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DIMENSIONAMENTO DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA ÉTICO Angelo Vargas Organizador • Angelo Vargas • João Batista Andreotti Gomes Tojal • Valéria Sales dos Santos e Silva • Américo Valdanha Netto - Erica Beatriz Lemes Pimentel Verderi - Sebastião Gobbi • Rony Tschoeke • Andreia Marcia Horst • Valéria Nascimento Lebeis Pires • Ana Beatriz Moreira de Carvalho Monteiro • Ercole da Cruz Rubini • Edvaldo de Farias • Cayo Lames DIMENSIONAMENTO DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA ÉTICO CONFEF Apoio: QUESTÕES ÉTICAS E LEGAIS DA AVALIAÇÃO FISICA: UMA REFLEXÃO Ana Beatriz Moreira de Carvalho Monteiro A avaliação física é uma ferramenta importante na rotina de trabalho do prossional de Educação Física. Geralmente é o primeiro contato entre pro- ssional e cliente, onde alguns testes e medidas especícos serão utilizados para identicar as necessidades e limitações do indivíduo, seja criança, adulto ou idoso. Por exemplo, a anamnese ajudará o prossional a obter informações preliminares sobre o risco para o desenvolvimento de doenças coronarianas e também a identicar a intensidade do treinamento, podendo ser leve, mo- derado ou vigoroso. Caso sejam observados fatores de risco que possam comprometer o indivíduo ao iniciar a prática de atividade física, o prossional deverá solicitar uma avaliação médica. É importante ressaltar que a avaliação clínica, realizada pelo médico, irá informar, através do atestado médico, se o cliente está apto ou não a iniciar um programa de exercício físico. Já a avalia- ção física, realizada pelo prossional de Educação Física, tem como objetivo a avaliação morfológica e funcional. Ambas são necessárias para uma melhor compreensão das necessidades do cliente. Entende-se que todo prossional de Educação Física deverá fazer uma ava- liação antes (diagnóstica), durante (formativa) e ao nal (somativa) de uma inter- venção, pois só assim, irá oferecer um serviço seguro e de qualidade. Para isso, o Conselho Federal de Educação Física – CONFEF elaborou a Nota Técnica nº 002/2012¹, a qual informa, orienta e padroniza as condutas e procedimentos no uso da avaliação física como elemento principal para prescrição de exercícios. Mas será que os prossionais estão realizando a avaliação física? Será que entendem a real importância deste procedimento? Será que conhecem as consequências legais de um ato decorrente de imperícia e negligência? Pro- vavelmente, se uma pesquisa for realizada para vericar quantos prossionais ou estabelecimentos de prestação de serviços em atividades físicas utilizam a avaliação física, os resultados poderão ser insatisfatórios. Cabe aos pros- DIMENSIONAMENTO ÉTICO DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA 102 sionais exigir a realização de uma avaliação física de qualidade e não apenas aceitar o atestado médico. Este, muitas vezes é solicitado de forma irrestrita e protocolar, principalmente após as determinações legais que surgiram no estado do Rio de Janeiro na década de 1990 e perduram até os dias de hoje. Segue a sequência cronológica das leis referentes à apresentação do atestado médico para iniciar a prática de atividade física: 1. Em 15 de Julho de 1992 entra em vigor no estado do Rio de Janeiro a Lei nº 2.014 ², a qual tem a seguinte redação no art. 1º: Fica obrigatória a apresentação de atestado médico de ap- tidão física, no ato da matrícula nas academias e ginásios de artes marciais, musculação e ginástica de qualquer tipo, que deverá ser renovado a cada 3 (três) meses e arquivado e anota- do na cha do aluno ou usuário. 2. Depois o art.1º da Lei 2.014/92 passará a ter a seguinte redação em 2007, através da Lei 4.978 !" Fica obrigatória a apresentação de atestado médico de ap- tidão física, no ato da matrícula nas academias e ginásios de artes marciais, musculação e ginástica de qualquer tipo, que deverá ser renovado a cada 12 (doze) meses, arquivado e anota- do na cha do aluno ou usuário. 3. Em maio de 2014, entra em vigor a Lei 6.7654 no estado do Rio de Janei- ro, a qual dispõe da obrigatoriedade do Questionário de Prontidão para Atividade Física e o Termo de Responsabilidade para prática de atividade física, conforme os artigos e anexos citados abaixo: Art. 1º Considera-se obrigatório e imprescindível para a prática de qualquer ati- vidade física e esportiva, em clubes, academias e estabelecimentos similares, o preenchimento, pelo interessado, do Questionário de Prontidão para Atividade Física constante do Anexo I e do Termo de Responsabilidade para a Prática de Atividade Física constante do Anexo II desta Lei. Parágrafo único. Se o interessado for menor de idade, o Questionário e o Termo de Responsabilidade deverão ser preenchidos e assinados pelo responsável le- gal, juntamente com sua autorização por escrito. Art. 2º Fica dispensada a apresentação de atestado médico ou a obrigatoriedade de qualquer outro exame de aptidão física aos interessados que responderem negati- vamente a todas as perguntas do Questionário de Prontidão para Atividade Física. ANA BEATRIZ MOREIRA DE CARVALHO MONTEIRO 103 Parágrafo único. Aos que responderem positivamente a qualquer uma das per- guntas do Questionário, será exigida a apresentação de atestado médico de apti- dão física, na forma das Leis Estaduais nº 2.014, de 15 de julho de 1992, e 2.835, de 17 de novembro de 1997, o qual deverá ser anotado e arquivado junto ao pron- tuário do interessado. ANEXO I QUESTIONÁRIO DE PRONTIDÃO PARA ATIVIDADE FÍSICA Este questionário tem por objetivo identicar a necessidade de avalia- ção por um médico antes do início ou do aumento de nível da atividade física. Por favor, assinale “sim” ou “não” às seguintes perguntas: 1) Algum médico já disse que você possui algum problema de cora- ção ou pressão arterial, e que somente deveria realizar atividade física supervisionado por prossionais de saúde? ( ) Sim ( ) Não 2) Você sente dores no peito quando pratica atividade física? ( ) Sim ( ) Não 3) No último mês, você sentiu dores no peito ao praticar atividade física? ( ) Sim ( ) Não 4) Você apresenta algum desequilíbrio devido à tontura e/ou perda momentânea da consciência? ( ) Sim ( ) Não 5) Você possui algum problema ósseo ou articular, que pode ser afe- tado ou agravado pela atividade física? ( ) Sim ( ) Não 6) Você toma atualmente algum tipo de medicação de uso contí- nuo? ( ) Sim ( ) Não 7) Você realiza algum tipo de tratamento médico para pressão arte- rial ou problemas cardíacos? ( ) Sim ( ) Não 8) Você realiza algum tratamento médico contínuo, que possa ser afetado ou prejudicado com a atividade física? ( ) Sim ( ) Não 9) Você já se submeteu a algum tipo de cirurgia, que comprometa de alguma forma a atividade física? ( ) Sim ( ) Não 10) Sabe de alguma outra razão pela qual a atividade física possa eventualmente comprometer sua saúde? ( ) Sim ( ) Não DIMENSIONAMENTO ÉTICO DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA 104 ANEXO II TERMO DE RESPONSABILIDADE PARA PRÁTICA DE ATIVIDADE FÍSICA Declaro que estou ciente de que é recomendável conversar com um mé- dico antes de iniciar ou aumentar o nível de atividade física pretendido, as- sumindo plena responsabilidade pela realização de qualquer atividade física sem o atendimento desta recomendação. (Local e data) (Nome Completo e assinatura) Infelizmente, muitos estabelecimentos de atividade física deixaram de rea- lizar, por completo, a avaliação física após a Lei 6.765 entrar em vigor. Esta lei pode até proteger o prossional de Educação Física das consequências legais da prática de atividade física, mas não o exime das responsabilidades relaciona- das à prescriçãoe orientação do exercício físico. Durante a atividade física, prin- cipalmente aquela de intensidade vigorosa, o prossional deverá estar atento à sensação de esforço do seu cliente, pois o artigo 2 desta lei não garante, em nenhum momento, que o indivíduo responderá com veracidade a todas as per- guntas. Para piorar a situação, geralmente quem aplica o questionário é a re- cepcionista do estabelecimento, que desconhece a importância e a seriedade das perguntas, deixando o cliente à mercê de um serviço de má qualidade. O questionário sugerido pela lei 6.765, parece que foi desenvolvido com base nas perguntas do Questionário de Prontidão para Ativida- de Física (PAR-Q - ©Canadian Society for Exercise Physiology), mas sua validade é desconhecida. Já o PAR-Q é um instrumento validado e re- comendado para indivíduos entre 15 e 69 anos que queiram iniciar a prática de exercício físico de intensidade leve a moderada. Segundo o Colégio Americano de Medicina Esportiva (ACSM), a realização de exa- me médico é recomendada para indivíduos que foram diagnosticados com risco moderado para doenças cardíacas e que queiram iniciar um ANA BEATRIZ MOREIRA DE CARVALHO MONTEIRO 105 programa de atividade física de intensidade vigorosa. Já aqueles com alto risco, deverão realizar o exame médico tanto para iniciar um pro- grama de atividade física de intensidade moderada e ou vigorosa. Fica claro, que o questionário é apenas uma ferramenta de identificação de riscos ao iniciar a pratica de atividade física, ou seja, para conhecer melhor o cliente, o profissional deverá realizar uma estratificação de risco detalhada, além da verificação da pressão arterial em repouso e, se possível, um eletrocardiograma. O CONFEF reconhece, por meio da Resolução Nº46/20027, as competên- cias e atribuições do prossional de Educação Física, como por exemplo, diag- nosticar, planejar, supervisionar, dentre outras. Estas três competências estão relacionadas à avaliação física. O diagnóstico/prognóstico, após realizado, possibilitará o planejamento e supervisão do plano de trabalho. Através da avaliação formativa é possível vericar se a forma de trabalho está adequada e, portanto, já apresenta algum resultado. Caso contrário, o treinamento de- verá ser ajustado para alcançar os objetivos. Uma das intervenções do prossional de Educação Física é avaliar o estado funcional e morfológico das pessoas, como também estraticar e diagnosti- car fatores de risco à saúde5. “...é imprescindível conhecer em profundidade os benefícios e os riscos potenciais que a prática de exercícios físicos pode trazer às pessoas de diferentes idades e as limitações inerentes aos diversos grupos de risco”. É notório que o prossional de Educação Física deva conhecer detalhada- mente as condições gerais do seu cliente. Para isso, é necessária uma avalia- ção física ampla e sistemática, iniciada com anamnese completa seguida de testes especícos relacionados à avaliação antropométrica, análise postural e avaliação da aptidão física relacionada à saúde, como, aptidão cardiorrespira- tória, força/resistência muscular e &exibilidade. Só assim, o prossional pode- rá prescrever o exercício de forma individualizada, tornando sua intervenção mais segura e ecaz. Aqueles que não seguem este procedimento cam mais vulneráveis a causar danos aos seus clientes e poderão responder civilmente, devendo o lesionado ser indenizado6 com base no Código Civil, art. 186: DIMENSIONAMENTO ÉTICO DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA 106 Art. 186. Aquele que por ação ou omissão voluntária, negligên- cia ou imprudência, violar o direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. O livro publicado pelo CONFEF (2010)5, Recomendações sobre condutas e procedimentos do pro#ssional de Educação Física na atenção básica à saúde, acrescenta informações importantes sobre o tema, quando diz que: “O dever fundamental da preservação da saúde dos beneci- ários implica responsabilidade social do prossional de Edu- cação Física, cabendo-lhe assegurar uma intervenção segura, competente e atualizada, livre de danos decorrentes de impe- rícia, negligência ou imprudência, utilizando para isso todo conhecimento, habilidade e experiência proporcionada pela sua formação acadêmica inicial e continuada”. Um prossional comete imperícia quando não tem qualicação teórica e/ou prática para realizar tal procedimento, ou seja, não adquiriu conheci- mento básico da prossão. Comete negligência quando age com descuido ou desatenção, e imprudência quando age sem cautela, ou seja, de forma precipitada. É inadmissível para qualquer prossão, principalmente as rela- cionadas à saúde, que prossionais cometam falhas como as citadas acima, e na Educação Física não é diferente. Por exemplo, aquele prossional que prescreve um treinamento sem conhecer as condições iniciais do seu cliente está sendo negligente, e aquele que não tem competência nem habilidade para avaliar, está cometendo imperícia. Outro ponto importante é o conhecimento das responsabilidades e deveres do profissional de Educação Física citados no Código de Ética profissional8. Este código determina 12 itens norteadores para sua apli- cação, que fixam a forma pela qual se devem conduzir os profissionais de Educação Física registrados no Sistema CONFEF/CREFs. Vejamos o exem- plo do XII item8: “Levando-se em consideração os preceitos estabelecidos pela bioética, quando de seu exercício, os Prossionais de Educa- ção Física estarão sujeitos sempre a assumirem as responsabi- lidades que lhes cabem”. ANA BEATRIZ MOREIRA DE CARVALHO MONTEIRO 107 Agora vejamos os incisos do capítulo III, “Das Responsabilidades e Deveres”: !"!#$$%&'(#(!#!$%'$!)%*%+,-.(-/$!'0!$%(1-2/!3(/+$$-/*#4! seguro, competente e atualizado, prestado com o máximo de seu conhecimento, habilidade e experiência; 5!"!%4#)/(#(!/!3(/&(#0#!6%!#7-1-6#6%$!6/!)%*%+,-.(-/!%0! função de suas condições gerais de saúde; 5!"!/8%(%,%(!#!$%'!)%*%+,-.(-/9!6%!3(%8%(:*,-#!3/(!%$,(-7/9! uma orientação segura sobre a execução das atividades e dos exercícios recomendados. Com base no código de ética, ca claro que prescrever sem conhecer as condições gerais de saúde do cliente é uma infração ética que poderá tra- zer consequências legais graves6. A prática do exercício físico não pode ser desenvolvida de forma indiscriminada e irresponsável, pois a falta de quali- dade e responsabilidade ética, além de ser considerada negligência prossio- nal, poderá ocasionar a má signicação da prossão e, consequentemente, do prossional de Educação Física perante a sociedade10. Com isso, podemos concluir que é RESPONSABILIDADE e DEVER de todo prossional de Educa- ção Física conhecer de forma detalhada o estado de saúde de seu cliente an- tes de iniciar um programa de exercícios. Ana Beatriz Moreira de Carvalho Monteiro Graduação em Educação Física - UFRJ Mestrado em Ciência da Motricidade Humana - UCB Coordenadora do Curso de Educação Física - UNESA – campus R9 Coordenadora do Projeto de Extensão Social “Aptidão Física e Controle do Peso em Crianças e Adolescentes” – UNESA – campus R9 Professora das disciplinas de Medidas e Avaliação em Educação Física e Avalição Morfofuncional – UNESA http://lattes.cnpq.br/7222342538968001 DIMENSIONAMENTO ÉTICO DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO FÍSICA 108 Bibliogra%a: 1 - Conselho Federal de Educação Física (CONFEF). Nota técnica nº"##$/2012. A avaliação física em programas de exercícios físicos e desportivos, 2012. 2 - Lei nº 2014, de 15 de julho de 1992. Dispõe sobre obrigatoriedade de exa- mes médicos e acompanhamentopermanente de prossionais de Educação Física nos locais que menciona e dá outras providências. Rio de Janeiro, 1992. 3 - Lei nº 4978, de 08 de janeiro de 2007. Altera a redação do art. 1º da Lei 2014 de 1992, que “dispõe sobre obrigatoriedade de exames médicos e acom- panhamento permanente de prossionais de Educação Física nos locais que menciona” e dá outras providências. Rio de Janeiro, 1992. 4 - Lei nº 6765, de 05 de maio de 2014. Dispõe sobre a prática de atividades físicas e esportivas em clubes, academias e estabelecimentos similares, e dá outras providências. Rio de Janeiro, 2014. 5 - Conselho Federal de Educação Física (CONFEF). Recomendações sobre con- dutas e procedimentos do prossional de Educação Física na atenção básica à saúde, 2010. 6 - Conselho Federal de Educação Física (CONFEF). Aspectos jurídicos da Inter- venção do Prossional de Educação Física, 2014. 7 - Resolução nº%& de 19 de março de 2002. Dispõe sobre a Intervenção do Pro- ssional de Educação Física e respectivas competências e dene os seus cam- pos de atuação prossional, 2002. 8 - Conselho Federal de Educação Física (CONFEF). Código de Ética dos Pros- sionais de Educação Física, 2015. 9 - American College of Sports Medicine (ACSM). Diretrizes do ACSM para os testes de esforço e sua prescrição. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 9ª ed., 2014. 10 - Tojal, Da Costa e Beresford. Ética profissional na Educação Física. Sha- pe, 2000.
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