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1 A LÓGICA MOLECULAR DA VIDA – BIONERGÉTICA Raúl René Valle, PhD QUE DISTINGUE ORGANISMOS VIVOS DE OBJETOS INANIMADOS? O grau de complexidade química e organização Organismos vivos extraem, transformam e usam energia do ambiente, ge- ralmente na forma de nutrientes químicos ou irradiação solar. Têm capacidade de se autorreplicar e auto-organizar, uma propriedade que é a quintessência de estar vivo. BIOQUÍMICA Bioquímica examina os processos pelos quais a energia é extraída, canalizada e consumida – bioenergética. Descreve, em termos moleculares, a estrutura, mecanismos e processos químicos compartilhados por todos os organismos e proporciona princípios organizadores comuns a vida em suas diversas for- mas, princípios que chamaremos coletivamente a lógica molecular da vida. PRINCÍPIOS DA LÓGICA MOLECULAR DA VIDA A UNIDADE QUÍMICA DOS ORGANISMOS VIVOS Todos os organismos formam moléculas com as mesmas classes de subu- nidades monoméricas: 20 aminoácidos, 8 nucleotídeos; o A maioria dos monômeros tem mais de uma função. A estrutura de uma macromolécula determina funções biológicas especifi- cas; Cada indivíduo é definido por um determinado conjunto de macromolé- culas. PRODUÇÃO E CONSUMO DE ENERGIA NO METABOLISMO Organismos vivos criam e mantêm suas complexas e ordenadas estruturas utilizando energia extraída de combustíveis ou da luz solar; Células vivas são maquinarias químicas que funcionam a temperatura constante; As necessidades energéticas da maioria dos organismos são supridas, dire- ta ou indiretamente, pela energia solar. 4H ―――→ 4He; fotossíntese. 2 O fluxo de elétrons em reações de óxido-redução governa a transdução de energia em células vivas. (Oxidação= perde elétrons, redução= ganha elé- trons). Organismos vivos são interdependentes, intercambiando energia e matéria via o ambiente. Bioenergética: transformações e trocas de energia das quais TODOS os organismos vivos dependem. É o estudo quantitativo das transduções ou transferências energéticas que ocorrem em células vivas e a natureza e fun- ções dos processos químicos que ocorrem nessas transduções. o Sistema: tudo dentro de um espaço definido. Conjunto cujos elementos mantêm entre si relações definidas. o Universo: o sistema e seu arredor. o Sistema fechado: se não há troca de matéria nem de energia com o re- dor. o Sistema isolado: se o sistema troca energia, porém não troca matéria. o Sistema aberto: se há troca de energia e matéria com o seu arredor, um organismo vivo. Primeira lei da termodinâmica: Principio da conservação da energia. Em qualquer mudança física ou química, a energia total do universo se man- tém constante. A energia pode mudar de forma ou pode ser transportada de uma região para outra, porém ela não pode ser criada nem destruída. Segunda lei da termodinâmica (Lei da Entropia, S): O universo sempre tende a um aumento de desordem. Em todos os processos naturais a entro- pia do universo aumenta. Nenhum processo que implique numa transfor- mação energética ocorrerá espontaneamente, a menos que haja uma de- gradação de energia de uma forma concentrada para uma forma mais dispersa (ou desorganizada). Assim sendo, nenhuma transformação de energia é 100% eficiente. Os organismos vivos possuem uma característica termodinâmica essen- cial: eles conseguem criar e manter um alto grau de ordem interna, ou uma condição de baixa entropia, que é obtido através de processos bio- lógicos contínuos e eficientes de dissipação energética. 3 Luz ------------------ Alimento Alimento ----------- Calor Ordem -------------- Biomassa Desordem ---------- Calor A respiração expulsa a desordem obedecendo, entretanto as limitações termodinâmicas. A razão R/B (razão entre manutenção da estrutura e a respiração) foi cunhada por Schrödinger como sendo a razão de ordem termodinâmica ou taxa de reposição ecológica. Energia livre de Gibbs: expressa a quantidade de energia disponível ca- paz de fazer trabalho durante uma reação a temperatura e a pressão constantes; Equilíbrio: a taxa de formação de produto é exatamente igual à taxa na qual o produto é convertido em substrato= equilibro dinâmico; Mudança de energia livre, ΔG: mudança de energia quando o sistema vai do seu estado inicial ao equilíbrio sem mudança de temperatura ou pres- são; Reações exergônicas: reações que ocorrem espontaneamente (os produtos tem menor energia livre que os substratos) na qual há liberação de ener- gia livre que pode ser utilizada para a realização de trabalho. ΔG é nega- tivo; Reações endergônicas: requerem inputs de energia, existe ganho de ener- gia livre. O valor de ΔG é positivo; Entalpia, H: expressa o conteúdo de calor do sistema em estudo. Reflete o número e classe de ligações nos substratos e produtos; Quando a reação química libera calor= exotérmica. O conteúdo de ca- lor dos produtos é menor que o dos substratos; ΔH é negativo. Quando a reação química obtém calor= endotérmica. O conteúdo de ca- lor dos substratos é menor que o dos produtos; ΔH é positivo. Entropia, S: expressa a desordem ou a aleatoriedade no sistema. ΔS é posi- tivo quando a entropia aumenta e negativo quando diminui. 4 Quando os produtos da reação são menos complexos e mais desordena- dos que os substratos a reação procede com ganho de entropia. Quando os produtos da reação são mais complexos e menos desordena- dos que os substratos a reação procede com perda de entropia. As unidades de ΔH e ΔG são J/mol ou calorias/mol (1 cal= 4.184 J). As unidades de ΔS são J/mol K. ΔG= ΔH – T ΔS. A MUDANÇA DE ENERGIA LIVRE PADRÃO É DIRETAMENTE RE- LACIONADA À CONSTANTE DE EQUILIBRIO A concentração de substratos e produtos em equilíbrio define a constante de equilíbrio Keq; aA + bB ← → cC + dD; Keq = [C] c [D] d / [A] a [B] b Quando um sistema não está em equilíbrio, a tendência para atingi-lo re- presenta uma força motora, cuja magnitude pode ser expressa como a mudança de energia livre da reação, ΔG. Sob condições normais de pres- são (1 atmosfera ou 101.3 kP), concentração de 1 M e 298 o K (25 o C) a força motora que leva o sistema ao equilíbrio é definida como mudança de ener- gia livre padrão, ΔG o . Bioquímicos definem este parâmetro com ΔG´o quando: [H + ] = 10 -7 [H2O]= 55,5 M [Mg]= 1 mM ΔG´o = - RT ln K´eq. ΔG´ o é a diferença entre o conteúdo de energia livre dos produtos e o conteúdo de energia livre dos substratos sob condições normais ou padrão. Se o valor da K´eq > 1; ΔG´ o é negativa, portanto o produto contém me- nos energia livre que os substratos. A reação procede espontaneamente; Se o valor da K´eq < 1; ΔG´ o é positiva, a reação tende a ir na direção contraria, significando que os produtos da reação tem mais energia li- vre que os substratos; 5 ΔG= ΔG´o + RT ln [C] [D] / [A] [B]. O critério de espontaneidade de uma reação é dado pelo ΔG e não ΔG´ o . Uma reação com ΔG´ o positivo pode continuar se o ΔG é negativo. ΔG´o e ΔG são expressões da quantidade teórica máxima de energia livre que uma reação pode fornecer – a quantidade de energia fornecida se um aparelho 100% eficiente estivesse disponível para utilizá-la. Contudo, Não existe tal aparelho. Cada reação química tem uma mudança de energia livre padrão ΔG´o característica que pode ser +, – ou 0, dependendo da Keq. ΔG´o diz em que direção e por quanto tempo uma dada reação deverá proceder para alcançar o equilíbrio quando a concentração inicial de cada componente é 1,0 M, pH= 7, temperatura= 25 o C, pressão= 1 atm (101,3 kPa),[H2O]= 55,5 M e [Mg]= 1 mM. Portanto, ΔG´ o é uma cons- tante: tem um valor característico para uma dada reação. A mudança de energia livre ΔG é uma função da [substratos] e [produ- tos] e da temperatura prevalecente durante a reação, que não necessa- riamente é igual às condições padrão. O valor de ΔG de qualquer reação que procede espontaneamente ao equilíbrio é sempre negativo, fica menos negativo no transcurso da rea- ção e é zero no ponto de equilíbrio, indicando que não pode fazer mais trabalho. O valor da ΔG´o de reações em seqüência é aditivo. Reações celulares endergônicas são realizadas pelo seu acoplamento a rea- ções exergônicas ou processos fotoquímicos através de intermediários co- muns. Glucose + Pi ―――→ glucose-6-fosfato ΔG´o= 13,8 kJ/mol. ATP + H2O ―――→ ADP + Pi ΔG´ o = –30,5 kJ/mol. Glucose + ATP ――→ glucose-6-fosfato + ADP ΔG´o= –16,7 kJ/mol. ATP é o transportador universal de energia metabólica, ligando rotas ca- tabólicas e anabólicas. 6 o Enzimas: catalisadores biológicos que aumentam a taxa de reações es- pecíficas sem serem consumidas ou transformadas no processo; o Energia de ativação: energia requerida para diminuir a barreira ener- gética entre substrato e produto; o Catabolismo: reações degradativas com liberação de energia livre; o Anabolismo: reações de formação de produtos que requerem inputs de energia; o Metabolismo: catabolismo + anabolismo. Células vivas são maquinarias químicas autoreguladas, continuamente se ajustando para um máximo de economia. o Retro-inibição: produtos regulam a produção e utilização de cada in- termediário metabólico. o Células vivas regulam a sua produção de enzimas. TRANSFERÊNCIA DE INFORMAÇÃO BIOLÓGICA A informação genética é codificada em seqüências lineares de quatro clas- ses de subunidades de DNA. o Desoxiribonucleotídeos: A= deoxiadenilato, C= deoxicitidilato, G= deo- xiguanilato, T=deoxitimidilato. A:T, C:G; o Mutação gênica: erros não consertados na seqüência de nucleotídeos. Geralmente são letais. Ocasionalmente conferem adaptabilidade ao ambiente; o Evolução. Mutação + ambiente =adaptação ao novo nicho ecológico. A molécula de DNA dupla hélice contém um modelo interno para sua própria replicação e reparo. A sequência linear de aminoácidos das proteínas leva à formação de uma estrutura tridimensional única (conformação nativa). Macromoléculas individuais com afinidades específicas por outras ma- cromoléculas (proteína - proteína, proteína - ácidos nucléicos, proteína - lipídeos) se ligam em complexos supramoleculares (cromossomos, ribos- somos, membranas). 7 Estruturas biológicas tridimensionais combinam as propriedades de flexi- bilidade e estabilidade. o Geralmente, as forças que proporcionam estabilidade e especificidade à estrutura tridimensional das macro e supramoléculas são interações não covalentes (pontes de hidrogênio, ligações iônicas, ligações de van der Waals, interações hidrofóbicas). AS RAIZES FÍSICAS DO MUNDO BIOQUÍMICO Toda célula viva é um sistema de moléculas a temperatura constante que se autocontém, autoconstrói, autoajusta, autoperpetua e extrai energia li- vre e matérias do ambiente que a rodeia. A célula utiliza esta energia para se manter num estado de equilíbrio di- nâmico e em constante desequilíbrio com o ambiente que a rodeia. As inumeráveis transformações químicas dentro da célula são organizadas em um sistema de rotas metabólicas, promovidas a cada passo por catali- sadores específicos, chamados de enzimas, produzidas pela própria célula. Uma grande economia de partes e processos é alcançada pela regulação de enzimas chave. A autoreplicação, através das gerações, é assegurada pelo autoreparo do sistema codificado de informação linear. A informação genética, codifica- da em seqüências de nucleotídeos no DNA e RNA, especifica a seqüência de aminoácidos em cada proteína. Este ordenamento determina, em últi- ma instância, a estrutura tridimensional e a sua função. Muitas interações fracas (não covalentes), atuando de forma cooperativa, estabilizam a estrutura tridimensional de macromoléculas e complexos supramoleculares, contudo, proporcionando suficiente flexibilidade para ações biológicas.
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