Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERDIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E TECNOLOGIA JAQUELINE SANTOS VARGAS A INCLUSÃO DO DEFICIENTE AUDITIVO EM ESCOLAS PÚBLICAS DE CAMPO GRANDE: AS VISÕES DO PROFESSOR, COORDENADOR, INTÉRPRETE E DO ALUNO CAMPO GRANDE/MS 2011 JAQUELINE SANTOS VARGAS A INCLUSÃO DO DEFICIENTE AUDITIVO EM ESCOLAS PÚBLICAS DE CAMPO GRANDE: AS VISÕES DO PROFESSOR, COORDENADOR, INTÉRPRETE E DO ALUNO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em Física da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, campus Campo Grande (MS), como um dos requisitos à aprovação da disciplina de Prática de Ensino de Física V, sob a orientação da Profa. Dra. Shirley Takeco Gobara. CAMPO GRANDE 2011 JAQUELINE SANTOS VARGAS A INCLUSÃO DO DEFICIENTE AUDITIVO EM ESCOLAS PÚBLICAS DE CAMPO GRANDE: AS VISÕES DO PROFESSOR, COORDENADOR, INTÉRPRETE E DO ALUNO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Licenciatura em Física da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, campus Campo Grande (MS), como um dos requisitos à aprovação da disciplina de Prática de Ensino de Física V, sob a orientação da Profa. Dra. Shirley Takeco Gobara. Campo Grande, MS, ____ de ______________ de 2011 COMISSÃO EXAMINADORA _____________________________________________ Profa. Dra. Shirley Takeco Gobara Universidade Federal de Mato Grosso do Sul _____________________________________________ Profº. Sérgio Luiz Piubéli Universidade Federal de Mato Grosso do Sul _____________________________________________ Prof. Dr. Rodolfo Langhi Universidade Federal de Mato Grosso do Sul “Aos meus pais e ao meu namorado Luiz Felipe.” AGRADECIMENTO Agradeço primeiramente a Deus, pela vida, e por ser um refúgio para as horas difíceis. Aos meus pais Antônio e Alaíde por me ensinarem a persistir em meus objetivos, incentivando e sendo uma base sólida para nossa família. Ao meu namorado Luiz Felipe por esses anos, de muito carinho, amizade, companheirismo e felicidade, além de ter me ajudando em vários momentos com essa pesquisa. Às minhas irmãs, pelos momentos de descontração e até de companheirismo. À minha avó Maria, por tudo que fez por mim, e por nossa família. Aos meus familiares e amigos, pela colaboração, incentivo e apoio durante essa minha trajetória. Aos meus amigos de graduação do curso em especial Fabiana Oliveira, Edilene Assunção, Ana Paula, Tairine, por serem amigas e companheiras, Julio, Eder, Johnathan, Bruno Simões, Paulo e José pela amizade e convívio, compreensão e estudos, além das “bagunças”. À minha orientadora Dra. Shirley Takeco Gobara, pela confiança, cobranças e ajuda em toda minha carreira universitária, além de sua amizade. Ao meu orientador do PIBID-Física e amigo Me. Sérgio Luiz Piubéli, obrigada pelo apoio, amizade, incentivos e até bagunças, além das ajudas em vários momentos. Ao Professor Dr. Rodolfo Langhi, por ter orientado todos os alunos que estavam fazendo a monografia, pelas broncas, elogios e até os momentos de descontração. À equipe do CAS e a Coordenadora de Educação Especial da Secretaria Estadual de Educação, Vera Carbonari, por ter aberto as portas das escolas para a realização da presente pesquisa, além de todos que participaram das entrevistas. Aos professores, intérpretes, coordenadores e especialmente aos alunos que voluntariamente concordaram em participar desta pesquisa contribuindo para o desenvolvimento da presente pesquisa. E por fim, agradeço a todos que me ajudaram diretamente ou indiretamente para o desenvolvimento desta pesquisa. OBRIGADA a todos vocês “... Surdo é aquele que não tem tempo de ouvir um desabafo de um amigo, ou o apelo de um irmão. Pois está sempre apressado para o trabalho e quer garantir seus tostões no fim do mês.” (Mário Quintana) RESUMO Este trabalho tem como objetivo investigar a inclusão de alunos surdos nas escolas públicas do Ensino Médio de Campo Grande-MS na rede estadual de ensino, e as dificuldades para a aprendizagem de Física. Esta pesquisa apresenta a situação dos alunos surdos que estão no Ensino Médio regular. Trata-se de uma investigação qualitativa em que foram observadas algumas aulas e realizadas entrevistas semi- estruturadas com os professores de Física, intérpretes, coordenadores e os próprios alunos surdos. Os resultados evidenciaram que, embora haja um intérprete para atender todas as matérias, a compreensão da Física fica prejudicada porque o intérprete não domina os conteúdos de Física e o professor não conhece a linguagem dos sinais. Do ponto de vista social a inclusão está acontecendo, no geral os alunos têm uma relação afetiva muito grande com as escolas que eles estudam. Mas, as condições oferecidas pela escola não favorecem o desenvolvimento das potencialidades cognitivas do aluno, inviabilizando a inclusão como as leis determinam. Palavras-chave: Alunos surdos, aprendizagem, ensino de física, inclusão educacional. ABSTRACT This work has as objective to investigate the inclusion of deaf pupils in the public schools of Average Education of Campo Grande-MS, and the difficulties for the physics learning. This article presents the situation of a deaf student who is in second year High School. It is a qualitative research that have been observed in some classes and semi- structured interviews with the teacher of physics, interpreter, coordinator and the proper student. The results showed that although there is an interpreter to meet all subjects, the understanding of physics is impaired because the interpreter does not dominate the physics content and the teacher does not know sign language. From the point of view social, the inclusion is happening, this student has an emotional relationship with this school. But the conditions offered by the school do not favor the development of student's cognitive potentialities, making impracticable the inclusion as the laws determine. Key words: Deaf students, learning, teaching of physics, educational inclusion. LISTA DE TABELAS Tabela 1-Número de artigos encontrados por periódico/revista LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CAS - Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento ao Surdo CEADA - Centro Estadual de Atendimento ao Deficiente da Audiocomunicação CEB/CNE - Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação EJA - Educação de Jovens e Adultos GINPEC - Grupo Interdisciplinar de Ensino de Ciências IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística LDBN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LIBRAS - Língua Brasileira de Sinais MEC - Ministério da Educação MS – Mato Grosso do Sul PCN - Parâmetros Curriculares NacionaisSED - Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul SEESP - Secretaria de Educação Especial SEMED - Secretaria de Educação do município de Campo Grande- MS SNEF - Simpósio Nacional de Ensino de Física UFMS - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 11 Justificativa ........................................................................................................................... 12 Objetivo Geral ...................................................................................................................... 13 Objetivos específicos ............................................................................................................ 13 1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................................... 14 1.1 O que é Surdez ........................................................................................................... 14 1.2 A Língua de Sinais ..................................................................................................... 14 1.3 O papel da Legislação ................................................................................................ 15 1.4 Educação Especial: da Integração à Inclusão ............................................................ 17 1.5 Abordagem histórico-cultural e as questões da linguagem ....................................... 19 2 METODOLOGIA DA PESQUISA .................................................................................. 21 2.1 Levantamento Documental e Bibliográfico ............................................................... 22 2.2 Levantamento documental ......................................................................................... 23 2.3 Levantamento Nos Órgãos Especializados ................................................................ 24 2.4 Observações ............................................................................................................... 26 2.5 Entrevistas .................................................................................................................. 26 3 ANÁLISE DOS DADOS ................................................................................................. 28 3.1 Análise das observações das aulas ............................................................................. 28 3.2 Análise das Entrevistas .............................................................................................. 32 4 ANÁLISE GERAL DAS CATEGORIAS ....................................................................... 50 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 52 Referências Bibliográficas ........................................................................................................ 54 Apêndice A - Guia para as Observações .................................................................................. 56 Apêndice B - Guia para as Entrevista ....................................................................................... 57 Anexo A - Termo de Consentimento Esclarecido .................................................................... 60 11 INTRODUÇÃO Atualmente a sociedade está dando maior atenção e se organizando para o atendimento às pessoas com necessidades especiais por meio do cumprimento das leis e regulamentações. Até 1988 já havia preocupação com a situação dos deficientes, vale destacar a aprovação da Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes em 1975, onde essas pessoas adquiriram direitos perante a sociedade. Nesse período, o Brasil usava uma tendência mundial para o atendimento educacional, onde usava o processo de inserção dessas pessoas na sociedade eram baseadas em teorias e leis internacionais, mas foi a partir 1988 que a educação passou a ser dever do estado conforme está descrito no art. 208, Inciso III da Constituição Federal de 1988: “O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino.” (BRASIL, 1988, p.1). A Constituição de 1988, portanto, é considerada um passo importante para a inclusão educacional das pessoas com deficiência no Brasil, pois foi a partir deste ano que o estado passou a assumir legalmente a responsabilidade pela educação com a garantia de um atendimento especializado. . Em 1996 foi estabelecida a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBN), e especificamente no capítulo VI foi definida a educação especial e o papel do governo com relação aos alunos com deficiência. E foi com o apoio dessa legislação que se iniciou de fato o processo de inclusão, o que até então não havia mecanismos legais para exigir do estado tal responsabilidade, que já fazia parte das reivindicações da sociedade e que foi respaldada pela LDBN. O que se observa é que em termos de política pública a sociedade brasileira está relativamente respaldada; as leis, decretos e portarias afirmam isso. Por exemplo, atualmente o governo está colocando em prática a lei que determina aos cidadãos providenciarem pisos táteis em suas calçadas, isso para ajudar o deslocamento dos cegos. É importante ressaltar que a sociedade é formada por pessoas de várias índoles e vontades, cabe ao estado criar leis para organizar e regulamentar o convívio das mesmas em lugares públicos e dar acessibilidade para os portadores de necessidades especiais. Preocupados com a inclusão dos alunos deficientes, em particular os deficientes auditivos, resolvemos investigar de que maneira está acontecendo a inclusão nas escolas, 12 assim como vários aspectos que colaboram para a implementação dessa prática nas salas de aulas, dentre estes, a formação do intérprete e a capacitação dos professores, já que são eles os maiores responsáveis pela aprendizagem do aluno. Outro fato que também foi investigado são as diferentes visões dos atores, que participam diretamente do processo de implementação das leis que determinam a inclusão dos alunos deficientes auditivos, em particular, nas escolas públicas de Ensino Médio de Campo Grande. JUSTIFICATIVA De acordo com as legislações atuais as escolas regulares devem receber os deficientes tanto para o ensino médio quanto para o fundamental. Isto é, o papel do estado incluir os alunos com deficiência nas escolas regulares de ensino, e no caso dos alunos surdos é estabelecido no Decreto nº 5.626/05, que regulamenta a Lei nº 10.436/2002, visando ao acesso à escola dos alunos surdos, e dispõe sobre a inclusão da Língua Brasileira e Sinais (LIBRAS) como disciplina curricular, a formação e a certificação de professor, instrutor e tradutor/intérprete de Libras, o ensino da Língua Portuguesa como segunda língua para alunos surdos e a organização da educação bilíngüe no ensino regular. (BRASIL, 2007, p.4). Estamos interessados em investigar a inclusão de alunos surdos nas escolas públicas de Ensino Médio de Campo Grande-MS e as dificuldades para a aprendizagem de Física porque, para essa modalidade de deficiência, há outro fator importante que é o papel do intérprete, pois a Língua de Sinais foi criada para a comunicação entre os surdos e entre os surdos e não surdos e para transpor os conteúdos escolares nem sempre há sinais equivalentes, e, de uma forma geral, cabe ao intérprete realizar a tradução para as diferentes matérias. Isso nos levou a questionar se a inclusão, da forma que está sendo implementada nas escolas públicas de Campo Grande, está de fato acontecendo, em particular para a matéria Física, dada as particularidadesdesse conhecimento em relação às condições oferecidas pela escola e a preparação do intérprete e professor. Isso nos levou a elaborar esse trabalho que teve o seguinte foco: “Inclusão de alunos surdos nas aulas de Física do Ensino Médio Regular em Campo Grande-MS”, tema que foi escolhido, também, por fazer parte de uma das linhas de pesquisa do Grupo Interdisciplinar de Ensino de Ciências (GINPEC) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e, 13 principalmente, pela escassez de trabalhos na área da Educação que tratam sobre alunos surdos, ou assuntos correlatos de acordo com um levantamento realizado. OBJETIVO GERAL Verificar ocorrência da inclusão para alunos com surdez, proposta pelas leis nacionais, nas escolas públicas de Campo Grande MS. OBJETIVOS ESPECÍFICOS Levantar as diferentes visões dos atores sobre a inclusão dos alunos deficientes auditivos; Realizar um levantamento das escolas que possuem alunos surdos no Ensino Médio regular e a porcentagem de alunos surdos e intérpretes nas escolas estaduais em Campo Grande; Observar as interações desses alunos nas aulas das escolas de Campo Grande, mais especificamente nas aulas de Física, independente da série que os alunos se encontram; Analisar as aulas de um conteúdo específico, nos seguintes aspectos: interação professor-aluno, interação professor-intérprete, entre outros aspectos que vão desde o comportamento dos alunos até a maneira que o professor leciona; Investigar a formação do professor e do intérprete que convivem diretamente com alunos surdos nas escolas regulares. 14 1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 1.1 O QUE É SURDEZ A surdez é a incapacidade de audição. De acordo com o decreto nº 5.626, no artigo 2°: [...] considera-se pessoa surda aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais. Parágrafo único. Considera-se deficiência auditiva a perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas freqüências de 500Hz, 1.000Hz, 2.000Hz e 3.000Hz.(BRASIL, 2005, p.1) ‘Uma diferença entre surdez e deficiência auditiva é que os surdos, enquanto grupo organizado culturalmente, não se definem como “deficientes auditivos”, ou seja, para eles o mais importante não é frisar a atenção sobre a falta/deficiência da audição’(WRIGLEY,1996 apud SÁ, 2006, p.1). Dessa maneira os surdos são definidos de acordo com sua cultura e de acordo com a língua que eles usam, assim, o termo “surdo” é usado entre eles para identificá- los, ou seja, é dessa maneira que eles querem ser conhecidos. Segundo Davis e Silvermann (1970) apud Dias (2006), a audição normal quanto à intensidade sonora, tem seu limiar situado entre a faixa de 10 a 26 dB e quanto à freqüência de 20 a 2000 Hz (1995). As freqüências mais importantes para o reconhecimento da fala estão entre os intervalos de 500 a 2000 Hz. Os resultados do Censo 2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que aproximadamente “5,7 milhões de brasileiros têm algum grau de deficiência auditiva, sendo que um pouco menos de 170 mil se declararam surdos.” (IBGE, 2000). Isso significa que apenas 0,1% da população brasileira possui algum grau de deficiência auditiva. 1.2 A LÍNGUA DE SINAIS A Língua de Sinais tem origem francesa e vem se difundindo desde 1857. Define-se a Língua Brasileira de Sinais de acordo com a lei n° 10.436, de 24 de abril de 2002, como a forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema lingüístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil.(BRASIL, 2002, p.1). 15 Assim a Libras é a língua usada pela comunidade surda brasileira, que foi criada e é usada no Brasil. Que possui suas regras gramaticais próprias, possibilitando assim, o desenvolvimento linguístico da pessoa surda, favorecendo o seu acesso aos conhecimentos existentes na sociedade. Segundo Quadros (2004), um fato importante é que o desenvolvimento lingüístico, cognitivo, afetivo, sociocultural e acadêmico não depende da audição, mas sim da aquisição e desenvolvimento da língua de sinais. Os sinais na Libras são formados a partir de parâmetros, como a combinação do movimento das mãos com um determinado formato num determinado lugar, podendo este lugar, ser uma parte do corpo ou um espaço em frente ao corpo. Dessa maneira, o sinal é formado com a combinação destes parâmetros. Conforme Quadros (2004), os parâmetros da Libras são: - Configuração das mãos; - Locação; - Movimentos; - Orientação das mãos; - Expressão facial e/ou corporal. Assim, para criar sinais é preciso combinar os parâmetros acima para a formação de textos e frases. De maneira geral a Língua de Sinais é uma língua espaço visual onde são usadas as mãos e as expressões corporais e faciais. De acordo com Quadros (2004) o surdo é um sujeito cuja língua é visual-espacial, o processo de aquisição de conhecimento é baseado em uma descrição visual. 1.3 O PAPEL DA LEGISLAÇÃO Antes da Constituição Federal de 1988, o Brasil usava uma tendência internacional para o atendimento educacional das pessoas com deficiência, onde eram implantados modelos de processos de integração de outros países. Vale destacar que em 1975, há a aprovação da Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes que tem como o objetivo versar os direitos das pessoas com qualquer tipo de deficiência. Segundo Rodrigues: 16 [...] A partir da década de 1980, começa a crescer uma inquietação contra os limites da integração, que ganha forma no conceito de sociedade inclusiva1 e se converte em princípios da política de direitos humanos de organismos internacionais e em direitos assegurados na Constituição Brasileira. “Em 1981, ao instituir o Ano Internacional das Pessoas Deficientes, a ONU oficializou o embrião do conceito de sociedade inclusiva.”. (RODRIGUES, 2006, p.1) Rodrigues (2006) também acredita que foi com a Constituição de 1988, que ficou consagrado o direito à acessibilidade, pois com esta, ficou garantido direito de ir e vir, e estabelece que: “XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”. Além disso, no artigo 227, está definido que a lei disporá, sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência. Um ponto marcante da Constituição Federal de 1988, é que no art. 208, Inciso III, diz que é “O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”. (BRASIL, 1988, p.1). No Brasil o processo de integração ficou evidenciado no ano de 1994, quando foi publicada a Política Nacional de Educação Especial, onde as ‘pessoas com deficiência podiam freqüentar o Ensino Regular, desde que esses alunos tivessem condição e capacidade de seguir o ritmo dos outros alunos “normais”. ’ (BRASIL, 1994, p.3). Em 1996 foi estabelecida a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBN), especificamente no capítulo VI, onde foi definida a educação especial e atribuindo ao estado a responsabilidade de oferecer a educação aos alunos com deficiências, anteriormente denominados como portadores de necessidades especiais. De maneira geral, essa lei oferece um apoio para os alunos com necessidades especiais,ao estabelecer que os professores devem ser capacitados e, também, as pessoas com deficiência têm o direito de receber o auxílio de especialistas em qualquer nível de ensino. Em 2002 foi criada a Lei Federal nº 10.436 que define a Libras como a “forma de comunicação e expressão, em que o sistema lingüístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema lingüístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil.” (BRASIL, 2002, p.1) 1 Sociedade Inclusiva: Todas as pessoas têm igual valor; A existência de pessoas com deficiência faz parte da diversidade humana; A diferença entre as pessoas é um princípio básico e nenhuma forma de discriminação pode ser tolerada; O respeito e a valorização das diferenças definem a sociedade inclusiva. 17 De acordo Decreto nº 5.626 de dezembro de 2005, capítulo II, no artigo 3°, a Libras deve ser inserida como disciplina curricular obrigatória nos cursos de formação de professores (Cursos de Licenciatura), em nível médio e superior, e nos cursos de Fonoaudiologia, de instituições de ensino, públicas e privadas, do sistema federal de ensino e dos sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. (BRASIL, 2005, p.2) A partir da publicação do Decreto nº 5.626, as instituições de ensino médio e as instituições de educação superior que oferecem cursos de Fonoaudiologia ou de formação de professores devem incluir Libras no currículo de disciplinas, nos seguintes prazos e percentuais mínimos: I - até três anos, em vinte por cento dos cursos da instituição; II - até cinco anos, em sessenta por cento dos cursos da instituição; III - até sete anos, em oitenta por cento dos cursos da instituição; e IV - dez anos, em cem por cento dos cursos da instituição. (BRASIL, 2005, p.2) Dessa maneira é possível verificar que com relação às leis, as pessoas com deficiência estão amparadas. De acordo com Rodrigues: A existência deste arcabouço legal, afora toda a legislação estadual e municipal que trata dos direitos da pessoa com deficiência, deve-se, principalmente, a luta do movimento de pessoas com deficiência, continuamente mobilizada em prol da garantia de seus direitos. Em 2004, o Brasil foi eleito pela organização não governamental internacional IDRM – International Disability Rights Monitor como um dos cinco países mais inclusivos das Américas. Um dos seis requisitos para a classificação era a existência de arcabouço legal que garantisse a adequada proteção das pessoas com deficiência. (RODRIGUES, 2006, p.6) 1.4 EDUCAÇÃO ESPECIAL: DA INTEGRAÇÃO À INCLUSÃO Durante muitos séculos, as pessoas com deficiência eram consideradas “inválidas” e socialmente inúteis, inclusiva na Idade Média, com o domínio da Igreja Católica, essas pessoas eram chamadas de aberrações, bruxos e até castigo de Deus. “Neste contexto de quase barbárie, a política de segregação formulada no final do século XIX e aplicada até a década de 1940, impondo a internação definitiva em instituições fechadas, representou um progresso humanitário.” (RODRIGUES, 2006, p.1) “Historicamente, os filósofos e os médicos têm sido os mais influentes na promoção da transição da concepção sobre deficiência. Gradativamente, a partir do século XVI, a questão da deficiência passa da órbita da igreja para tornar-se objeto da medicina.” 18 (TELFORD, 1984, p.27). Conforme o tempo foi passando o pensamento da sociedade foi evoluindo, e com o avanço da medicina essas pessoas começaram ser estudadas. No século XX, os estudos com as pessoas com deficiência começaram a dar importância para a auto-estima destas pessoas e assim começaram a se pensar na educação, assim como, nos elementos para o atendimento especializado. Foram surgindo teóricos preocupados com a educação e ao atendimento das pessoas com deficiência, assim como foram criadas instituições e centros para o atendimento das mesmas. Dessa maneira, foi surgindo um tratamento especial, que mais tarde foi chamada de Educação Especial. A Educação Especial é uma ramificação da Educação, na qual se tem a preocupação de educar as pessoas com deficiência em geral, em entidades e escolas especializadas. A Educação Especial está fora da escola regular, isso facilita de certa forma, pois as pessoas com deficiência possuem atendimento especializado de acordo com suas necessidades já que a escola é especializada. Porém há certa crítica de alguns psicólogos, sociólogos, pedagogos entre outros especialistas, pois eles acreditam que é prejudicial para essas pessoas conviverem apenas com pessoas iguais a eles, não interagindo e convivendo com outras pessoas com outro tipo de deficiência e até mesmo as que não possuem nenhum tipo de deficiência. Com a criação de centros especializados para o atendimento das pessoas com deficiência, começou o processo de integração das pessoas nos ambientes freqüentados por pessoas sem deficiência, inclusive nas escolas regulares. Com a Política Nacional de Educação Especial em 1994, o processo de integração ficou evidenciado, onde nesse processo os alunos com deficiência, deveriam se adaptar ao regime já posto. Essa prática não visava uma modificação no currículo escolar e nem na prática docente, os alunos apenas se enquadravam no quadro de alunos da escola e com suas dificuldades era preciso acompanhar os outros alunos. Resumidamente essas pessoas deveriam se adaptar para fazer parte da sociedade. Atualmente o que se tem feito, é tentar construir uma escola inclusiva, na qual a escola se adapta as necessidades desses alunos. Nas Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, Resolução CNE/CEB nº 2/2001, no artigo 2º, determinam que: Os sistemas de ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas organizarem-se para o atendimento aos educandos com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade para todos. (MEC/SEESP, 2001, p.3) Dessa maneira o processo de integração está totalmente ligado ao de inclusão, porém a inclusão consiste em tornar as aulas e processo de aprendizagem no ritmo do aluno com 19 deficiência, isso não significa fazer uma aula voltada só para esses alunos, mas que eles consigam participar e aprender conforme sua necessidade, da mesma maneira que os alunos sem deficiências. 1.5 ABORDAGEM HISTÓRICO-CULTURAL E AS QUESTÕES DA LINGUAGEM O surdo como membro da sociedade também participa das relações sociais. Nesta seção iremos olhar o surdo como um indivíduo, assim como um ouvinte, que constrói os novos conhecimentos influenciados pelas relações sociais. Nesse sentido, o referencial teórico adotado é baseado nas idéias de Vygotsky, além disso, esse autor também trabalhou com crianças que possuíam problemas congênitos (cegueira, surdez, retardamento mental), o que o motivou a ajudar as crianças a se desenvolverem, tendo um trabalho importante com crianças surdas. Em seus trabalhos, Vygotsky tentou explicar o desenvolvimento cognitivo dos indivíduos e para o entendimento deste o autor focou no contexto sócio e cultural, onde ficou restrito na natureza da gênese e nos processos sociais humanos, dessa maneira ele estudou o ser humano socialmente e geneticamente, assim como estabeleceu relações com as condições biológicas. Nesta pesquisa iremos usar os trabalhos de Vygotsky em que há a relação do pensamento e a linguagem, articulados às interações existentes entre o aluno com surdez e os outros presentes na sala de aula, mediados por instrumentos ou pessoas assim como a origem de ambos, além da articulação da teoria com os trabalhos voltados às pessoas com surdez. Na teoria da mediação, o autorafirma que os processos mentais superiores tem origem nos processos sociais, ou seja, só a partir da socialização que o sujeito se torna capaz de se desenvolver cognitivamente. Além disso, a relação do indivíduo com o mundo é sempre mediada por alguém ou por algum instrumento ou signos. Ou seja, as relações sociais são convertidas em funções psicológicas através dos instrumentos e signos, onde ambos são usados como mediadores para as interações entre os seres humanos, mas também para interação deles com o mundo. Os instrumentos são ferramentas que auxiliam o ser humano e até mesmo os animais a fazerem alguma coisa, ou seja, é qualquer objeto que tenha uma utilidade prática. Já os signos são usados para simbolizar algo que já foi criado, ou seja, o signo significa outra coisa que já existe. “Eles trazem algum significado implícito.” (SOARES, 2002, p.19). Assim, os signos podem ser diferentes em lugares que possuem culturas diferentes, já que ele é algo que tem 20 significado dentro de certo contexto. Eles podem ter relação com a causa e o efeito, como por exemplo, fumaça indica fogo, também podem ser imagens ou desenhos para significar algo, ou pode ser algo abstrato daquilo que realmente significa, como por exemplo, números, palavras, gestos, etc. Para Vygotsky a linguagem é um sistema de signo, mediadora das interações, na qual ocupa um papel central para o desenvolvimento do sujeito. Segundo Silva (1999), Vygotsky afirma que é por meio da linguagem que o indivíduo ingressa em uma sociedade, internaliza conhecimento e modos de ação, organiza e estrutura seu pensamento. Os signos também mudam de acordo com os costumes, além disso, para esse autor os signos são compartilhados em uma comunidade, não tendo significado se for apenas para um indivíduo, nesse sentido os signos foram criados por necessidade de uma organização social. No caso da pessoa com surdez, acontece que essa pessoa só vai perceber que tem uma deficiência quando houver interações com outras pessoas. Assim Vygotsky afirma que: “A criança percebe a sua deficiência em questão somente indiretamente, secundariamente como um resultado de sua experiência social” (Vygotsky, 1997, p.2). Dessa maneira evidenciamos a importância das relações sociais entre outras pessoas segundo esse autor, porém, a linguagem usada pelos surdos é diferente. Por exemplo, os signos para a pessoa com surdez, pode não ser o mesmo para uma pessoa ouvinte, dessa maneira o intérprete tem um papel de destaque, pois ele se torna mediador das interações entre pessoas surdas e ouvintes. Mas não é esse papel do intérprete, segundo Quadros (2004), o intérprete especialista para atuar na área da educação deverá ter um perfil para intermediar as relações entre os professores e os alunos, bem como, entre os colegas surdos e os colegas ouvintes, dessa maneira o papel do intérprete é o de interpretar e não o de explicar os conteúdos e conceitos. 21 2 METODOLOGIA DA PESQUISA Segundo Gil (2002) a presente pesquisa é de caráter qualitativo, documental, bibliográfica e analítica, já que nos propusemos a investigar a situação da inclusão dos alunos surdos nas escolas regulares de Campo Grande-MS, além de outros aspectos que também envolve essa situação. Foram realizados alguns levantamentos documentais e bibliográficos para dar o alicerce ao trabalho, onde o objetivo foi levantar os trabalhos que já existem na área da Física voltados para a Educação Especial, além de verificar alguns trabalhos de entidades especializadas na cidade de Campo Grande. Outro ponto importante foi a leitura das leis e decretos. Para investigar a inclusão nas escolas, realizamos um levantamento em 10 escolas estaduais na cidade de Campo Grande, e em cada escola foram entrevistados, alunos surdos, professores de Física, coordenadores e intérpretes. A amostra foi constituída por 57 pessoas, sendo que são 13 intérpretes, 10 coordenadores, 10 professores e 24 alunos surdos. Os alunos ouvintes não foram entrevistados, pois nos propusemos entrevistar os sujeitos que estão diretamente ligados ao processo de inclusão. Para a caracterização do grupo, consideramos os alunos dos 1°, 2° e 3° anos do Ensino Médio, pois na rede estadual de ensino, a disciplina Física só é lecionada nesses três anos. No caso dos professores, foram selecionados os que dão aula para a turma em que o aluno deficiente auditivo estava inserido. Dos participantes que pertenceram à amostra, 23 são do sexo feminino e 34 do sexo masculino. A idade dos alunos varia entre os 18 e os 30 anos, mostrando que os alunos entram tarde no Ensino Médio, quando comparamos com os outros alunos ouvintes e em média saem com 18 anos. Para a identificação das escolas adotamos a letra E e um número como índice para indicar diferentes escolas, por exemplo, escola 3 tem a representação E3. Da mesma maneira, identificamos os sujeitos da pesquisa: os professores usamos a letra P, os intérpretes letra I, os alunos surdos letra A e para os coordenadores letra C, todos acompanhados pelos números de representação. O que acontece normalmente com os intérpretes é que eles não acompanham apenas um aluno, eles acabam acompanhando outros alunos em outros períodos ou até mesmo na 22 mesma sala de aula, assim é importante ressaltar que, os intérpretes I3, I5, I6, I7 e I9 acompanhavam mais de um aluno, sendo que I7 também acompanhava nas escolas E7 e E8 em períodos distintos, tendo os alunos, A8, A9, A10, A11, A12, A13, isso mostra que a quantidade de alunos é praticamente o dobro de intérpretes entrevistados. A coleta de dados foi dividida em duas partes, na primeira realizamos as entrevistas, onde utilizamos entrevistas semi-estruturadas. Na segunda, os dados foram coletados durante as observações em sala de aula, na qual utilizamos um guia para as anotações, este guia foi criado para facilitar o registro das anotações, onde este continha um mapa de sala, que serviu como um guia para observar as interações entre os indivíduos observados, além disso, algumas aulas foram filmadas, para complementar os dados. 2.1 LEVANTAMENTO DOCUMENTAL E BIBLIOGRÁFICO O levantamento bibliográfico teve como foco as revistas na área de Física e Ensino de Ciências de Qualis2 A e B, nos artigos sobre educação. O período escolhido para a realização do levantamento foi a partir do ano 1988 até 2010, pelo fato de percebermos que a preocupação com as pessoas portadoras de necessidades especiais destacou-se, após a Constituição Federal de 1988. No total, foram cinco revistas na área de Ciências e de Física, e uma revista de Educação Especial. Com este levantamento, notamos o escasso número de trabalhos na área. Nas revistas específicas na área de Ensino de Ciências encontramos 10 trabalhos para alunos cegos, sendo que para alunos surdos não foi encontrado nenhum trabalho publicado. Na Revista Brasileira de Educação Especial foram encontramos 20 trabalhos com o foco em alunos surdos. Isso mostra que os trabalhos com ou para alunos com surdez, ainda não estão voltados para as áreas científicas, mas ainda há a preocupação com a linguagem e a Língua Portuguesa, pois os trabalhos encontrados são de Letras e da Psicologia. Outro ponto de destaque nesse levantamento, é que os trabalhos foram restritos a algumas regiões do país, ou seja, a preocupação com o aluno com deficiência ainda está se expandindo, no entanto há pessoas com surdez em todo o território brasileiro. Nas regiões Sul e Sudeste estão concentrados os maiores números de trabalho. 2 Sistema de avaliação de revistas e periódicos, sustentado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). 23 Tabela 1-Número de artigos encontradospor periódico/revista Periódico/Revista Tipo de deficiência Qualis Número de Artigos Caderno Catarinense de Ensino de Física Cegueira A 0 Caderno Brasileiro de Ensino de Física Cegueira A 0 Ciência e Educação Cegueira B 4 Investigações em Ensino de Ciências Cegueira B 3 Revista Brasileira de Ensino de Física Cegueira A 3 Revista Brasileira de Educação Especial Surdez B 20 Com o levantamento nos Encontros e Simpósios na área de Educação e Ensino de Ciências e Física, nota-se a temática “Educação Especial”, sendo inserida, porém, ainda são poucos os trabalhos na área. Além disso, não são todos os encontros que possuem esta temática. O Simpósio Nacional de Ensino de Física (SNEF) inseriu esta temática em 2005, porém no SNEF do ano de 2011, não houve esta temática. 2.2 LEVANTAMENTO DOCUMENTAL Paralelamente ao levantamento bibliográfico, realizamos uma Pesquisa documental, na qual foi investigada a Legislação voltada à Educação Especial. Foram feitas análises e leituras dos documentos oficiais e, assim como as leis, de alguma maneira abordam também a educação especial. O site do Ministério da Educação (MEC), no setor de educação especial, possui a Legislação Específica, assim como os Documentos Internacionais, que também foi estudado, porém o foco ficou na legislação brasileira. Com este estudo foi possível notar a preocupação do governo brasileiro em incluir as pessoas com deficiência física e mental, tanto socialmente quanto no âmbito escolar, porém a grande parte da sociedade não tem conhecimento dessas legislações ou muitas vezes não tem o interesse de conhecer a legislação para as pessoas com deficiência. 24 Com relação à disseminação das Libras, o processo ainda está em adaptação. Na Lei n° 10.436, de 24 de abril de 2002, especificamente no 3° artigo, informa que: “O sistema educacional federal e os sistemas educacionais estaduais, municipais e do Distrito Federal devem garantir a inclusão nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus níveis médio e superior, do ensino da Língua Brasileira de Sinais - Libras, como parte integrante dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), conforme legislação vigente”. (BRASIL, 2002, p.3) porém isso ainda não acontecendo, por exemplo na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), há a disciplina de libras que deve ser ministrada para os cursos de Licenciatura, mas na prática essa disciplina ainda não está sendo oferecida sistematicamente para todos os cursos da Instituição. Algo que está sendo implantado e que mostra um grande avanço para a inclusão, é que o aluno com deficiência tem o direito de estudar na escola mais próxima de sua casa, pois o Decreto n°6.094, de 24 de abril de 2007, no art.2, garante a matricula na escola mais próxima de sua residência. De maneira geral o que foi possível perceber com o levantamento das Leis e Decretos é que o governo esta preocupado com as pessoas com deficiência, tanto que a legislação é uma prova disso. A etapa mais difícil é implantar o que está no papel, e é neste momento que estamos. Cada vez é mais comum ter pessoas com deficiência nos ambientes que até então eram freqüentados apenas por pessoas sem deficiência. O que é preciso estudar é a eficiência deste processo, até em que ponto essas pessoas estão sendo incluídas. 2.3 LEVANTAMENTO NOS ÓRGÃOS ESPECIALIZADOS Após os levantamentos preliminares, procuramos os órgãos especializados para adquirirmos os dados dos alunos surdos na cidade de Campo Grande, pois somente a partir deste levantamento é que constituímos, realmente, a nossa amostra, pois estávamos dispostos a investigar o maior número de alunos possível. Mas isso não foi possível, pois alguns alunos só foram realizar a matrícula no Ensino Médio no mês de maio, então não conseguimos as informações a tempo para realizarmos as entrevistas. O levantamento teve início em março, mas os resultados e dados gerais, só recebemos em setembro, dessa maneira para selecionar a amostra usamos a indicação de pessoas que 25 conheciam escolas que possuem alunos com deficiência auditiva, além de escolas de fácil acesso. Com a ajuda do Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento ao Surdo (CAS/MS) e do Centro Estadual de Atendimento ao Deficiente da Audiocomunicação (CEADA), instituições especializadas da cidade de Campo Grande, obtivemos os números de alunos e escolas com alunos surdos. E com o apoio da Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul (SED/MS), especificamente da Coordenadoria de Educação Especial, pudemos entrar nas escolas para realizar as entrevistas, assim como observar as aulas de Física. O levantamento com os órgãos responsáveis pelo encaminhamento dos alunos surdos para a escola regular nos mostrou que no estado que Mato Grosso do Sul existem 362 escolas estaduais, sendo que 87 estão em Campo Grande. De acordo com a coordenadora de Educação Especial da SED Profª. Vera Lucia Carbonari, em todos os municípios do estado ainda existem pessoas com surdez que não estão preparados linguisticamente, ou seja, não usam Libras, porém ela não nos informou o número exato. A Secretaria de Educação do município de Campo Grande- MS (SEMED) disponibiliza 47 intérpretes de Libras para o atendimento de 103 alunos surdos matriculados e inseridos nas escolas Pólos, que são as escolas que são preparadas para receber os alunos com surdez. A SEMED, SED e o CAS oferecem cursos de Libras para os professores e para a comunidade em geral, visando à disseminação dessa língua, além disso, eles disponibilizam intérpretes para palestras, audiências judiciais, eventos e outras situações. Nas escolas estaduais de Campo Grande os dados que adquirimos nos mostra que das 87 que são de Campo Grande, 50 possuem alunos surdos em diferentes séries, tanto no Ensino Fundamental quanto no Ensino Médio, além da Educação de Jovens e Adultos (EJA), sendo que no total são 87 alunos. Nesta pesquisa nos propusemos investigar apenas os alunos que cursam o Ensino Médio Regular, com esse critério o número reduziu a 18 escolas, com o total de 31 alunos. É importante ressaltar que uma das escolas estaduais de Campo Grande foi escolhida para sediar um centro financiado pelo governo, a CEADA. Esta escola é uma escola bilíngüe, onde todos os funcionários, desde a secretária até a merendeira sabem LIBRAS. A escola oferece ensino infantil até o 9° ano do Ensino Fundamental, depois o aluno pode escolher a escola que quer estudar, ou se preferir o aluno também tem a opção de ser encaminhado para 26 as escolas Pólos. Esta escola é apenas para os alunos surdos onde o foco é que eles adquiram e se apropriem da Língua de Sinais. 2.4 OBSERVAÇÕES As observações foram realizadas nas 10 escolas na qual propusemos investigar, e o critério que usamos para a escolha da turma, foi que o aluno surdo fizesse parte dos alunos que pertenciam à turma. Foram escolhidas as aulas de Física, pois também estamos interessados em saber se o professor de Física está preparado para dar aula para os alunos com surdez e de que maneira ele interage com o aluno e vice-versa. Para a observação foi criada uma ficha de observação, na qual foram elaborados os seguintes aspectos para a observação: as interações entre os indivíduos presentes na sala de aula, com o foco no aluno surdo, o preparo e planejamento das aulas do professor, a maneira que o professor tenta interagir com o aluno surdo e também com os outros alunos e o interesse do intérprete pela disciplina. Em média foram observadas de uma a duas aulas em cada uma das escolas. Algumas escolas permitiram a filmagem, mas a grande maioria não, nestas foram usados apenas um diário de bordo para asanotações. 2.5 ENTREVISTAS As entrevistas foram elaboradas com o intuito de atingir o objetivo da pesquisa a partir do ponto de vista dos entrevistados. A entrevista foi parcialmente estruturada, pois tínhamos algumas perguntas norteadoras, mas se o pesquisado não chegasse à resposta que esperávamos, o entrevistador explorava melhor a situação para receber mais informações que chegasse ao foco da entrevista. Para a elaboração da entrevista, primeiro focamos nos dados que queríamos obter e que não trouxessem dúvidas ao entrevistado. No total foram elaboradas quatro entrevistas, uma para cada sujeito da pesquisa, com uma média de 15 perguntas cada, onde as questões 27 iniciavam tratando de um aspecto geral sobre a formação dos sujeitos e foram evoluindo até chegar às questões específicas sobre a inclusão. Antes de iniciarmos as entrevistas, esclarecíamos que se tratava de uma pesquisa acadêmica e que em nenhum momento as pessoas seriam identificadas. Além disso, todos os entrevistados assinaram um termo de consentimento livre e esclarecimento. 28 3 ANÁLISE DOS DADOS As análises dos dados foram divididas em duas etapas, na qual a primeira etapa é a das observações das aulas, onde focamos nas interações na sala de aula. Para as análises utilizamos o referencial teórico da abordagem histórico-cultural especificamente com o autor Vygotsky, que também teve a preocupação com as crianças com surdez. A segunda etapa são as análises das transcrições obtidas pelas entrevistas na qual foi realizada através das técnicas de Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2009). Onde foram usadas as três fases cronológicas sugeridas por Bardin (pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados, as inferências e a interpretação). 3.1 ANÁLISE DAS OBSERVAÇÕES DAS AULAS Das 10 escolas observadas, apenas três foram usadas filmadoras para registrar as aulas, pois o comportamento dos alunos ficou alterado na presença da câmera, assim achamos viável que apenas observássemos as aulas, as três escolas na qual foi usada a câmera foram: E3, E7 e E9, nas outras sete escolas foram usados diários de bordo, onde havia um modelo para todas as aulas observadas. Nas observações o nosso interesse foi o de verificar as relações existentes na sala de aula, com o foco nas interações na qual o aluno com surdez faz parte. Os resultados das observações das 10 turmas foram bem semelhantes, assim as análises foram generalizadas, porém, quando relevante, algumas situações individuais foram exemplificadas. De maneira geral os professores parecem preocupados com a aprendizagem do aluno, mas não fazem esforços para mudar essa situação. De fato foram raras as vezes que percebemos que o professor estava dando aula para todos os alunos e ao mesmo tempo para o aluno com surdez. O que nos pareceu foi que às vezes o professor leciona para todos ou apenas para o aluno com surdez, assim ele acaba optando pelo resto da turma. Para a análise das observações foram pré-determinados alguns critérios para observar as interações na sala de aula e esses critérios são: Planejamento das aulas, incentivo à participação do aluno, interação entre intérprete-aluno, interação professor-aluno e interação aluno-colegas. A seguir segue as análises de cada um dos critérios citados. 29 3.1.1 Planejamento das aulas Com relação ao planejamento das aulas, o que foi observado é que os professores não possuem o hábito de planejar as aulas, e isso fica pior quando comparamos com o planejamento para o aluno com surdez, eles acabam dando uma aula tradicional, usando mais o quadro e giz, de todas as aulas assistidas, somente dois professores desenhava no quadro, o que facilita a visualização do aluno com surdez, porém todos os professores demonstraram interesse em fazer uma aula na qual o aluno pudesse entender e participar, mas em prática nenhum dos professores faz algo para melhora a aprendizagem do aluno. 3.1.2 Incentivo à participação do aluno Durante as observações percebemos que os professores tentavam se comunicar com o aluno, mas o que acontece é que o fato dele não saber Libras faz com que essa comunicação seja limitada, dessa maneira, em quase todas as aulas observadas os professores apenas olhavam para o aluno, esperando alguma resposta do aluno com algum gesto. Porém em uma das aulas, um professor demonstrou uma técnica que ele inventou, ele explica o conteúdo e vai até a mesa do aluno escreve no caderno dele, perguntando se está tudo certo, se o aluno entendeu então ele retoma a aula, e ele vai fazendo pausas durante a aula para dialogar com todos os alunos inclusive o aluno com surdez. Ao olhar o caderno do aluno, foi possível ver a comunicação entre os dois. 3.1.3 Interação entre intérprete-aluno Com todos os alunos observados, foi possível verificar que há uma relação muito forte entre o intérprete e o aluno com surdez, o aluno confia em tudo que o intérprete repassa para ele. Porém, o papel do intérprete não é ser amigo do aluno, e acontece que os dois ficam interagindo um com o outro, usando Libras, mas não interagem com as outras pessoas que também estão na sala de aula. De acordo com Quadros (2004), realizar a interpretação da língua falada para a língua sinalizada e vice-versa, é preciso seguir os seguintes itens: a) confiabilidade (sigilo profissional); b) imparcialidade (o intérprete deve ser neutro e não interferir com opiniões próprias); 30 c) discrição (o intérprete deve estabelecer limites no seu envolvimento durante a atuação); d) distância profissional (o profissional intérprete e sua vida pessoal são separados); e) fidelidade (a interpretação deve ser fiel, o intérprete não pode alterar a informação por querer ajudar ou ter opiniões a respeito de algum assunto, o objetivo da interpretação é passar o que realmente foi dito). Além disso, é importante ressaltar que de acordo com Vygotsky, o aluno surdo deve manter relações com outros alunos sem deficiência, pois só assim ele poderá se desenvolver, através da abordagem histórico-cultural, pois o homem vai criando e sendo criado por elementos mediadores. Segundo Vygotsky (1925), os princípios e os mecanismos psicológicos da educação são os mesmos aqui como para uma criança normal, dessa maneira o intérprete deveria incentivar a relação do aluno com surdez com os seus colegas, mas não é isso que acontece. Em todas as escolas que realizamos as investigações, o aluno interagia com o intérprete. Já com os colegas eram apenas cumprimentos e saudações, dessa maneira o intérprete não é apenas um tradutor, é um amigo do aluno que não o incentiva a participar das relações sociais na qual os outros colegas também fazem parte. Um exemplo foi observado que ilustra bem este fato, na escola E8 o intérprete ficava com o aluno durante todo o tempo, inclusive na hora do intervalo, até para pegar um lanche na cantina quem buscava para o aluno era a intérprete. Esse tipo de comportamento, embora demonstre toda a preocupação e atenção do interprete, não contribui para o desenvolvimento do aluno surdo porque o impede de tentar uma comunicação com outras pessoas. Outro ponto que é importante destacar na relação intérprete- aluno, é que o intérprete deve apenas interpretar o que o professor diz, isto é, de acordo com a teoria de Vygotsky, o intérprete, a princípio, não deveria assumir o papel de mediador entre o aluno e o professor, ou seja, ele não deve interferir e nem modificar o que o professor fala, porém o que observamos, em todas as escolas, é que intérprete interage e a mediação ocorre o tempo todo com o aluno, mesmo quando o professor não está explicando, e o intérprete, também, modifica algumas falas do professor, ao traduzir o conteúdo para o aluno com surdez.Esse é um aspecto que merece um aprofundamento e que será objeto de estudo futuro, que é investigar qual é o papel do interprete, dada as dificuldades que o interprete tem em “traduzir” um novo conhecimento que muitas vezes eles não têm domínio e não há também sinais específicos na linguagem compartilhada (Libras) pelo aluno surdo e o intérprete, como é o caso de alguns conceitos de Física e Matemática. 31 3.1.4 Interação professor-aluno Praticamente não existe uma relação do professor com o aluno. E o fato acontece em todas as escolas, o que parece é que existe uma turma regular com alunos sem deficiência, e um aluno deslocado em um dos cantos da sala, além disso, parece existir uma barreira entre o aluno e o professor. O que acontece é que o professor não sabe Libras, e isso é geral, então ele acaba evitando um diálogo com aluno, e quando ele tenta é através de um gesto ou até mesmo da escrita. Dos 11 professores observados, apenas um deles, tentava se comunicar com o aluno, através de expressões faciais e até mesmo gestos, porém o aluno não respondia, pois não entendia o que o professor tentava fazer ou falar, e nesses momentos o intérprete apenas observava, mas não interferia para mediar essa relação. 3.1.5 Interação aluno-colegas De acordo com Vygotsky é através das interações que o sujeito se desenvolve, e é importante destacar que essas interações devem ser em situações em que os indivíduos sejam familiarizados. A escola é um lugar onde os alunos se relacionam, e é normalmente neste local que alguns alunos se formam como indivíduo, pois existem várias pessoas com culturas diferentes, mas com um mesmo objetivo, a aprendizagem e o desenvolvimento. O aluno surdo também tem o mesmo desenvolvimento que um aluno ouvinte, porém ele não consegue se comunicar com os colegas, pois as Línguas usadas por ambos são diferentes, dessa maneira o aluno não consegue se desenvolver da mesma maneira que o aluno ouvinte, aumentando a diferença entre um e outro, sendo que eles poderiam estar em um mesmo nível de desenvolvimento. Nas observações o que percebemos foi que os alunos ouvintes apenas cumprimentam os alunos com surdez. Não há nenhum tipo de interação, na sala de aula, pra começar eles sentam afastados do aluno com surdez, mas a barreira principal é que eles possuem línguas diferentes. 32 3.2 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS As entrevistas foram analisadas pelo método de Análise de Conteúdo de Laurence Bardin (2009), mais especificamente sobre a Categorização, na qual o critério de categorização utilizado foi focado no objetivo da pesquisa. 3.2.1 A pré-análise As entrevistas passaram pela leitura flutuante, na qual foram lidas com o intuito de conhecer as respostas. A partir de leituras mais analíticas e precisas foi possível pensar em categorias relacionadas aos objetivos do trabalho. Com este primeiro contato já foram estabelecidas algumas categorias, sendo elas: Condições oferecidas pela escola, Formação dos Professores e Formação dos Intérpretes. Após a leitura flutuante foram transcritas todas as entrevistas. Paralelamente foram selecionados trechos das entrevistas que são relevantes para atingir os objetivos da pesquisa, assim finalizamos a etapa da escolha dos documentos e assim o material para a análise ficou preparado e selecionado. 3.2.2 A exploração do material e o tratamento dos dados e resultados A fase da exploração do material foi realizada na pré-análise, assim só alguns detalhes foram acrescentados para facilitar o tratamento dos resultados, como por exemplo, numerar as falas dos atores entrevistados. No tratamento dos resultados foram elaboradas 10 categorias na qual o objetivo da pesquisa foi usado como o foco para a criação destas. Na próxima seção cada uma dessas categorias será detalhada. 3.2.3 Categorias para análise dos dados A partir dos objetivos estabelecidos e das respostas que obtivemos nas entrevistas, as categorias foram elaboradas para sintetizar as respostas dos entrevistados. Em várias leituras 33 cuidadosas das transcrições das entrevistas foram criadas as seguintes categorias de análise as seguintes categorias de análise: Responsabilidade, condições oferecidas pelas escolas, importância de saber Libras, afetividade, formação do intérprete, formação do professor, relação intérprete-professor, papel do intérprete, opinião dos alunos sobre as aulas de Física e opinião dos atores sobre a inclusão. Estabelecida as categorias, segue na seqüência a descrição e analise de cada um das categorias. Categoria (1): Responsabilidade A presente categoria foi criada independente das questões da entrevista, pois surgiu espontaneamente nas respostas dos entrevistados, e pela riqueza de informação foi estabelecida esta categoria cujo foco é chegar a um consenso sobre a responsabilidade da inclusão, ou seja, na opinião dos entrevistados quem é o responsável pela inclusão. De acordo com as respostas chegamos a duas subcategorias: Governo e Professor. 1.1) Governo; De maneira geral as respostas submetem a responsabilidade ao governo, há a fala de um coordenador que retrata bem essa opinião. C1: “O governo está certo em incluir os alunos desde que haja uma preparação, não apenas colocar a responsabilidade na escola. O apoio deve ser maior, tanto com materiais, mas também com cursos para os funcionários.” O que ficou bem claro nas respostas dos coordenadores é que eles estão envolvidos no processo de inclusão, e eles têm maior conhecimento do que os professores. Assim, eles conhecem as leis e sabem de quem é a responsabilidade para o processo de inclusão acontecer. Com relação às respostas dos alunos e dos intérpretes, ambos acham que é papel do governo a inclusão. Um grande número de alunos acha que os professores deveriam saber Libras, pois isso os ajudariam a acompanhar as aulas. No caso dos intérpretes, eles acham que o governo deixa a desejar na infra-estrutura e nos materiais, dessa maneira eles mencionam que a escola não está preparada. I7: “Falta muita coisa. O que o governo oferece ao aluno é o intérprete.” 34 I13: “É eu acho que, no caso deles as escolas deveriam ser melhor equipadas e o governo que deve fazer isso, então na realidade a única coisa que se usa dentro desses estabelecimentos é o intérprete e como a língua deles é uma língua visual então se deveria ter muito mais coisa em sentido visual para incluir eles”. A20: “Ele sente necessidade de recursos a mais na sala de aula, que a escola não tem, é necessário que as instituições especializadas ajudem as escolas a se adaptarem para acolher melhor nós, e o governo tem que dá incentivo.” Com essas falas fica claro que os intérpretes e alunos têm as opiniões formadas sobre a inclusão, e, além disso, eles dão sugestões de melhorias e o que o governo pode fazer para melhorar a inclusão. Estas opiniões são importantes, pois são eles que estão envolvidos diretamente no processo de inclusão. 1.2) Professor Há alguns professores que se culpam por não saberem Libras, além disso, eles acham que poderiam fazer mais para que o aluno consiga acompanhar as aulas, mas ao mesmo tempo eles percebem que não conseguem por falta de tempo, inclusive alguns dão aulas em três períodos. P5: “Olha, eu não planejo as aulas pensando nos alunos surdo, eu não tenho tempo para fazer isso. O que eu gostaria mesmo é saber Libras, eu até procurei no CAS para fazer, por lá tem de graça, mas o que acontece é que os horários e dias bate com os que eu tenho aula, então eu fico sem mudar minhas aulas, e isso prejudica os alunos surdos.” P9: “Acho que o governo deveria incentivar os professores a fazerem Libras, mas para isso temos que ter tempodisponível, pois como o salário é pouco, a maioria dos professores dão aula mais de um período, isso faz com que não tenhamos nenhum preparo para tralhar com os alunos surdos, eu mesmo não planejo aula para eles e nem sei a língua deles.” Alguns alunos também acham que o professor poderia fazer mais para o próprio aluno. Eles acabam sentindo certo desprezo por parte do professor, não é por que os professores não sabem a língua, mas pelo fato do professor deixar, somente, por conta do intérprete. 35 A3: “... ele não tem a atenção dos professores pra ele, então, acontece que ele não acompanha o ritmo da sala, então ele fica atrasado na turma, e ele quer aprender igual aos outros, pra ser bom, e conseguir entrar na universidade.” No geral o que pareceu é que os professores se sentem culpados por não estarem diretamente ligados ao processo, além de não saberem Libras. Eles acham que deveriam se preocupar mais os alunos com surdez, além disso, eles querem aprender Libras, mas não tem tempo para isso. Dessa maneira eles também acham que o governo deveria oferecer o curso em horários ou dias que eles pudessem fazer. Categoria (2): Condições oferecidas pela escola Nesta categoria a preocupação foi em resumir as opiniões sobre as condições das escolas que estão recebendo os alunos com deficiência. Além de obter informações sobre a maneira em que as escolas estão sendo preparadas para receber estes alunos. Outro ponto importante são as sugestões que os intérpretes dão para melhorar a adaptação da escola. Essa categoria obteve várias respostas diferentes, mas que todas convergiram para um mesmo ponto, que as escolas possuem apenas o intérprete como auxílio para receber os alunos. Os intérpretes são os que mais criticaram com relação à preparação das escolas, pois são eles os responsáveis em “traduzir” o que o professor diz para os alunos. Na opinião deles é preciso instrumentos que auxiliem no dia-a-dia dos alunos como, por exemplo, a fala seguinte: I13: “... por exemplo, tem o sino eles não escutam o sino geralmente eles usam sinais de luz nesse sentido, as escolas poderiam ter isso e poderia ter mais placas na escola, por que pra eles a sinalização é uma coisa que ajuda muito, é então, isso poderia melhorar a inclusão deles, eles se sentirem mais a vontade dentro das escolas junto com os outros alunos.” Assim é possível perceber que os surdos possuem uma linguagem espacial, e que não é explorada porque nesse aspecto também as escolas estão deixando a desejar. Tanto que os alunos alegaram que a escola deveria ter sinalizações indicando as salas, banheiros, até mesmo a direção. 36 A7: “Quando ele entrou no meio do ano, ele não sabia onde ficava as coisas, então ele pedia para eu perguntar para os outros alunos, como por exemplo, onde ficava o banheiro. Ele acha que a escola deve colar cartaz para sinalizar, ele pode tentar se comunicar com os outros alunos, mas é difícil eles saberem a Língua de Sinais.” De maneira geral, tanto os intérpretes quanto os alunos acham que a escola precisa ser mais bem equipada para receber os alunos com surdez, já os professores acreditam que as escolas estão cumprindo a parte que cabe a elas, tanto que tem alguns professores que elogiam muito. É o caso do seguinte professor: P6: “Gosto da maneira que a escola acolhe os alunos especiais, pois os coordenadores e intérpretes estão preocupados com o aluno, mas não só aqui dentro da escola, eles têm um contato com a família do aluno, posso dizer isso, por que minha esposa é intérprete e ela é muito preocupada com o aluno dela, pois ele tem que confiar nela para que haja um trabalho bom entre os dois.” Observa-se pela fala do professor que o fato do intérprete da escola se preocupar com a vida do aluno e a coordenação da escola também, significa uma escola preparada para receber os alunos. Essa opinião revela uma certa ingenuidade ou mesmo uma confusão, e que os intérpretes e alunos entendem como algo a mais, mas que não melhora a situação da infra- estrutura e nem da formação das pessoas que trabalham na escola, isto é, que a escola, e portanto o governo, deve proporcionar as condições previstas por leis para receber esses alunos. Categoria (3): Importância em saber Libras Essa categoria é considerada uma das mais importantes, pois explicita realmente o que os alunos com surdez acham sobre os professores não saberem Libras. Foram unânimes as respostas, todos os alunos acham que se os professores soubessem a língua, o aprendizado seria melhor. A17: “Ele disse que gosta mais das aulas de Química, por que o professor sabe Libras e isso ajuda a interação entre eles, além disso, ele consegue se comunicar com o professor, e isso o deixa a vontade com o professor, ele disse que só tira nota boa, e aprende bastante.” 37 A19: “É difícil, por que o professor não sabe a Língua de Sinais, e isso dificulta, por que eles não têm comunicação, ele acha que se os professores, todos deveriam saber Libras, isso facilitaria as relações com os professores, isso também faria as matérias ficar mais fáceis, e assim ele aprenderia melhor, igual os alunos ouvintes.” Assim, é notável que os alunos querem que os professores saibam Libras, tanto que no caso em que o professor sabe, o aluno prefere a disciplina que ele leciona, pois o professor consegue se comunicar com ele. Além disso, o que eles querem é manter uma relação com o professor para poder perguntar e interagir com o professor, de maneira que eles tenham as mesmas oportunidades como todo e qualquer aluno. Outro ponto que vale a pena destacar é que os professores acreditam que a Libras é importante, além disso, eles acham que o desenvolvimento dos alunos seria melhor se os professores soubessem Libras, isso mostra que eles têm consciência de que precisam saber a língua, mas alegam falta de tempo para aprendê-la. Categoria (4): Afetividade Nesta categoria buscamos obter informações sobre os aspectos afetivos relacionados com as aulas e os professores, como por exemplo, a matéria que mais gosta, e as relações com os professores. E o resultado obtido com as respostas é que os alunos acabam gostando mais das disciplinas lecionadas por professores que sabem um pouco de Libras, ou então pelas disciplinas que os professores estão preocupados com os alunos. De acordo com a fala de um intérprete, é possível verificar este fato: I2: “... Convivendo com estes alunos, percebi que eles precisam de atenção, mas eles não gostam que as pessoas fiquem com dó, eles querem ser tratados como os outros alunos, mas acontece que os professores não interagem, não sabem a língua...” Nessa fala é notável que eles querem a igualdade, mas o que impede isso é a diferença entre a língua usada por eles, além disso, quando eles percebem que os professores ou até mesmo outros alunos tentam interagir com eles, eles se tornam amigos, pois eles possuem um afeto imenso pelas pessoas que não os tratam como coitados. 38 A6: “Ele disse que gosta muito das aulas da professora de ma temática, por que a professora tenta explicar as coisas direto para ele, isso fez ele criar uma confiança por parte dele. Outra coisa também, é que a professora tenta aprender com ele, então ele gosta de ensinar gestos pra professora.” O fato de eles ensinarem os professores inverte os papéis, e eles se tornam importantes. Assim há uma troca de conhecimentos entre aluno e professor, fazendo com que o aluno ganhe autoconfiança e acredite que eles são capazes. Com relação à afetividade, perguntamos qual a disciplina que eles mais gostavam e a que eles menos gostavam, e o resultado foi interessante. Vários alunos disseram que gosta de Língua Portuguesa,pelo fato de ser a segunda língua que eles usam, além disso, também disseram que é a língua que todos usam, por isso eles acham importante aprender. Mas as disciplinas que eles acham mais fáceis são as exatas, pois eles afirmam que trabalhar com os números é fácil, e eles gostam de decorar fórmulas. A1: “A três matérias que ele mais gosta são Língua Portuguesa, Matemática e Química. Em especial a Língua Portuguesa por que pra eles é a língua que eles são mais cobrados e é a que todas as pessoas usam 24 horas por dia, no entanto pra eles é muito difícil por que pra aprender a Língua Portuguesa é preciso ouvir, precisaria escrever bem e ler bem, e ele não tem esses três pontos, né, eles não conseguem ouvir por isso que eles não conseguem aprender a Língua Portuguesa.” A24: “Ele disse que gosta muito da matemática, por que ele sabe fazer bem as contas, ele só tira nota alta, na matemática, sabe certinho as fórmulas, ele gosta muito mesmo da matemática. O que é possível perceber, com os depoimentos dos alunos, que os professores das disciplinas mais teóricas passam muito conteúdo no quadro, e depois explicam o que está escrito, então, para os alunos com surdez não é fácil acompanhar uma aula teórica, com muitos textos. Eles gostam de visualizar as situações, assim eles acabam perdendo o interesse, pois eles não vão conseguem acompanhar o professor. 39 Categoria (5): Formação do Intérprete Esta categoria é delicada, pois envolve aspectos da formação dos intérpretes que acabam intervindo no processo que interpretação para traduzir o conteúdo por meio da Libras. Foram feitas algumas perguntas aos intérpretes sobre a formação em Libras (formação de curta duração e sobre uma graduação). Também foram feitas perguntas que revelasse como o intérprete faz para traduzir os conceitos que o professor está falando. Alguns aspectos importantes foram observados, a começar pela formação em Libras: os intérpretes admitidos nas escolas e indicados pelo CAS não precisam fazer um curso, eles podem aprender com outras pessoas e até mesmo com os próprios surdos. Para ser considerado como intérprete, eles fazem uma prova, a ProLibras, aplicada pelo CAS e se forem aprovados nessa prova, eles estão aptos a trabalhar nas escolas auxiliando o aluno. I13: “Nunca fiz nenhum curso de Libras, aprendi Libras com um grupo de surdos que freqüentavam a mesma igreja que eu.” Outro ponto importante, é que os intérpretes alegaram que eles acabam mudando algumas coisas quando vão interpretar para os alunos, pois eles acham necessário transpor o conhecimento porque a língua de sinais não possui sinais específicos para alguns conceitos e eles precisam usar uma analogia para traduzir o conceito e passar a ideia, por exemplo, a fala a seguir, onde a intérprete muda o exemplo da professora de Física. I5: “Eu mudo o que os professores falam, por que tem coisas que eles não vão entender mesmo, por exemplo, um dia a professora deu o exemplo de uma barra condutora de calor, que as partículas do material se agita e vão transferindo para a outra partícula e assim o calor conduz na barra. Eu disse pra ela o exemplo do ônibus, quando o motorista freia as pessoas trompa uma nas outras e isso vai passando para as pessoas.” Com essa afirmação é possível perceber que há necessidade de que o intérprete tenha uma formação mínima, pois ele não está apenas traduzindo o que o professor fala, mas ele as vezes acaba mudando os conceitos que o professor está ensinando pelas dificuldades que ele tem da própria língua ou pela falta de conhecimento específico e pelas condições oferecidas pelas escolas. Algumas vezes esses conceitos são traduzidos de forma inadequada, ou até 40 mesmo incorretamente, e isso prejudica o aluno, mais especificamente o aprendizado do aluno. No caso da Física o fato é ainda mais agravante, pois os intérpretes alegam que não existem sinais para os conceitos da Física, então acontece que eles precisam adaptar os sinais já existentes, isto é mediar a aprendizagem. Além disso, os alunos com surdez, muitas vezes não possuem os conceitos necessários para ancorar os conceitos novos para aprender a Física, então o intérprete tenta “ensinar” ou sinalizar o que eles já deveriam saber, para sim interpretar os conceitos que estão sendo ensinados pelo professor. Categoria (6): Formação do professor Atrelada a formação do intérprete, está à formação do professor, pois como o interesse desse trabalho é investigar como a inclusão do aluno está acontecendo, é interessante saber a formação e preparo do professor responsável pelo ensino. Dos professores entrevistados nenhum sabe Libras, alguns até tentam se comunicar com os alunos, mas nunca fizeram nenhum tipo de curso. Além disso do 10 entrevistados, apenas 4 são formados em Física. De maneira geral as respostas que obtivemos, mostra uma preocupação do professor com relação à maneira que o intérprete está transmitindo os conceitos que ele ensina. Alguns chegam a desconfiar se o intérprete realmente está traduzindo o que ele fala. Porém, como o professor não tem a formação em Libras, fica difícil saber se sua opinião está correta ou não. P2: “... Eu não sei Libras e às vezes fico desconfiado, por que não sei como o intérprete está transmitindo o que estou falando... eu me sinto impotente, por que eu deveria estar conversando com o aluno, por que eu que sou o professor eu que devo ensinar.” P5: “Eu não preparo a aula para o aluno por que tem o intérprete, assim ele vai explicando pro aluno o que eu falo.” P9: “De verdade... eu tenho medo, por que não sei como ele ta explicando, mas não me preocupo em planeja uma aula diferente, ou não sei...por que o que eu sei é que o intérprete fala tudo que agente fala pro aluno, só não sei se é igual o que agente fala.” P10: “Eu nunca fiz nenhum curso, não sei nada de Libras, então é difícil que eu consiga me envolver com o aluno... Minhas aulas são iguais a outras turmas que não tem alunos surdos, não planejo algo focado ao aluno. A escola também não exige e nem incentiva isso.” 41 Está evidente que o professor acaba jogando a responsabilidade de ensinar para o intérprete, e mesmo assim, ele acaba desconfiando, pois não sabe a língua. Além disso, um ponto importante é que os professores têm consciência de que eles são os responsáveis por ensinar, mas eles não conseguem se comunicar com o aluno, dessa maneira eles acabam deixando o aluno de lado, delegando toda a responsabilidade do ensino para o intérprete. Categoria (7): Interação Professor-Intérprete Esta categoria tem como enfoque discutir as relações existentes entre o professor e o intérprete, quando o assunto é o aluno com surdez. Tentamos focar nos planejamentos e até nas conversas sobre as aulas, isto é, de que maneira estes dois profissionais interagem para tornar a aula mais significativa para esse aluno. Com as respostas obtidas, percebemos que o intérprete e o professor trabalham independentes, cada um faz o seu trabalho, e nenhum interfere no trabalho do outro. Algumas falas dos professores explicitam o fato. P1: “Ele nunca me procurou (o intérprete), são pouco os momento em que conversamos e somente durante as aulas e para tirar dúvida do conteúdo.” P2: “Não. O intérprete não é muito interessado, além disso, ele da moleza para o aluno, e isso é notável por que o aluno não copia tudo e às vezes o próprio intérprete escreve. Inclusive é notável em provas que o intérprete ajuda nas respostas.” Porém não são apenas os professores que sentem certo desinteresse, os intérpretes também sentem por parte dos professores. I5: “É ele sempre menciona né, o que ele vai passa pros alunos né, mas não antes, quando ele ta na aula mesmo, ai ele menciona o que
Compartilhar