Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
44 Publicidade e Propaganda – 1º sem. Leitura e Produção de Textos Prof. Lêda Ribeiro Módulo 6 6. DESCRIÇÃO E TEXTOS DESCRITIVOS Associado ao texto narrativo, na literatura, o texto descritivo tinha uma função meramente decorativa até o advento do Romantismo (final do Séc. XVIII), quando passou a ganhar funções como criar a ilusão do real. A explicação de comportamentos, a descrição de ambientes internos e externos, a descrição física dos personagens, vestimentas, jóias passaram a manifestar a psicologia dos personagens da história. A principal diferença entre um texto descritivo e narrativo ocorre pela marca da temporalidade. A descrição representa um momento; a narração, uma sucessão de fatos e sentimentos no tempo. Enquanto a narração é ativa e dinâmica, a descrição é passiva e estática. A descrição caracteriza-se por um processo de denominação e definição (expansão), ou seja, o relato do que é e como é. Palavras em cadeia que formam uma imagem representativa, a sensação de uma “fotografia”, na mente do leitor. O escritor, mediante uma atitude contemplativa, procura captar e transmitir uma cena, um momento, possibilitando ao receptor visualizar aspectos físicos de pessoas, de ambientes, de objetos. A descrição pede ao leitor que reconheça, associe, classifique, hierarquize e atualize o estoque de referências de sua memória. É um texto que exige saber e conhecimento para que possa adquirir sentido. A denominação refere-se ao tema ou objeto da descrição. A expansão refere-se aos subtemas ou classificações desse objeto. (Tema: livrarias; Objeto: livros; classificação: didáticos, ficção, filosóficos, científicos, técnicos, artísticos etc.). Na descrição há uma relação de todo e partes na qual o texto vai se compondo por partes e subpartes. Nos enunciados predominam verbos de estado, situação (ser/estar), ou de propriedades (ter), atitudes (fazer) e qualidades (ser). Pela expansão, estabelecem-se relações entre uma nomenclatura e um grupo de predicados (adjetivos) referentes a ela. Embora muitos textos combinem narração e descrição, há sempre a predominância de elementos que transmitem idéia de fotografia ou de movimento, possibilitando a classificação como texto descritivo ou narrativo. 6.1 A ORGANIZAÇÃO DA DESCRIÇÃO A constituição de um texto descritivo é estabelecida através de categorias e regras que possibilitam a existência de um modelo construído com base na observação dos usos sociais, que podem ser divididas em três categorias: 45 • Designação: a designação tem como papel nomear, dar a conhecer algo. É uma forma de reconhecer os seres do mundo, a capacidade de referir-se a algo por meio de uma palavra. • Definição: a definição determina a extensão de um ser, estabelece os limites e informa os atributos essenciais e específicos desse ser, de modo que o torne individual, específico, característico, inconfundível. É um conjunto de predicados seqüenciados à designação. • Individuação: a individuação compreende particularizar, caracterizar, distinguir, especificar, tornar único. Ocorre pela enumeração minuciosa de tudo o que o autor vê. Na estrutura de um texto descritivo, uma das principais características é que se pode alterar a ordem do discurso sem afetar sua compreensão. Outra característica importante é que não existe alteração temporal. O uso de verbos de ação no texto descritivo não transmite a idéia de transformação, de mudança de tempo, pois não há dois momentos que se sucedem. Os tipos de textos que utilizam com mais freqüência a descrição são os textos de turismo publicados em cadernos de jornais e revistas especializadas, os verbetes de enciclopédias e dicionários e os textos literários. A descrição parece distinguir os bons dos maus escritores. É a grande prova da imaginação de um escritor, e é característica relevante em um escritor saber descrever, saber tornar vivo o que viu. Segundo Mário Erbolato, existem três tipos de textos descritivos: o pictórico, o topográfico e o cinematográfico: • Na descrição pictórica, escritor e objeto permanecem parados. A situação do escritor assemelha-se a de um pintor, que transpõe para tela tudo o que vê. Trata-se de uma posição que permite campo de visualização limitado. A luz tem grande influência em seu trabalho, pois só pode relatar aquilo que vê. As cores e os detalhes são resultados da luminosidade. Ao escritor cabe reproduzir com fidelidade o recorte da realidade que traçou. • Na descrição topográfica, o escritor está em movimento e o objeto parado. Essa posição de observação permite ao escritor construir um “mapa” em relevo de tudo o que vê. Valorizando a massa, tamanho e forma. A descrição perde em objetividade, mas ganha em subjetividade, liberdade. • Na descrição cinematográfica, o escritor permanece parado enquanto os objetos e seres aparecem em movimento. Além de massa, cores e luz, o escritor ocupa-se também do som, descrevendo as cenas quadro a quadro. 46 6.2 QUALIDADES DA DESCRIÇÃO São qualidades da descrição a unidade, a coerência, a ênfase e a disposição dos pormenores. É recomendável estar atento ao fato de que descrições de espaço, ambiente, pessoas em relação ao homem e à vida animal produzem grande efeito. Quem se põe a escrever pode questionar-se de mil modos, associar o fato a outras circunstâncias, ao tempo, ao espaço, descrevê-lo, falar das emoções despertadas, reações comportamentais, comparações, oposições, causas, conseqüências. A observação é condição fundamental para a produção de um texto descritivo. É preciso ter algo para dizer, ter idéias para expor, e um dos meios de criar idéias é praticar a observação e refletir sobre questões como: • Que impressão o ambiente/objeto causa? • Os fatos provocam admiração? • Há motivos para satisfação ou descontentamento? • Se assemelha com algo que já conheço? A observação pode ser direta ou indireta. Nada proporciona melhores resultados a uma descrição que a observação direta, no próprio local. Não se trata de acumular detalhes, mas de expor os mais relevantes e que têm mais força como elementos caracterizadores. Quando não se pode valer da observação direta, o escritor pode lançar mão da imaginação, da memória. Busca apoiar-se naquilo que viu ou recordar tudo o que se relaciona com a cena a ser descrita. Procura a proximidade com a verdade, a verossimilhança com a realidade, desfazendo qualquer sinal que comprometa e revele ser fato imaginado. É necessário transmitir a sensação de que tudo é verdadeiro. Uma fonte inesgotável de observação indireta é a leitura. É por meio dela que se consegue despertar a sensibilidade e a imaginação, ampliar o vocabulário, fortalecer o pensamento. 6.3 MODALIDADES DE DESCRIÇÃO A descrição é relevante em um texto literário ou jornalístico. Pode haver texto descritivo sem a presença de elementos narrativos, mas dificilmente um texto narrativo sem a presença de descrição, porque qualquer designação de seres e circunstâncias já é o princípio de uma descrição. Os enunciados, ou seja, os tipos de abordagens descritivas mais comuns são: 1. Descrição expressiva ou subjetiva: modalidade em que prevalecem a percepção do autor. Há preocupação com os detalhes, com a criação de uma nova realidade (impressionista). Daí, quanto mais carregada de emoções, mais longe da realidade. A subjetividade do autor aparece em suas opiniões sobre a 47 personagem/objeto que descreve. Os recursos de linguagem usados são sempre a metáfora, a metonímia, a adjetivação exagerada. Ex: “O sexto convidado era um moço de dezessete anos, o Sr. Rochinha, que trazia impressa na tez amarrotada, nas profundas olheiras e na aridez dos lábios, avelhice prematura. Libertino precoce, curvado pela consunção1, tinha o orgulho do vício, que estampara nas faces, receando talvez que o insultassem pondo em dúvidas os seus brasões de nobreza, conquistados com o copo em punho nalguma tasca2 imunda. Se fosse pobre, o Sr. Rochinha teria fumaças de poeta byroniano; mas ainda era rico da herança que esbanjava, e portanto não passava de um moço gasto” (José de Alencar, Lucíola). 2. Descrição de lugares: neste processo, abrange-se um plano maior e, como se fosse uma câmera, detém-se em partes relevantes. Suponha-se que o local seja a Praça da Sé, em São Paulo. Focalizam-se o movimento de pedestres, os edifícios ao redor, as barraquinhas dos vendedores ambulantes. E, no meio de tantos elementos diversos, focaliza-se a alegria de um vendedor de bilhete de loteria. E como num close, as expressões faciais desse indivíduo é que interessam. Enumera-se uma série de substantivos, referencia-se, define-se, expande-se a referência pela equivalência e hierarquização. Ex: “As paredes, barradas de azulejos portugueses e, para o alto, cobertas de papel pintado, mostravam, nos seus desenhos repetidos de assuntos de caça, alguns lugares sem tinta, cujas manchas brancacentas traziam à idéia joelheiras de calças surradas. Ao lado, dominando a mesa de jantar, aprumava-se um velho armário de jacarandá polido, muito bem tratado, com as vidraças bem limpas, expondo as pratas e as porcelanas de gosto moderno; a um canto dormia, esquecida na sua caixa de pinho envernizado, uma máquina de costura Wilson, das primeiras que chegaram ao Maranhão; nos intervalos das portas simetrizavam-se quatro estudos de Julien, representando em litografia as estações do ano; defronte do guarda-louça um relógio de corrente embalava melancolicamente a sua pêndula do tamanho de um prato e apontava para as duas horas. Duas horas da tarde” (Aluísio de Azevedo, O mulato). 3. Descrição de cena: seu conteúdo é captado mediante observação direta dos seres, porém exige também imaginação, 1 Ato ou efeito de consumir-se. Definhar. 2 Taberna 48 invenção, criatividade. Podem-se utilizar adjetivos, desde que não banais nem em série interminável que nada acrescenta. Procura- se não só descrever, mas também externar idéias e emoções. Produz uma visão de mundo e das coisas através dos detalhes. Ex: “Deu por si na calçada, ao pé da porta; disse ao cocheiro que esperasse, e rápido enfiou pelo corredor, e subiu a escada. A luz era pouca, os degraus comidos dos pés, o corrimão pegajoso; mas ele não viu nem sentiu nada. Trepou e bateu. Não aparecendo ninguém, teve idéia de descer; mas era tarde, a curiosidade fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe; ele tornou a bater uma, duas, três pancadas. Veio uma mulher; era a cartomante. Camilo disse que ia consultá-la, ela fê-lo entrar. Dali subiram ao sótão, por uma escada ainda pior que a primeira e mais escura. Em cima, havia uma salinha, mal alumiada por uma janela, que dava para o telhado dos fundos. Velhos trastes, paredes sombrias, um ar de pobreza, que antes aumentava do que destruía o prestígio” (Machado de Assis, A cartomante). 4. Descrição física e psicológica de pessoas: há muitos aspectos que identificam uma pessoa. A parte física é talvez a menos dotada de pormenores. O caráter, os hábitos, os gostos, o temperamento proporcionam maior riqueza. As pessoas não são quadros de galeria, nem objetos de museus. É necessário penetrar o íntimo delas para captar elementos realmente individualizantes, tais como o conjunto de ações que a personagem realiza, as palavras que ela profere e, muitas vezes, o próprio meio onde se insere, proporcionando seu "retrato" físico e psicológico no espaço social no qual se insere, através de sua linguagem e comportamento, podendo ser construída a partir da análise e identificação dos seguintes aspectos: 4.1 Aparência física 4.2 Caracterização pela fala 4.3 Espaço e ambientação 4.4 Características psicológicas 4.5 Perfil ideológico Cada um desses aspectos possui diversos itens que podem ser analisados e ressaltados na construção de um perfil, conforme veremos: 4.1 Aparência física: descrição dos traços mais salientes e mais singulares do personagem ou dos objetos (paisagem) que o cercam. Não se trata de descrever o maior número possível de detalhes, e sim, selecionar os aspectos que mais impressionam os sentidos, restringindo-se ao essencial. 49 Ex: Grandalhão, de bigodes, barrigudo (...) (...) um homem alto, forte e meio narigudo. Franzino, as mãos pequenas, como as de um menino de 10 ou 12 anos, com pouco mais de um metro e meio de altura, 57 anos de idade. 4.2 Caracterização pela fala: as palavras pronunciadas por uma personagem não transmitem apenas aquilo que significam literalmente, pois além do sentido semântico elas também são impregnadas por valores sócio-contextuais. Situações que dizem respeito à região de onde procedem as personagens ou em que vivem, à sua idade, área de atividade profissional (esporte, policial, economia), posição social ou grau de escolaridade. Ex: - Cê taí, sô? - Tô - respondi no falar da terra. - Sentaí que eu já vô. (...) essa gente vai ter de entender que defesa de mercado é defesa de mercado mesmo. Os investidores externos pedem regras definidas e uma lei antitruste. No Brasil, eu era um cara muito preguiçoso, acomodado. Casa de mamãe... e tal. (...) Agora tem aquela hora do rango que a mãe não tá, e tenho que me virar sozinho. Seu doutor, o patuá é o seguinte: depois de um gelo da coitadinha resolvi esquiar e caçar uma outra cabrocha que preparasse a marmita e amarrotasse o meu linho no sabão. (...) Tonho, você está outra veiz se enleando com rabo de saia, num tá? Já andei sabendo disso. Deixa de molecagem, tu já é homem de ter vergonha. A cumade Maria veio queixá que ocê tá botando cas pra outra muié, e isso num se faiz. 4.3 Espaço e ambientação: geralmente, entre a ação de uma personagem e o espaço onde ela se insere há uma fusão, uma harmonização. As características, os traços, as qualidades de uma personagem podem estar projetados no seu espaço, através das características ambientais, decoração ou objetos. Ex: A casa fica a uns cem metros da rua, à qual se chega por um caminho de pedra, descendo sempre (...) A casa do candomblé tem na frente o terreiro, isto é, um grande salão de oito metros por seis. (...) 50 O rancho é modesto. Uma mesa, um banco, uma estante de livros, a moringa, um espelho e uma pia. Num canto sua rede branca. (...) (...) a sala de consultas é pequena, apenas uma janela e a porta. Sobre a mesinha de canto, há um Cristo colorido, ao lado alguns retratos: Allan Kardec, Chico Xavier, Bezerra de Menezes - teóricos e médiuns espíritas. (...) A máquina de calcular é sua companheira preferida. Ele a usa em todas as operações, mesmo para somar cinco mais cinco, e segue com carinho e ansiedade o seu solene matraquear. Enquanto conversa, não a abandona: sua mão direita está sempre acariciando a tecla. (...) 4.4 Características psicológicas: num texto literário ou jornalístico sobre uma pessoa, poderá haver um conjunto formado pelas ações e reações atribuídas a essa pessoa. Tal conjunto pode induzir o leitor a concluir que essa pessoa tem um determinado tipo de caráter e de temperamento. Os indícios estão espalhados ao longo do texto, através de manifestações verbais e não- verbais, e vão se acumulando à medida que ele transcorre, caracterizando a personagem com adjetivos de personalidade e comportamento contrastados de forma binária: generoso/ mesquinho, calmo/agitado,deprimido/eufórico, amoroso/hostil, exibicionista/discreto, sensível/insensível, vaidoso/modesto, otimista/pessimista, seguro/inseguro, sonhador/cético e inúmeros outros, proporcionando ao leitor elementos para suas próprias conclusões sobre o caráter e temperamento da personagem. As características psicológicas podem ser observadas e interpretadas através das seguintes manifestações: a) Paralinguagem: intensidade, tom e velocidade da voz, caracterização do sotaque ou do idioma, ruídos vocálicos (hum, ah...), grito, cochicho, choro, pigarro, bocejo e suspiro. Ex: - E não sente nenhum ponto de contato com os italianos? - Ponto de contato? Nãooo! Tinha o "erre" frouxo, mas tão frouxo que lá pelas tantas deixava de ser frouxo para não mais existir. (...) A cada pergunta, os presentes ondulavam, cochichavam, suspiravam. (...). b) Gestos: descrição no texto dos gestos feitos pela personagem. 51 Ex: (...) tinha até os gestos lentos, seguros. Fez um sinal com a mão longa, de pianista. Logo o garçom trouxe dois drinks (...) - E ele? Apontou para o fotógrafo. c) Postura: descrição da postura corporal assumida pelo personagem (tenso, relaxado, formal, informal etc.) Ex: (...) estava ali imóvel, inexpressivo, vestido de cinza... Nem sequer se levantou. (...) conversava com os braços cruzados sobre a mesa onde a família faz as refeições nas ocasiões mais importantes (...) d) Expressão facial: descrição dos sentimentos manifestados no rosto do personagem através de descrição ou comparação. Ex: (...) e o seu rosto pobre, bondoso, torcia-se de angústia: sua boca triste apertava-se de medo. Seu rosto impressiona: redondo como a lua cheia, inexpresivo como uma bola, com dois olhinhos invisíveis e enterrados na gordura. e) Olhar: descrição da percepção do narrador sobre a expressão dos olhos da personagem. Ex: Voltou para os ministros um olhar incrédulo, interrogativo, perdido (...) O rosto parecia imóvel e os olhos nada exprimiam. Nem surpresa, nem medo, muito menos vontade de chorar (...) f) Riso: o riso ou o sorriso do personagem podem expressar emoções como prazer, alegria, sarcasmo, desdém, satisfação, aceitação, que podem ser usadas para compor o estado de espírito da personagem. Ex: A entrevista, de fato, começou com gargalhadas e entre gargalhadas prosseguiu por uma boa meia hora. (...) 52 O sorriso e o aceno que dirigiu às pessoas que gritavam seu nome foi tímido, inseguro, quase aflito (...) g) Silêncio: o silêncio do personagem pode ser rico de significados, se bem interpretado pelo escritor. Ex: (...) Seguiu-se um silêncio de pedra. (...) estava ali imóvel, inexpressivo, vestido de cinza. Não disse nada. Nem sequer se levantou. h) Distância: o relato da distância física mantida pelo entrevistado também pode ser carregado de significados, ligando-se a outros elementos da comunicação não-verbal como a postura, o toque, os movimentos dos olhos, o calor dos corpos, as sensações olfativas etc. Ex: (...) manteve-se sentado atrás da mesa, sem esboçar nenhuma reação à minha chegada. (...) Nós Americanos, de fato, somos relutantes em cheirar uns aos outros. Vivemos com medo do mau hálito, do suor, dos cheiros domésticos, dos odores genitais. i) Toques: a forma como o personagem toca seus interlocutores pode trazer indícios de sexualidade, poder, afeição, podendo ter o significado afetado por fatores como: a parte do corpo que se toca, a duração do contato, a pressão empregada, os movimentos após o toque, a presença de outras pessoas e a situação do momento. Ex: Os dois são altamente sensuais e manifestam sua sensualidade tocando o interlocutor, mulher ou homem. Diferença: Maluf gosta de abraçar e com a mão direita mete um cafuné na nuca do abraçado; Covas corre a mão pelo braço do interlocutor. 4.5 Perfil ideológico: o comportamento de uma pessoa é influenciado pelas idéias que ela tem sobre si própria, sobre as outras pessoas e sobre o mundo de uma forma geral. O comportamento pode revelar novos valores sociais ou apego às idéias consideradas arcaicas. Ex: Suas roupas são coloridas, vistosas. Começou com ternos parecidos aos dos Beatles, paletó sem gola, bolsos diagonais. Depois, passou a desenhar o que iria vestir: camisas vermelhas, cor-de-rosa, folgadas, punhos 53 largos, cordões cruzados no peito, à moda dos cowboys americanos; calças colantes, cintos de cores berrantes, botinhas de várias cores. Ele diz que é necessário que suas roupas sejam agressivas, mas nunca de mau gosto. Exemplo descrição física: “Rui era, fisicamente, parecido com o pai João José: de estatura baixa, um metro e cinqüenta e oito centímetros; corpo de adolescente, franzino e ligeiramente encurvado, 48 quilos de peso; circunferência torácica de 84cm, circunferência do abdômen de 72 cm; cabeça grande de poucos e lisos cabelos em desacordo com o corpo; media 57 cm e parecia maior pela conformação; orelhas grandes, fronte espaçosa, largas entradas laterais, rosto oval, nariz médio e quase grego; boca bem traçada, bigodes grossos caindo pelos cantos da boca, lábio inferior saliente num prognatismo visível; olhos vivos de hipermetrope, pescoço longo, colarinho de 36 cm; bem proporcionado de membros; tez morena de sertanejo” (Rejane Magalhães. Rui Barbosa na Vila Maria Augusta). Exemplo descrição psicológica: “Também ele, em criança, e ainda depois, foi supersticioso, teve um arsenal inteiro de crendices que a mãe lhe incutiu e que aos vinte anos desapareceram. No dia em que deixou cair toda essa vegetação parasita, e ficou só com o tronco da religião, ele, como tivesse recebido da mãe ambos os ensinos, envolveu-os na mesma dúvida, e depois em uma só negação total. Camilo não acreditava em nada. Por quê? Não poderia dizê-lo, não possuía um só argumento; limitava-se a negar tudo. E digo mal, porque negar é ainda afirmar, e ele nào formulava a incredulidade; diante do mistério, contentou-se em levantar os ombros, e foi andando.” (Machado de Assis, A cartomante). 5. Descrição de objetos: a descrição de um objeto tem como base uma observação rigorosa. Apesar da proximidade e dos detalhes individualizantes serem fundamentais, não são garantia de uma observação consistente e eficaz. Deve-se fugir à vaguidade. Procura-se descrever segundo uma ordem, como, por exemplo, de fora para dentro, da direita para a esquerda, percebendo pouco a pouco o que há de mais característico no objeto - características sensoriais: gustativas, auditivas, olfativas, táteis, 54 visuais. Porém, não se percebe somente por meio dos sentidos. A descrição consistente é mais que uma fotografia, ela estimula, instiga, desperta o interesse. Ex: “Era uma tela desbotada de tom defumado, onde uns restos de face avermelhada, com uma cabeleira em cachos, sobressaíam vagamente sobre um fundo sombrio. Um vermelhão baço indicava o veludo de uma casaca de corte; a pança saliente e ostentosa enchia um colete esverdeado. E a parte mais conservada da tela era, ao lado sobre um coxim, a coroa real – que o artista trabalhava com uma minuciosidade entusiasta, ou por preocupação de idiota, ou por adulação de cortesão” (Eça de Queiroz, A relíquia). 6. Descrição objetiva (relatórios): é a descrição exata, sem floreios, que não busca a emoção estética e trabalha com a função referencial da linguagem. Deixa de lado o aspecto artístico, preocupando-se com a eficácia e a exatidão da comunicação. O vocabulário é preciso, os pormenores são exatos e a linguagem sóbria. Seu objetivo é esclarecer, informar, comunicar.Ex: Relatórios administrativos e científicos. 7. Descrição de funcionamento: também conhecida como descrição de processo, é utilizada em folhetos informativos que acompanham eletrodomésticos, máquinas, aparelhos eletrônicos. Tem como propósito mostrar o funcionamento do aparelho, os mecanismos de funcionamento, assistência técnica etc. Suas características são: • Exposição em ordem cronológica, esclarecendo-se as diversas etapas do funcionamento. • Objetividade: não usa linguagem abstrata ou afetiva. • Ênfase nos pormenores de funcionamento do aparelho. • Indicação dos diferentes estágios de funcionamento. • Ausência de suspense. • Normas necessárias ao uso do aparelho. Esse tipo de descrição exige conhecimento detalhado do assunto e espírito de observação aguçado. É mais que uma descrição, é um manual. 55 6.4 EXEMPLOS DE TEXTOS DESCRITIVOS MÚSICA FALTANDO UM PEDAÇO (Djavan) O amor é um grande laço, um passo pr'uma armadilha Um lobo correndo em círculos pra alimentar a matilha Comparo sua chegada com a fuga de uma ilha: Tanto engorda quanto mata feito desgosto de filha O amor é como um raio galopando em desafio Abre fendas cobre vales, revolta as águas dos rios Quem tentar seguir seu rastro se perderá no caminho Na pureza de um limão ou na solidão do espinho O amor e a agonia cerraram fogo no espaço Brigando horas a fio, o cio vence o cansaço E o coração de que ama fica faltando um pedaço Que nem a lua minguando, que nem o meu nos seus braços 56 JORNALISMO Sem espelho falante (Veja, 5 de jan. 1994) A vida em Estouros, povoado a 290 km de Belo Horizonte, segue um ritmo que parece eterno. Não é necessário relógio. Acorda-se com o raiar do Sol e dorme-se quando as estrelas começam a surgir. Os homens trabalham a terra e as mulheres cuidam da casa e dos filhos. Nas refeições, as famílias se alimentam daquilo que a terra lhes devolve. Os jornais só aparecem para embrulhar encomenda. Estouros é um lugar sem aquele eletrodoméstico que ocupa o lugar central na residência da maioria dos brasileiros — um aparelho de TV. O que é a TV? O menino Carlos, 10 anos, sete irmãos criados por um lavrador, que todos os dias caminha 12 km para ir à escola e voltar, explica: “É uma caixa de som com um espelho na frente.” O irmão mais velho, Wilson, já viu TV nas redondezas. Mas, se pudesse, Wilson não compraria um aparelho. Uma égua de 3 anos teria maior utilidade: “Eu descansaria das pernas. A gente anda sempre a pé ou no caminhão do leite.” Wilson assistiu à exibição de um programa de reportagens ao vivo e ficou de olhos esbugalhados. Não se conforma até hoje: “A gente vê batida de carro, roubo”, espanta-se. “Aqui não tem nada disso. Tem bandido que mata a pessoa à toa. Aqui a gente mata porco. E para comer.” Economia de troca - É mesmo estranha a vida sem o espelho falante do pequeno morador. Serra Velha, em Santa Catarina, com 300 habitantes e 60 casas, é um povoado encravado em uma montanha e seu acesso é restrito a uma única estrada. Ali nunca se ouviu falar do pacote do ministro da Fazenda. Tampouco de Roberto Carlos ou Pelé. O ídolo naquelas paragens é o professor Santanor, único na região, proprietário de uma caminhonete que faz 30 km por hora como velocidade máxima. Pessoa mais bem informada da cidade, o professor não sabe o nome do cidadão que exerce o cargo de presidente da República. Esse país indiferente à passagem do tempo, mais pobre e menos confortável, mas pacífico, integra uma das mais bem-sucedidas utopias nacionais. A do Brasil rural, de pessoas simples e valores estabelecidos, de pequenos heróis e pequenos vilões naturais em qualquer parte. É um país delicioso de ver e explorar, como de s cobriram as novelas rurais que a TV produz e eles não vêem. Mas é uma utopia urbana achar que o povo desses lugares quer ficar assim. TV é eletricidade, eletricidade é progresso e não há como preferir um lampião de querosene a uma lâmpada, nem é possível achar que o cidadão que não sabe o nome do presidente é mais feliz do que aquele capaz de recitar a lista de todos os ocupantes do Planalto de 1964 para cá. Há seis meses, em Lagoa do Oscar, lugarejo do interior de Minas, correu o boato de que, enfim, os postes de luz chegariam ao local. Foi um alvoroço. O roceiro Domingos, um senhor já de meia-idade, percorreu 110 km apenas para fazer uma troca. Entregou uma espingarda nova para um muambeiro, que lhe deu uma TV portátil trazida do Paraguai. O roceiro aguardou quatro meses pela luz. Como ela não veio, vendeu a TV para um caminhoneiro. Mas não desistiu. “As crianças só falam do dia em que terão uma TV em casa”, diz. Com 3.000 moradores, a 700 km de Salvador, Muquém é outro exemplo. Ali não existe luz elétrica, água encanada nem rede de esgoto. Mas tem TV. Um aparelho, de propriedade da prefeitura, ligado a um gerador a óleo diesel. Todos 57 os dias, um funcionário pega o televisor de 20 polegadas em um barraco onde ele fica trancado e o transporta até a praça da cidade. Ali, cercada com arames farpados, a TV fica ligada das 6 da tarde até às 11 da noite. Até o prefeito acha um absurdo. “É um luxo gastar dinheiro com isso”, reconhece. Mas não há alternativa. Desde que a TV foi instalada, no final de 1991, é sucesso absoluto. Nos dias normais, reúne trinta pessoas na praça. Em grandes momentos, passa de oitenta. PROPAGANDA 58 ATIVIDADE INDIVIDUAL EXTRA: 1. Escolha uma personalidade célebre: um político, um jogador de futebol, uma artista, um cantor ou uma cantora popular ou qualquer outra pessoa famosa que você admire (ou não suporte). Observe atentamente essa figura e elabore um texto descritivo, procurando caracteriza-la física e psicologicamente. É importante que em seu texto não seja mencionado o nome da pessoa. 59 BIBLIOGRAFIA DE APOIO: ANDRADE, Maria Margarida, MEDEIROS, João Bosco. Curso de língua portuguesa para a área de humanas – Enfoque no uso da linguagem jornalística, literária, publicitária. São Paulo: Atlas, 1997. FIORIN, José Luiz, PLATÃO, Francisco. Para entender o texto: leitura e redação. São Paulo: Ática, 1990. INFANTE, Ulisses. Do texto ao texto – Curso prático de leitura e redação. São Paulo: Scipione, 1998. SILVEIRA, Regina Célia. A gramática portuguesa na pesquisa e no ensino: ensino de gramática a partir do texto. São Paulo: Cortez, 1990. VILASBOAS, Sérgio. Perfis e como escreve-los. São Paulo: Summus,2003.
Compartilhar