abordagem que visse na empresa um agente passivo ante a sociedade em que está inserida, não se trata de uma adaptação mecânica da empresa às imposições econômicas e técnicas que vêm de fora...” (A. M. Kirschner) Conclua o pensamento acima. RESOLUÇÃO: Os atores no seio da organização empresa rial têm sempre escolhas possíveis, segundo a autora, e constroem uma organização cujo resultado é san - cionado pelo exterior. Assim, a empresa instaura um conjunto de relações sociais e culturais e produz identidades novas. Nela se desenvolvem relações de oposições e de alianças e o ator vivencia as relações de trabalho de forma interativa e estratégica. Exercícios Propostos 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 10 – 11 1. Introdução Políticas de inclusão social consistem em ações positivas de combate à exclusão social e econômica de pessoas muito pobres, de baixo grau de instrução, portadoras de deficiências físicas ou ainda perten - centes a alguma minoria social. Assim, espera-se poder oferecer condições dignas de vida e maiores possibilidades de participação social a todos. Para realizar tal empresa humanitária, foram elaboradas leis, políticas e programas voltados ao atendimento imediato de excluídos, contando com a participação dos setores público e privado e da sociedade civil. Nos últimos anos, por exemplo, no Brasil, foram criadas leis que facilitam a vida das pessoas na ter - ceira idade e de deficientes físicos. Até recente mente, não se via a circulação de coletivos em condi ções de transportar cadeiras de rodas, ou banheiros especiais para deficientes físicos. Hoje, são produ zidos e exigidos mecanismos que adaptem os defi cientes aos sistemas sociais, facilitando a frequência de institui - ções comuns e, quando necessário ou aconselhável, são gerados sistemas especiais separados. Há uma preocupação e esforço em inserir cida - dãos, antes excluídos, naturalmente, desenvolvendo habilidades de circulação, programas de educação, sistemas de acesso à cultura, lazer e atividades pro - fissionais. Além disso, a legislação condena qual quer forma de discriminação e segregação. No Brasil, a Lei Federal n° 7.853, de 24 de ou - tubro de 1989, assegura os direitos básicos dos por - tadores de deficiência. Em seu artigo 8º, será julgado por crime punível com reclusão (prisão) de 1 a 4 anos e multa quem 1. recusar, suspender, cancelar ou fazer cessar, sem justa causa, a inscrição de aluno em estabe leci - mento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, porque é portador de defi ciência; 2. impedir o acesso a qualquer cargo público, porque é portador de deficiência; 3. negar trabalho ou emprego, porque é portador de deficiência; 4. recusar, retardar ou dificultar a internação hos - pitalar ou deixar de prestar assistência médico-hos - pitalar ou ambulatória, quando possível, a pessoa portadora de deficiência. A inclusão social consiste, portanto, na constru - ção de uma sociedade nova, alterando a mentalidade de todas as pessoas. O Brasil é considerado um dos países com mais avançada legislação nesse esforço. O destaque está na acessibilidade por parte de pes - soas com deficiências. A chamada lei de aces si - bilidade está no Decreto Federal 5.296/2004. Po rém, muitas pessoas desconhecem as leis e outras vivem ainda à margem das políticas de inclusão social. Coreografia de inclusão: programa desenvolvido pela Universidade Paranaense. 2. Texto 1 Ações afirmativas e políticas públicas de inclusão social (João do Nascimento) Karl Marx, historiador alemão (1818-1883), entre os teóricos do socialismo científico, afirmou durante sua vida que “a sociedade capitalista é antes de tudo uma sociedade de classes” e a “história do homem é a própria luta de classes”. Sendo assim, o conflito social interclasses gera a apropriação dos bens e das oportunidades sociais por alguns segmentos. É a partir da análise do pensamento de Marx dos propósitos capitalistas que vigoram no Brasil há mais de 400 anos que se insere a exploração do povo Políticas de Inclusão SocialMÓDULO 4 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 11 12 – afrodescendente como mera ferramenta de utilidade material, força de trabalho e bem comercializável. Não há o devido reconhecimento do desmantela men - to de centenas de milhares de etnias que compunham o continente africano e que se dispersaram por todo o mundo ocidental, constituindo o capitalismo, em suas múltiplas contradições sociais. Para tentar superar as mazelas sociais e promover a inclusão e a justiça, a partir dos anos 1990, o Brasil tem sido alvo em potencial dos programas de açõesafirmativas que visam reconhecer e corrigir situações de direitos negados socialmente ao longo da história. As ações afirmativas vêm sofrendo críticas por uma pequena parcela da sociedade brasileira (a elite), que há muito tempo vem acumulando riquezas e opor - tuni dades. O que o negro e os outros segmentos excluí dos da participação e usufruto dos bens, riquezas e oportunidades querem é o direito à cida - dania, à cultura, educação, trabalho digno e partici - pação das políticas públicas de caráter social. Os programas de ações afirmativas são, na verdade, políticas de correção de desigualdades sociais e formas de efetivação de direitos. Portanto, defender as ações afirmativas é de fato se posicionar contra o mito da democracia racial e a exclusão social existente no Brasil. É preciso agir na raiz do problema para erradicar a situação de exclusão social. O programa de cotas para negros e afrodescendentes é uma das ações afirmativas de caráter radical, pois mexe com privi - légios estabelecidos por determinados segmentos da sociedade brasileira. “Ações afirmativas são medidas especiais e tem - porárias, tomadas pelo Estado e/ou pela iniciativa pri vada, espontânea ou compulsoriamente, com o obje - tivo de eliminar desigualdades historicamente acu - mu ladas, garantindo a igualdade de oportuni dade e tratamento, bem como compensar perdas pro vocadas pela discriminação e marginalização, por motivos raciais, étnicos, religiosos, de gênero e outros.” (Ministério da Justiça, 1996, GTI População Negra) As políticas afirmativas visam reconhecer as diversidades entre a população negra e a não negra e direcionar os esforços para minimizar e gradati - vamente diminuir as distâncias socioeconômicas que permeiam a vida social brasileira. 3. Texto 2 Sobre exclusão social e políticas de inclusão (Henrique Rattner) Os programas oficiais e das ONGs encaram o problema da exclusão de modo parcial, privilegiando ora a geração de renda (bolsa de escola, cesta básica etc.), ora a questão de emprego por meio de frentes de trabalho, particularmente no Nordeste flagelado pelas secas recorrentes. Nenhum desses programas atinge o objetivo de inclusão social, no sentido mais lato e profundo da palavra, por omitir a dimensão central do fenômeno – a perda de autoestima e de identidade de pertencer a um grupo social organizado. A inclusão torna-se viável somente quando, através da participação em ações coletivas, os excluídos são capazes de recuperar sua dignidade e conseguem – além de emprego e renda – acesso à moradia decente, facilidades culturais e serviços sociais, como educação e saúde. Esta tarefa ultrapassa o âmbito estreito dos programas de filantropia desenvolvidos por ONGs e exige o engajamento contínuo do poder público atra - vés de políticas proativas e preventivas em nível federal, sobre tudo na área econômica, que per meiem as ações dos governos estaduais e municipais. As políticas em nível macro executadas pelas diversas instâncias do poder público não devem ser concebidas como competitivas ou substitutivas dos programas e projetos realizados pelas ONGs e outras entidades da sociedade civil. Ambos são necessários e complementares, à condição de que não haja cooptação ou aproveitamento dos programas desenvolvidos para fins político-partidários. Em retrospectiva, nas últimas décadas percebe-se o avanço gradual da sociedade civil nas disputas sobre sua admissão nas esferas de decisão, até mesmo com a alocação de recursos dos orçamentos gover - namentais. Assim, é possível prever um longo período de poder dual em que as autoridades e instituições tradicionais procurem manter o status quo na defesa dos interesses das classes proprietárias e da tecno - cracia a elas aliada. Por outro lado, as múltiplas organizações da sociedade civil, adquirindo saber e experiência no manejo e na defesa das causas públicas, conquistam maior autonomia e autocon - fiança na sua capacidade de gerir o próprio destino no processo de transformação social e política. 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 12 – 13 Exercícios Propostos 1. “O conceito de inclusão nos ensina não a tolerar, respeitar ou entender a deficiência, mas sim a legitimá-la, como condição inerente ao ‘conjunto humanidade’…” (Cláudia Werneck) Por que a autora afirma que inclusão social não nos ensina a tolerar? RESOLUÇÃO: O termo “tolerar” é de fato ambíguo. Pode significar aceitar ou aguentar. A autora sugere com a frase acima que a política de inclusão vai além da simples compreensão de uma suposta infelicidade do outro. A deficiência passa a ser vista como uma das muitas condições humanas dentro da diversidade e múltiplas possibilidades de existência autenticamente humana. 2. “Um ponto importante sobre a inclusão social é percebermos que o fato de incluir significa também que devemos capacitar...” (Juliana Mafra) Teça um comentário que continue a frase, dando-lhe sentido. RESOLUÇÃO: Devemos capacitar todas as pessoas (empresas, alunos, trabalhadores, professores) para assumir a responsabilidade de colaborar no processo de inclusão. 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 13 14 – 3. “A falta de conhecimento da sociedade, em geral, faz com que a deficiência seja considerada uma doença crônica, um peso ou um problema. O estigma da deficiência é grave, transformando as pessoas cegas, surdas e com deficiências mentais ou físicas em seres incapazes, indefesos, sem direitos, sempre deixados para o segundo lugar na ordem das coisas. É necessário muito esforço para superar este estigma.” (Maria Regina Cazzaniga Maciel) Comente o sentido do texto acima. RESOLUÇÃO: O potencial e as habilidades de pessoas com deficiências são pouco valorizados nas suas comuni da - des de origem, que, obviamente, possuem pouco escla - recimento a respeito de tais deficiências. 4. Leia o texto de João do Nascimento e julgue as afirmativas abaixo, colocando V para as verdadeiras e F para as falsas. I. O autor não posiciona historicamente o problema de exclusão do afrodescendente no Brasil. ( ) II. O autor afirma que no Brasil não existem ações afir - mativas e políticas adequadas de inclusão. ( ) III. O autor posiciona-se a favor das propostas de cotas para afrodescendentes, porém afirma que elas contrariam interesses de classe. Resposta: F F V 5. Leia o texto de Henrique Rattner e julgue as afirmativas abaixo, colocando V para as verdadeiras e F para as falsas. I. Segundo o autor, as ONGs e as políticas públicas possuem um enfoque inadequado, no Brasil, na superação dos problemas sociais. ( ) II. Para o autor, o trabalho das ONGs pode substi - tuir perfeitamente a responsabilidade pública do Estado. ( ) III. Os interesses e trabalhos das ONGs devem compe - tir com as políticas de administração pública, embora a sociedade civil esteja conquistando, com a sua participação política representada pelas ONGs, crescente autonomia. ( ) Resposta: V F F 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 14 – 15 1. Introdução Globalização é a interligação do mundo, ou o processo de aprofundamento da integração mundial, particularmente econômica, com repercussões no plano social, cultural e político. No final do século XX, surgiram novas tecnolo - gias que aceleraram o processo de produção, de informação e de comércio. Um exemplo desse fenô - meno histórico é a Internet. Trata-se de uma nova fase de produção capitalista e de sua expansão baseada na formação de uma “aldeia global”. Ocorre a invasão de mercadorias, informação, pessoas, serviços e tecnologias de várias partes do mundo em diversos lugares. Pode-se dizer que o mundo está em processo de globalização desde o início da história. As viagens, as guerras, a expansão marítima estão inseridas num processo de mundialização. Porém, o fenômeno a que hoje chamamos de globalização é um processo mais recente e muito específico. O colapso do mundo socia lista e o fim da Guerra Fria inauguram uma nova ordem mundial. Vê-se um processo de homogeneização dos cen - tros urbanos,a expansão das corporações, o forta - lecimento das organizações supranacionais e a reor ganização das estruturas sociais e culturais. Manuel Esteves, O Mundo na Era Global. Uma característica da globalização é a insa - ciabilidade de acúmulo de capital a baixos custos e no prazo de tempo mais curto possível. Aqui entra a ação dos agentes especulativos, conhecidos como smart money ou hot money (respectivamente, “di - nhei ro esperto” e “dinheiro quente”). Os fluxos de capi tais internacionais crescem significativa mente e redesenham o palco em que se disputam poderes e influências. Essa nova fase do capitalismo define-se por um mundo ordenado de forma multipolar, com a atuação marcante das transnacionais e formação de blocos econômicos. 2. Texto O lado perverso da globalização na sociedade da informação (Maria Elza Miranda Ataíde) Introdução Passados alguns anos da entrada do Brasil na era da globalização, podemos constatar a mudança de paradigmas econômicos, políticos e sociais. O objetivo do desenvolvimento econômico é o aumento contínuo do bem-estar do povo, propor cio - nando a satisfação de necessidades básicas e minimi - zando desigualdades de acesso a bens e serviços. A globalização prometia abertura de mercado e igualdade de oportunidades para todos. Isto signi - ficaria que todos os indivíduos fariam ou poderiam fazer parte de um mesmo mundo, de uma mesma realidade. A democracia pressupõe uma sociedade livre, com igualdade de direitos e deveres ou, no mínimo, sem grandes desigualdades entre os cidadãos. A globalização está permitindo as mesmas oportunidades para todos? Ou está privilegiando pequenos grupos? Em um rápido balanço de final de século, que conclusões podemos elencar? Alguns resultados do processo de globalização O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) divulgou um relatório sobre o desenvolvimento humano no qual revela um quadro bastante negativo no período de 1990 a 1995, que podemos relacionar com os primeiros resultados do processo de globalização. Segundo este relatório, o nível de pobreza aumentou no mundo. Antes se concentrava na América Latina, no sul da Ásia e na África. Hoje, sabemos que os países da Europa Oriental e os da antiga União Soviética engrossam a lista dos excluídos. Até os países ricos viram o índice de pobreza subir de forma alarmante. Globalização e SociedadeMÓDULO 5 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 15 16 – O desemprego alcançou níveis iguais aos da década de 1930, e a desigualdade de renda cresceu ainda mais. O mercado tornou-se mais agressivo com a globalização da economia. O capital estrangeiro entrou no Brasil. O monopólio agonizou. O governo brasileiro lançou uma política de privatização. Para Forrester, as privatizações, sob a alegação de reduzir o tamanho dos Estados, desejam mesmo é poupá-los de realizar cortes de pessoal. Segundo ela, a globalização e a informatização significam a privatização do máximo de empresas estatais que for possível, seu enxugamento e o enfraquecimento dos trabalhadores pelo terror do desemprego. As empresas brasileiras, para se tornarem com - pe titivas e sobreviverem nesta economia globalizada, tiveram de introduzir modificações em suas estratégias de competição e crescimento. Muitas desapareceram, ou estão fechando suas portas. O desemprego aumenta a cada dia. A globalização pode estar acentuando as desigualdades sociais no mundo. A globalização pode estar acentuando as desigualdades sociais no mundo. Os Perigos da Globalização (Prof. Vanderlei de Barros Rosas) I. O perigo da construção de uma sociedade hedonista. O prazer pelo prazer. Sexo, drogas e música (antigamente era rock, agora é funk) são objetivos prioritários para nossa juventude. Fico assustado quando ouço nos meios de comuni cação de massa músicas com apologias ao crime organizado, drogas e a prática de sexo livre em grupo. Tais músicas fazem sucesso porque encon tram guarita em um mundo glob alizado, no qual o ser humano tem procu rado satisfazer suas necessidades básicas através de suas realizações de prazer. Creio que até Freud ficaria assustado com tanta libido social. II. O perigo da construção de uma sociedade niilista. A ausência total de referencial. Deleuze, filósofo francês, apontou uma crítica que Nietzsche fez à filosofia de Schopenhauer. Para Schopenhauer, existe um nada de vontade, enquanto, para Nietzsche, existe a vontade do nada. Hoje estamos vivendo mais um negativismo schopenhaueriano do que o niilismo proposto por Nietzsche, que se apropriou deste conceito da religião budista. Nossa sociedade caminha para uma ausência total de desejo, pois os velhos paradigmas estão sendo quebrados, porém não estamos construindo outros no lugar. Há uma total ausência de ícones na sociedade pós-moderna. III. O perigo da construção de uma sociedade alienada. Nas grandes empresas, fala-se muito sobre a questão da transversalidade, associada à questão da qualidade total (a velha reenge - nharia, lembra-se?). Este modelo neoliberal imperialista seria melhor definível como “Trans ver salidade Ideológica”. Missão, decla - ração de propósito, lema da empresa, qualquer que seja o título que se emprega a esta modalidade, nada mais é do que a tentativa de desviar o homem dos temas centrais, reais e necessários à sua sobrevivência, e alienar principalmente os países do Terceiro Mundo dos temas centrais que interessam tão somente aos imperialistas. IV. O perigo da construção de uma sociedade de consumo adicto. O vício do consumismo. O im portante é o ter e o consumir, e não o ser e o existir. O direito do cidadão virou direito do consumidor. Tudo agora está girando pela questão do patrocinador (...). LEITURA COMPLEMENTAR 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 16 V. O perigo da construção de uma sociedade individualista. A relação de competição é tão grande que fica difícil identificar sociologi - camente onde há conflito e competição. Esta - mos evoluindo para a lei da selva. Meu pai falava sobre a lei do MURICI: Cada um cuida de si. Quando era criança, não entendia muito o que ele queria dizer com isto, e ainda não sei se entendi plenamente, mas seja o que for estamos vivendo momentos em que as rela - ções humanas não têm valor algum, a não ser na base de troca. A pergunta básica é: o que eu vou ganhar com isso? Este individualismo acerbado tem trazido terríveis danos à nossa sociedade. Precisamos resgatar valores como cooperação, amizade, companheirismo, recipro cidade etc. VI. O perigo da construção de uma sociedade “tec - no lo gicêntrica”. Com base na teoria de Descartes, passamos a adotar o falso mito da racionalidade humana como veículo de domí - nio da explicação do mundo. Isto tomou força com o racionalismo Kantiano, em que a razão passa, através do turbilhão, a ser o instrumento da visão e de entendimento do mundo. O iluminismo permeado desta tão grande razão perpetuou tais conceitos, culminando com Augusto Comte através de sua filosofia positivista, quando coloca o estágio tecnológico como o final do processo evolutivo do homem (Mito – Filosofia – Ciência). O tecnicismo e o cientificismo em que estamos mergulhados tende a um processo de desuma nização das relações humanas. Estamos nos relacionando mais com máquinas do que com seres humanos. A máquina é o fim, o homem o meio. Devemos usar a máquina e amar o ser humano; inverter esta ordem causa problemas. VII. O perigo da construção de uma sociedade amo - ral. Diante das recentes descobertas científicas, prin ci palmente na área biogenética, o homem precisa, mais do que nunca, estabelecer referenciais, condu tas e posturas éticas para que não venhamos a proce der contra a própria natureza humana (se é que existe uma natureza humana no homem). A clonagem, as informações do mapeamento genético, os trans - gênicos e outras novas descobertas: qual é o limite do homem? Numa sociedade na qual o capitalismo se instaurou como único modelo econômico, o imperialismo opri me os mais fracos, o prazer está pelo prazer, a pornografia(principalmente a pedofilia) tem cresci do assustadoramente e o comércio do narcotráfico é o mais rentável, o que devemos esperar? VIII. O perigo da construção de uma sociedade com perda de identidade cultural. O imperialismo do Primeiro Mundo ocorre principalmente pelo processo de globalização. Tal domínio começa a se estabelecer através da linguagem, na qual aportuguesamos várias expressões importadas: deletar, escanear etc. Não sou xenófobo – aquele que tem aversão ao que é estrangeiro –, mas acre dito na valorização daquilo que é nosso cultural mente, até como princípio de preser - vação de nossa identidade cultural. Também não sou tão radical, pois, se formos considerar a cultura brasileira como nossa identidade cultural, precisaremos res gatar o tupi-guarani nas escolas e reavaliar a cultura afro-europeia. Concluo, se é que podemos concluir um assunto desta natureza, com uma pequena comparação: um certo homem decidiu derrubar sua velha casa onde foi criado desde sua infância e, de um dia para outro, demoliu tudo, porém não planejou a sua nova morada, ficando ao relento. Assim estamos vivendo nesta era da pós-modernidade com terríveis consequências deste mundo globalizado, onde estamos perdendo não somente nossa morada, mas principalmente nossa identidade. O que será do futuro? Só o futuro dirá. Glossário: Paradigma: referencial teórico. – 17 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 17 1. São características do mundo globalizado ou da nova ordem mundial: I. Fortalecimento do conceito de soberania do Estado. II. Formação de uma ordem multipolar marcada pela disputa econômica e de mercados. III. Criação de blocos militares como a Otan. IV. A democratização econômica e de informação, diminuindo a distância entre ricos e pobres. É (são) coerente (s): a) todas. b) I e III, apenas. c) II, apenas. d) IV, apenas. e) III e IV, apenas. Resposta: C 2. Há uma ideologia, hoje, que considera o cres - cimento econômico como fim, quando o correto seria vê-lo como meio. Elabore uma reflexão relacionando essa afirmação com o texto de Maria Elza Miranda Ataíde. RESOLUÇÃO: A autora afirma que o objetivo do desenvolvimento econômico é o aumento contínuo do bem-estar do povo, proporcionando a satisfação de necessidades básicas e minimizando desigualdades de acesso a bens e serviços. Porém não é isso que se vê. Fala-se no desenvolvimento econômico como um fim em si mesmo. Durante os anos 1970, propagava-se a ideia de que era preciso primeiro deixar o bolo crescer para depois dividi-lo, mas o que ocorreu foi um modelo de contínua concentração de renda. 3. A globalização dinamiza economias e integra mercados, porém ela traz em si alguns problemas novos e acentua outros velhos para a humanidade. Escolha um dos perigos da globalização previstos pelo filósofo e teólogo Vanderlei de Barros Rosas e use-o para elaborar uma reflexão pessoal. RESOLUÇÃO: O aluno deve ser orientado a escrever um pequeno texto com coerência e baseado na realidade social. 18 – Exercícios Propostos 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 18 – 19 1. Introdução É evidente que a globalização registra profundas marcas na cultura. É observável a mudança e inovação de padrões de comportamentos, assim como uma exposição às influências culturais externas em cada cultura nacional e local. Tornou-se até mesmo um lugar-comum afirmar que a glo balização homogeneizará as culturas, extinguindo as tradições e as localidades. Por isso, fala-se em pro ces sos de destradicionalização e de desterri to rialização. O professor e sociólogo Renato Ortiz (Mundialização e Cultura, Brasiliense, 1998), que utiliza os termos acima, não acredita, porém, numa homogeneização, mas em processos de reinter pretação das culturas e das tradições. Ortiz fala em novos estilos de vida, marcados pela aceleração do tempo e redução do espaço geográfico. Assim, a nova ordem inaugura uma cultura fast-food, que não significa uma ame rica - nização da cultura global. Não há, portanto, segundo o autor citado, um movimento de unicidade cultural. Apresentação de música étnica (world music) na Holanda, em Maastricht. 2. Texto Efeitos culturais da globalização (Antonio Inácio Andrioli – Doutorando em Ciências Sociais na Universidade de Osnabrück – Alemanha) “Nós vivemos na era da globalização, tudo con - verge, os limites vão desaparecendo.” Quem não ouviu, no mínimo, uma destas expressões nos últimos anos? A globalização é um chavão de nosso tempo, uma discussão que está na moda, em que opiniões fatalistas conflitam com afirmações críticas e o temor de uma homogeneização está no centro do debate. Suposições de uma sociedade mundial, de uma paz mundial ou, simplesmente, de uma economia mundial surgem segui damente, e suas consequências levariam a proces - sos de unificação e adaptação aos mesmos modelos de consumo e a uma massificação cultural. Mas há que se perguntar: trata-se apenas de conceitos em disputa ou há algo que aponte, de fato, nesta direção? Quais são, afinal, os efeitos culturais da globalização? O processo de constituição de uma economia de caráter mundial não é nada novo. Já no período colonial houve tentativas de integrar espaços inter - continentais num único império, quando a ideia de “dominar o mundo” ficou cada vez mais próxima. Por outro lado, a integração das diferentes culturas e povos como “um mundo” já foi desejada há muito tempo e continua como meta para muitas gerações. Sob esta ótica, o conceito de globalização poderia ter um duplo sentido, se ele não fosse tão marcado pelo desenvolvimento neoliberal da política internacional. Conforme o sociólogo alemão Ulrich Beck, com o termo “globalização” são identificados processos que têm por consequência a subjugação e a ligação transversal dos Estados nacionais e sua soberania através de atores transnacionais, suas oportunidades de mercado, orientações, identidades e redes. Por isso, ouvimos falar de defensores da globalização e de críticos à globalização, num conflito pelo qual di fe - ren tes organizações se tornam cada vez mais conhe - cidas. Neste sentido, não se trata de um conflito stricto sensu sobre a globalização, mas sobre a prepotência e a mundialização do capital. Esse proces so, da forma pela qual ele atualmente vem aconte cendo, não deveria sequer ser chamado de glo ba lização, já que atinge o globo de forma dife renciada e exclui a sua maior parte – se observarmos a circulação mundial de capital, podemos constatar que a maioria da população mundial (na Ásia, na África e na América Latina) permanece excluída. Essa forma de globalização significa a predo - minância da economia de mercado e do livre mer - cado, uma situação em que o máximo possível é mercantilizado e privatizado, com o agravante do desmonte social. Concretamente, isso leva ao do mínio mundial do sistema financeiro, à redução do espaço Globalização e CulturaMÓDULO 6 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 19 20 – de ação para os governos – os países são obri gados a aderir ao neoliberalismo – ao aprofun damento da divisão internacional do trabalho e da concorrência e, não por último, à crise de endivi damento dos Estados nacionais. Condições para que essa globalização pudesse se desenvolver foram a interconexão mundial dos meios de comunicação e a equiparação da oferta de mercadorias, das moedas nacionais e das línguas, o que se deu de forma pro gressiva nas últimas décadas. A concentração do capital e o crescente abismo entre ricos e pobres (48 empresários possuem a mesma renda de 600 milhões de outras pessoas em conjunto) e o crescimento do desemprego (1,2 bilhão de pessoas no mundo) e da pobreza (800 milhões de pessoas passam fome) são os principais problemas sociais da globalização neoliberal que vêm ganhando cada vez mais significado. É evidente que essa situação tem efeitos sobre a cultura da humanidade, especialmente nos países pobres, onde os contrastes sociais são ainda mais perceptíveis. Em primeiro lugar, podemos falar de uma espécie de conformidadee adaptação. Em razão da exigência de competitividade, cada um se vê como adversário dos outros e pretende lutar pela manutenção de seu lugar de trabalho. Os excluídos são taxados de incompetentes e os pobres tendem a ser responsabilizados pela sua própria pobreza. Paralelamente a isso, surge nos países industria - lizados uma nova forma de extremismo de direita, de forma que a xenofobia e a violência aparecem entrelaçadas com a luta por espaços de trabalho. É claro que a violência surge também como reação dos excluídos, e a lógica do sistema, baseada na com - petição, desenvolve uma crescente “cultura da violência” na sociedade. Também não podemos es - quecer que o próprio crime organizado oferece opor - tunidades de trabalho e segurança aos excluídos. Embora tenham sido desenvolvidos e disponi - bilizados mais meios de comunicação, presencia mos um crescente isolamento dos indivíduos, de forma que as alternativas de socialização têm sido, parado - xalmente, reduzidas. A exclusão de muitos grupos na sociedade e a separação entre camadas sociais têm contribuído para que a tão propalada integração entre diferentes povos não se efetive; pelo contrário, isso tem levado a um processo de atomização da sociedade. O valor está no frag mento, de modo que o engajamento político da maioria ocorre de forma isolada como, por exemplo, o feminismo, o ambientalismo, movimentos contra a discriminação ética e sexual etc. Tudo isso sem que se perceba um fio condutor que possa unificar as lutas isoladas num projeto coletivo de sociedade. Nessa perspectiva, fala-se de um “fim das utopias”, que se combina com uma nova forma de relativismo: “A verdade em si não existe; a maioria a define.” No que se refere à educação, cresce a sobre - valorização do pragmatismo, da eficiência mera mente técnica e do conformismo. O mais importante é a formação profissional, concebida como único meio de acesso ao mercado de trabalho. A ideia é a de que, com uma melhor qualificação técnica, se tenha maiores possibilidades de conseguir um emprego num mercado de trabalho em declínio. Em conse quência a isso, a reflexão sobre os problemas da sociedade assume cada vez menos importância e valores como engajamento, mobilização social, soli dariedade e comunidade perdem seus significados. Importante é o luxo, o lucro, o egocentrismo, a “liberdade do indivíduo” e um lugar no “bem-estar dos poucos”. Esses valores são difundidos pelos grandes meios de comunicação e os jovens são, nisto, os mais atingidos. A diminuição do su jei - to/indivíduo surge como decorrência, pois o ser humano é cada vez mais encarado como coisa e estimulado a satisfazer prazeres supérfluos. Os excluídos são descartados sem perspectiva e encontram cada vez menos espaço na sociedade que, afinal de contas, está voltada aos consumidores, enquanto o acesso público é continuamente reduzido. Por outro lado, há reações que se desenvolvem internacionalmente contra essa tendência. A amplia - ção das possibilidades de comunicação tem contri - buído para que protestos isolados se encontrem e constituam redes. O lema “pensar globalmente e agir localmente” pôde ser superado, de forma que uma ação global se tornou possível, alterando a visão de mundo e os limites de tempo e de espaço. Para além das diferenças étnicas, religiosas e linguísticas dos povos, podemos falar de uma nova divisão do mundo: de um lado, uma minoria que é beneficiada pela globalização neoliberal e, de outro, a maioria que é prejudicada com a ampliação do livre mercado. Esse conflito está no centro do debate atual da humanidade, cujos efeitos caracterizam o espírito do nosso tempo e influenciarão a cultura da humanidade futura. Se a imagem das futuras gerações será fragmentada ou mais homogeneizada, ainda não se sabe, mas a possibilidade de uma crescente desumanização é muito grande. 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 20 – 21 Exercícios Propostos 1. Para existir enquanto língua mundial, o inglês deve se nativizar, adaptando-se aos padrões das culturas específicas. A diversidade de usos determina estilos e registros particulares. (Renato Ortiz, Mundialização e Cultura) Com base nesse texto, pode-se concluir que a) a globalização implica padronização. b) há perda total das identidades e culturas nacio - nais. c) a mundialização não se identifica à uniformidade. d) há homogeneidade e pasteurização das culturas locais. e) ocorre a americanização do estilo de vida. Resposta: C 2. Quais as consequências que a globalização está imprimindo no tempo, no espaço e nas culturas? RESOLUÇÃO: Ocorre uma redução do espaço geográfico e uma aceleração do tempo por meio do desenvol vimento dos transportes e meios de comunicação. Alguns autores, como o sociólogo Renato Ortiz, afir mam estar acontecendo um processo de desterri torialização dos elementos culturais, isto é, a perda da definição de um espaço geográfico específico de um determinado elemento cultural. Assim, por exemplo, a imagem do cowboy já não se refere somente ao Texas americano, mas a uma cultura rural globa lizada. 3. Essa forma de globalização significa a predo - minância da economia de mercado e do livre mercado, uma situação em que o máximo possível é mercantilizado e privatizado, com o agravante do desmonte social. Concretamente, isso leva ao domínio mundial do sistema financeiro, à redução do espaço de ação para os governos — os países são obrigados a aderir ao neoliberalismo —, ao aprofundamento da divisão internacional do trabalho e da concorrência e, não por último, à crise de endividamento dos estados nacionais. (Antonio Andrioli) Segundo o texto, é possível afirmar que o processo a) gerará uma concentração de capital e crescente abismo entre ricos e pobres. b) formará Estados nacionais totalitários e endivi - dados. c) levará a uma perda do espaço privado, diante da valorização crescente do espaço público. d) promoverá um maior entrosamento entre todas as economias nacionais, caracterizando efetiva - mente a globalização. e) trará maior acesso à informação, permitindo maior competitividade social e definindo uma verdadeira meritocracia social. Resposta: A 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 11:16 Página 21 22 – 1. Introdução A modernidade é a atmosfera cultural que per - meou o desenvolvimento do capitalismo, na sua fase de acúmulo de capital e de ascensão da burguesia. Alguns autores marcam o início da modernidade na Expansão Marítima da Revolução Comercial; outros, no advento do racionalismo filosófico do século XVII ou Iluminismo. O pilar da modernidade é a crença no conceito de progresso, na noção do sujeito e na racionalidade humana. O tempo era percebido como um todo, pois a noção de progresso dava uma estrutura à história e, sobretudo, o homem era visto como um projeto para a emancipação, no sentido de que o progresso acabaria resolvendo as mazelas sociais e existenciais da humanidade. Como projeto cultural, a modernidade apresenta ambiguidades, pois, se trouxe bem-estar material e conforto para muitas pessoas, não resolveu muitos problemas fundamentais da humanidade. O avanço tecnológico e as revoluções industriais colaboraram para desenhar um tecido social repleto de nós como as desigualdades, a intolerância e os impactos ambientais. Assim, é evidente que tal quadro exigia um novo olhar sobre o mundo e sobre a condição humana. Por outro lado, as constantes mudanças no modo de produção capitalista redefiniram contextos culturais e estilos de vida. Muitos autores passaram a chamar de pós-moder - nidade essas mudanças com portamentais, teóricas e estéticas que marcam a atual fase do capitalismo. A arte pós-moderna valoriza a forma, sem conteúdo. A imagem sugere um culto ao consu mismo: característica da pós-modernidade. 2. O que é a pós-modernidade Pós-modernidade é a condição sociocultural e estética do capitalismo contemporâneo, também denominado pós-industrial ou financeiro. Alguns autores se opõem ao uso da expressão, pois afirmam não perceber efetivas rupturas com a modernidade; por isso,o filósofo francês Gilles Lipovetsky prefere o termo hipermodernidade. Para François Lyotard, a condição pós-moderna caracteriza-se pelo fim das metanarrativas. Os grandes esquemas explicativos teriam caído em descrédito e não haveria mais garantias, pois nem mesmo a ciência pode hoje ser considerada como a fonte da verdade e das certezas. O sociólogo polonês Zygmunt Bauman prefere usar a expressão modernidade líquida: uma realidade ambígua, multi - forme, na qual, como escreveu Marx, tudo o que é sólido se desmancha no ar. Já o filósofo alemão Jürgen Habermas afirma que a pós-modernidade traz tendências políticas e culturais neoconservadoras, determinadas a combater os ideais iluministas. As principais características da pós-moder nidade são o fim da crença no conceito de progresso e da visão total da história, portanto a chamada frag - mentação do tempo, em que os fatos são vistos apenas como episódios isolados; a valorização do efêmero, o individualismo; o consumismo e a ética hedonista. No plano estético e da produção artística – geralmente se emprega o termo pós-modernismo – ocorre a valorização da forma sem conteúdo. 3. Texto O lugar do coletivo na pós-modernidade (Nete Benevides – Mestra em Artes Cênicas, Arte-Educadora, Atriz e Diretora Teatral) Por que será que, apesar de todas as facilidades da vida moderna, o homem contemporâneo não consegue estabelecer laços afetivos que lhe produzam satisfação pessoal? Por que será que, mesmo diante de tantos avanços científicos e tecnológicos, ele ainda se acha angustiado? Na obra O Mal-Estar da Pós-Modernidade, o sociólogo polonês Zygmunt Bauman argumenta que isso acontece, sobretudo, porque corresponde à característica da pós-modernidade, uma sociedade Modernidade e Pós-ModernidadeMÓDULO 7 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 22 – 23 marcada pelo capitalismo pós-industrial, consumo exacerbado, movimento constante, efemeridade e fragilidade dos laços afetivos entre as pessoas. O im - pacto desses fenômenos nos relacionamentos afe tivos interfere nas relações transformando-as “em amores líquidos”, reflete Bauman, que, amparado nas ideias dos pensadores franceses Jacques Derrida e Emmanuel Lévinas, vai chamar atenção para a baixa cotação da alteridade dos indivíduos que vivem este tempo, para o irreconhecimento do outro em todas as relações de um modo geral, permitindo, dessa forma, o “blo - queio” de um exercício cotidiano que envolva ques - tões éticas como tolerância, respeito, solidariedade etc. Assim, substitui-se o “investimento” no amor e no outro pela prática das “redes de relações”, uma vez que, conforme afirma o sociólogo Michel Maffesoli em sua obra A Contemplação do Mundo, as cidades contemporâneas desta sociedade são povoadas por “tribos”. Maffesoli defende que, na sua pluralidade de origens e comportamentos, as sociedades não nascem da redução da diversidade até chegar a um elemento centralizador único, mas da conjunção de elementos díspares, que formam uma grande “colcha de retalhos”. Se na sociedade pós-moderna se destaca fundamentalmente o movimento cotidiano de entrar e de sair das “redes de relações”, esta prática não permite que as relações humanas possam amadurecer e nem exigir dos indivíduos um “investimento afetivo”. Tudo isso provoca a incapacidade de se manter laços duradouros, a substituição da durabilidade pela transitoriedade e pela novidade, o encurtamento do período de tempo entre o desejo de sua realização e a utilidade e desejabilidade das posses de sua inutilidade e rejeição. Neste cenário, Zygmunt Bauman observa que a “síndrome do consumismo” nos conduz à presença de reciprocidade entre velocidade de aquisição e lixo, tudo o que vem a ser descartado. Porém, a pós-moder nidade “não se fundamenta em distinções precisas e simples, mas em uma complexidade que integra tudo e seu contrário”, destaca Maffesoli naquela obra, acrescen - tando que o estilo de um homem ou de um determinado grupo nada mais é que a cristalização da época em que este homem vive, o que lhe permite servir de revelador da complexidade social deste quadro geral que exprime sincronicamente a vida social. Esse estilo funciona como uma linguagem comum e nos remete à compreensão do social como interação e como vivência de momentos em que é partilhado o convívio entre as pessoas e são criados laços e uniões que permanecem presentes na memó - ria das pessoas. Essa ideia compreende as atitudes emocionais, as formas de pensar e de agir e nos faz entender, nesse quadro social, a relação que se estabelece entre subjetividade, intersubjetividade e intrassubjetividade. A vida social, de acordo com Michel Maffesoli, é uma sequência de copresença, ou como disse Rimbaud: “Eu é um outro”, pois é preciso partir da alteridade, que se acha no âmago do eu, para com - preen der a sociedade pós-moderna, sobretudo porque, apesar de o pensamento racional ainda nortear o comportamento e as atitudes dos homens que têm o poder de dizer e fazer, esta sociedade traz na essência de sua caminhada características associadas à temática de Dionísio, deus grego da versatilidade, do jogo, do trágico e do desperdício de si mesmo. Assim, como no domínio desse mito reina a ambiguidade, a narrativa fragmentada e a magia como metáfora, a pós-modernidade, em sua particu - laridade, também deve aliar contrários, fazendo-os entrar em sinergia e permitindo uma originalidade ao seu tempo histórico. Desse modo, as culturas se interpenetram e suas diversas tempora lidades conta - minam as formas de ser e pensar e, neste sentido, a história registra uma mitologia plural e diversificada. A socialidade maffesoliana se remete a um sentimento de comunidade que é marcado, predo - minantemente, pelo corpo coletivo sobre o indivi - dual. No estilo pós-moderno, o particular se apaga para dar lugar ao típico, podendo-se observar nesse cená rio, por exemplo, o “tipo musical”, “tipo polí - tico”, “tipo guru” etc. O viver social como estilo de um tempo está permeado por imagens e simbolismos que constituem a vida em uma grande ou banal aventura, na qual coexistem emoção e razão, tornan - do mais próximas as experiências vividas em comum. Este processo ético-estético coloca em jogo uma “paixão operante” cuja vitalidade constitui a base de toda “socialidade” ou solidariedade de base. A solidariedade de base reafirma o ethos do viver comum, aglutinando os indivíduos pela vontade de “ligação” instaurada pelo simples fato de estarem juntos, envolvidos pela “banalidade” da vida cotidiana. Este sentimento de agregação, este compartilhar acentua, conforme Maffesoli, o caráter ético da emoção estética; ele faz com que o pertencimento aos grupos, ou às “tribos”, se transforme no “cimento” que sustenta a vida 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 23 social. Portanto, esta “argamassa” que fundamenta a comunidade também está apoiada por elementos “objetos” e concretos, que são a ação militante, os grandes eventos culturais, a moda, a caridade, a ação voluntária etc. Todavia, esses elementos devem ser reconhecidos como pretextos cuja função é possibilitar e legitimar a relação de alguém por outrem. Além disso, essa estruturação de base, ou socia - lidade de base, está igualmente vinculada aos “pal - cos” onde se desenrolam as cenas da vida cotidiana: os shoppings, eventos esportivos e culturais, megaeventos religiosos, a vida nos condomínios e as relações de vizinhança de toda a ordem. São esses “cenários” que ajudam a compor as formas que caracterizam a vida social, lembrando que formas e conteúdos são uma e mesma coisa. É preciso concordar com Michel Maffesoli quando afirma a ligação existente entre a emoção estética e a socialidade (ou solidariedade de base), porque é esta relação que possibilita a emergência de um viver ético-estético-afetivo, que surge da am - biência comunitária e se fortalece pelos princípios de simpatia social. Trata-se mesmo de empatia porque tal sentimento pode ser compartilhado por meio da generosidade de espírito, da proximidade e da correspondênciamútua entre as pessoas. A noção de empatia ressalta a emoção comuni - tária, isto é, um movimento em direção ao outro que assinala a disponibilidade de compartilhar experiên - cias que brotam das razões e das sensações do “pluralismo societal”. Portanto, esta orientação em direção ao outro, esta correspondência social, é acentuada pela ideia de empatia e se constitui em característica exemplar do “estetismo”, ou estilo estético-afetivo. O estilo estético-afetivo exalta a ideia de um sentimento de religare aos sentidos sociais, ou ainda de “religação” ao outro; por isso, permite pensar uma ética estética nascida da vida de todo dia, isto é, dos significados dos vivenciados comuns na qual ética é um compromisso “sem obrigação nem sanção”, nenhuma outra obrigação que não seja aquela de se agregar, “de ser membro do corpo coletivo” e, neste sentido, conforme Maffesoli, o estilo estético: ao se tornar atento à globalidade das coisas, à reversibilidade dos diversos elementos dessa globalidade e à conjunção do material com o imaterial, tende a favorecer um “estar junto” que não busca um objetivo a ser atingido, não está voltado para o devir, mas empenha-se, simplesmente, em usufruir dos bens deste mundo, em cultivar aquilo que Michel Foucault chamava de “cuidado de si” ou “uso dos prazeres”, em buscar, no quadro reduzido das tribos, encontrar o outro e partilhar com ele algumas emoções e sentimentos comuns. No balanço cíclico dos valores sociais, assiste-se ao retorno do ideal comunitário, em detrimento do ideal societário. Uma tal pulsão comunitária é encontrada no que chamei de tribalismo pós-moderno, cujos efeitos se fazem sentir tanto nas efervescências juvenis quanto na multiplicação das agregações que foram elaboradas com base nos gostos sexuais, culturais, religiosos ou até mesmo políticos. São agregações que não mais se devem a uma programação racional, mas, em vez disso, repousam sobre o desejo de estar com o semelhante, com o risco de excluir o diferente. É a “homossocialidade”, que predomina em todos os domínios e não deixa nada indene: a política torna-se uma história de clãs; a universidade ou a imprensa fragmentam-se em igrejinhas concorrentes e opostas; as instituições, sejam elas quais forem, dividem-se em grupos, mais ou menos hostis, e com muita frequência lutam entre si. (Maffesoli, 1995, p. 54) Então, qual é mesmo o lugar do coletivo na pós-modernidade? Do mesmo modo que na Idade Média observamos o “estilo teológico” e durante a modernidade verificamos o “estilo econômico”, na pósmodernidade vem sendo elaborado o “estilo estético” e uma nova ordem se esboça. É com base nessa ordem que se deve buscar, conforme Nietzsche, “a profundidade na superfície das coisas”. Para isso, é necessário olhar novamente para as coisas e, nesse novo olhar, buscar uma identificação (que é um conceito mais “móvel” que a identidade) com as várias culturas e “tribos”, apreendendo e apreciando cada coisa com base na nossa coerência interna e não em um julgamento exterior que dita o que ela deve ser, como se fosse possível estabelecer a supremacia de um código, principalmente quando compreendemos que a ideia central da trajetória do “aprender a viver” possui a mesma dimensão filosófica de se “aprender a morrer” – angústia maior do homem. Glossário: Ética hedonista: doutrina moral que considera ser o prazer a finalidade da vida. Há pessoas que professam naturalmente o “hedonismo” — termo originário de uma palavra grega que significa “prazer”. 24 – 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 24 – 25 1. São elementos da cultura contemporânea que acusam, segundo alguns autores, o advento da pós-modernidade: I. História como entidade unitária. II. Colapso da ideia de progresso. III. Morte dos meios de comunicação de massa. IV. Suposta ou possível crise das ideologias. V. Valorização do conceito de sujeito histórico. VI. Esvaziamento de sentido da busca da verdade e do justo. São coerentes apenas: a) I, II, III e IV. b) II, III e IV. c) III, IV e V. d) II, IV e VI. e) I, III e V. Resposta: D 2. Leia o texto: Se na sociedade pós-moderna se destaca funda - mentalmente o movimento cotidiano de entrar e sair das “redes de relações”, esta prática não permite que as relações humanas amadureçam e exijam dos indivíduos um “investimento afetivo”. (Nete Benevides) Disso advém a) a incapacidade de se manter laços duradouros. b) a formação de uma rede social solidária. c) uma cultura baseada no consumismo e coleti - vismo. d) a crença na noção de temporalidade total. e) a coesão das relações humanas baseada num “cimento” racional. Resposta: A 3. Que consequências a pós-modernidade imprime no tecido social, segundo a autora Nete Benevides? RESOLUÇÃO: A sociedade urbana pós-moderna seria constituída por tribos que agrupam pessoas de comportamentos e estéticas afins, em que se formam redes de relações efêmeras e instáveis. A sociedade pós-moderna se assemelha mais a uma complexa colcha de retalhos do que a um tecido único. Assim, as relações se estabelecem mais por uma pulsão de comunitarismo do que por um ideal de sociedade. Exercícios Propostos 2o_Ano_Sociologia_2016_Keli 28/03/16 09:38 Página 25 26 – A articulação social da diferença, da perspectiva da minoria, é uma negociação complexa, em andamento, que procura conferir autoridade aos hibridismos culturais que emergem em momentos de transformação histórica (Homi Bhabha) 1. Introdução Já vimos que a globalização imprime profundas mudanças nas relações sociais e na cultura. As constantes migrações intercontinentais e interna - cionais colocam em convivência pessoas de culturas diversas e a política atual orienta-nos a um com - portamento de tolerância e entendimento mútuo. Multiculturalismo é um termo que revela a coe - xistência de múltiplas culturas num mesmo lugar, isto é, descreve uma sociedade composta de pessoas de “mundos” diferentes. O multiculturalismo, portanto, implica um trabalho de assimilação das minorias, em que seus agentes representantes sejam publicamente reconhecidos, combatendo formas de discriminação. O Canadá e a Austrália são exemplos comuns de multiculturalismo. Já o Brasil é uma sociedade mar - ca da pela forte miscigenação étnica e sincre tismo dos elementos culturais. O multiculturalismo está em oposição ao etno - centrismo e ao monoculturalismo, típico das socie - dades nacionalistas e com forte sentimento de solidariedade fechada. Há um movimento multicultural de resistência à ho mogeneidade cultural; daí a preocupação em defender a sobrevivência das tradições culturais diversas. Trata-se de um projeto de enriquecimento e aber - tura de novas e diversas possibilidades, como confir - mam o sociólogo Michel Wieviorka e o histo riador Serge Gruzinski, ao demonstrarem que o hibridismo e a maleabilidade das culturas são fatores positivos de inovação. Charles Taylor, autor de Multiculturalismo, Diferença e Democracia, atesta que toda política identitária não deve ultrapassar a liberdade individual. Indivíduos são únicos e não podem ser categorizados. Taylor definiu a democracia como a política do reconhecimento do outro, ou seja, da diversidade. De fato, não há democracia sem o direito e o respeito às diferenças. Alguns grupos sociais contestam o multiculturalismo, pois enxergam nele mais um mal da globalização. Porém, na atualidade, a convivência com a diversidade é inevitável e faz-se necessária uma postura política bem orientada. A imagem expressa a aversão que alguns grupos devotam contra o multiculturalismo, afirmando que o mundo não é um supermercado de culturas. 2. Texto Multiculturalismo (Extraído da Enciclopédia Itaú Cultural) Hibridismo, diversidade étnica e racial, novas identidades políticas e culturais: estes são termos dire - tamente relacionados ao rótulo multicultura lis mo. Se a diversidade cultural acompanha a história da humanidade, o acento político nas diferenças culturais data da intensificação dos processos de globalização econômica que anunciam, segundo os analistas, uma
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