Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 1 AULA 01: PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO Oi Pessoal, A aula de hoje é sobre o tal Regime Jurídico Administrativo, mais detidamente sobre os princípios da Administração. Queridas(os), ao lado da teoria, serão apresentados exercícios de fixação, e reproduzidas jurisprudências. Sem mais, vamos ao encontro do dia, Cyonil Borges. Observação: amigas(os), só consegui antecipar a aula do curso de vocês porque, felizmente, estou com um curso, em andamento, para a preparação em concursos promovidos pelo Cespe. No entanto, há duas aulas que serão postadas semana que vem, quero melhorar um pouco mais, recheando-as com mais itens do Cespe. Observação: o amigo Sandro Bernardes vai nos fornecer provas comentadas do ano de 2013. Verifiquei as últimas provas, e o Cespe parou de ser criativo. Há uma repetição muito grande de questões. Ademais, gostaria de fazer propaganda do meu trabalho no TECCONCURSOS (www.tecconcursos.com.br). Vou lançar, por lá, um material de Direito Constitucional, em exercícios, com mais de 500 itens de Cespe, sendo muitos de 2012 e 2013. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 2 Sumário 2. Regime Jurídico da Administração ................................................................. 4 2.1. Regime Jurídico Administrativo ................................................................... 8 2.2. Princípios Básicos da Administração ...................................................... 13 2.2.1. Princípios Expressos .................................................................................... 19 2.2.1.1. Legalidade ............................................................................................ 21 2.2.1.2. Impessoalidade, finalidade ou isonomia .............................................. 26 2.2.1.3. Moralidade ........................................................................................... 30 2.2.1.4. Publicidade ........................................................................................... 40 2.2.1.5. Eficiência ............................................................................................... 47 2.2.2. Princípios implícitos ou reconhecidos ............................................... 54 2.2.2.1. Supremacia do Interesse Público sobre o Interesse Privado ................. 54 2.2.2.2. Indisponibilidade do Interesse Público ................................................. 55 2.2.2.3. Finalidade Pública ................................................................................. 56 2.2.2.4. Controle Judicial dos Atos Administrativos ........................................... 57 2.2.2.5. Princípio da Responsabilidade Civil do Estado...................................... 60 2.2.2.6. Princípio da Autotutela ......................................................................... 62 2.2.2.7. Princípio da Igualdade .......................................................................... 63 2.2.2.8. Especialidade ........................................................................................ 63 2.2.2.9. Presunção de legitimidade ou de veracidade ....................................... 64 2.2.2.10. Probidade Administrativa ................................................................... 65 2.2.2.11. Segurança Jurídica .............................................................................. 67 2.2.2.12. Princípio da Confiança e Boa Fé ......................................................... 72 2.2.2.13. Princípio da Motivação ....................................................................... 74 2.2.2.14. Princípio da Proporcionalidade ........................................................... 77 2.2.2.15. Razoabilidade ..................................................................................... 79 2.2.2.16. Princípio da Continuidade do Serviço Público ..................................... 83 Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 3 2.2.2.17. Princípio da Realidade ........................................................................ 84 2.2.2.18. Princípio da Responsividade ............................................................... 85 2.2.2.19. Princípio da Sindicabilidade ................................................................ 85 2.2.2.20. Princípio da Juridicidade ..................................................................... 87 2.2.2.21. Princípio da Sancionabilidade ............................................................. 88 2.2.2.22. Princípio da Precaução ....................................................................... 88 2.2.2.23. Princípio da Subsidiariedade .............................................................. 88 2.2.24. Princípio da Função Cogente ................................................................. 89 Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 4 2. REGIME JURÍDICO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Em alguns editais de concursos públicos, há a menção aos “princípios da Administração”. Porém, os manuais clássicos de Direito Administrativo, preliminarmente ao estudo de tal conteúdo, avançam pelo Regime Jurídico Administrativo. De pronto, vamos definir a expressão “regime” isoladamente. Regime quer dizer o conjunto de normas e de princípios aplicáveis a uma determinada situação. Muitas vezes a expressão é conjugada com um qualificativo, um termo, que lhe trará adjetivação. Por exemplo: - Regime de concurso público: para passar no concurso público, devemos seguir um conjunto de normas e de princípios, caso contrário, o resultado final (passar no concurso) não será facilmente alcançável. - Regime de peso: para emagrecer devemos seguir um conjunto de regras (caminhar uma hora/dia) e de princípios (evitar a gula), sob pena de não alcançarmos o objetivo desejado. - Regime de escola militar: para cumprir o estágio militar, devemos acordar cedo, malhar (natação, corridinha mixuruca que não dá nem pra cansar), estudar, passar pela provação das refeições (carne de monstro, jacuba das cores mais variadas), enfim, cumprir uma série de princípios e de regras, sob pena de não alcançarmos a excelência na formação militar. Trazendo agora para a nossa realidade, há, igualmente, regime jurídico. Há regime jurídico de servidores. Há regime jurídico de licitações. Nesses casos, a expressão diz respeito às normas principais aplicáveis aos servidores e às licitações, respectivamente. Enfim, a Administração Pública convive com um conjunto de normas e de princípios, no Regime Jurídico da Administração. A expressão “regime jurídico da Administração” é o gênero, que comporta como espécies o Regime de Direito Privado e o Regime Jurídico Administrativo (normas e princípios de Direito Público). Para a Professora Maria Sylvia Di Pietro, a expressão regime jurídico da Administração Pública é utilizada para designar, em sentido amplo, os regimes de direitopúblico e de direito privado a que pode submeter-se a Administração Pública. Já a expressão regime- jurídico administrativo é reservada tão-somente para abranger o conjunto de traços, de conotações, que tipificam o Direito Administrativo, colocando a Administração Pública numa posição privilegiada, vertical, na relação jurídico-administrativa. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 5 Fácil concluir, portanto, que o regime jurídico adotado pela Administração não é formado só por normas de Direito Público. Nem sempre a Administração acha-se em posição de verticalidade (unilateralidade, império) sobre os administrados. Vamos entender um pouco melhor o assunto, ao velho estilo “Jack” (por partes). Quem já ouviu falar em Caixa Econômica Federal (CEF)? Todos, obviamente. A CEF é empresa pública da União (é do Estado, portanto). E o Banco do Brasil (BB), alguém já ouviu falar? Claro que sim! O BB é sociedade de economia mista da União (é do Estado, em conclusão). Será que tais entes são pessoas jurídicas de Direito Público ou de Direito Privado? Será que o regime é de Direito Público ou de Direito Privado? Façamos, agora, a leitura do art. 173, §1º, da CF/1988: A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (...) II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; Em síntese: a CF/1988 definiu, a priori, o regime das empresas governamentais como de Direito Privado (próprio das empresas privadas, no dispositivo acima), não deixando, portanto, espaço para a adoção de regime jurídico distinto. Assim, temos que nem sempre o Estado se submete integralmente às normas de Direito Público. Façamos a leitura, nesse instante, do art. 175 da CF/1988: Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 6 I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; (...). Distintamente das empresas do Estado (CEF e BB, por exemplo), em que o regime é, primordialmente, de Direito Privado, nos termos da CF/1988, percebemos que a Lei disporá sobre o regime das empresas concessionárias e permissionárias, logo, podendo ser: Direito Público ou Direito Privado ou Híbrido (público e privado). Fixação CESPE - TJ TRE ES/TRE ES/Administrativa/"Sem Especialidade"/2011 Acerca da administração pública e de seus princípios, julgue o próximo item. Os princípios elencados na Constituição Federal, tais como legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, aplicam-se à administração pública direta, autárquica e fundacional, mas não às empresas públicas e sociedades de economia mista que explorem atividade econômica. (Certo/Errado)1 Em suma: a Administração Pública não é regida só por normas de Direito Privado, podendo o regime ser definido como de Direito Público na própria CF/1988 ou pela legislação ordinária. Essa submissão ora ao Direito Público, ora ao Direito Privado, ou a ambos, levou parte dos doutrinadores à classificação de que existe algo maior que regime jurídico administrativo, é o Regime Jurídico DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ou regime jurídico administrativo, em sentido amplo). Responsável, assim, por englobar tanto as normas de Direito Público (regime jurídico- administrativo), como as de Direito Privado (regime jurídico de direito privado), aplicáveis à própria administração em situações específicas. Chegamos à conclusão de que o conceito de “DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA” é MAIOR que “ADMINISTRATIVO”. Assim, regime jurídico DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA não abrange tão- 1 ERRADO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 7 somente o regime JURÍDICO-ADMINISTRATIVO, como também o de DIREITO PRIVADO. No entanto, é no regime jurídico-administrativo (de Direito Público) que a Administração dispõe de prerrogativas (de força, de supremacia sobre os particulares). Isso ocorre em razão do significado que o Estado possui na sociedade: a de ser responsável pelo cumprimento dos interesses coletivos (públicos). Em consequência, a Administração Pública dispõe de “poderes especiais” que não são colocados à disposição do particular. Como exemplos de tais prerrogativas: o exercício do poder de polícia, a desapropriação de bens, a possibilidade de aplicação de sanções administrativas independentemente da intervenção judicial. Todavia, no regime jurídico-administrativo, não há só prerrogativas (autonomia). Jamais! Existem também as restrições (à liberdade), contrapartida das prerrogativas. Vamos mais um exemplo. Imagine que a Administração Pública tenha de adquirir veículos e toma conhecimento que uma loja está com uma “promoção”, com preços bastante inferiores aos correntes no mercado. Poderia o Administrador livremente, ao seu arbítrio, adquirir os veículos? Sonoramente, NÃO! A razão disso que é Constituição Federal submete a Administração ao dever de licitar suas aquisições (art. 37, inc. XXI), restringindo o que se poderia nominar de “liberdade” da Administração em realizar contratos. Portanto, o regime jurídico-administrativo poderia ser resumido em duas expressões: prerrogativas e sujeições do Estado, no desempenho de suas atividades Administrativas. Ainda quanto aos regimes jurídicos aplicáveis à Administração, como já se disse, a Administração Pública pode estar submetida, preponderantemente, a normas do Direito Privado. É o que acontece, por exemplo, na exploração de atividades econômicas por parte do Estado. Com efeito, como sobredito, o inc. II do §1º do art. 173 da CF/1988 estabelece que as empresas públicas e sociedades de economia mista que explorem atividades econômicas se submetem às Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 8 mesmas normas que valem para as empresas privadas quanto a direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributárias. Assim, o Banco do Brasil, sociedade de economia mista federal, ao atuar no mercado, submete-se às mesmas “regras do jogo” que valem para os bancos privados. A doutrina clássica costuma firmar que, nestes casos, os órgãos ou entidades da Administração Pública se encontram em posição “horizontal”quando comparados ao particular. Cuidado especial, no entanto, merece ser dado. Por mais que a Administração Pública submeta-se predominantemente ao Direito Privado, esta submissão não é integral. Isso se dá porque, ao fim, o papel dos órgãos/entidades da Administração é o alcance do interesse público, independentemente de qual regime jurídico é aplicável ao caso. Por exemplo: a CEF e o BB devem licitar, devem realizar concursos públicos, ou seja, apesar de não gozarem de prerrogativas, contam com restrições de Direito Público. Fixação CESPE - AUFC/TCU/Controle Externo/2004 Considerando as fontes e os princípios constitucionais do direito administrativo e a organização administrativa da União, julgue os seguintes itens. A expressão regime jurídico-administrativo, em seu sentido amplo, refere-se tanto aos regimes de direito público e de direito privado a que se submete a administração pública quanto ao regime especial que assegura à administração pública prerrogativas na relação com o administrado. (Certo/Errado)2 2.1. REGIME JURÍDICO ADMINISTRATIVO Como esclarece a Professora Maria Sylvia Di Pietro, o Direito Administrativo nasceu e se desenvolveu baseado em duas ideias opostas: de um lado, a proteção aos direitos individuais frente ao Estado, que serve de fundamento ao princípio da legalidade, um dos pilares do Estado de Direito; de outro lado, a de necessidade de 2 O item está ERRADO. Não é uma questão trivial. A expressão regime jurídico administrativo, em sentido amplo, pode ser utilizada como sinônimo para Regime Jurídico da Administração. Este, por sua vez, refere-se ao conjunto de normas de Direito Público e Direito Privado. Perceba que, no quesito, há a afirmação de que o Regime, em sentido amplo, assegura “regime especial”. Na verdade, apenas o regime jurídico administrativo, em sentido estrito, é que garante prerrogativas. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 9 satisfação dos interesses coletivos, que conduz à outorga de prerrogativas e privilégios para a Administração Pública, quer para limitar o exercício dos direitos individuais em benefício do bem- estar coletivo (poder de polícia), quer para a prestação de serviços públicos. As liberdades dos indivíduos são, para estes, verdadeiros direitos, e, portanto, restrições para o Estado. Por outro lado, o Estado conta com autoridade, sintetizada nas prerrogativas que lhe permitem assegurar a supremacia do interesse público sobre o particular. Para o autor Celso Antônio, o regime jurídico-administrativo é construído, fundamentalmente, em dois princípios básicos, dos quais os demais decorrem: o da supremacia do interesse público sobre o particular (prerrogativas) e o da indisponibilidade do interesse público (restrições). Portanto, relativamente ao estudo do regime jurídico- administrativo, percebemos que as prerrogativas são sinais de força (poderes) (p. ex.: a desapropriação), enquanto que as restrições representam sujeições (deveres) (p. ex: o cumprimento da finalidade pública), binômio poder-dever ou dever-poder. As prerrogativas podem ser traduzidas no princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, enquanto que as restrições, no princípio da indisponibilidade e da legalidade. Esses dois princípios são informadores do regime jurídico administrativo. Fixação CESPE - AUFC/TCU/Controle Externo/Auditoria de Obras Públicas/2009 Acerca dos contratos administrativos, julgue o item seguinte. O regime jurídico-administrativo fundamenta-se, conforme entende a doutrina, nos princípios da supremacia do interesse público sobre o privado e na indisponibilidade do interesse público. (Certo/Errado)3 O princípio da supremacia do interesse público, metaforicamente, quer significar que a Administração Pública é colocada em posição vertical (diferenciada) quando comparada aos particulares. Isso se deve à prevalência do interesse público sobre o privado, que dá, por conseguinte, uma série de prerrogativas em favor da Administração. 3 O item está CERTO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 10 Fixação CESPE - PMP (INSS)/INSS/2010 Acerca do direito administrativo, julgue o item a seguir. O sistema administrativo ampara-se, basicamente, nos princípios da supremacia do interesse público sobre o particular e da indisponibilidade do interesse público pela administração. (Certo/Errado)4 No caso de confronto entre o interesse individual e o público, este é que, em regra, prevalecerá, tendo em conta ser mais amplo. Ou de outra forma: o grupo é mais importante do que o indivíduo. Aprendemos isso cedo, não é mesmo? Quantas vezes as nossas professoras do primário nos disseram isso... Obviamente, não só de prerrogativas se faz um Estado. Em contrapartida da supremacia do interesse público, a indisponibilidade desse mesmo interesse faz com que a Administração, por intermédio de seus agentes, não tenha “vontade própria”, por estar investida no papel de satisfazer a vontade de terceiros, quais sejam, o coletivo, a sociedade. De fato, os agentes públicos têm o papel de levar as atribuições do Estado a efeito, Estado esse que, ao fim, é uma espécie de “tutor” dos interesses públicos. Não pode o agente, dessa forma, atuar da forma que bem entender, mas sim conforme exigido pela coletividade por intermédio do instrumento que é próprio para tal exigência: a lei. Fixação CESPE - Ana MPU/MPU/Administrativo/2010 Com relação aos poderes, atos e contratos administrativos, julgue o item a seguir. As prerrogativas do regime jurídico administrativo conferem poderes à administração, colocada em posição de supremacia sobre o particular; já as sujeições servem de limites à atuação administrativa, como garantia do respeito às finalidades públicas e também dos direitos do cidadão. (Certo/Errado)5 Com efeito, o princípio da indisponibilidade guarda uma relação muito estreita com o princípio da legalidade. Por este último, a Administração só faz o que a norma determina ou autoriza, 4 CERTO. 5 CERTO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 11 quando e como permite, sendo, pois, bastante diferente da legalidade aplicada aos particulares, que podem fazer tudo o que não é proibido pela norma. Percebe-se, por fim, significativa diferença quanto à vontade administrativa X vontade dos particulares, que pode ser assim resumida: enquanto os particulares possuem ampla liberdade de vontade, podendo realizar tudo aquilo que não lhes seja proibido, à Administração só é lícito fazer o que lhe é determinado, ou ao menos autorizado pela norma. Antes de passarmos para o próximo tópico, seguem breves considerações sobre o interesse público. O que é esse tal de interesse público? O interesse público, por dizer respeito ao coletivo, sobrepõe-se aos interesses individuais, daí ser dito “supremo”. Claro que a prevalênciado interesse público não é um fim em si mesmo. Sob o pretexto de dar cumprimento aos interesses públicos não pode o administrador público simplesmente fulminar os direitos e liberdades individuais, garantias consagradas constitucionalmente. A “chave” então da melhor interpretação do princípio da supremacia do interesse público é a ponderação entre as prerrogativas estatais de um lado e os direitos/liberdades individuais de outro, entendidas estas como verdadeiras restrições na atuação do Estado. Portanto, deve-se preservar o equilíbrio, dado que não há poderes ilimitados concedidos à Administração Pública. Ainda que quase inviável precisar-se o que é “interesse público”, não se pode conceituar esse como sendo apenas o que diz respeito ao Estado, em si, relacionado à entidade representante. Tampouco se pode conceituá-lo como resultante do somatório dos interesses individuais. Dessa forma, a doutrina costuma segmentar o interesse público em: I) Primário – corresponde ao cumprimento da lei, e, portanto, ao interesse público propriamente dito ou finalístico. É visto de dentro para fora, exemplo da prestação de serviços públicos. II) Secundário – entendido como a necessidade de a Administração lograr vantagens para si. Ocorre internamente à Administração (atividade-meio): finanças públicas e nomeação de servidores, por exemplo. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 12 O Estado é uma instituição que age por intermédio de órgãos, entidades e agentes, mas que, ao fim, num plano extrajurídico, tem interesse de “maximizar” seus ganhos, e muitas vezes tende a privilegiar interesses secundários em detrimento dos primários (o que veremos não ser possível). Mais um exemplo para ilustrar o que se expõe. O Estado pode, em determinado momento, querer elevar ao máximo as alíquotas dos impostos, almejando mais receita para cobrir dívidas passadas. Neste caso, tenderia a agir como um particular: maximizar receitas para cobrir despesas. Só que, evidentemente, não é isso que a sociedade e a lei exigem do Estado. De outra forma, quer-se do Estado que a tributação seja feita nos limites necessários para se proporcionar o bem-estar social. Por conseguinte, pode-se afirmar que só é permitido ao Estado perseguir interesses públicos secundários quando estes coincidirem com os interesses públicos primários (os públicos, propriamente ditos). Assim, é correto afirmar que o interesse público primário não coincide, necessariamente, com o do Estado (o secundário, o destinado para atender suas conveniências internas). De fato, em um aspecto puramente “gerencial”, o Estado tentaria maximizar seus próprios interesses, muitas vezes não condizentes com aqueles dispostos na norma. Por outro lado, a observância dos interesses públicos compete não aos órgãos e entidades da Administração em si, uma vez que estes não passam de mera ficção jurídica. Para que os interesses públicos sejam atingidos, são necessários agentes públicos, os quais tornarão concreta a atuação da Administração Pública. Esses agentes, na busca dos interesses públicos, atuam não em razão de vontade pessoal, mas daquilo que lhes impõe a norma, em sentido amplo. A doutrina majoritária tem dito que “falta vontade” àquele que atua em nome do interesse público, o agente público. De outra forma, este se norteia por determinação ou autorização da norma, que torna o interesse público indisponível ao agente em si. Melhores momentos: I) regime jurídico é um conjunto de normas e de princípios aplicado à determinada situação; Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 13 II) o regime jurídico aplicável à Administração pode ser tanto de direito público (administrativo), como de direito privado (Regime Jurídico da Administração ou regime jurídico-administrativo, em sentido amplo); III) o regime jurídico-administrativo é um conjunto de prerrogativas e sujeições concedido à Administração Pública, para melhor cumprimento dos interesses públicos; IV) ainda que se sujeite predominantemente a normas de direito privado, a Administração Pública nunca se submete de forma integral a normas de tal ramo jurídico. Por exemplo: as empresas estatais estão sujeitas às restrições legais e constitucionais (realização de concurso público e de licitações, por exemplo); V) O interesse público primário representa a Administração Pública no sentido finalístico, extroverso, com outras palavras, é o interesse público propriamente dito, pois dirigido diretamente aos cidadãos (de dentro do Estado para fora – Administração Extroversa). Já o interesse público secundário diz respeito aos interesses do próprio Estado, internos, introversos, portanto, inconfundíveis com os primários (propriamente ditos). Por exemplo: a locação de um galpão para guarnecer livros, enquanto a biblioteca passa por reforma. É ato interno, porém, visa à proteção do interesse público propriamente dito. 2.2.PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA A palavra princípio quer significar o que vem antes ou depois? Claro que antes! Os princípios são os vetores fundamentais que alicerçam o edifício jurídico das regras. Há quem diga que a não observância aos princípios é mais grave que ignorar o comando legal6, afinal os princípios têm eficácia nomogenética, ou seja, na genética (DNA) das leis encontramos os princípios (consiste em dar fundamentos finalístico-valorativos para a edição de novos preceitos e neles reproduzir esse conteúdo). 6 Celso Antônio Bandeira de Mello, por exemplo. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 14 Além da eficácia normogenética, socorre-se dos ensinamentos do autor Diogo de Figueiredo para enumerar outras formas de eficácia mediata dos princípios. Vejamos: Axiológica: consiste em definir com clareza, na ordem jurídica, os valores que a informam; Otimizadora: consiste em orientar a interpretação dos preceitos e dos atos concretos que conformam uma ordem jurídica, conferindo-lhes a mais ampla, profunda e completa aplicação possível a seu conteúdo de valor; Sistêmica: consiste em interconectar todos os preceitos e atos concretos informados pelo mesmo princípio, como que conformando uma superestrutura abstrata, que lhes infunde unidade e coerência; Integrativa: consiste em preencher eventuais lacunas da ordem jurídica. A doutrina [Cretella] classifica os princípios em: a) onivalentes ou universais, comuns a todos os ramos do saber, como o da identidade e o da razão suficiente. Por exemplo: A não é B, logo B não é A (isso é universal); b) plurivalentes ou regionais, comuns a um grupo de ciências, informando-as nos aspectos em que se interpenetram. Exemplos: o princípio da causalidade, aplicável às ciências naturais e o próprio princípio do alterum non laedere (não prejudicar a outrem), aplicável às ciências naturais e jurídicas; c) monovalentes, que se referem a um só campo do conhecimento, há tantos princípios monovalentes quantas sejam asciências cogitadas pelo espírito humano. É o caso dos princípios gerais de direito, como o de que ninguém se escusa alegando ignorar a lei. d) setoriais, que informam os diversos setores em que se divide determinada ciência. Por exemplo, na ciência jurídica, existem princípios que informam o Direito Civil, o Direito do Trabalho, o Direito Penal etc. Com base nesta classificação, pode-se dizer [Maria Sylvia Zanella Di Pietro] que o Direito Administrativo está informado por determinados Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 15 princípios, alguns deles próprios também de outros ramos do Direito Público e outros dele específicos e enquadrados como setoriais. Se os princípios são normas que antecedem as regras, fácil perceber que os são dotados de carga normativa mais perene do que as leis, principalmente porque não há hierarquia material entre princípios (por exemplo: princípio da eficiência é o mais recente dos princípios expressos, porém não apaga a legalidade. Tais postulados convivem harmonicamente). A partir de um exemplo, fica mais tranquilo compreender a ausência de hierarquização material entre princípios. Imaginem a construção de um prédio. Começamos por onde? Pela sua base, claro, seus alicerces, que devem estar nivelados, para que o prédio não corra risco de desmoronar. Se tivéssemos uma parte do alicerce mais elevada que as demais, nosso prédio certamente tombaria. Pois bem. Nosso “prédio”, daqui por diante, é a Administração Pública. E seus pilares, seus princípios, dão suporte a toda atividade da Administração, e as janelas são as regras (leis). Ah! Quebrar a janela é menos grave que derrubar um dos alicerces, concordam? Alguns desses “pilares” são explícitos na Constituição, e constam, por exemplo, do caput do art. 37 da CF/1988. Outros são encontrados implicitamente no texto constitucional, são depreendidos do sistema jurídico-administrativo-constitucional. Mas a CF não é o único repositório dos princípios. Há princípios expressos em textos legais (no campo infraconstitucional), como os do art. 2º da Lei 9.784/1999 (Lei de Processo Federal), e, por fim, a doutrina pátria “constrói” inúmeros princípios, a partir da interpretação da ordem jurídica. Abre-se um parêntese para esclarecer que há, na doutrina, quem defenda a existência de hierarquia entre princípios. Por isso, citou-se, acima, ausência de hierarquia material entre os princípios. Para Diogo de Figueiredo, os princípios podem se hierarquizar formalmente, enciclopedicamente ou axiologicamente. Na ordem jurídica brasileira, hierarquizam-se, formalmente, os princípios constitucionais e infraconstitucionais. Enciclopedicamente, os princípios distinguem-se em fundamentais, gerais e setoriais. Por fim, axiologicamente, segundo a importância filosófica, política, Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 16 econômica ou social que apresentam (preeminência da dignidade humana sobre o da publicidade, por exemplo). Como dito, por serem orientativos, os princípios constitucionais não possuem, entre si, hierarquização conceitual: não há princípio mais ou menos importante, TODOS são de igual importância. Vem a pergunta: se não há hierarquia material, como resolver eventuais conflitos? O quadro, a seguir, sintetiza as formas de resolução de conflitos das leis e dos princípios. Perceba que são critérios distintos. CONFLITO LEIS PRINCÍPIOS Hierarquia Princípio da predominância dos valores Cronológico Especialidade Para o conflito entre as leis, vale a norma superior sobre a inferior (critério da hierarquia “lex superior derogat inferior”). Exemplo da prevalência da CF sobre as normas infraconstitucionais); se equivalentes em termos de hierarquia, aplica-se a lei mais nova sobre a antiga (critério cronológico ou da anterioridade “lex posterior derogat priori”), e, por fim, o critério da especialidade, em que lei especial derroga lei geral. Agora, tratando-se de princípios, o que acontece, em um caso concreto, é que um ou mais princípios podem prevalecer quando comparado a outro. Aplica-se o princípio da preponderância de interesses ou valores ou da ponderação. Assim, devemos afastar a “velha” ideia de que o princípio da legalidade está além, acima, dos demais, em razão do estrito dever de a Administração obedecer à lei, por intermédio de seus agentes. O entendimento é equivocado. O princípio da legalidade precede (vem antes) aos demais, mas não é maior do que os demais princípios. Com efeito, como dito, os princípios não possuem, entre si, hierarquização material: não há princípio mais ou menos Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 17 importante, todos se equiparam. Explicando de uma forma mais “construtiva”. Foi realizada uma comunicação anônima ao TCU ou ao MPF a respeito de fatos graves praticados no âmbito da Administração Pública. Ora, o texto constitucional veda o anonimato (inc. IV do art. 5º), logo, deve o TCU ou o MP determinar o arquivamento do processo? Não é bem assim. Se, por um lado, a liberdade de expressão não é absoluta, impedindo o abuso quanto à opinião, garantindo-se a identificação do eventual denunciante; por outro, não há impedimento para que o TCU e o MP adotem medidas de ofício (por iniciativa sua) para averiguação de fatos informados mediante documentos apócrifos. A Administração Pública não pode se furtar de atender o interesse público. Assim, imagine-se que os fatos comunicados ao Estado sejam extremamente graves e que possuam claros indícios de serem verdadeiros. Poderia o Estado simplesmente não apurar por conta da sobredita vedação ao anonimato? Claro que não! Deveria apurar, mas não em um processo autuado como denúncia, mas noutro, como, por exemplo, numa representação da Unidade Técnica. Dessa forma, a denúncia não seria conhecida, mas a situação seria apurada, se fundamentada estivesse. Pergunta-se: qual seria o princípio a amparar essa apuração de ofício? Além da legalidade, impessoalidade e moralidade, o princípio da verdade real (ou material) determinaria a apuração. Professor, o que é esse tal princípio da verdade real ou material? Não é o momento ideal para avançarmos nos pormenores do referido princípio. Em todo caso, uma rápida “pincelada” acerca do princípio da verdade material. A busca pela verdade real orienta a atuação da Administração Pública. Isso se dá, em especial, porque, diferentemente dos processos judiciais comuns (da esfera cível), nos processos administrativos a relação jurídica constituída é bilateral e não trilateral. Nos processos administrativos, de um lado, tem-se a Administração que, ao tempo que integra o processo como interessada, possui o Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 18 dever de buscar as informações (provas, quando for o caso) para a tomada dedecisão. Nos processos judiciais cíveis, a produção de provas compete às partes, com um terceiro isento, neutro (o Juiz ou Tribunal Judicial) responsável pela decisão. Bem diferente, portanto, da natureza dos processos administrativos, para os quais podem ser apontadas as seguintes características básicas: I) é uma relação bilateral: de um lado estará a Administração e de outro, o interessado, que pode ser um particular ou mesmo um agente público. Já os processos judiciais comuns constituem uma relação trilateral; II) cumpre à Administração movimentar o processo administrativo, uma vez que o integra como interessada. Vale o princípio do “impulso oficial”. Assim, mesmo que não provocada, a Administração poderá instaurar um processo administrativo, desde que entenda necessário. Por isso, um documento apócrifo (anônimo), em casos concretos, poderá dar início a um processo administrativo, ainda que tal processo não seja constituído a partir do expediente anônimo. Nos processos judiciais comuns, o impulso (andamento) do processo incumbe às partes (de regra), as quais devem provocar a atuação jurisdicional para que o feito tenha andamento; e, III) nos processos administrativos prevalece a busca da verdade real, assim entendida como aquela que se levanta dos fatos efetivamente ocorridos, ainda que não constantes formalmente de um processo administrativo, por exemplo. Nos processos judiciais cíveis, vale a verdade formal, ou seja, se uma informação não estiver formalmente contida nos autos do processo, para o Juiz ou Tribunal Judicial é como, de regra, não houvesse no mundo. Dessa forma, ainda que a comunicação tenha sido anônima, poderia (e até deveria) o TCU instaurar um procedimento de ofício, visando ao esclarecimento dos fatos. A vedação ao anonimato, portanto, pode ser relativizada, em casos específicos, a bem da preservação do interesse público. Outro exemplo de ponderação é colhido na jurisprudência do STJ (RMS 24339). Na ocorrência de ilegalidade, é dever de a Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 19 Administração (de ofício ou por provocação) e o Judiciário (por provocação) anular o ato administrativo. No entanto, é possível a legalidade ceder espaço para o princípio da segurança jurídica, em que a manutenção do ato ilegal causará menos prejuízos que a sua retirada (fenômeno da estabilização dos efeitos do ato administrativo). 2.2.1. PRINCÍPIOS EXPRESSOS Em termos de texto constitucional, o Capítulo VII, do Título III (Da organização do Estado), da Constituição da República Federativa do Brasil, consagra as normas básicas regentes da Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios; e proclama os princípios constitucionais essenciais para a probidade e transparência na gestão da coisa pública. São princípios constitucionais expressos no caput do art. 37 da CF (LIMPE): Legalidade; Impessoalidade; Moralidade; Publicidade e Eficiência. Tais princípios valem para todos os Poderes, de todos os entes integrantes da Federação Brasileira (União; estados; Distrito Federal, e municípios), e respectivas Administrações Direta e Indireta. Façamos a leitura do teor do referido dispositivo constitucional: Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...). No momento adequado, veremos que a Administração Indireta dos Estados, também chamada de Descentralizada, é formada por entidades administrativas de Direito Público (Autarquias, por exemplo) e de Direito Privado (Sociedades de Economia Mista, por exemplo). Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 20 Importante: perceba que o comando constitucional, também, dirige- se a toda a Administração Indireta, independentemente da natureza jurídica da entidade. Assim, mesmo entidades da Administração Pública que explorem atividades econômicas, como o Banco do Brasil e a Petrobras, submetem-se aos princípios constitucionais da Administração Pública. (2011/Cespe – TJ TRE ES/Administrativa/"Sem Especialidade" Acerca da administração pública e de seus princípios, julgue o próximo item. Os princípios elencados na Constituição Federal, tais como legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, aplicam-se à administração pública direta, autárquica e fundacional, mas não às empresas públicas e sociedades de economia mista que explorem atividade econômica7. Na verdade, além da Administração Pública, a carga normativa dos princípios é cogente, coativa, obrigatória, inclusive, para os particulares. Como assim para os particulares? Nunca ouvi falar sobre isso! Vamos entender melhor, então. Os particulares não são obrigados a manter qualquer vínculo especial com a Administração Pública. Porém não há impedimento de se submeterem, facultativamente, conforme o interesse, às regras de Direito Público. Por exemplo: tais particulares podem ser qualificados, discricionariamente, como Organizações Sociais (OSs), e podem, doravante, passar a receber dinheiros públicos para operacionalizar eventual contrato de gestão celebrado com Ministério Supervisor. Nos termos da Lei 9.637, de 1998 (Lei das OSs), as OSs acham-se presas, em suas aquisições, ao cumprimento dos princípios da Administração Pública. Vendo o assunto sob outra ótica, pode se afirmar que os princípios constituem, ainda, direitos do cidadão. Com efeito, caso a Administração atue em conformidade com os princípios isso garantirá que suas ações sejam legais, impessoais, morais, por exemplo. Por isso a afirmativa – a observância dos princípios por parte Administração constituem verdadeiro direito do cidadão. (2011/Cespe – PREVIC – Cargo 6) O cumprimento dos princípios administrativos — especialmente o da finalidade, o da moralidade, o do interesse público e o da legalidade — constitui um dever do 7 Gabarito: ERRADO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 21 administrador e apresenta-se como um direito subjetivo de cada cidadão8. Deixando de lado, por enquanto, os princípios específicos contidos nas leis 9.784/1999, 8.666/1993, e 8.987/1995 (os quais serão analisados nas cenas das próximas aulas), serão comentados os princípios constitucionais e legais expressos, bem como implícitos ou reconhecidos no direito positivo, igualmente informadores do Direito Administrativo. Evidentemente, as análises, a seguir procedidas, não esgotarão todos os princípios, já o número destes dependerá do doutrinador utilizado como referência. Mas serão abordados aqueles considerados mais relevantes para o nosso objetivo: GABARITAR o assunto em prova. 2.2.1.1. Legalidade Sabe-se que, no âmbito das relações privadas, vige a ideia de que tudo que não está proibido em lei estápermitido. Nas relações públicas, contudo, o princípio da legalidade envolve a ideia de que a Administração Pública só pode atuar quando autorizada ou permitida pela lei. A norma deve autorizar o agir e o não agir dos sujeitos da Administração Pública, pois ele é integralmente subserviente à lei. (por Dirley Cunha) Sabemos que os princípios da Administração possibilitam a responsabilização dos agentes estatais, bem como visam garantir a honestidade do emprego dos dinheiros públicos. Para Maria Sylvia, sendo o Direito Administrativo de elaboração pretoriana e não codificado, os princípios representam papel relevante nesse ramo do direito, permitindo à Administração e ao Judiciário estabelecer o necessário equilíbrio entre os direitos dos administradores e as prerrogativas da Administração. Para concluir que a partir dos princípios da legalidade e da supremacia do interesse público sobre o particular se constroem os demais, enfim, tais princípios precedem os demais. Atenção: não confundir “preceder” com “prevalecer”. Prevalecer remete-nos a ideia de hierarquia, e, como sabemos, inexiste hierarquia material entre os princípios. A precedência, portanto, é mais interpretativa: como os interesses públicos são superiores (supremos) quando comparados aos particulares e como a Administração só pode agir em conformidade com a Lei, os princípios 8 Gabarito: CERTO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 22 em referência servem à interpretação de tudo que vá ser feito pela Administração. O princípio da legalidade é da essência do Estado de Direito e, por isso, fundamental para o Direito Administrativo, já que este nasce com aquele. É fruto da necessária submissão do Estado à Lei. Consagra a ideia de que por meio da norma geral, abstrata e, portanto, impessoal, editada pelo Poder Legislativo, a atuação da Administração objetiva a concretização da vontade geral (art. 1º, parágrafo único, da CF/1988). Fixação 2004/Cespe – Procurador TCU O princípio da legalidade pode ser afastado ante o princípio da supremacia do interesse público, especialmente nas hipóteses de exercício de poder de polícia. (Certo/Errado)9 De acordo com a acepção doutrinária clássica do princípio da legalidade, a Administração Pública só pode fazer aquilo que a norma determina, permite, autoriza, de modo expresso ou implícito. De modo expresso ou implícito?! Com isso pode acontecer Professor? Explico. Quando a norma traça todos os pormenores, sem deixar espaço de atuação por parte dos administradores, ter-se-á atuação vinculada. Por exemplo: na esfera federal, a aquisição de bens e de serviços comuns, enquadrados como padronizados, devem ser adquiridos por Pregão. Isso mesmo. Na esfera federal, o uso do Pregão é obrigatório, uso vinculado. Já, quando a norma deixa escolha, opção aos administradores, enfim, uma maior margem de liberdade (mas sempre com limites postos pela norma), verificar-se-á discricionariedade. Por exemplo: o Pregão pode ser presencial ou eletrônico. Apesar de o presencial, na esfera federal, ser obrigatório, o eletrônico permanece preferencial (leia-se: há certa discricionariedade). Mas vejam: mesmo que conte com certa liberdade (discricionariedade), a Administração só faz o que lei estabelece. Por isso, pode-se afirmar que o princípio da legalidade “precede” todos os demais, isto é, vem na frente, para efeitos interpretativos. Obviamente, essa “precedência” não tem sentido hierárquico. Não é que o princípio da legalidade seja mais importante que os demais, 9 ERRADO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 23 mas sim que todos estes outros princípios devem ser interpretados à luz das leis. O princípio da legalidade não é restrito à Administração, enfim, também vale para o particular, mas com outro enfoque (legalidade constitucional): se uma norma não proibir, o particular, dispondo de forma livre de sua vontade, pode agir da maneira que melhor entender. Pode-se, previamente, concluir que a Administração Pública só pode agir da maneira que a lei determinar ou autorizar, enquanto o particular age do modo que julgue mais conveniente, desde que a lei (não apenas a Constituição) não o proíba. Isso significa que o agente público, responsável por tornar concreta a missão da Administração Pública, não pode fazer tudo o que não seja proibido em lei, e sim só o que a norma autoriza ou determina. Para o particular, o princípio da legalidade terá caráter mais restritivo que impositivo: não sendo proibido em norma, é possível ao particular fazer. Parafraseando o autor Hely Lopes, o princípio da legalidade para o administrador significa “deve fazer assim”, enquanto para os particulares, “pode fazer assim”. Referência doutrinária (Gustavo Scatolino): O princípio da legalidade pode ser entendido em dois sentidos: legalidade em sentido amplo e em sentido estrito. A legalidade em sentido estrito significa atuar de acordo com a lei, ou seja, obedecer à lei feita pelo Parlamento. A legalidade em sentido amplo ou legitimidade significa obedecer não só à lei, mas também obedecer aos princípios da moralidade e do interesse público. Dessa forma, a palavra legitimidade apresenta um conceito mais abrangente do que o conceito de legalidade, pois legalidade seria obedecer à lei e a legitimidade obedecer à lei e aos demais princípios administrativos. Em síntese: o princípio da legalidade é bem mais amplo do que a mera sujeição do administrador à lei formal, pois se refere ao ordenamento jurídico, às normas e aos princípios constitucionais, sem falar das normas regulamentares por ele mesmo editadas. Obviamente, algumas disciplinas são separadas pelas constituições à disciplina de lei formal (reserva de lei), ou seja, necessariamente resultante da tramitação de norma no Poder Legislativo. No entanto, os limites do princípio da legalidade devem ser bem compreendidos. A doutrina registra que, em casos de prestações pessoais ou patrimoniais, o princípio tem força absoluta (estrita legalidade), decorrente da norma que estabelece que “ninguém é Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 24 obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Sobre o tema, vejamos trecho da ADI-STF 2075: O tema concernente à disciplina jurídica da remuneração funcional submete-se ao postulado constitucional da reserva absoluta de lei, vedando-se, em consequência, a intervenção de outros atos estatais revestidos de menor positividade jurídica, emanados de fontes normativas que se revelem estranhas, quanto à sua origem institucional, ao âmbito de atuação do Poder Legislativo, notadamente quando se tratar de imposições restritivas ou de fixação de limitações quantitativas ao estipêndio devido aos agentes públicos em geral. O princípio constitucional da reserva de lei formal traduz limitação ao exercício das atividades administrativas e jurisdicionais do Estado. A reserva de lei- analisada sob tal perspectiva - constitui postulado revestido de função excludente, de caráter negativo, pois veda, nas matérias a ela sujeitas, quaisquer intervenções normativas, a título primário, de órgãos estatais não-legislativos. Essa cláusula constitucional, por sua vez, projeta-se em uma dimensão positiva, eis que a sua incidência reforça o princípio, que, fundado na autoridade da Constituição, impõe, à administração e à jurisdição, a necessária submissão aos comandos estatais emanados, exclusivamente, do legislador. Não cabe, ao Poder Executivo, em tema regido pelo postulado da reserva de lei, atuar na anômala (e inconstitucional) condição de legislador, para, em assim agindo, proceder à imposição de seus próprios critérios, afastando, desse modo, os fatores que, no âmbito de nosso sistema constitucional, só podem ser legitimamente definidos pelo Parlamento. É que, se tal fosse possível, o Poder Executivo passaria a desempenhar atribuição que lhe é institucionalmente estranha (a de legislador), usurpando, desse modo, no contexto de um sistema de poderes essencialmente limitados, competência que não lhe pertence, com evidente transgressão ao princípio constitucional da separação de poderes. Já no que diz respeito ao processo administrativo, o entendimento doutrinário é o de que a Administração não pode eximir-se de decidir os pedidos em razão de inexistirem normas de competência expressa, pois ao processo administrativo foram dadas as mesmas garantias constitucionais do processo judicial (art. 5º, LV, da CF/1988). Assim, Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 25 ao administrador não é permitido lançar o administrado à via mais dificultosa: a judicial. Deve-se considerar que o ordenamento jurídico supre suas próprias lacunas, mediante a aplicação/criação de normas. Por fim, a doutrina aponta situações em que o princípio da legalidade sofrerá constrições (restrições) temporárias: medidas provisórias (espécies normativas efêmeras), estado de defesa e de sítio (o Presidente da República é quem decreta, não há lei formal). Para Celso Antônio, as medidas provisórias não se confundem com as leis, têm força de leis, mas com estas não se confundem. São espécies normativas efêmeras. Já o Estado de Defesa e o de Sítio são situações excepcionalíssimas regidas por Decreto do presidente da República. CESGRANRIO - PB (BNDES)/Direito/2006 A doutrina aponta como restrições excepcionais ao princípio da legalidade: I - as normas contidas nas medidas provisórias; II - o estado de defesa; III - o estado de sítio. Está(ão) correta(s): a) II, apenas. b) III, apenas. c) I e II, apenas. d) I e III, apenas. e) I, II e III.10 Fixação CESPE - TA (IBAMA)/IBAMA/2012 No que concerne à administração pública, julgue o item a seguir. De acordo com a CF, a medida provisória, o estado de defesa e o estado de sítio constituem exceção ao princípio da legalidade na administração pública. (Certo/Errado)11 10 Letra E. 11 CERTO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 26 2.2.1.2. Impessoalidade, finalidade ou isonomia O princípio republicano e o dever, que nele se contém, de ser dar trato público à coisa pública, que nesta forma de governo se encarece, fundamentam a impessoalidade administrativa. É que nela a qualificação pessoal não conta, como não conta a situação pessoal daquele que detém o cargo público e que se deve manter neutro e objetivo em sua conduta, seja qual for a situação social, econômica ou político-partidária do cidadão sobre o qual incidirão os efeitos do ato da Administração. (por Cármen Lúcia) Como esclarece Lucas Rocha Furtado, o princípio da impessoalidade admite seu exame sob os seguintes aspectos: Dever de isonomia por parte da Administração Pública; Dever de conformidade ao interesse público; Imputação dos atos praticados pelos agentes públicos diretamente às pessoas jurídicas em que atuam. Nesse contexto, pode-se dizer que o princípio da impessoalidade, expresso na CF, de 1988, e implícito na Lei Federal 9.784, de 1999, tem uma “tripla formulação”, “três faces”. Numa primeira visão, para parte da doutrina, a impessoalidade como princípio significa que o administrador público só deve praticar atos voltados à consecução do interesse público. Por tal princípio, o tratamento conferido aos administrados em geral deve levar em consideração não o “prestígio” social por estes desfrutado, mas sim suas condições objetivas em face das normas que cuidam da situação, tendo em conta o interesse público, que deve prevalecer. Fixação CESPE - AUFC/TCU/Controle Externo/Auditoria Governamental/2007 Acerca dos princípios constitucionais que informam o direito administrativo, julgue os próximos itens. O atendimento do administrado em consideração ao seu prestígio social angariado junto à comunidade em que vive não ofende o princípio da impessoalidade da administração pública. (Certo/Errado)12 12 ERRADO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 27 Para esses doutrinadores, a atuação impessoal determina uma atuação finalística da Administração, ou seja, voltada ao melhor atendimento dos interesses públicos. Desse modo, o princípio da impessoalidade é sinônimo de finalidade pública. Sobre o tema, vejamos Ementa do Recurso Extraordinário (RE) 191.668, apreciado pelo STF: 1. O caput e o parágrafo 1º do artigo 37 da Constituição Federal impedem que haja qualquer tipo de identificação entre a publicidade e os titulares dos cargos alcançando os partidos políticos a que pertençam. O rigor do dispositivo constitucional que assegura o princípio da impessoalidade vincula a publicidade ao caráter educativo, informativo ou de orientação social é incompatível com a menção de nomes, símbolos ou imagens, aí incluídos slogans, que caracterizem promoção pessoal ou de servidores públicos. A possibilidade de vinculação do conteúdo da divulgação com o partido político a que pertença o titular do cargo público mancha o princípio da impessoalidade e desnatura o caráter educativo, informativo ou de orientação que constam do comando posto pelo constituinte dos oitenta. (2011/CESPE/ECT/Administrador) Entre as acepções do princípio da impessoalidade, inclui-se aquela que proíbe a vinculação de atividade da administração à pessoa do gestor público, evitando-se, dessa forma, a realização de propaganda oficial para a promoção pessoal13. Em outra interessante acepção do princípio da impessoalidade, os atos e provimentos administrativos são imputáveis não ao funcionário que os pratica, mas ao órgão ou entidade administrativa em nome do qual age o funcionário. Por essa linha, pelos atos dos agentes responde a Administração Pública, em razão da impessoalidade de atuação daqueles. A tese é consagrada em diversos momentos da nossa atual Constituição Federal, como no art. 37, §6º do textoconstitucional: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa 13 Gabarito: CERTO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 28 qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Vê-se que a pessoa jurídica à qual é vinculado o agente responde pelo dano causado por este, nitidamente devido à impessoalidade da atuação funcional. Portanto, o agente tem sua atuação imputada ao órgão/entidade a que se vincula (teoria do órgão ou da imputação volitiva). Uma terceira face da impessoalidade pode ser encontrada no art. 37, inc. II, por exemplo. Ao se exigir concurso público para o acesso aos cargos públicos, o legislador prezou pelo mérito, sem criar discriminações benéficas ou detrimentosas, em observância ao princípio da isonomia ou igualdade. Obviamente, não significa dizer que as leis não possam criar critérios para a seleção dos candidatos. Sobre o tema, o STF, no RE 148.095, reconheceu que, em se tratando de concurso público para agente de polícia, mostra- se razoável a exigência, por lei, de que o candidato tenha altura mínima de 1,60m. A exigência de altura, por sua vez, não é razoável para o cargo de escrivão de polícia, dado as atribuições do cargo, para as quais o fato altura é irrelevante (STF - AI 518863). Fixação CESPE - ATI (ABIN)/ABIN/Administração/2010 Julgue o item subsequente, acerca dos princípios, poderes e atos administrativos. O princípio da impessoalidade decorre, em última análise, do princípio da isonomia e da supremacia do interesse público, não podendo, por exemplo, a administração pública conceder privilégios injustificados em concursos públicos e licitações nem utilizar publicidade oficial para veicular promoção pessoal. (Certo/Errado)14 Assim, a atividade administrativa deve se dar segundo critérios de bom andamento do serviço público, afastando-se favoritismo ou mesmo desfavoritismos. Sobre o tema, o STF, na ADI 1072/RJ, declarou a inconstitucionalidade de lei estadual que dispensava os candidatos integrantes do Quadro Permanente da Polícia Civil da prova de capacitação física e de investigação social (“Não há razão 14 CERTO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 29 para se tratar desigualmente os candidatos ao concurso público, dispensando-se, da prova de capacitação física e de investigação social, os que já integram o Quadro Permanente da Polícia Civil do Estado, pois a discriminação implica ofensa ao princípio da isonomia”). Lúcia Figueiredo explica que a impessoalidade pode levar à igualdade, mas com ela não se confunde. É possível haver tratamento igual a determinado grupo (que estaria satisfazendo o princípio da igualdade), porém, se ditado por conveniências pessoais do grupo e/ou do administrador, estará infringindo a impessoalidade. É verdade que estão próximos os princípios, mas certamente não se confundem. Para efeito de concursos públicos, é costumeiro as organizadoras exigirem as aplicações práticas dos princípios. Assim, vejamos abaixo algumas das mais importantes aplicações: §1º do art. 37 da CF/1988: A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos. Art. 18 da Lei 9.784/1999 (Lei de Processo Administrativo Federal): regras de impedimento e de suspeição. Responda rápido: se você fosse o julgador de processo administrativo em que o acusado é sua sogra, o resultado seria favorável? Não precisa responder! No caso concreto, para evitar a parcialidade no julgamento, é conveniente que o agente público se reconheça impedido, evitando-se, inclusive, eventual responsabilização administrativa. Fixação CESPE - Proc (MPTCU)/TCU/2004 A respeito dos princípios administrativos, julgue os itens subsequentes. Regras relativas a impedimentos e suspeições são aplicadas a servidores públicos como corolário do princípio da impessoalidade. (Certo/Errado)15 15 CERTO. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 30 Atos praticados por agente de fato (putativo ou necessário): é, por exemplo, o particular que ingressou na Administração Pública, no entanto, de forma irregular (agente putativo). É o agente “denorex” (parece que é, mas não é), e, de acordo com a teoria da aparência, seus atos praticados serão considerados válidos perante terceiros de boa-fé. O agente necessário, por sua vez, é aquele que atua em casos de emergência, fazendo as vezes do agente público, como, por exemplo, o cidadão que orienta o trânsito, haja vista o mau funcionamento do semáforo. Art. 100 da CF/1988: o regime célere e eficaz de pagamento de dívidas do Estado - precatórios. A inscrição em precatórios observa, de regra, uma ordem cronológica de apresentação, sendo proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias. CESPE - ATI (ABIN)/Administração/2010 Julgue o item subsequente, acerca dos princípios, poderes e atos administrativos. O princípio da impessoalidade decorre, em última análise, do princípio da isonomia e da supremacia do interesse público, não podendo, por exemplo, a administração pública conceder privilégios injustificados em concursos públicos e licitações nem utilizar publicidade oficial para veicular promoção pessoal. 2.2.1.3. Moralidade A ilegalidade mais grave é a que se oculta sob a aparência de legitimidade. A violação maliciosa encobre os abusos de direito com a capa de virtual pureza (por Caio Tácito). O princípio da moralidade é “velho” conhecido da doutrina. No entanto, passou a ser explícito, em termos constitucionais, a partir de 1988. Na doutrina francesa, Maurice Hauriou, depois de diferenciar a moral comum da moral jurídica, define a moralidade jurídica como o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração. Portanto, a conduta da Administração deve ser mais exigente do que simples cumprimento da frieza das leis. Deve-se divisar o justo do injusto, o lícito do ilícito, o honorável do desonorável, o conveniente do inconveniente. A moralidade passa a ser pressuposto de validade dos atos do Estado, sendo que em toda a atuação estatal deverão estar presentes princípios da lealdade, da boa-fé, da fidelidade funcional, dentre outros, atinentes à moralidade. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 31 Lúcia de Figueiredo esclarece que a anulaçãode atos provenientes do excesso de poder é fundada tanto na noção de moralidade administrativa quanto na legalidade, de tal sorte que a Administração é ligada, em certa medida, pela moral jurídica, particularmente no que concerne ao desvio de poder. Lealdade, boa-fé, honestidade são preceitos éticos desejados pela sociedade que nos remunera direta ou indiretamente. Por isso, o princípio da moralidade pode ser considerado a um só tempo dever do administrador e direito público subjetivo. O legislador constitucional, sensibilizado com a moralidade, traz algumas aplicações práticas. Vejamos: Art. 5º, LXXIII (ação popular) - a proteção da moralidade administrativa, nesse caso, depende de iniciativa exclusiva de qualquer cidadão (não é qualquer particular, cuidado); Art. 37, § 4º, e 85, V, (atos de improbidade administrativa); A probidade é um aspecto da moralidade. De acordo com o Dicionário Aurélio (eletrônico), probidade diz respeito à integridade de caráter, honradez, ou seja, conceito estreitamente correlacionado com o de moralidade administrativa, tal como gosta de afirmar o examinador em provas do CESPE. Vejam aí o exemplo: (2007/CESPE/TCU/Analista) A probidade administrativa é um aspecto da moralidade administrativa que recebeu da Constituição Federal brasileira um tratamento próprio16. Art. 70 (princípios da legitimidade e economicidade, das quais irradia a moralidade); Os amigos são sabedores de que a Constituição Federal vigente consagra os controles interno e externo, este, em termos parlamentares, a cargo das Casas Legislativas com o auxílio técnico dos Tribunais de Contas. O controle parlamentar está previsto, ainda, no art. 50 e seus parágrafos, além do § 3º do art. 58 da CF, de 1988, que dá poderes 16 Gabarito: CERTO. Apesar de ser tecnicamente ligada à moralidade, a probidade possui tratamento próprio no § 4º do art. 37 da CF/1988. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 32 de investigação próprios das autoridades judiciais às Comissões Parlamentares de Inquérito – CPIs. A esses órgãos incumbe controlar os atos da Administração, inclusive sob o aspecto da moralidade. Art. 129, III (ação civil pública); Então, prontos para definir moralidade administrativa? O conceito talvez não, mas as aplicações vocês já estão treinados. O conceito de moralidade é um conceito jurídico indeterminado, tais como “bem comum” e “interesse público”. De fato, o Direito contém um sem-número de conceitos indeterminados, elásticos, plurissignificativos, equívocos, os quais levam à loucura alguns, sobretudo aqueles da área das ciências mais precisas (as ditas “exatas”). Nós temos amigos de engenharia, matemática e outras, que sempre dizem assim: mas que ciência ‘doida’ esse tal de direito, hein? Como é que pode uma situação concreta ter um monte de interpretação? Nossa resposta: o Direito é uma ciência do social, e suas interpretações irão mudar junto com a sociedade, resultando essa “multiplicidade” de interpretações. Com a mudança social, muda-se a interpretação... Realmente, a moralidade é um conceito indeterminado, como muitos outros. Mas qual seria a razão de o legislador utilizar essa “técnica” de conceitos indeterminados? Quando o legislador lança mão de conceitos vagos, indeterminados, faz com que uma norma tenha maior “longevidade”, ou seja, viva por mais tempo. Um exemplo torna mais claro. O art. 1º da Lei 10.520/2002 diz que o pregão, uma das modalidades de licitação, serve à aquisição de bens e serviços “comuns”. Vem a indagação: mas o que são ‘bens e serviços comuns’? Esse conceito é vago demais! De fato, o conceito é bastante “aberto”, ou, abstrato. Porém, isso é positivo, faz com que a norma “viva” mais tempo. Por exemplo, o Pregão, há trinta anos, não serviria à aquisição de bens e serviços de informática, pois não eram comuns (no sentido de padronizados). Hoje, no entanto, o Pregão servirá, sim, para boa parte destas aquisições, uma vez que muitos bens e serviços de Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 33 informática são padronizados no mercado. É isso que quero dizer com “a norma vive mais tempo”, ao se utilizar conceitos indeterminados. Apesar de tratar-se de um conceito vago, a moralidade administrativa não está imune ao controle judicial. Basta ver o que diz o inc. XXXV do art. 5º da CF/1988 para chegar a essa conclusão. Relembremos o dispositivo: a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Notem, nem mesmo a lei excluirá da apreciação judicial um ato que, ao menos potencialmente, possa causar prejuízos. A simples utilização de um conceito indeterminado, como a moralidade, não impede a atuação do Poder Judiciário de exercer o legítimo controle do ato. Mesmo que tal conceito seja empregado em sua “acepção pura”, ou seja, em seu sentido filosófico, entendida, portanto, como um conjunto de regras de conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada (conceito extraído do Dicionário Aurélio Eletrônico), estará a salvo do controle judicial. E, agora, prontos para separar a moralidade da legalidade? E a moralidade comum da jurídica? É de interesse a distinção entre a legalidade e moralidade, enquanto princípios, os quais, por razões óbvias, não podem ser entendidos como sinônimos perfeitos. Pelo princípio da legalidade, a Administração Pública só pode atuar de acordo com o que a lei estabelece ou autoriza. Já a moralidade é um dos conceitos que conta com um dos maiores graus de abstração no mundo jurídico: o que seria a “moral”? Ainda que o conceito seja passível de inúmeras interpretações, é claro que sua definição perpassa por uma noção muito subjetiva, influenciada, ainda, pelo momento histórico vivido. Exemplo disso é o nepotismo, tratado mais à frente. Há dez, vinte anos, seria impensável alguma autoridade judicial dizer que a prática do nepotismo não se alinhava ao princípio da moralidade. Hoje, felizmente, nosso direito evoluiu, e a nomeação de parentes para cargos de chefia passou a ser refutada pela sociedade, bem como por tribunais judiciais. Curso Teórico de Direito Administrativo para AFT Profº Cyonil Borges – aula 01 Profº. Cyonil Borges www.estrategiaconcursos.com.br 34 O princípio da moralidade tem profunda relação com o “padrão de comportamento” desejável dos agentes públicos, estreitando-se com o que poderia nominar, sinteticamente, por ética. Por dizer respeito a “comportamento”, nota-se extrema dificuldade em tentar se “isolar” uma moral essencialmente administrativa, ou seja, do Estado. De fato, para se chegar ao conceito de padrão, o intérprete da lei será certamente influenciado pela noção de moral “comum”, que prevalece no seio da sociedade em determinado momento histórico. Em síntese: a “moralidade” administrativa e a comum são indissociáveis, não havendo como se falar de uma sem se abordar a outra. É fácil observar a consagração do princípio da moralidade administrativa,
Compartilhar