Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
SOBRE A (DES-)CONSTRUÇÃO DAS TEORIAS LINGüíSTICAS Michel Pêcheux Resumo:Nesteensaio,Michel Pêcheuxfazaproximaçõesentrediferen- tesmomentosepistemológicosda Lingüística,mostrandoqueos traços queunemedistanciamasaliançasteóricasquecaracterizamessesmo- mentostêmsuaorigemnoprocessohistóricodeconstituiçãodaprópria disciplina.O autormostraqueocortesaussureanocontinuaevanescente: emrelaçãoa eleasdiferentesteoriaslingüísticasproduzemafastamen- tose retornos.A partir da consideraçãodo equívococomoconstitutivo da linguagem,Pêcheuxdefendequea pesquisalingüísticadevecons- truirprocedimentoscapazesdeabordareste"fatoestruturalimplicado pela ordemsimbólica". ABSTRACT: /n thisessay,Michel Pêcheuxbringsdose to oneanother dijferentepistemologicalmomentsinLinguistics,showingthatthefeatures which bring togetherand breakapart the theoreticalallianceswhich characterizethesemomentshavetheirorigin in thehistoricalprocess'of constitutionofthedisciplineitself Theauthorshowsthatthesaussurean cut is still {!V(//Iescent:i1lrelationto it thedifferentlinguistictheories pmd/lCl's{!paratiollsmul rel/lms,JJy takillgintoaccounttheequivoque a,l' cllllslitllliveo/Iallguage,f1êcheuxdefelldsthatIillguisticresearchmust Imildpmc{'dure.\'capahleo/dealillg withthis "structuralfactentailedin 111/' sYl/lhlllicalOIr/U". ESTE TEXTO éumuversãomodificadadeumaexposiçãoapresentada no scmim1riodo DRLA V. O títulopropostoinicialmenteera;"Considera- çõcscpistcmológicussobreos processosde constituiçãodasteoriasIin- gilfsticas",Devoconfessardeimediatoquenãotrateido assunto.., - emprimeirolugar,porqueo termoepistemologia,outrorasuspeitode terrorismofilosófico-polfÚco,veiculaatualmentea reconfortanteidéiade uma"intervenção"especializadanacolocaçãodeescudos,alertasfilosófi- cos,levantamentodeprecauçõesmetodológicas,eestabelecimentodeum 7 illslrulllClllalcOllceitualcom pretensõesdeadaptar-seà interpretaçãoe à avaliaç,10formaldasteorias.Nãotenhopossibilidade,nemvontadede me dedicara essaespéciedeexercício; - mas,sohreludo,porqueaexpressãoprocessodeconstituição,aplica- daaoespal':odasteoriaslingüísticasnocontextoatualmecausaoestranho elcilodeumaantífraseirônica:daíaidéia,umpoucoprovocadora,deapre- sentaralgumasobservaçõessobreastendênciasà desconstruçãodasteo- rias 1/0 campolingüístico. O procedimentoconsisteemtentar(emtornodealgumasreferências: (Saussure/anos20/anos50/o período1960-1975/o início dosanos80) aproximaçõesentrepontosdehistóriaepistemológicadadisciplinalingüís- tica,ealgunstraçosdoprocessohistóricodeconjuntonoqualestahistória seinscreve:a idéiaéa dequeestainscriçãopodecontribuirparaexplicar asmudançasde afinidadeepistemológicada Lingüística,as transforma- çõesqueafetaramsuarededealiançasteóricas,nocampodasdisciplinas "exatas"e "humanas"e "sociais",atéasituaçãoatual. 1."E Saussureficousozinhocomseusproblemas..." (Benveniste) O quetemosaquinadamaiséqueumlevantamentobastanteesquemático de alguns pontos sensíveis retirados da história epistemológicada Lingüístical• 1.1Ao finaldeumaconferênciapronunciadaemGenebranodia22de fevereiro de 1963,em comemoraçãoao cinqüentenáriode mortede FcrdinanddeSaussure,Émile Benvenisteevocoupudicamenteaobserva- çãonostálgicadeMeillet (Saussureemvidanãoteria"cumpridotodoo seu destino")econcluiu: "Abarcandocomo olharessemeioséculojá decorrido,podemosdizer queSaussurecertamentecumpriuseudestino.Alémdesuavidaterrestre, .\'Uasidéias irradiammuitomais longedo quepoderia ter imaginado,e estedestinopóstumotornou-se umasegundavida, que se confunde doravantecoma nossa"(1966:45). A frasedeBenvenisteé umaagulhadano corpoacadêmicodaciência lingilísticadosanos80;vinteanosdepois,elatocaemqualquerlingüista- pois "não há lingüistaatualmenteque não lhe devaalgo" (Benveniste, 1966:32)- a feridaaparentementeinseflsível:o pontoinauguralda Lin- 8 güísticaenquantodisciplinaautônoma. "No quediz respeitoà língua,(Saussure)existemcertaspropriedades quenãosãoencontradasemqualquerlugar.Como quequerquesecom- pare,a línguaaparecesemprecomoalgodiferente.Mas noqueelaédife- rente?Considerandoestaatividade,a linguagem,emquetantosfatores sãoassociados,biológicos,físicosepsíquicos,individuaisesociais,histó- ricos,estéticos,pragmáticos,elesepergunta:ondeestáo próprioda lín- gua?" (Benveniste,1966:33). Atravésdestaquestão,Saussurepôs-seapensarcontraseutempo,rom- pendocomumasériedeinterrogaçõespré-lingüísticassobrea origemda linguagemesuasdeterminaçõesbiológicas,lógicas,sócio-históricasoufi- losóficas(cf. osváriosprojetosdegramáticasuniversais,osdebatessobre aunidadeorigináriadaslínguasesuadivisão,osempreendimentosdagra- máticacomparadae asquerelassobrea relaçãoentrea línguae "a vida" dosindivíduose dospovos). Ora,o quemostrao estadoatualdaLingüísticaéqueo pontoinaugural permaneceevanescente,equearupturaporelesupostanuncaéefetuada: contraa proclamaçãotriunfantede Benveniste,queafirmavaquea Lin- güísticaeradoravanteconstituídaemsuaidentificaçãoteóricacomseufe- liz fundadorequedeveapenasreconhecereexplorarseudomíniopróprio (oprópriodalíngua,seurealnosentidodadoporI.C. Milner aestetermo), observa-sequeo destinodaLingüísticasaussureananãosecumpriu(nova- ment~"umdestinofunesto"?)2 O efeito-Saussurenãoconstitui,emhipótesealguma,umpontodenão- retorno:aprovaéo pequenonúmerodelingüistasparaquemo empreendi- mentosaussureanorepresentahojealgomaisqueumaesperançarenegada, umprojetonãorealizado,ouatéumamorteóricotransformadoemódio.A maior parte das forças da Lingüística pensanestemomento"contra Saussure",assemelhadaà legislaçãodeumdiretor-de-escola-atrás-de-sua escrivaninha),edebandaparaasociologia,a lógica,aestética,apragmáti- caoua psicologia... Com efeito,o evento/adventodaciêncialingüística(que,comoqual- quergrandeevento,chegava"empezinhosdepomba"(Nietzsche,citado porBenveniste(1966:45))nãoparou,desdeaorigem,desenegaratravés deumaalternânciadediásporasreaisedereunificaçõesenganadoras,re- metendo,talvez,nopensamentodo Genebrino,à tendênciainternadeseu 9 auto-encobrimento.3 1.2A primeiradiásporaaparecenosanos20:aLingüísticasaussureana vaivagardocírculodeMoscou(ondeéintroduzidadesde1915 porlakobson e Karcevski)atéo círculodePraga,depoisvaiparaVienae Copenhague. Nestepercurso,seproduzumaespéciededifraçãoepistemológicaquedis- tribui,deumlugaraooutro,diferentesinterpretaçõessociologistas,logicistas ou psicologistasdas intuiçõessaussureanas:em Moscou,os inícios do fonualismoestrutural,mastambémo iníciode umasociologiadalingua- gemdeinspiraçãoplekhanoviana;emPraga,a fundaçãoda[onologiae o desenvolvimentodeinvestigaçõesabertasàescritaliterária,mastambémo contatocomopsicologismodasteoriasdaGestalt;emCopenhague,enfim, o projetoexplícitodeconstruçãodeumalógicasemiótieadosigno. 1.3Os anos50 dãoa aparênciade umareunifieaç~ío,naquala teoria saussureanateriafinalmenteencontradoseucaminho:a"segundavida"de SaussurepareceseconfundircomadaLingüísticaenquantodisciplinaaci- ma de qualquer suspeita: do funcionalismo de Martinct às tcorias behavioristasdacomunicação,o pensamentodeSaussureseestendeatéo estruturalismodistribucionaldeBloomficld: "Talvezsejaútil situarnestepontodevistaumadasescolasestrutura- listasqueeraa maiscaracterísticanacionalmente,ouseja,11 escolaameri- canadeBloomfield.PoucossabemqucBloomfieldhaviaescritonoCours de LinguistiqueGénéraleumaresenhaelogiosu,na qual, enallecendo Saussurepela distinçãoentrelallguecparo/e, eleooncluÍa:"hchasgiven usthetheoreticalbasisfor ascience01'hum<lIlspeech"(ModernI,anguage loumal, 1924:8).Por maisquea LingÜíslicaamericanatenhasetornado diferente,nãodeixadeterumaligaçãocomSaussure"(Benvenisle,J 966:43). Efetivamente,deBloomfieldatéHarris,edcsteatéosprimeirostraba- lhosdeChomsky,aherançadoestruturalismosaussureanopareciasediri- gir parasuasmelhorescondiçõesderealização,atravésdaespetacularre- tomada,no nível sintático,dos fundamentosteóricosqueSaussurehavia formuladonoplanofonológicoe morfológico;o momento"galileano"do cortesaussureano(cf.Haroche,Henry,Pêcheux,1971)pareciadesembo-car (sob a formade umatomadade construçãoformal da sintaxe)na reunificaçãomatemática"newtoniana",.reunificaçãodianteda qual o behaviorismofuncionalistapendiaprogressivamenteparaumirremediável 10 desequilíbrio. 1.4Ora,estaunidadeacadêmicadalingÜística pós-saussureanaia no vamenteesfacelar-senoinício dosanos60,sobo efeitodedoisproccssos aprioriindependentes,masquesedesenvolviamsimultaneamente,durante cercade quinzeanos: _ o desenvolvimentoda hegemoniateóricada GramáticaGeralivo- Transformacional(GGT), diantedasposiçõesinstituciolluisadquiridas110 períodoanteriorpelasdiferentestendênciasfuncionalistas(protcgidas011 nãopelaetiquetadoestruturalismolingüístico,elascontinuarama"collser- vaI'o território",tantonosEUA quantonaEuropa); _ o aparecimento na França de uma nova corrente filosófica, epistemológicae politicamentebastanteheterogênea,masquecOllslituiu seuespaçopelareferênciaatrêsnomesfundadorese à (re-)Ieituradesuas obras:Marx, Freude...Saussure. A propriadesignaçãodestanovacorrentepelonomedeestruturalis/l/o manifestaaposição-chavequeo novomaterialismodaestruturaatribuíaii Lingüísticaenquanto"ciência-piloto". A (re-)leiturade Saussurefoi um dosprincipaismotoresdestemovi- mento.A apostalingüísticanãoerapequena:tratava-sededestacara l,ill güísticadofuncionalismosócio-psicologista,apoiando-senotadamenteIIOS trabalhosdeJakobsonedeBenveniste. Do pontodevistafilosóficoresulta,sobretudo,aproduçãodeUlllaiIl\ . pressionantesériedefilosofemas(taiscomoasnoçõesdesignificanle.de estruturacombinatória,de sistemasincrônicode diferençassemlermos positivos,de distribuiçãode posições,funçõese lugares,de causalidade estruturalpresentenasériedeseusefeitosetc.).OstrabalhosdeLévi-Strauss. deLacan,deAlthusser,deFoucault,deDerrida...materializaramdedife- rentesfonuasosefeitosdestenovodispositivofilosófico. No própriocampodalinguagem,emsuarelaçãocomalíngua,o textol' a fala,o efeitodestesedistribuiu,comdiversasconseqüências,entreuma reflexão"semiológica"sobreo espaçoliterário(Barthes,Kristeva...) e lam- bém.aconstituiçãodeposiçõesoriginaisno campoinstitucionaldaspes·· quisaslingüísticas:dentreestasposições,a de A. Culioli, se referindoà lógicadeFrege(cf. emparticularCulioli, 1968)paraconfrontaras tradi- çõeslingüísticasfrancesas(Tesniere,Guillaume,Benveniste...) COlllnovos II de~àfiosdaGGT, edesembocandonaelaboraçãodeumateoriaformalda gramáticacapazde construir os fenômenosenunciativos(ao invés de constatá-los,comentá-los indefinidamente);e a deJ.C. Milner, levandoa umareflexãosingularmaispróximada GGT, sededicandoa discerniro que,dointeriordestateoria,resisteàsuaderívaepistemológicainterna,ea estaopacificaçãodo fato inconscienteda "lalangue"4soba construção racionaldagramáticadeumalíngua. Nestasériedeefeitos,inscreve-setambéma emergênciaproblemática doqueseconvencionouchamara análisedodiscursodetipofrancês,ini- cialmenteengajadapelostrabalhosdeJ. Dubois:estadisciplinatransversal emformaçãofoi fortementemarcadapelaconjunturaepistemológicaqueacabadeserlembrada. O paralelismodestesdoisacontecimentos(aGGT nosEUA enaEuro- pa/o estruturalismofilosóficonaFrança)duroutodaa décadade60e até meadosdaseguinte.Ele explicasemdúvida,porumlado,aresistênciados lingüistasfrancesesemrelaçãoaochomskismo:por umentrecruzamento derazõescontraditórias,a GGT nãoultrapassounaFrançao níveldevul- garizaçãouniversitáriadesuperfície,duplicadaporummisteriosofuncio- namentodeseitadeiniciadoS.5 As tentativasde inscrevero conceitode transformaçãono espaçodo movimentoestruturalistacontinuaram,salvoexceções,noestágiodojogo depalavrasfilosófico,eLacantriunfouao"apontar"queo famosoenunci- ado"Colorlessgreenideassleepfuriously"6constituía,atravésdaaparên- cia absurdadasuasemânticaliteral,umaboadefiniçãodosprocessosin- conscientes!DiantedasubversãoteóricadaTrípliceAliançaEstruturalista (Marx - Freud- Saussure),quecolocavaaantropologia,ahistória,apolíti- ca,a escritaliteráriae a poesiaao ladoda LingüísticaedaPsicanálise,as minuciosasargumentaçõesdaGGT nãotinhampeso... Por suavez,asaplicaçõespsicolingüísticasaí embasadas(osexperi- mentosquecontrolavamcomumcronômetroastransformaçõesdasárvo- res sintáticasno cérebrodos "sujeitos"...) constituíamum exemplo_ caricaturalmentebehaviorísta- destasmetodologiasempiristascomasquais o "materialismoestrutural"tinhadecididoromperemtodososcampos. Enfim, os diferentesfuncionalismossócio-psicologistas,inscritosna linhagemdas"sociologiasdalinguagem",tenhamconservadoposiçõesbas- tantesólidasparafornecerargumentospolíticosparaumanti-chomskismo 12 "deesquerda",não hesitandoem associaro estruturalismo,Saussuree Chomskynomesmoódioteórico. 1.5O início dosanos80 aparecemarcadopor umanovamudançano regimedaspesquisaslingüísticas.No decorrerdosúltimosanos,diversos signossemultiplicaram,manifestandosimultaneamenteo finaldomateria- lismoestruturalà francesa(decompostoatravésdesuasúltimasrepercus- sõescontraditórías)e o do chomskismotalcomosedesenvolveudurante cercadequinzeanos(cf. Grüning,1981). Scríamaisdoqueumacoincidência?Estasimultaneidadeentreo esgo- tamentodo efeitoSaussure,pelo qual a Lingüísticaperdeuprogressiva- menteseusaresdeciência-pilotonocampodasCiênciasHumanase Soci- ais,e o bloqueiodaspesquisasteóricasconduzidaspelaGGT (essencial- menteno domíniodasintaxe)justifica,dequalquermaneira,a formação, entr!-los lingüistas, de um largo consenso anti-saussureanoe anti- cholllskiatlo,repousandona idéia(simples,porémeficaz!)de quea Lin- güísticaformal-eapesquisasobreosformalismossintáticosemparticular - é falaciosae inútil,equeémaisdoqueurgenteseocupardeoutracoisa. O fatodequeo próprioitineráriodaGGT tenhapodidocontribuir,na basedeumcertoencobrimentointernodaespecificidadedosfatossintáti- cos,paradeslocarcadavezmaiso pontodeaplicaçãodareflexãoemdire- çãoà semânticae à lógica,depoisparaa pragmática,nãoconstituifacea csteconsensosenãoumaprovasuplementar:a homenagemforçada,pelo víciq formalista,àsvirtudesdeumpensamento"abertopara o exterior"! Sem interrogarmaisa relaçãorealentreSaussuree Chomsky- esta relaçãopermaneceumimpensadofundamentaldaLingüística- nãosepode deixardesublinharqueelespartilharampelomenosamesmapreocupação obsessivadedeterminar"ondeestáo própriodalíngua",aopassoquehoje estaobsessãopareceincomodarmaisdeumlingüista.O amorpelalíngua conduziraSaussurearecusar"osquadroseasnoçõesqueviaseremempre- gadosemqualquerparteporquelhepareciamestranhosàpróprianatureza dalíngua"(Benveniste1966:39).Nãoseria,aocontrário,umacertavergo- nha(umaaversãoinconsciente?)noquediz respeitoaopróprio da língua quelevahojevárioslingüistasa seprecipitaremparaos quadrose asno- çõesquevêemserempregados? Um novoconsensonãoestariasereconstituindonabasedeumaunida- u denegativa,desembocandoemumanovadiásporaintelectual,quetendea mergulharaLingüísticaemquestõesdebiologia,delógicaedepsicologia (individualousocial)? ComoseascondiçõesdeautonomiaepistemológicadaLingÜísticaen- quantociênciaseencontrassemmaisumavezhistoricamentecomprometi- das...Comose,novamente,Saussureficassesozinhocomseusproblemas! 2. "Que estranhodestinoo dasidéias..." (novamenteBcnvenistc!). É realmenteestranhaestasériederetomadasqueman:aa históriadas idéiaslingüísticas,atravésdesuasrelaçõescomoutrasciências(constitu- indoseumeioespecífico,sçu"exterior"epistemollÍgico)c tambématravés dainserçãoemumprocessomaisvasto,uIlrapassandoo ccnÚriodospuros fatoscientíficos. Este"estranhodestino"contradizaomesmolelllpll a concepção,com aparênciaracionalista,quesupõeumdesenvolvilllenlllaUI{)nolllo,retilíneo e cumulativode umnúcleodeconhecimentosdo ohjclo língua,e a visão cética (oportunistaoupragmática)quereduziriaa histÓriadaLingüística aoconfrontodealgumasindividualidadesouà oscilaçãoarbitrÚriademo- dasintelectuais:é precisosuporqueestadisciplinaeSlâ,deumamaneira quelheéprópria,expostadeseuprópriointerioraosefeitoscomplexosdo processoconjunturalhistóricoepolíticoqueconstituioespw,:onoqualsuahistóriaseproduz. Mas, ao tentarpensara Lingüística"foradesi mesma"(ef.Gadet& Pêcheux,1980),nahistória,nãocorremoso riscodeperderdevistao real próprio aoqual,comoacabamosdeafirmar,elaestârelacionada'! As posiçõesdefendidasemLa LangueIntrouvableconstituemurnaten- tativadecontornarestaaporia,mostrandoquea questãodo "próprio"da Lingüística(daespecificidadedeseureal)é indissociáveldaquestãodas escolhasdeembasamentoatravésdasquaisseconstituie setransformaa rede'desuasalianças. Tentarhipóteses(do tipo dasque são apresentadasadiante)no que concerneàs determinaçõeshistóricasquevêm"assinalar"as sucessivas redesdeafinidadesdaLingÜística- desdeosanos50atéo períodoatualé, então,também,(nãoadiantadissimular)seposicionaremrelaçãoaoreal próprioentãoàLingüísticaenquantorealda língua.As trêspropostasse- 14 guinteslimitam-seaevocar,deumamaneiranecessariamenteultra-rápida e alusiva, os feixes de indícios históricos, pontos sensíveis onde se entrecruzamdiferentesníveis. 2.10 momentodeaparenteunificaçãodaLingüísticados anos50,na formadominantedofuncionalismo,coincidecomaretomadadodesenvol- vimentoindustrialdopós-guerra,queprecisadodesenvolvimentoedadi- fusãode novosprocedimentostecnológicos,nasesferasda produção,da formaçãoprofissional,daeducaçãoedasaúde. O problemadas"comunicações"(quese tornaria,por deslocamento metafórico,o temaprincipal'dasideologiasdo consenso)foi inicialmente umquebra-cabeçaparaosengenheirosdatelefonia:ateoriadainformação (ShannoneWeaver)seconstituinesteterreno,emqueo emissoreo recep- torsãoinstrumentos,antesdeseremossujeitosfalantesqueosutilizam. Simultaneamente,ostrabalhosdevonNeumannconfrontamosmode- los matemáticos,neuropsicológicoseeconômicosdacomunicação(i.e.a transmissãode informaçãoentrepares),e desembocam,em associação comMorgenstern,na"teoriadosjogos" (quesequerumateoriageraldas interações,concebidascomotrocadeinformações)(cf. Plon, 1976).A no- çãodehomeostasiaemerge,destaforma,enquantocategoriainterdisciplinar, visandodarconta,emtermosdecircuitosdeinformação,deregulamentos comportamentaissuscetíveisdecaracterizartantoumamáquinaquantoum animal ou um grupo social: a psicologia behaviorista(skinnerianae pavlo,viana)adotao esquemada "caixapreta"comomodeloadequado~s suasteoriasde aprendizagem(enquantoregulageminstrumentaldo jogo das"entradas"edas"saídas"estruturandoo comportamento- eemparti- cularo "comportamentoverbal");a cibernéticadesenvolvemecanismos auto-reguláveis(ohomeostatodeAshby,operceptrondeSeymourPapefte as tartarugaseletrônicasde Grey Walter...), simulandodiversostiposde comportamentos"normais"ou "patológicos";a matemáticadesenvolve, aomesmotempo,modelosestatísticoseprobabilistasdestinadosatrataras "mensagens"enquantofluxo de informação,e teoriasformais(derivadas dos trabalhosdeTuring),autorizandoa programaçãodecálculoslógicos (osprimeiroscomputadoresà válvulanecessitavamde váriosandaresde umprédioparaefetuaro queummicro-processadorcondensahojeemal- gunsmm3!):nohorizonte,vislumbram-seosprojetosiniciaisdetradução automática- queiamdesembocarnaestruturanão-markovianadasintaxe, e asprimeirastentativasde simulaçãode inteligência(a noçãode inlelic 1."1 gênciaartificialapareceuem 1956),visandoà construçãodedispositivos capazesderaciocínio.7 Nestatramadeaproximaçõesinterdisciplinaresquemarcouaconjuntu- radosanos50,transparecia,noestadoembrionário,umdesejoutópicode "dominaro mundo",associadoa estehumanismopolíticode boasinten- çõesque,porexemplo,a UNESCO, desdesuacriaçãoem 1946,sepôsa difundir:aidéiadeumaregulaçãopsico-bio-cibernéticadoscomportamentos humanos,individuaisesociais,atravésdaergonomia,damedicinae _so- bretudo- daeducaçãoaparececomoaúltimarepercussãodoesquemafun- cionaldacomunicaçãolingüística,projetadaemummeio"científico"em funçãodasafinidadeseletivasqueacabamdeserlembradas.Essedesejo sistêmico-funcionalnão dispunhana épocade condições(biológicas, neurofisiológicas,cibernéticase informáticas)necessáriasà suarealiza- ção,maso projetoestavatraçado;quantoaosetordasdisciplinasfilosófi- case literárias(dominadopelafenomenologiae pelohumanismoexisten- da!), nãohaviaoutra"relação"comtalprojetoa nãosera não-relaçãoda ignorânciadistante,aderrisãoestetizante,eareivindicaçãodosdireitosdo "vivido", do "autêntico",edo "poético"...diantedaciência. Apesardos esforçosexcepcionaisde lingüistascomoJakobsonpara darcontadatarefa,e fazervalero estatutopoéticodalinguagemhumana, levandoa argumentaçãoparao terrenodo funcionalismoH, a Lingüística dosanos50continuoupresanesteimagináriointerdisciplinardacomuni- caçãocomoregulaçãofuncional controlada:elao haviapreviamentede formaindiretaautorizado,senãosuscitado,aodenominar-se"funcionalista". 2.2O períodode 1960-1975secaracteriza,pelomenosnoquediz res- peito à Françae a umapartedo espaçodas culturaslatinas,por uma reestruturaçãoglobaldarededeafinidadesdisciplinaresemtornodaLin- güística.Foi lembradoacimaqueestarestruturação,queapareceudeuma formabastantebrusca,haviaseorganizadoatravésdoeventoestruturalista que marcou o fim da hegemoniafilosófica da fenomenologiae do existencialismo(Husserl,Heidegger,Sartre...) eredistribuiucompletamente asrelaçõesentreas"ciências"eas"letras":o aparecimentodaantropolo- gia estrutural,a renovaçãoda epistemologiae da históriadasciências,a organizaçãoanti-psicologistado campopsicanalítico,o aparecimentode novasformasdeexperimentaçãonaescritaliterária,earetomadadateoria marxistatraduziamsimultaneamenteestamudançadeconjuntura,abalan- 16 doosistemadasaliançasfeitasemtornodaLingÜfstil:lI,queIIplln'l'lill'Olllll agarantiajá parcialmenterealizadadeumaCiênciaPormaldoSiglliticlIlIlI' Conceitostaiscomoosdemetáforae metonfmia,declldcillsíglliliCIIIIIl', efeitode sentidosetc.tornavam-sea baseteóricacomumdl: IOllllldllsdI' construçãocrítica,abalandoasevidênciasliteráriasdalIulelltil:idlldcVIVI daeascertezascientíficasdopositivismobio-psico-funcionlll. "O fundamentalfoi o desafiointelectual,políticoc pcssoalqtll'SIIIglll quandoas trêsteorias(psicanalítica,marxista,lingüística/anlropolúglCill coincidiram,duranteumbreveperíodo"(Turkle I9H2:10):o deito StlhV1'1 sivodestedesafiointelectualtraziaapromessadeumarevohlçlllll'tllI\Ilal, colocandoemcausaasevidênciasdaordemhumanaCOIllOordeml'sllilu mentebio-social.Restituiralgodotrabalhoespecíficodaletra,dIl S11111111111, dotraço,eracomeçaraabrirumabrechanoblococompactodaspcdugllgl as,dastecnologias(industriaisebio-médicas),doshumanismoslIIomliWIIII'~; oureligiosos:eraquestionaressebloco,estaarticulaçãodualda/lia/l/gll'o como social, emqueo simbólicoé excluído,e o "sujeilo psicolÓgico", surdoao significantequefundatal articulação(comoa glândulapilll'ul cartesianaconcedeaohomema substânciapensantee a substância~~XII'1I sa).Designarestabrechacomoefeitoirredutívelda ordemsimbÓlical'm golpearo narcisismo(individuale coletivo)daconsciênciahumalla,qll\' nãopáraderenegociarsua"articulação"entreo nadadainconsciclIl'iahi ológicae a gestãocontratualdo eu (soi) (comosenhor/escravode Sl'IIS gestos,palavrase pensamentos,em suarelaçãocom o outro-eu(I'alltll' soi». ' Resumindo:arevoluçãoculturalestruturalistanãoeliminouasllspl'itu, totalmenteexplícita,emrelaçãoaoregistrodopsicológico(eàsP,\';c%gi as- docomportamento,doeu(moi),oudo"sujeitoepistêmico" '1111'pll' tendemsera teoriadisso),Portanto,estasuspeitanãoé engendradapelo ódiodahumanidadequefreqüentementeatribuiu-seaoestruluralislllo;dll traduzo reconhecimentodeumfatoestruturalprópriodaordelllI1l1l11allll:o dacastraçãosimbólica9, No contextopolíticodaFrançadosanos60,o efeitosubversivo~'Stl'lltll ralistaultrapassourapidamenteo quadrouniversitárioda"produçi1oldlli ca" e o dasrevistasliteráriasespecializadas;a teoriae a IiteraluratOllla vam-se lugares de intervençãoideológica, suscetfveisde ufclal, l'lIl contrapartida,o conjuntodo camposócio-político:quarentaunosdl'pois do engajamentodos formalistasrussosno movimentorcvolucionlÍl'iodl~ 17 Outubro,a mesmaquestãoressurgia(comnovasformas)deumtrabalho dosigniftcantenoregistropolítico,visandoaumaoutramaneiradeouvira políticalO• Sabemoscomo,no decorrerdadécadaposteriora maiode 1968,esta repetiçãoda"cenaprimitiva"revolucionáriadosanos20vaiscdesmoro- nar progressivamente:o fim do "Iacanismo",a "criscdo marxismo"e a irrupçãoda"novafilosofia"marcaramanovareviravoltada ideologiali'an- cesa,.Asevidênciasinduzidaspeloqucpoderíamoschamardca I'{,l-'o/uçÜo culturalabortadadosanos60vêmafetaro dispositivointl'leetuuldasCi- ênciasHumanaseSociais;o esgotamentodosefeitosdo llIovimentoestru- turalistaacarrela,paraa disciplinaqucdeuseu1I01l1e11 t'sll'IIlllvillWlIlo, ulIlareconfiguraçãodeseudispositivodeelllhasllllll'ultlSl'pisll'IIIOIÔ~ic(ls, 23 O paradoxodesteiníciodos1I110SHO éque(I slIfoClIlIIl'lItodoesllu turalismopolílico fl'llncês'l(que,110Clltlllllo,l'lllllílllllllll'lodll/.ir efeitos, sobretudo,110espaçolutilloumericlIIlD),coilll'idl'COIUIIIIIC1l'Sl'llIll'lIlodll relcpçàodos trabalhosde I ,IICUII,/lurthes,Ikrridu t' POlll'uulI110ClIIUpO anglo·saxÔllico,tllUtolia IlIgllllcrraqUllllto1111t\kUlIl/lhll l' IIOSI':sllldos Ullidos, DesseIlIodo,alravésde UIIIeslrallhoefeitodt'deslol'lIllIl'1I10,110 exalo II/omelllo em ql/e LI AII1l5ricadescohre o eslfutufulislllOI!. u illtelcclualidadcfra/ll:esll"vira IIIH~gilla",desenvolwlldoulIIfCSSClltiIllCII- to maciçocom relaçãoàs teorias,dasquuisse suspeitade que ICllhlllll pretendidofalaremnomedasmassas,produzindoumalongasériedcgcs- tossimbólicosineficazeseperfonnativospolíticosinfelizes.Estcressenti- mentoéumefeÍlodemassavindo"debaixo":umaespéciedecontra-golpe ideológicoqueforçaà reflexão,equenãopodeserconfundidocomo alí- vio negligentede muitosintelectuaisquereagemdescobrindosó depois que"aTeoria"oshavia"intimidado"! A grandeforçadestarevisãocríticaécolocar,impiedosamenteemques- tãoas alturasteóricasno nível dasquaiso estruturalismopolítico tinha pretendidoconstruirsuarelaçãocomo Estado(e, singularmente,com o Partido-Estadodarevolução!),e obrigarosolharesa vero querealmente acontece"embaixo",nosespaçosinfraéticosqueconstituemocomumdas massas,lá onde,de modoparticularmenteaguçadoem períodode crise econômica,circulaalinguagemdaurgência:"Ohomem,durantemilênios, permaneceuo queeraparaAristóteles:umanimalvivoealémdissocapaz deterumaexistênciapolftica;o homemmodernoé umanimalnapolftica 18 cujavidade servivo estáemquestão"(Foucault1976:188). Em história,emsociologia,nosprópriosestudosliterários,aparececada vezmaisexplicitamenteapreocupaçãoemsehabilitaraouvirestediscur- so,namaioriadasvezessilencioso,daurgênciadesedominarosmecanis- mosda sobrevivência:trata-se,paraalémda leiturados GrandesTextos (daCiência,do Direito,do Estado)desecolocarà escutadascirculações cotidianastomadasno comumdo sentido(cf., por exemplo,de Certeau, 1980). Simultaneamente,o riscoquecomportaestemesmomovimentoébem evidente:éo queconsisteemseguiralinhadamaiorinclinaçãoideológica eemconceberesteregistrodo comumdosentidocomoumfatodenature- za P.l';('o-!Jio/ágica, allteriora qualquerordemsimbólica,e independente dcla, I~sohrcl~stailldinaçf\oquc,emnomedasuperaçãodeFreud,deSaussure c doestruturalismo,cnguia-sehojeumaparteda intelIigentsia"moderna" liascil'llciushumallnsesociuisnomOlllelltoemque(arecepçãodosestru- ItlntlisUIOS('SllíajudandolIisso,dentreoutrosfatores)lima- pequena- bre- cha(,lIln~lIhrcsenohdlllviorismofuncionaldaideologiacientíficainterna- dOllllllllCllledOlllilllllllc,Sob u press:lode umllespéciede populismoda lII'gr.lIl'ia,o (lcsdO depl'dllgogiasedetccnologiuseficazesrenasce,contor- nandoo 1'1110 cslnlluralda l'IlSlnl(~fiosimhÓlica,e soldandonovamenteo hlocohio socialdo lInillllll humllnidade, Com o J'cllpaJ'ecimcntotriunflllltedaglfindulapinealpsicológica,écla- ro: "No infcio dos 1I110S60, Alain Resnais,com L'Année derniere à Marie/lblld, articulavaUJll filme sobrcmclMorastais comoespelhosno interiordeespelhose amanipulaçãosimbólico-matemáticadefósforos.O título destefilme tornou-sesinÔnimode umaconcepçãodo homemque enfatizavaacomplexidadedo simbólico,e nãoasimplicidadedo instinto. Vinteanosmaistarde,emMOII o/lde d'Amérique,ametáforacentraléado ratode laboratóriocomcomportamentopré-programado,condicionadoe condicionável.Nestefilme, a "voz da autoridade"é a do biólogoHenri Laborit.A versãoqueeleapresentadasócio-biologianãoapenasrejeitao simbólicoemfavordeumacausalidademaisbiológica,masvaimuitomais alémedesembocaemumateoriaanálogaàpsicologiadoeu(moi):comum esforçoconsciente,podemosusarnossoconhecimentodosprocessosins- tintivos a fim de dominá-Ios. O círculo está fechado, voltamos ao 19 voluntarismo.E esseéapenasumpequenoexemplodentreoutros"(Turkle 1982:11). Dessemodo,porum"estranhodestinodasidéias",1980repetiria1950, como1960repetiraI 920?Defato,aidéiadeumsimplesloopil/g histÓrico reconduzindohojeaconfiguraçãoepistemológicadosanos50,éprofunda- menteinadequada:aevoluçãotecnológicaacelerada,nasÚreasdaeletrôni- ca,da informáticae da cibernética,sustentadapelaelllergênciade novas "demandassociais"(darobóticaaosbancosdedados),os reeentesdesen- volvimentosda pesquisabio-médica- partieulan\J(:nteda genétieae da neurofisiologia,a reorientação"cognitivisla"da psicologiaexperimental (apassagemprogressivadeSkinnera Piagct)e Sl:lIemhasamentonosde- senvolvimentos"sofisticados"dalÓgicafll/'lIIal,contrihllemparaestrutural', atravésdetrocasde"modelos"entreos eSJleci,llistasemcérebro,osteóri- cosdossistemaseosconstrutoreslll: roh(ls,11111 (',I,/ItIÇO muitomaiscoeren- tedo queem (1)50,e no qualos funlasnlllsdc domíniohio·socialpodem desabrochar,ullrapassandoo nívelelllhrion;'Íriodosprojetosutópicos. 'l1l11toquea pressàopOJlulislada urgCncia.queaeahade serevocada, fO/'lleeenessemOll\l:ntoumahaseideológicaeulllajustificutiva"democrá- tica"paraos fanlasmasenlqueslilo".Seacreseelllanllosque,porseulado, a pesquisafilosMiea fralleesaparece/"inallllenlelevarlisérioaexistência doempirislllolÓgico,doqualelasempresemanteve1\ distâneia(deBergson aSartre,etambémnuesquerdalllarxista,a ignorÜnciaeraargumento!)cal- culamoso quantoasitUlll;i1olIludou:cmtomodosprogramasdepesquisas interdisciplinares,em inlcligllnciaartificiale em lratalllentoda informa- ção,umnovosistemadealiançasestlíformando-se,noqualumaeertacon- cepçãodaLingüísticaéconvidadaalomarseulugar,eomaúnicacondição deaceitartrataro simbólicocomoumsinalea linguagemeomouminstru- mentológico.Ou seja,nofl!ndo,comacondiçuodeaLingüísticareconhe- cera Psicologiacomoa novaciência-pilolOdo selor,epislemológicaepo- liticamenteacimadequalquersuspeita. Ora,umatalconcepçãodaLingüísticaexiste;elaatéganhoumuitafor- çajuntoadiversoslingüistas,apartirdomomentoemqueaepistemologia chomskianaexplicitouseuspressupostosiniciaissustentandoquea língua é"umórgãomental"eque,conseqüentemente,aLingüísticaéumramoda Psicologia (ver a respeitodisto J. C. Milner, "Linguistique,biolo~ie, 20 psychologie",emMilner 1982:302-317). Dissoresultaparaapesquisalingüísticaumrecalquetendencialdaor- demsimbólica(no sentidoem queo materialismoestruturalesforçou-se paraconstruiro conceito),que nãoimpedeninguémdedormir!14 Aliás, é precisoreconhecerque o eventoestruturalista,por diferentesrazõesjá evocadas,teveapenaspoucosou nenhumefeitosobreo desenvolvimento efetivoda Lingüística após 1960,e da GGT em particular.Apesar da redistribuiçãodasaliançasteóricas,queprivilegiaareferênciaàmatemáti- caemrelaçãoà física e à biologia,e contornandono própriointeriorda matemáticao quepodemoschamarde"matemáticadeserviço"(asestatís- ticasquantitativas,porexemplo)paraaproximar-sedasescritasalgébri- cas,lógicas ou topológicas,as "lógicasdo significante"inspiradaspelo materialismoestruturalnãotiverammuitainfluênciasobrea evoluçãoda teoriasintáticagerativo-transformacional,derivandocadavezmaispara urnainterpretaçãopsico-Iógicadasemântica,daenunciaçãoedapragmáti- ca:comosesetratassesemprede"restabelecernaplenitudedeseusdirei- tose deveresumsujeitodonodesi mesmoou,aomenos,responsávelporsuasescolhas.O universopodeentãodançarconformea músicadasesfe- ras,entreasmãosdo gênerohumano,curadoda inqualificávelferidaque podiaconstituirasuposiçãodequea língua,ouqualquercoisadela,esca- pa-lhe"(Milner, 1982:126-7). 3. "A linguagemérealmenteo quehá demaisparadoxalno mundo,e infeliZessãoosquenãoo vêem"(novamenteBenveniste!) Falardeumatendênciaà"desconstruçãodasteoriaslingüísticas"supõe aadoçãoumcertopontodevista,do tipodoqueaquisustentamos, Se,pelocontrário,considerarmosqueo episódioestruturalistanãofez muitomaisdoquedesviarapesquisalingÜísticadeseusobjetivos(particu- larmentenaFrança),éagoraqueadisciplinaestáemplenafasedeexpan- sãoe de construção:o incidenteestáencerrado,estamosnovamenteno caminhocerto... mais um esforçoparaatingiro nível internacionaldo positivismobio-psico-funcional! Mas, mesmodestepontodevista,diversos"roteiros"epistemológicos mostram-sepossíveis,segundoapressupostarelaçãoentreo biológicoe o 2'] social:aLingüísticapodeescolherentreo esfacelamentoeaintegração. 3.1 No limite, o roteiro do esfacelamentoimplica a dissociação institucionalentreumaLingüísticadocérebroeumaLingüística~ocial. As atuaisconexõesda.biologia- coma psicologiaexperimental(atra- vésdaneurobiologia,daneurofisiologia,dapsicofisiologiaedaetologia,a análisee a sínteseda voz, a psicolingüísticae as construçõesde lógica natural),coma inteligênciaartificial(cibernética,robótica,estudodo "di- álogohomem-máquina",análisedecenas)ecomasciênciasdotratamento dainformação- tendemaformarumespaçoderecepçãoparaumaLingüís- ticadocérebrosegundoaqualo sistemanervosohumano,munidodesuas "entradas"(auditivase visuais)e desuas"saídas"(fonatóriase gestuais), representao hardware- a basematerial- deumsistemamultifuncionalno interiordo qualaslínguasnaturaisconstituiriamumaclassedeprogramas entreoutras.Estaposiçãoextremista,quenãodeixadeterapoionaUniver- sidadee noCNRS, acabarianormalmentepor incorporaraLingüísticado cérebrono setordasCiênciasdaVida,deixandoparaosdiferentesramos dasdescriçõeslingüísticasdecampo,dassociolingüísticasedassociologi- asda linguagem,todaa liberdadedeseconsagraraoestudodosaspectos dalinguagemdo"tecidosocial",noespaçodasciênciashumanasesociais. 3.2Mas asrepercussõesprevisíveisdessadissociação,colocandoaLin- güísticasocialemumaposiçãodominadae marginal,tornamfinalmente esteprimeiroroteiropoucoplausível:a idéiade umaintegraçãoda Lin- güísticasocialcomumaLingüísticadocérebro,resultandoemumateoria bio-socialde funçõesde comunicação,podeseduzirmaisemvirtudede suaaparênciadecompromissoepistemológico;paratantobastasupor,como toda a tradição funcionalista sugere, a presença maravilhosa, no entrecrul.amentodo espaçosócio-políticoe do universodasmáquinasde retro-açao,da"glândulapinealpsicológica",ou seja,dosujeitosenhorde si mesllloeresponsávelporsuasescolhas,adaptadoaulIll11undobio-social normal'j • Os atuaisdesenvolvimentosdasteoriaspragmáticllsemdircl,"ãoa uma sociologiadasinteraçilcs,qucSUPllcatosdc lingullgcnlindirl'los,cúkulos de infcrênciae utili/,ll(,:ãodemáximasdellpll~L'Ía~:ííoc de!li,ÜO, ni\ose ins- crcveulllIassiVlllllcntenestaleudência'? "- Porquevocêvolloulão tardcontclllà noitc'!"lançouMagpicbrutal- 22 mente. "_Fui aoboliche",respondeuScoURobertson,seumarido,indiferente àprovocação. Magpierecomeçou,pérfida: ,,_Penseiquevocêtivessehorrordeboliche...•• "- Não quandoestoucomcompanhia...•• "- Por acasoeunãosoucompanhia?" Scoudefendeu-sepachorrentamente: "- Não é a mesmacoisa." ,,_É claro,porquevocênãopodeencontrarmulheresemcasa!" A brigadecasalteriasidodasmaisclássicasseestaamericanaciumen- tanãotivessea fria fisionomiadeumterminaldecomputador,aindapor cimamudo. Magpieé umprogramadecomputadorquefaz o papeldeumaesposa desagradávelquequerdominarseusupostomarido...16 Daanálisedastrocasverbaisimplicadasnoritualdarefeiçãonorestau- rante,atéàtransformaçãodasfábulasdeLa Footaineemroteirosactanciais (cf.Sabah,Rady,Soquier,Berthelin,1981),o projetodeumaincorporação das"funçõesde comunicação"a umasemio-lógicainteracionaldeveser totalmentelevadoasério:elejá estáscndorealizado. 3.3A conseqüênciacvidentedas duashipótesesque acabamde ser evocadasé que- sejaláqualfor arelaçãoentrcaLingüísticado cérebroe a Lingüística social - a própriaidéiade qucstionaro estatutoda ordem simbólicaedacastraçãoCOIllOfatoestruturalpareceaíestritamenteincon- gruente.Esla incongruênciallIarcao lugardeixadoemtalperspectivapara ullIare("lcxÜoqucprctendefal.ervaler,noespaçodapesquisalingüística,o jogo lIlullul'lIlcunodos significantes,a incidênciainconscientedo Witz (chiste)edetudoo que,dalíngua,escapaaosujeitofalante:o lugardeum entrc-utosengraçadodcntroda seriedadedaciência,umaespéciede do- mingopoéticodo pensamento. O registrodo literárioe do poéticoseria,assim.(novamente)o que nuncadeixoude seraosolhosde alguns,apesarassim,dos trabalhosde 23 Jakobson,de Benveniste,de Barthes,de Kristevae dealgunsoutros:um luxoaristocráticoparaos temposdepaz,quedevesaberapagar-sediante dapressãológicadaurgência. Que"o própriodalíngua"possa,assim,tornar-seumobjetoresidualda pesquisalingüísticadáumsentidoprecisoànoçãodedesconstruçãoteóri- ca talcomoelaécolocadaaqui. Ninguémpensaem negarque existamdiversassériesde universos discursivoslogicamenteestabilizados,inscritosnoespaçodamatemáticae dasciênciasdanatureza,nodastecnologiasindustriaisebio-médicas,ena esferasocialdosdispositivosdegestão-controleadministrativos.É claro queaconstruçãohistóricadetaisuniversossó foi possívelapoiando-seem certas propriedadesdas línguas naturais,autorizandooperaçõesde esquematização,dedicotomização,decálculológicoctc..., epermitindoa manipulaçãodemetalínguasaptasarepresentardemaneiranão-ambíguao conjuntode"estadosdecoisa"possíveis,inerentesaomicrolnundosupos- to por tal manipulação:emtaisuniversosdiscursivos,todaambigüidade comporta,defato,umrisco"mortal",eéprecisamenteaexistênciadestes múIiiplosespaçosdaurgência(acarretandoumaumeIHodepedagogiasde todasasespécies),quegarantemaciçamenteoatualembasamcntodarelle- xãolingüísticaemconceitoslógicos,semânticose pragm<Íticos,importa- dosdestasériedeuniversos. Mas - a nãoserqueseconsiderea funcionalidadehio-socialcomoum fatouniversalmenterealizado- é necessárioreconhecerquequalquerlín- guanaturalé também,e antesde maisnada,a condiçãodeexistênciade universosdiscursivosnão-estabilizadoslogicamente,própriosao espaço sócio-históricodosrituaisideológicos,dosdiscursosfilosóficos,dosenun- ciadospolíticos,daexpressãoculturale estética.Nestasegundacategoria deuniversosdiscursivos,a ambigüidadeeo equívococonstituemumfato estruturalincontornável:ojogodasdiferenças,alterações,contradiçõesnão podeaíserconcebidocomoo amolecimentodeumnúcleodurológico:"A heterogeneidadeconstitutiva"dalínguanãoseconfundecomamanipula- çãoostentatóriada"heterogeneidademostrada"(cf. sobreestaquestãoos trabalhosde1.Authier,particularmenteAuthier-Revuz,1982). Portanto:nãoabrirmãodessesdoisartigos(de"fé racional")enuncia- 24 porJ. C. Milner,quaissejam: "- nadadapoesiaéestranhoà língua; - nenhumalínguapodeserpensadacompletamente,se a ela nãose integraa possibilidadedesuapoesia"(l.C. Milner, "RomanJakobson,ou lebonheurparIa symétrie"1n:Milner, 1982:336) impõeàpesquisalingüísticaaconstruçãodeprocedimentos(modosdein- terrogaçãodedadose formasderaciocínio)capazesdeabordarexplicita- menteo fato lingüísticodoequívococomofato estruturalimplicadopela ordemsimbólica,ouseja,trabalharno pontoemqueacabaa consistência darepresentaçãológicainscritanoespaçodos"mundosnormais". O objetodaLingüística(o própriodalíngua)apareceassimatravessa- do por umadivisãodiscursivaentredois espaços:o da manipulaçãode significaçõesestabilizadas,normatizadasporumahigienepedagógicado pensamento,eo dastransformaçõesdosentido,escapandoà todanormaa priori, deumtrabalhodosentidosobreo sentido,tomadono lanceindcl'i- nidodasinterpretaçõesI? • A fronteiraentreosdoisespaçosé tãodifícildedeterminarqueexiste todaumazona intermediáriade processosdiscursivos(concernenlesao jurídico,aoadministrativoeàsconvençõesdavidacotidiana)queoscilam emtornodestafronteira:eo queasseguraaeficáciadissoéprecisamentea possibilidadequeelasoferecemdesejogarcomasaparênciaslógicas,para melhor"fazerpassar"osdeslizamentosdosentido. 3.4Estecaráteroscilanteeparadoxaldoregistrodocomumdosentido, emqueos dois espaçosse interpenetram,pareceterescapadocompleta- menteà intuiçãofilosóficado movimentoestruturalista:designar,desdeo início,"a sociedade","a ideologia",asformasdo"empirismoprático"etc. comoo ponto-cegodeumapurareproduçãodosentido,eraaomesmotem- po autorizara idéiadequeo momentodesuatransformaçãonojogo dos deslocamentossimbólicoséummomentoexcepcional- o momentoherÓi- co solitáriodo teóricoou do poético(Marx/MaIlarmé)comotrabalhoex- traordináriodosignificarite. Estaconcepçãoaristocrática,apropriando-se,defato, domonopÓliodo segundoespaço(odasdiscursividadesnão-estabilizadaslogicamente),per- manecepresa,mesmoatravésdesuaadesão"proletÜria",navelhacertew elitistaquepretendequeasclassesdominadasnuncainventemnada,por- 1."1 · , queelasestãodemasiadamenteabsorvidaspelaslógicasdo cotidiano:no limite,osproletários,asmassas,o povo...teriamumatalnecessidadevital de universoslogicamenteestabilizadosqueosjogos daordemsimbólica nãolhesdizemrespeito! Nesteponto,a posiçãoteórico-poéticado movimentoestruturalistaé insuportável.Por nãoterdiscernidonoqueo humoreo traçopoéticonão sãoo domingodopensamento,maspertencemàscompetênciasfundamen- taisdainteligênciapolíticae teórica,elatinha,deantemão,cedidodiante do argumentopopulistada urgência,já quepartilhavaimplicitamenteo pressupostoessencial. Sabe-sequeasdiversascorrentesestruturalistasnegligenciaram,quase quecomplet~mente,aspesquisasanglo-saxônicassobrea linguagemordi- nária,osproblemaslevantadospelaanálisedasconversaçõese,emgeral, dosacontecimentosdiscursivos"cotidianos",sobo pretextodequeosteó- ricos queos abordaram(na linhagemdos trabalhosde J.L. Austin) não pararamde manifestarumanotávelindiferençapor tudoo quetangeao registrodo inconsciente.Mas nadaprovaquesetratassedeumaimplica- çãonecessária:pesquisasrecentessãomesmobrilhantestestemunhasdo contrário- porexemploo trabalhodeShoshanaFclman(1980)queaborda seriamenteas relaçõesentrea teoriados atosde falae a psicanálise,de FreudaLaean.As perspectivasabertasà reflexãolingüísticapelareleitura pós-estruturalistade Wittgensteincaminhamno mesmosentido:o da desconstruçãodasevidênciasdosujeitopsicológico,nocall1poemqueelas estãomaisbeminstaladas. Evocar,comofoi feitoaqui,o riscodeuma"des-construçãodasteorias lingüísticas"nãovisa,portanto,fazerplanarumasuspeitageralsobreo fatodequemuitoslingüistasconcentramhojeemdiaseusesforçosnaprag- máticaenaenunciação(aliás,comquedireitoestasuspeita?),massomente interrogaramodalidadedominantesobaqualdesenvolve-seestenovoin- teresse:seemtaisassuntos,o lingüistacededeantemãotudoàpsicologia dosujeitodonodesi eresponsávelporsuasescolhas,o querestadorealda línguaenquantoele"fazirrupçãopelorealdeumafalta"(Milner,1982:337)'1 "O queé,então,esteobjeto,queSaussureerigesobreumatábularasa detodasasnoçõesantesreconhecidas?Tocamosaquinoquehádeprimor- dial nadoutrinasaussuriana...esteprincípioé quea linguagem,sobqual- querpontode vistaestudado,é sempreumobjetoduplo..." (Benveniste, 26 1966:40). Princípio simétrico de dualidade ou desdobramento equívoco assimetrisante,a noçãodeduplooscilaentre"a felicidadepelasimetria" paraaqualtendeuJakobson,eo dramadaaberturadecadapalavraquenão paroude perturbarBenveniste.J.C. Milner caracterizaestaoscilaçãono casodaenunciação: "OndeBenvenistevia comoqueos estigmatasnalínguado quelheé radicalmente"outro"- pronomespessoais,temposverbais,performativos- Jakobsonconstruiuumateoriados"embrayeurs",emquetudoseconstitui emquadrosimétrico,dedutívelde umapropriedadeprevisível.Paraisto, bastaqueà subjetividadequeBenvenisteinstituicomoumaaberturanão simetrizávelnalíngua,substitua-seo termomensagem,tomadocomoopo- siçãoregularaotermocódigo(Milner, 1982:336). É aí queMilner, aproximandoBenvenistede Saussure,comentaeste medo,já evocado,quetomao genebrinodiantedesuasprópriasdescober- tas: "Ainda maissingularmente,Saussurepensouterperdidosuareputação desábiopor teracreditadoreconheceranagramas.Jakobsonosencontrae osadaptadetalmodoquenadanelesseleiaa nãoserasviaselegantesde umarazãopoética"(Milner, 1982:336). Entre a simetria(atravésda qual o outroaparececomo o reflexodo mesmo,porumaregradeconversão)eo equívoco(noqualaidentidadedo mesmose desregula,sealteraa partirdo interior),o paradoxoda língua tocaduasvezesnaordemdaregra:pelojogo nasregras,e pelojogo sobre asregras18• Pensara línguacomosimplesjogo nasregrasapresentasempreriscos decobriro espaçoprópriodoqueregulamentao realdalíngua,substituin- do-oporregras(bio)-lógicasdeengendramentodasarborescênciassintáti- cas, constrangidas pela semânticade "sistemas de conhecimento" (discursivamenteestabilizadosem relaçõestemáticase em formaslógi- cas),ou por regrasdejogos de linguagemtranslingüísticosa partirdas quaiso registrosocialdopragmáticoe do enunciativoescapariaao"pró- priodalíngua",desmascarando,dessemodo,o estatutofictício desteúlti- mo. Tentarpensara línguacomoespaçoderegrasintrinsecamentecapazes 27 dejogo, comojogo sobreas regras,ésupornalínguaumaordemderegra quenãoénemlógica,nemsocial:é fazerahipótesedequeasintaxe,como espaçoespecificamentelingüístico,nãoé nemumamáquinalógica(um sistemaformalautônomo,exterioraolexical,aosemântico,aopragmático eaoenunciativo),nemumaconstruçãofictíciadenaturezametalingüística (redutívela efeitosdepoderinscritosemumdomínioque,supostamente, governao discursoescrito). Nestaperspectiva,asintaxeseria,aocontrário,oquetocademaisperto no próprio da língua enquantoordemsimbólica, com a condiçãode dissimetrizar o corpo de regrassintáticas,construindoaí os efeitos discursivosque o atravessam,os jogos internosdestes"espelhamentos" léxico-sintáticosatravésdosquaistodaconstruçãosintáticaécapazdedei- xar aparecerumaoutra,no momentoemqueumapalavradeslizasobre outrapalavra'9. Mais do quecelebrarou lamentara volatilizaçãodo realda língua, tratar-se-iaentãode pensá-Iacomoumcorpoatravessadopor falhas,ou seja,submissoà irrupçãointernadafalta. Tradução:Cekne M. CruzeClémenceJouet-Pastré Notas 1 Uma apresentaçãomaisextensadessatentativade "acupuntura"no corpohistóricoda Lingüísticaencontra-seemGadete Pêcheux(1981). 2Éo títulodeumaobradeF.Roustang,dedicadaaumareflexãosobreaconjunturalacaniana e pós-Iacanianaem'psicanálise. 3 •••••Saussurepensouter perdidosua reputaçãode sábio por ter acreditadoreconhecer anagramas",observaMilner (1982:336). , No L' amourde Ia langue,J.C. Milner reelaboraestetermolacaniano,atravésde uma reflexão sobre o statusda disciplina lingüística, tomada"anfibiologicamente"entre as representaçõesinscritíveisna"ciênciauniversaldossimbolismospossíveis,emoutraspalavras, a lógica"e a insistêncianalínguado "pontodepoesia"comoefeitodo inconsiente.La lallgue illtrouvablese apóia na reflexãode Milner paratrabalhar,contraas idéiaspré-concebidas, estefatoinauguraldaGGT: aprimeirateoriasintáticaasuporumacontinuidadedogramatical e do a-gramatical,na medidaem que ela constróio gramaticalpor outravia que não em relaçãoàquiloqueapresentaerro,vaii.açãooudesvioanormal.Na mesmaocasião,demonstrou- 28 sequeChornskye oschomskianosnãoparáramdeencobrirestadesclllll'l'rlllllll'd(·"'lIl1l'1ll1.(' quechegarama seusfins... S Ao contrário,os efeitosdo estruturalismofrancêsnosEUA, naAlemanha,1IIIIIll!IalnlllllRII ultrapassaram,durantetodoesteperíodo,o círculouniversitáriodosdeparlalllclllllh.11'1111111'1', e de filosofia, e o de algunsgrupospolíticos de esquerda,prevenidos· alb:llmllsVell', ,Ir maneiraextremamenteprecisa- da existênciadasteorias"parisÍl:nses".1'111'I'lIlOI'S1IIl,'.IlII111· evidentes,a "recepção"foi muitomaioremaispolíticaempaísescomoa IlÚliae lia A1111'1"'li Latina. •Sabe-sequeesteexemplocanônicodaGGT foi declarado"agramatical"a partirtia I"'" 111 propostaemAspects,enquantoem SyntacticStructures,Chomskysemosll'Oonlais1"11111'1111' ef. sobreesteaspectoGadete Pêcheux(1981:168-9). 7 Em particularNewell e Simon,nademonstraçãoautomáticade teoremasIIIaIClIllílil'U'. 8 O ideal de Roman Jakobson foi o de integraro lodo da Lingüística (se 11:11111111111111 Lingüística).J.C. Milner ("A Roman Jakobson,ou le bonheurpar Ia symétrie"in: MillI'" (1982:329-327»mostraquenestedesejodaEnciclopédia"trata-sede algodiferenleti•.III1I1l vontadede planejamento- mesmose,sob o pesodastecnologiaspróximas,Jakllllslln p(\tI•.. longeda Europa,parecerquecediaa isso" (p.335). 9 Enquantoa psicanálisequestionaa noçãodeumeuvoluntaristae unitárill,slIa11i,01(111111111 adeumaidéiasubversivaengajadaemumalutacontraa normalização.E a tellslIlI•.1110•.1111111 concepçãodoeu"centrada"e outra"descentrada"estevequasesemprenoceme.11111111ai1111(I conflitoentreLacane os psicólogosdo euconduziuestalutaa seupontode illullllk ••, ~lId" Lacan mobilizou em duasoutrasconcepçõesdo pensamento,inependcnlcsd" )lsinlllllll",'. mas,comoela, ligadasa umanoçãodescentradadoeu;refiro-me,é claro,noCSIIIIIII,,,li',IIIOr aomarxismo"(Turkle, 1982:9). 10 Nas primeiraspáginasdeLer o Capital,L. Althussertocavaexplicitamcntc'11'.,1"'I"I'!.ll1o política,nos seguintestermos:"A partirde Freud,começamosa suspeitardo lI"C CMIII",. " portantodoquefalar(ecalar-se)querdizer;queeste"quer-dizer"do falaredOI:SCII'",cI,'"n,IIIl'. sob a inocênciada palavrae da escuta,a profundidadeassinalávelde 1111I.111)11••III1Hlo.o "quer-dizer"dodiscursodoinconsciente- esteduplofundosobreoquala l.iIlV.lIfs1ic:a'"0dl'lll". nosmecanismosda linguagem,pensaos efeitose ascondiçõesformais"((1.14I~) " O termo"estruturalismopolítico" designaaqui,especialmente,a retolllatlllllllllllSM'1illll" na teoria marxista,mas não pretendelocalizar ao mesmotempoo polfl;m; o III0VIIIIl'1I10 estruturalista,comoumtodo,contribuiuparao alargamentodo polltico: se"Indo t' pollll•.••... as questõesexplicitamelltepolíticas (particularmenteas que se forlllulullI no I'NllIl~O.1"•• estratégiasdeconquistaou demanutençãode Estado)devemcederuosprivil~IlION (2 Vinte anospassaram-seentreo fenômenoe sua"recepção"IIOSEstil(losUnidos' 1I'IIIpO paraqueafontedofenômenoparedeseagitar,paratomar-seumobjetointdcl'lnnlUlIINllnllvd'/ Estejá tinhasidoo casoda fenomenologiahusserlianae do exbtcnciulislllO,"n',relllllo,,''li," E~~ a partirdosanos60. Haveriaespaçoparaelucidarasquestõescomplexasentreoredllciollislnodelltistll(1111111I1110 o serhumanQcomoo animalmaiscomplexo),asideologiasdo cotidiullopnítlw,' lI" .IIVI'I"II', raízeshistóricasdo populismo,cujaemergênciaatualconstituiullltl'unfo )lollliUl '"111"1 I'Sobre a existênciado simbólicocomolocal deumapanilhll cntreentll~IlI.inlltll.lkll t' 11 Psicologia,vertambémGadet,Haroche,Henrye Pêcheux(no prelo). 15Paralocalizar-seentreasmáquinaseletrônicase os mecanismosSOdllis,pOlll'".' "1'1111"1' recorrerà normacomportamentalcomo critériodelieional:elU um UniVI'INOIll) 111hnltt~lllI" que não correspondemmais à definição clássica do objeto (já que "lululII" I' ,,111111111111 JW "emoções"),as criançassãoobrigadasa traçarnovasfronteirasparadefinir suaidentidade: "as pessoas,são os que vão ao restaurantee têmumafamília" acaboupor responderuma meninaamericanaem umarecenteenquetesociológicado MIT. 16 Retiradode"L' intelligenceartiticielleestdéjànée",rubrica"Sciences"do nO2-8 Abril de 1982da revistaI'Express,p.1OI. "Esta divisãorepercutenonfveldavontadepolftica;noprimeiroespaço,odesenvolvimento dasnovastecnologias(informática,engenhariabio-médica,telecomunicações)constituium dosmaiorestrunfosdaestratégiaeconômicagovernamentalparasairdacrise:comreservasa um controle dos efeitos neotaylorianosdesta"revolução tecnológica",os objetivos são politicamenteclarosesocialmentepoucocontestáveis.Mas,comreferênciaaosegundoespaço, emergetambém,face ao "impcrialismo financeiroe cultural" das grandesindústriasda comunicação,a vontadcpolíticade umarcsistênciaà uniformizaçãodos modosde vida,das formasdc pensamentoe deexpressão(cf. recentementea declaraçãodo ministroJ. Lang da UNESCO e,em umoutroplano,a decisãodecriarumCol/egell/Iemaliol/aldePhilosophie). Em cada um destesdois espaços,a vontadepolítica temexcelentesrazões;masnão se tratamdemundosst:parados,comomostra,porext:mplo,a questãodotratamentodos"dados texlUais",constitnindoumdoscasos-limitesemqueaLingüfsticaencontra-seimplicada.Seo inevitávelcontatoentreos dois espaçosdeveriaunir-sepor uma"transferênciatecnológica" dosconceitos,softwares,metalinguaslógicase procedimentosdo primeiroespaçoemdireção ao segundo,que lugarrestàriaà incôntornávelambigüidadedaslfnguasnaturais,aoslimites de transparênciade todopensamento,ao surgimentodo sentidoCOlllO eventoimprevisívele não-reprodutfvel? Retiraro desafiosupõenãocederao "próprioda língua" - dando-se,senecessário,meios de confrontar-secom as tecnologiasoriundasdo primeiroespaço,paratrabalhara fim de deslocá-Ias,paraarriscar,tambémnestecampo,novasviasqueresistamà inclinaçãonatural . datransferênciateenológieadominante.Limitar-me-eiaevocaro casoqueconheçoumpouco melhor:o da construçãode algoritmosinformatizudosno campoda análisedo discurso. Certamentehaveriamuitosoutrosexemplos. 18 RetomoaquiasformulaçõesdeF. Gadet,inscritasem umareflexãosobreu línguacomo espaçoderegrasatravessadoporfalhas.Cf., porexemplo,"enganara língua"(Gadet,1981:117- 126),em queela propõeconcebera regracomo"comportandoem seupróprioprincípioum espaçodejogo: no sentidode umjogo de criançaou de sociedade,mastambém,talvez,do jogo deum músculoou dojogo deummecanismo"(p.214). 19 A noçãode"espelhamento"léxico-sintáticofoi introduzidaemAnálisedo Discursopor J.M. Marandin.Cf. "Linguistiqueet algorithmestextuels",comunicaçãofeitano Colloque Internationald' InfoffilatiqueetSciencesHumaines,Liege, novembrode 1981. BIBLIOGRAFIA: ALTHUSSER, L. (1965)Lire Le Capital.Paris:Maspero,Traduçãobrasi- leira:Ler O Capital.Rio deJaneiro,RJ: Zahar,1979/1980. AUTHIER-REVUZ, J. (1982)"Hétérogénéitémontréeet hétérogénéité constitutive:élémentspouruneapprochede I'autredansle discours" Dans:DRLAV, RevuedeLinguistique26(pp.91-151). 30 BENVENISTE, E. (1966) "Saussure apres un demi-siec1e".Dans: BENVENISTE, E. Problemes de Linguistique Générale. Paris: Gallimard.Traduçãobrasileira:"Saussureapósmeio século"In: Pro- blemas de Lingüística Geral 1. Campinas, SP: Pontes/Editora da UNICAMP, 1991,pp.34-49. CERTEAU, M. de.(1980)L'inventionduquotidien:UGE (=10/18.1363). Traduçãobrasileira:A invençãodocotidiano:arlesdefazer. Petrópolis,RJ: Vozes,1996. CULIOLI, A. (1968)"La formalisationenlinguistique".Cahierspour l'analyse9 (pp.l06-117). fELMAN, S. (1980)Le scandaleducorpsparlanl,Don Juan avecAustin ouIa séduclionendeuxlangues.Paris:Seuil. FOUCAULT, M. (1976)La volontédesavoir.Paris:Gallimard. GADET, F. (1981)"TricherIa langue"Dans:Matérialitésdiscursives.éd. parCONEIN, B. etaI..LiJle: PUL, pp. 117-126. GADET, F., HAROCHE, CL., HENRY, P., PÊCHEUX, M. "Note SUl' Ia questiondulangageetdusymbolismecnpsychologie".(àparaí'lredans: FundamentaScientiae). GADET, F.& PÊCHEUX, M. (1981)La langucintrouvable.Paris:Maspero. TraduçãobrasileiradeMARIANI, B., noprelo. GADET, F. &PÊCHEUX, M. "La IinguistiquehorsJ'elle-même;I'hisloire absolutement",L'hisloiredesscienceshumaines,pourquoiecomment? Nanterre,1980(Ronéo,1981) GRUNIG, B.-N. (1981) "La c1ôturcchomskyenne".Paris: Centre de recherchesdeI'universilédeParisVIIl. =DRLAY. RevuedeIinguislique 24. HAROCHE, Cl., HENRY, P.,PÊCHEUX, M. (1971)"La sémantiqueell~ coupuresaussurienne:langue,langage,discours.Langages24,pp.93- 106. MARANDIN, J.M. "Linguislique et algorilhmeslextuels". (CoIloque Internationald' InformatiqueetSciencesHumaines,Liêge, Novembre 1981.À paraí'tre), MILNER,J .C. (1976)L'amourde Ia langue.Paris,Seuil.Traduçãobrasi- leira:O amordalíngua.PortoAlegre,RS: ArtesMédicas,1987-,(1982) Ordresetraisonsdelangue.Paris,Seuil. PLON, M. (1976)La théoriede jeux: une politique imaginaire.Paris: Maspero. 31 SABAH, G., RADY, M. SOQUlER, L., BERTHELIN, 1.B. (1981),"Un systememodulairedecomprehénsiond'histoiresracontéesenfrançais". T.A. Informations22,2, pp.3-33. TURKLE, S. (1982)La Francefreudienne.Paris:Grasset. 32 LA ACADEMIA ESPANOLA Y LA HISTORIA DE LA GRAMÁTICA Carlos Rafael Luis CONICET e InstitutodeLingüística(FacuItaddeFilosofía y Letras,UBA) Resumo:A Real AcademiaEspanolapublicousuas Gramáticasentre 1771e 1931,como intuitodemanterumanormauniformeemtodosos .territóriosOfldeo espanholéfalado. Essestextostiveraminfluênciano ensinoda língua,apesardoaparecimentodeoutrasgramáticasdemai- or qualidadena Espanhae na Américaduranteo séculoX1X.O texto acadêmico- publicadocompequenasalteraçõesao longo destes160 anos- recebe/lcríticasdiversas,relacionadasprincipalmenteà suade- pendênciadagramtÍticalatina.Na segundametadedesteséculo,apare- ceramnovosmateriaiscomalgumasnovidadesquantoà consideração deoutrasvariedadesdo castelhano,coincidentescomumaconcepção diversada autoriaeumaatitudemaisatentaàsnovascontribuiçõesda lingüístiClJ. Abstract:111eRealAcademiaEspanolapublisheditsGrammarsbetween 1771and 11)31,withtheaimofkeepinga uniformliguisticnormin aU territorie.vwltereSpanisltisspoken.Thosegrammarsstronglyinfluenced the teaclting(~lSpanish ill spite of other bettergrammars' having appeare'dil/ Spail/alldAmericaduringtheX1Xcentury.TheAcademic textwhichlUIS beenpubli'~'hedwithslightchangesin these160yearshas comeill j(Jr variouscriticisms,mainlyconcerningits dependenceupon Latin gral/ll/lU1:111 thesecolldhalI of thiscentury,theAcademiaissued newmateriaIswhichpresentedcertaininnovationswithregardtotaking into accountothervarietiesof Castilianwhichwerecoincidentwitha newconceptianaf authorshipanda moreattentiveauitudetowardsthe newcOlltributionsof Linguistics. LA REAL AcademiaEspanoladeIaLengua(RAE) fuecreadaen1713. Ya en su actade fundaciónse declarabael propósito normativo:sus miembroshandeser"capacesdeespeculary discernirlos erroresconque sehalIaviciadoel idiomaespanol",La primeraobrarealizadaporelcuerpo 33
Compartilhar