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Treino de Habilidades Sociais

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Treino de Habilidades Sociais
Simone Rodrigues de Oliveira Dornelas
Stéphani Cristina Bettanin
Ms. Graziela Freire
Pontifícia Universidade Católica de Goiás
Goiânia, 2013.
Treino de Habilidades Sociais
Simone Rodrigues de Oliveira Dornelas
Stéphani Cristina Bettanin
Ms. Graziela Freire
A importância do estudo do Treinamento de Habilidades Sociais é importante devido ao fato das pessoas passarem muito tempo envolvidas em interações sociais. Ao serem socialmente habilidosas, possibilitam a promoção de interações sociais satisfatórias, favorecendo o aumento de reforçadores, prevenindo e/ou reduzindo suas dificuldades psicológicas (Caballo, 1997 citado por Bolsoni-Silva, 2002).
Segundo Caballo (2011), uma das principais lacunas deste tema, habilidades sociais, é a carência de uma definição universalmente aceita. Existem inúmeras definições, mas nenhuma que seja um consenso entre todos os autores. Não pode haver um critério absoluto de habilidade social, pois esta depende do contexto em que está inserida, o qual pode ser mutável, de acordo com fatores tais como sexo, idade, classe social, educação, valores, crenças, etc. Sendo assim, um comportamento considerado adequado em determinada situação pode ser totalmente inadequado em outra.
O termo “habilidades”, segundo Caballo (2011), significa que o comportamento interpessoal implica que a capacidade de se comportar é aprendida e não inerente à pessoa, como defendem outras teorias de personalidade.
Del Prette e Del Prette (2001) dizem que habilidades sociais é um termo que se aplica às diferentes classes de comportamentos sociais do repertório de um indivíduo, que contribuem para a competência social, favorecendo um relacionamento saudável e produtivo com as demais pessoas.
De acordo com Alberti (1977) citado por Caballo (2011), a habilidade social é uma característica do comportamento, específica à situação, e não inerente à pessoa, que deve ser entendida no contexto cultural do indivíduo considerando demais variáveis. Além de ser uma característica do comportamento socialmente efetivo, não prejudicial e ser uma livre escolha do individuo.
Existem inúmeras classes de respostas de habilidades sociais, as geralmente mais aceitas são: 1) iniciar e manter conversações; 2) falar em público; 3) expressões de amor, agrado e afeto; 4) defesa dos próprios direitos; 5) pedir favores; 6) recusar pedidos; 7) fazer obrigações; 8) aceitar elogios; 9) expressão de opiniões pessoais, inclusive discordantes; 10) expressão justificada de incômodo, desagrado ou enfado; 11) desculpar-se ou admitir ignorância; 12) pedido de mudança no comportamento do outro; e 13) enfrentar as críticas. Tais dimensões ocorrem necessariamente com determinadas pessoas e diante de certas situações (Caballo, 2011).
Linehan (1984), citado por Caballo (2003), identifica três tipos básicos de consequências para o comportamento socialmente habilidoso, são elas: 1) eficácia nos objetivos – a eficácia para atingir os objetivos da resposta; 2) eficácia na relação – a eficácia para manter ou melhorar a relação com outra pessoa; e 3) eficácia no respeito próprio – a eficácia para manter a autoestima da pessoa socialmente hábil. O valor desses objetivos varia de acordo com o tempo, as situações e os agentes.
No Treinamento de Habilidades Sociais, as tarefas de casa constituem a ferramenta, muito importante, pela qual as habilidades aprendidas são praticadas no ambiente real, ou seja, são generalizas ao cotidiano do paciente. O início e o fim de cada sessão, normalmente, são utilizados para discussão da tarefa de casa (Caballo, 2011).
O treino de habilidades sociais visa promover comportamentos adequados às demandas dos relacionamentos interpessoais, ou seja, assertivos. Os comportamentos de passividade e/ou agressividade geram consequências problemáticas (Elias & Britto, 2007).
Uma primeira distinção entre comportamentos assertivos, passivos e agressivos pode ser feita com uma dimensão referindo-se ao tipo de expressão, manifesta/encoberta e uma outra dimensão referindo-se ao estilo de comportamento, coercitivo/não-coercitivo (o estilo de comportamento coercitivo emprega o castigo e a ameaça para atingir o objetivo). Na “asserção”, o comportamento seria expresso de forma manifesta e sem exercer coação sobre a outra pessoa, enquanto o comportamento “agressivo” seria expresso de forma manifesta, mas de modo coercitivo sobre a outra pessoa. Na passividade, ou há uma falta de expressão do comportamento ou faz-se de forma indireta, mas sem intimidar o outro. Na “agressão passiva”, o comportamento é expresso de maneira indireta, mas coagindo a outra pessoa, isto é, tenta-se controlar o comportamento da outra pessoa de maneira indireta ou sutil. (Caballo, 2003)
Podemos também dizer que nas reações passivas, os comportamentos se expressam predominantemente na forma encoberta de incomodo, mágoa, ressentimento, ansiedade e/ou por meio de esquiva ou fuga das demandas interpessoais ao invés do enfrentamento. Já nas reações assertivas, os comportamentos que a pessoa apresenta são coerentes entre componentes abertos e encobertos, adequação às demandas e conseqüências obtidas. Nas reações agressivas, os comportamentos comprometem sua competência social por se expressarem predominantemente na forma aberta de agressividade física ou verbal, negativismo, ironia, autoritarismo e coerção. (Del Prette, 2005).
 Outros dois conceitos são importantes na caracterização das habilidades sociais, são eles déficits de aquisição e déficits de desempenho. Os déficits de aquisição resultam na ausência de conhecimento sobre como se comportar de maneira socialmente apropriada, podendo se caracterizar como problemas do tipo “não consigo fazer”. Porém, vale ressaltar, que é uma tarefa complexa a identificação de habilidade apropriada para determinada situação. Já os déficits de desempenho podem ser descritos como uma falha aceitável no desempenho de uma habilidade específica, mesmo quando a pessoa sabe como desempenhar, podem ser problemas do tipo “eu não vou fazer” (Gresham, 2009).
Tendo em vista as exposições anteriores, o presente trabalho teve como objetivo o desenvolvimento prático de um programa de intervenção em habilidades sociais em uma participante anteriormente triada por estagiários da Clínica Escola Vida.
Método
Participante
Ana (nome fictício), 56 anos, ensino fundamental incompleto, aposentada, solteira, mãe de dois filhos adultos e casados, mora sozinha. Ana buscou atendimento na Clínica Escola Vida, da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, com a queixa de sentir-se desprezada pelos filhos e querer se despreocupar com as pessoas que pegam coisas que pertencem a ela, segundo o prontuário. 
Ambiente
As sessões foram realizadas em um dos consultórios padrões da Clínica Escola Vida, contendo três cadeiras, uma mesa, uma mesinha de apoio, duas poltronas e um divã. O ambiente era bem iluminado e arejado, porém a acústica não era a adequada.
Instrumentos e materiais
Os instrumentos utilizados foram: versão adaptada do Questionário de História Vital de Lázarus (1980), entrevista, tarefas de casa e ensaios comportamentais. Os materiais utilizados foram papel e caneta.
Procedimento
Foram realizadas dez sessões, semanais, sendo três sessões de linha de base, seis sessões de intervenção e uma sessão de avaliação final.
Na primeira sessão de linha de base as estagiárias terapeutas se apresentaram, explicaram sobre as normas da Clínica Vida e, resumidamente, sobre o programa e a Terapia Comportamental, além de ter sido iniciada a coleta da história de vida e instaurado a esperança à participante. A tarefa de casa proposta foi que a participante observasse, durante a semana, as situações que alterassem seu estado de humor e registrasse de alguma maneira. 
A segunda sessão de linha de base começou com a indagação sobre a tarefa de casa, que a participante não havia feito. Em seguida houve a continuidade da coleta de dados sobre a história de vida da participante, finalizando coma proposta de uma nova tarefa de casa, desta vez, uma folha de registro, confeccionado pelas estagiárias, contendo figuras com expressões de humor numeradas, para que a participante registrasse conforme situações vividas no decorrer da semana. Este registro se encontra em Anexos. 
A terceira sessão de linha de base foi uma sessão extra, pois identificou-se a necessidade de dar a oportunidade à participante de discorrer mais sobre suas queixas. Nesta sessão, foi utilizada uma situação trazida pela participante para explicar sobre o comportamento assertivo e diferenciá-lo do agressivo. Foi revisada a tarefa de casa, novamente não realizada, revelando que a participante não havia compreendido a proposta da mesma. 
Na primeira sessão de intervenção, foi realizado um ensaio comportamental, a partir da fala da participante, com a finalidade de que a mesma discriminasse seu comportamento agressivo. A tarefa de casa proposta foi que a participante convidasse cada um de seus filhos, separadamente, para um momento agradável, no qual não haveria cobranças nem discussões.
A segunda sessão de intervenção foi iniciada com o questionamento a respeito da tarefa de casa, que não foi realizada, novamente proposta para a semana seguinte. Para que a participante entendesse melhor a proposta das estagiárias, foi realizado outro ensaio comportamental, exemplificando como ela deveria convidar os seus filhos de uma forma mais assertiva.
A terceira sessão de intervenção foi iniciada com a discussão sobre a tarefa de casa a qual foi parcialmente realizada, já que Ana fez o convite para apenas um filho, que o recusou. A participante disse estar decidida a mudar de cidade, pois se sente abandonada ha muito tempo pelos filhos, sem perspectiva de mudança. Ao relatar seu desejo de passar um período de tempo com um de seus netos, foi proposta a seguinte tarefa de casa: fazer um pedido para o pai de seu neto, seu filho, para que este o levasse para passar uma tarde com ela. As estagiárias demonstraram através de encenação, com a finalidade de facilitar a compreensão e discriminar a forma assertiva de fazer o pedido. 
Na quarta sessão de intervenção as alunas estagiárias tentaram aplicar a técnica ensaio comportamental com a finalidade de a participante ter um comportamento alternativo em relação aos filhos, pois com o atual comportamento as consequências não eram reforçadoras, segundo a mesma. 
Na quinta sessão de intervenção foi realizado novamente o ensaio comportamental, com a mesma finalidade.
Na sexta sessão de intervenção foi utilizada a técnica do espelho, pois como a queixa da participante envolvia a agressividade dos filhos para com ela, as alunas estagiárias utilizaram a afirmação da participante “se sou agressiva com minha nora e falo as coisas para ela é porque ela fez por merecer” e a topografia de seu comportamento para que ela percebesse as prováveis consequências, optando por ser menos agressiva. 
A última sessão foi utilizada para a realização de um encerramento, envolvendo a retomada do que foi feito e os resultados que eram esperados, bem como a percepção da participante em relação ao programa de intervenção.
Resultados e Discussão
A partir das intervenções realizadas, esperava-se que a participante, até o fim do programa de intervenção, conseguisse diferenciar os comportamentos passivo, assertivo e agressivo, tendo mudanças em seus próprios comportamentos que incluíssem o aumento da assertividade e a diminuição ou extinção da agressividade. Mudanças estas que resultariam em consequências menos punitivas ou até reforçadoras para a participante, no caso, amenização do sentimento de ser ou estar sendo abandonada pelos filhos, aproximação com os filhos e com os netos e colaboração dos filhos em questões pessoais (que envolvem a aquisição de uma casa e o tratamento de sua doença). 
Entretanto, devido ao baixo nível de compreensão e escolaridade (não significando que ambos tenham uma relação de causalidade) da participante, algumas técnicas, que otimizariam o curto tempo disponível de intervenção com a presença das alunas estagiárias, não puderam ser utilizadas como, por exemplo, as tarefas de casa Registro e Questionário de História Vital, e as técnicas que foram utilizadas (instrução, ensaio comportamental e espelho) não obtiveram os resultados esperados.
De acordo com relatos da participante, o resultado obtido foi o “alívio” desta em relação a seus problemas, ou seja, houve a satisfação da participante de ter a possibilidade de estar em um lugar onde falava de seus problemas para uma audiência não punitiva, o que não é possível nos demais ambientes da participante.
Sendo assim, sugere-se o encaminhamento da participante a um processo psicoterapêutico, caso seja de seu consentimento, que possibilite uma intervenção com um prazo de tempo maior ou o suficiente para atender efetivamente suas demandas.
Apesar da não obtenção dos resultados esperados, o programa de intervenção em habilidades sociais proporcionou às alunas estagiárias a rica experiência de atuarem como terapeutas na prática, visualizando de maneira concreta conceitos estudados ao longo da graduação e ampliando o conhecimento a respeito dos mesmos, o que torna válida a experiência. Sugere-se ainda que, mesmo que em tão pouco tempo, tal prática seja continuada.
Referências	Comment by lucia: Deve inicia na próxima página.
Bolsoni-Silva, A. T. (2002). Habilidades sociais: breve análise da teoria e da prática à luz da análise do comportamento. Interação em Psicologia, 6(2), p. 233-242 1. Universidade Estadual Paulista, Bauru. Versão eletrônica: https://docs.google.com/viewer?url=http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs-2.2.4/index.php/psicologia/article/viewFile/3311/2655&chrome=true, acesso em 22/10/2013.
Caballo, V. E. (2003). Manual de Avaliação e Treinamento das Habilidades Sociais. São Paulo: Santos.
Caballo, V. E. (2011). Manual de técnicas de terapia e modificação do comportamento. São Paulo: Santos.
Del Prette, Z. A. P., & Del Prette, A. (2001). Inventário de Habilidades Sociais: Manual de aplicação, apuração e interpretação. São Paulo: Casa do Psicólogo. 
Del Prette, Z. A. P. e Del Prette, A. D. (2005). Psicologia das Habilidades Sociais na Infância: teoria e prática. Petrópolis: Vozes.
Elias, P. V. O. & Britto, I. A. G. S. (2007). A função da assertividade no relacionamento afetivo. R. R Starling (org). Sobre Comportamento e Cognição: temas aplicados. (Vol. 19, pp. 23-36). Santo André, ESETec. Versão eletrônica: http://pospsicopatologia.com.br/paula/Paula_A_funcao_da_assertividade_no_relacionamento_afetivo.pdf, acesso em 22/10/2013.
Gresham, F. M. (2009). Análise do comportamento aplicada às habilidades sociais. Em: Z. A. P. Del Prette & A. Del Prette (Orgs.), Psicologia das Habilidades Sociais: Diversidade teórica e suas implicações (pp. 17-66). Petrópolis: Vozes.

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