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SUMÁRIO 1. O QUE SÃO OS ESQUEMAS? 2 1.1 OS ESQUEMAS ATRAVÉS DE EXEMPLOS DO DIA-A-DIA 3 1.2 DE ONDE VÊM OS ESQUEMAS? 3 1.3 OS ESQUEMAS E O TEMPERAMENTO EMOCIONAL 4 1.4 COMO OS ESQUEMAS FUNCIONAM? 6 1.5 OS ESQUEMAS SÃO FORMADOS APENAS ATRAVÉS DE TRAUMAS? 7 1.6 EXEMPLO DE PERPETUAÇÃO DOS ESQUEMAS 7 1.7 EXEMPLO DE CURA DOS ESQUEMAS 8 2 NECESSIDADES PARA TER UMA VIDA SAUDÁVEL 9 2.1 EXPERIÊNCIAS QUE FORMAM OS ESQUEMAS 11 2.2 QUAIS SÃO OS ESQUEMAS? 13 2.3 ESQUEMAS DESADAPTATIVOS REMOTOS COM DOMÍNIO DE ESQUEMAS ASSOCIADOS 18 2.4 ESQUEMAS CONDICIONAIS X ESQUEMAS INCONDICIONAIS 22 3 ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO 24 3.1 ESTRATÉGIAS COMUNS PARA LIDAR COM OS ESQUEMAS 24 3.1.1 SUPERCOMPENSAÇÃO 24 3.1.2 RESIGNAÇÃO 26 3.1.3 EVITAÇÃO 26 3.2 COMO EVITAMOS ENFRENTAR OS ESQUEMAS? 27 3.3 COMO COMPENSAMOS OS ESQUEMAS 28 3.4 COMO ACABAMOS “ACEITANDO NOSSOS ESQUEMAS 29 4 RESPOSTAS DE ENFRENTAMENTO 30 4.1 A CURA E AS RESPOSTAS DE ENFRENTAMENTO 30 4.2 POR QUE É TÃO DIFÍCIL MUDAR ESSES ESQUEMAS? 31 4.3 MODOS DE OPERAÇÃO DOS ESQUEMAS 31 4.4 SOBRE O CONCEITO DE MODO 32 5 COMO A TERAPIA PODE AJUDAR? 34 5.1 O PROCESSO TERAPÊUTICO 34 5.2 TÉCNICAS UTILIZADAS NA TERAPIA TO ESQUEMA 35 5.3 RELAÇÃO TERAPEUTA-PACIENTE 37 5.4 A TERAPIA DO ESQUEMA COMO UM MODELO AMPLO E INTEGRADOR 37 5.5 A “TERCEIRA ONDA” DA TERAPIA COGNITIVA 38 5.6 OS ESQUEMAS DE YOUNG: OUTROS CONCEITOS 38 5.7 A TEORIA DE APEGO DE BOWLBY E A NECESSIDADE DE VÍNCULO 39 6 BIBLIOGRAFIA 40 2 1. O QUE SÃO ESQUEMAS? As pessoas diferem naquilo que as deixam deprimidas, ansiosas ou com raiva. Essas diferenças são denominadas como esquemas. Esquemas são as maneiras habituais por meio das quais você vê as coisas, são um modo de ver o mundo. São eles que determinam como você sente, como age, como se relaciona com os outros e como pensa. Um esquema é um padrão de funcionamento que se inicia na infância e permanece ao longo da vida. Eles ativam sentimentos intensos, como a raiva, a tristeza ou a ansiedade. Mesmo quando tudo parece bem, como seu status social, casamento, amizades, trabalho, ainda permanece a sensação de que não consegue apreciar a vida e suas conquistas. O esquema se inicia com algo feito a você por parte da sua família ou por outras crianças ou até adultos que não sejam seus parentes. Algum dia você pode ter sido abandonado, criticado, superprotegido, abusado, excluído ou privado, ou seja, foi maltratado de alguma maneira. Mesmo fora do ambiente familiar, você cresce e continua entrando em situações semelhantes as quais foi maltratado, ignorado, maltratado ou abandonado, e em algum momento falha em alcançar seus objetivos de vida. Por exemplo, a depressão caracteriza-se por esquemas relacionados a perda, privação e fracasso; a ansiedade é caracterizada por esquemas relacionados a ameaça ou medo de fracasso; e a raiva caracteriza-se por esquemas relacionados a insulto, humilhação ou violação de regras. Pesquisas sobre personalidade indicam que as pessoas diferem nos temas contidos na depressão, ansiedade ou raiva. Os esquemas possuem três características principais: São padrões de funcionamento São destrutivos Lutam para sobreviver 3 1.1 OS ESQUEMAS ATRAVÉS DE EXEMPLOS DO DIA-A-DIA Uma pessoa pode focar muito nas questões envolvendo realização, outra pode focar as questões em torno da rejeição e outra ainda as questões ligadas ao medo de ser abandonada. Digamos que seu esquema — sua questão ou vulnerabilidade em particular — esteja relacionado com realização. As coisas podem estar indo bem com você no trabalho, mas então você tem um contratempo que ativa seu esquema sobre realização — a necessidade de ser muito bem-sucedido de modo que não se veja como fracasso. O contratempo no trabalho levar ao esquema de fracasso (ou estar ”na média”, o que equivale a fracasso), e então você fica ansioso ou deprimido. Ou digamos que seu esquema esteja relacionado a questões de abandono. Você pode estar muito vulnerável a quaisquer sinais de rejeição ou abandono. Enquanto o relacionamento for bem, você não fica preocupado. Mas, devido a esse esquema, você pode preocupar-se com o abandono ou a rejeição. Se o relacionamento acaba, isto o leva a sentir-se deprimido porque não suporta ficar sozinho. Além das situações citadas acima, vejamos por outra perspectiva: você se sente frequentemente dentro de relacionamentos românticos com pessoas frias, ou sente que pessoas próximas não te compreendem o suficiente? Ou sente que, no fundo, o que se destaca são sempre os seus defeitos e que, se alguém o conhecer com mais profundidade não o amaria ou o aceitaria? Você sempre se vê colocando as necessidades dos outros a frente das suas, onde as suas próprias nunca são atendidas, ou pior, você não sabe comunica- las as pessoas? Se você se identifica com alguma dessas afirmações, lhe convido a explorar o material e descobrir quais esquemas estão por trás desses sentimentos, muitas vezes tão desconfortáveis e que trazem sofrimento no seu cotidiano. 1.2 DE ONDE VÊM OS ESQUEMAS? Os esquemas resultam de necessidades emocionais não satisfeitas na infância e que se perpetuam ao longo da vida. Isto é, os esquemas ou “esquemas desadaptativos remotos”, se formam através dessas necessidades emocionais não satisfeitas. Eles são compostos por padrões emocionais e cognitivos autoderrotistas (céticos, pessimistas) que são iniciados no começo de nosso desenvolvimento e repetidos ao longo da vida. Sendo assim, os comportamentos desadaptativos se desenvolvem como respostas aos esquemas, ou seja, eles são provocados pelos esquemas, não 4 fazem parte da composição deles. Outra característica importante dos esquemas, é que eles são dimensionais, tendo diferentes níveis de penetração. Assim, quanto mais grave o esquema, maior é o número de situações que podem ativa-lo, e mais intenso costuma ser o sentimento negativo atrelado a ele, e costuma ter uma duração maior. 1.3 OS ESQUEMAS E O TEMPERAMENTO EMOCIONAL Além do ambiente remoto da criança, outros fatores cumprem papeis importantes para o desenvolvimento de esquemas, sendo ele o temperamento emocional. É comum os pais perceberem rapidamente que a criança tem uma personalidade ou temperamento único desde os primeiros meses de vida, algumas são mais irritadiças, enquanto outras são mais tímidas ou até agressivas. Pesquisas realizadas sobre traços de temperamentos presentes na primeira infância apontam que eles são bastante estáveis com o passar do tempo. A definição de um esquema desadaptativo remoto é: • um tema ou padrão amplo, difuso; • formado por memórias, emoções e sensações corporais; • relacionado a si próprio ou aos relacionamentos com outras pessoas; • desenvolvido durante a infância ou adolescência; • elaborado ao longo da vida do indivíduo; • disfuncional em nível significativo. 5 Seguem algumas dimensões do temperamento emocional, que, segundo a hipótese levantada, podem ser inatas e relativamente imutáveis se tratadas apenas por meio da psicoterapia: O temperamento pode ser visto como a combinação singular que cada pessoa possui de pontos neste conjunto de dimensões. Ele interage com experiências dolorosas da infância na formação de esquemas. Diferentes temperamentos colocam a criança, de forma seletiva, a diferentes circunstâncias de vida. Sabemos também que o comportamento é influenciado pelo ambiente. Quando ele é seguro e estimulador tem maior probabilidade de fazer uma criançatímida despertar comportamentos mais extrovertidos. Porém, se esse ambiente estimular de forma negativa, uma criança calma pode se tornar ansiosa. Os fatores hereditários e o ambiente moldam e influenciam nossa personalidade. Por isso, nossa maior influência na infância é exercida pela família; a dinâmica familiar é a dinâmica de mundo que conhecemos pela primeira vez na vida. No momento em que ativamos um esquema, nos encontramos com a dinâmica familiar inicial. Na maioria das vezes, a influência familiar é mais forte na infância e vai diminuindo gradualmente, enquanto a criança cresce. Outras influências vão aparecendo (amigos, escola, pares, etc.), mas a família continua sendo a dinâmica inicial. Lábil (instável) Não reativo Depressivo Otimista Ansioso Calmo Obsessivo Distraído Passivo Agressivo Tímido Sociável 6 Assim, hereditariedade e ambiente interagem. A influência destrutiva das situações presentes na infância juntamente com o temperamento pré determinado, forma os esquemas. Uma situação de abuso pode ser usada como exemplo: usualmente, acontece de apenas um filho da família ser abusado, e é o temperamento que determina parcialmente como ele irá reagir as situações. Pois em determinado ambiente, sendo ele o mesmo, duas crianças podem responder de forma diferente. As duas podem ser abusadas, mas uma age de forma passiva e a outra luta contra isso. 1.4 COMO OS ESQUEMAS FUNCIONAM? Existem duas operações de funcionamento fundamentais dos esquemas: a perpetuação e a cura. Todos os aspectos relevantes aos esquemas – sentimentos, comportamentos, sensações corporais, experiências de vida – ou perpetuam, vão ganhando força e são mais elaborados durante a vida, ou curam, sendo enfraquecidos. A perpetuação refere-se a tudo o que o paciente faz (internamente ou de modo comportamental) que mantenha o esquema funcionando. Eles são perpetuados através de três mecanismos básicos: Distorções cognitivas: a pessoa percebe as situações de forma equivocada, de tal maneira que o esquema é reforçado, atenuando a informação que o confirma ou negando a afirmação que o contradiz. Padrões de vida autoderrotistas: a pessoa escolhe, de forma inconsciente, situações e relacionamentos que ativam e perpetuam os esquemas e mantendo-se neles, enquanto evita relacionamentos saudáveis, que tem a probabilidade de curá-los. Estilos de enfrentamento: existem três tipos de estilos de enfrentamento desadaptativos, sendo eles a hipercompensação, resignação e a evitação. Esses termos serão apresentados mais adiante. A cura, por sua vez, como uma finalidade última da terapia do esquema, envolve a redução da intensidade das memórias, emoções, sensações corporais e as soluções desadaptativas, todos esses fatores que compõem o esquema. Além disso, a cura do esquema também envolve a mudança 7 comportamental conforme o paciente vai aprendendo a substituir estilos de enfrentamento desadaptativos por padrões de comportamentos adaptativos. 1.5 OS ESQUEMAS SÃO FORMADOS APENAS ATRAVÉS DE TRAUMAS? A resposta é não. Uma pessoa pode desenvolver um esquema de dependência/incompetência, sem ter sofrido traumas na infância, pelo contrário: sendo uma criança totalmente abrigada e superprotegida. Entretanto, mesmo nem todos os esquemas sendo originados de traumas, ainda assim são destrutivos. Vejamos um exemplo clínico: F., uma mulher de 45 anos, com um tremendo potencial vive presa em sua casa, pois seus medos a incapacitaram. Mesmo tomando sua medicação para ansiedade, vive refém de sua Vulnerabilidade ao Dano. F. não tem vida, porque tem muito medo de fazer qualquer coisa, pois considera o mundo perigoso demais e acha mais seguro ficar em casa. Ela se preocupa com doenças como a Aids, com acidentes de carro, com ser assaltada e com gastar muito dinheiro. Na infância de F., seus pais eram superprotetores e a tratavam como uma boneca frágil, e frequentemente a ameaçavam com possíveis ameaças ao seu bem-estar. Ela poderia pegar uma pneumonia, ficar presa no banheiro, afogar-se ou ser vítima de um incêndio. Não é de se surpreender que ela tenha ficado a maior parte de sua vida em estado de ansiedade e alerta, preparada para um perigo iminente, privando-se de diversão. 1.6 EXEMPLO DE PERPETUAÇÃO DOS ESQUEMAS M. desenvolveu um esquema de defectividade, advinda, em sua maior parte, de sua relação com a mãe na infância. M. afirma que não havia nada em que a mãe aprovasse nela e não havia nada que ela pudesse fazer a respeito. Aos olhos da mãe, não era bonita, não era expansiva, nem admirada, não tinha uma personalidade marcante, não se vestia bem. Apenas era inteligente, o que não era muito significativo para a mãe. Na vida adulta, atualmente, M. tem poucas amigas. Seu namorado T. apresentou às namoradas de seus amigos. M. gosta delas, porém sente que nunca vai conseguir estabelecer uma amizade com elas. M. não acredita que as novas amigas gostem dela, e acaba ficando excessivamente nervosa em sua presença. Podemos perceber que M. age frequentemente, de forma a perpetuar o esquema de defectividade com essas mulheres. Em termos cognitivos, costuma distorcer 8 as informações e sinais de que as mulheres correspondem sua amizade, ignorando-os, e interpreta de forma errônea o que elas fazem e dizem como evidências de que não gostam dela. 1.7 EXEMPLO DE CURA DOS ESQUEMAS Você se lembra do exemplo clínico anterior? De F., 45 anos, que possuía um esquema de vulnerabilidade ao dano? Com o auxílio da terapia medicamentosa e da psicoterapia, conseguiu se expor de forma gradual aos seus medos. Ela passou a ser capaz de viajar, ver seus amigos, ir ao cinema, e até mesmo um emprego. Durante o tratamento, o terapeuta a ajudou a avaliar melhor as possibilidades de coisas ruins acontecerem. Lhe era mostrado que, na maioria das vezes, ela dava uma proporção maior e catastrófica às situações e superestimava sua vulnerabilidade e fraquezas fora de casa. Então, ela aprendeu a tomar precauções aceitáveis, seu casamento melhorou ela passou a ter uma vida muito mais alegre e prazerosa. 9 2. NECESSIDADES PARA TER UMA VIDA SAUDÁVEL Não precisamos ter uma infância perfeita para sermos pessoas saudáveis na vida adulta. Mas precisamos ter um mínimo de adequação para que seja boa o suficiente. Uma criança precisa se conectar com os outros, se sentir competente, com boa autoestima, livre para se expressar e ser aberta a respeitar limites. Se ela tiver esses aspectos supridos durante sua infância, seu desenvolvimento psíquico será satisfatório, caso contrário, acarretam problemas de desenvolvimento. São cinco as necessidades emocionais fundamentais para os seres humanos. 1. Vínculos seguros com outros indivíduos (inclui segurança, estabilidade, cuidado e aceitação). Oferecimento de uma base emocional estável e de previsível apego. Relações baseadas na honestidade, verdade, senso de lealdade e ausência de situações de abuso. Presença de afeto e amorosidade nas relações com exercício da empatia e proteção nas relações. Aceitação amorosa incondicional dos cuidadores, encorajamento para compartilhar áreas de conflito pessoal e garantia de confidencialidade, ausência de criticismo e rejeição. Sentimento de aceitação e inclusão nos valores e interesses de sua comunidade (amigos). 2. Autonomia, competência e sentido de identidade. Suporte e orientação no desenvolvimento de habilidades em diversas áreas (lazer, educacional, esportiva, etc.). Auxílio por parte dos cuidadores no equilíbrio entre indicadores de doença ou problemas versus habilidades de enfrentamento. Evitação de exposição de preocupações excessivas ou superproteção. Desafios, suporte e orientação para o aprendizado de como manejar o cotidiano. Convivênciacom pessoas significativas que a aceitem de seu modo e que respeitem os seus limites e direcionamentos. 3. Limites realistas e autocontrole. Orientação e firmeza empática e afetiva no adiamento de gratificações para atender tarefas diárias. Limites expressos quando as emoções se mostram fora de controle ou inapropriada para os contextos. Orientação e imposição 10 de limites afetivos para o aprendizado do efeito das ações dos outros para si e vice-versa. 4. Liberdade de expressão, necessidades e emoções válidas. Liberdade para expressar suas necessidades, sentimentos e opiniões, sem sofrer rejeição ou punição. Equilíbrio na avaliação da importância das necessidades de cada pessoa, não utilização da culpa para controlar a expressão de necessidades da criança. 5. Espontaneidade e lazer. Cuidadores que sejam espontâneos e honestos com a expressão emocional e que incentivem a criança e expressar e falar sobre sentimentos. Orientação no desenvolvimento de metas e outros aspectos relevantes da vida (lazer), com perdão por erros ocasionais. Essas necessidades são universais: todas as pessoas as têm, embora algumas apresentem necessidades mais fortes do que outras. Um indivíduo psicologicamente saudável é aquele que consegue satisfazer de forma adaptativa (habilidades que permitem adaptação ao ambiente) as necessidades emocionais fundamentais. Experiências de vida nocivas configuram a origem básica dos esquemas. Os esquemas desenvolvidos mais cedo e mais fortes geralmente se originam na família nuclear. Em grande medida, as dinâmicas da família de uma criança são as dinâmicas de todo o seu mundo remoto. Quando os pacientes se encontram em situações adultas que ativam os esquemas, o que vivenciam é um drama da infância, em geral com um dos pais. Tais experiências levam as pessoas a terem a tendência de considerar verdades absolutas a priori (por dedução, suposição, etc.) que influenciam seu modo de processar as experiências e interpretar as situações, vendo somente através da “lente” desses esquemas, que determinam como a pessoa pensa, sente e age, e como se relaciona com os outros. Portanto, quando adultos, as pessoas acabam por recriar essas condições da infância, condições essas que lhes foram mais prejudiciais e causaram sofrimento. Outras influências – como amigos, escola, grupos da comunidade e cultura ao seu redor –, tornam-se cada vez mais importantes à medida que a criança amadurece e podem ocasionar o desenvolvimento de esquemas. Contudo, os 11 esquemas desenvolvidos posteriormente não costumam ser tão impregnados ou tão poderosos. 2.1 EXPERIÊNCIAS QUE FORMAM OS ESQUEMAS Observa-se quatro tipos de experiências no início da vida que estimulam a aquisição de esquemas. I. A primeira delas é uma frustração nociva de necessidades, ocorrida quando a criança passa por poucas experiências boas e adquire esquemas como privação emocional ou abandono por meio de déficits no ambiente, no início de sua vida. O ambiente da criança carece de sensações importantes, como estabilidade, compreensão e amor. II. O segundo tipo de experiência de vida remoto que engendra esquemas é a traumatização ou vitimização. Neste caso, causa-se um dano à criança ou ela se transforma em vítima e desenvolve esquemas como desconfiança/abuso, defectividade/vergonha ou vulnerabilidade ao dano. III. No terceiro tipo, a criança passa por uma grande quantidade de experiências boas: os pais lhe proporcionam em demasia algo que, moderadamente, seria saudável. Com esquemas como dependência/incompetência ou arrogo/grandiosidade, por exemplo, a criança raramente é maltratada. Em lugar disso, é tratada com demasiada indulgência. Não se atende às necessidades emocionais de autonomia ou limites realistas. Os pais podem estar exageradamente envolvidos na vida da criança, superprotegê-la ou dar-lhe liberdade e autonomia sem limites. IV. O quarto tipo de experiência de vida que origina esquemas é a internalização ou identificação seletiva com pessoas importantes. A criança identifica-se seletivamente e internaliza pensamentos, sentimentos, experiências e comportamentos dos pais. 12 Aprendemos esses esquemas negativos com nossos pais, irmãos, colegas e parceiros. Os pais podem contribuir com os esquemas negativos ao fazê-lo sentir que não é bom o suficiente a menos que seja superior a todos, dizendo a você que é muito gordo ou que não é atraente, comparando-o com outras crianças que estão “se saindo melhor”, dizendo que você é egoísta porque tem necessidades, ou se intrometendo em sua vida e dando ordens, ou ameaçando se matarem ou abandoná-lo. Existem muitas maneiras diferentes pelas pais ensinam às crianças esses esquemas negativos sobre si próprias e sobre os outros. Conforme indicado, outras pessoas que não nossos pais podem ser fontes de esquemas. Talvez seu irmão ou irmã o tenham maltratado, levando-o a formar esquemas de abuso, não-merecimento de amor, rejeição ou controle. Ou talvez seu parceiro ou parceira tenha lhe dito que você não é bom ou boa o suficiente, levando a esquemas de não ser atraente, não ter valor e não ser digno de amor. Nós até internalizamos esquemas a partir da cultura popular, como imagens de ser esbelta e bonita, ter corpo perfeito, de “como homens Por exemplo, pense nas seguintes experiências reais que algumas pessoas recordaram sobre como seus pais lhes “ensinaram” os esquemas negativos: 1.“Você poderia sair-se melhor - por que tirou aquele B?”: esquema envolvendo a necessidade de ser perfeito ou evitar inferioridade. 2. “Suas coxas são muito gordas e seu nariz é feio”.: esquema de obesidade e feiura. 3. “Seu primo foi para Harvard - por que você não pode ser mais parecido com ele?”: esquema de inferioridade e incompetência. 4. “Por que vocês estão sempre reclamando? Vocês não percebem que tenho problemas ao cuidar de vocês, crianças?”: esquema de exclusivismo das necessidades. 5. “Talvez eu devesse simplesmente ir embora e deixar vocês crianças cuidarem de si mesmas”.: esquema de sobrecarga e abandono. 13 de verdade deveriam ser”, sexo perfeito, rios de dinheiro e enorme sucesso. Essas imagens irreais reforçam esquemas de perfeição, superioridade, inadequação e imperfeição. 2.2 QUAIS SÃO OS ESQUEMAS? Abandono/ instabilidade Percepção de que os outros com quem poderia se relacionar são instáveis e indignos de confiança. Envolve a sensação de que pessoas importantes não serão capazes de continuar proporcionando apoio emocional, ligação, força ou proteção prática porque seriam emocionalmente instáveis e imprevisíveis, não mereceriam confiança ou só estariam presentes de forma errática; porque morreriam a qualquer momento, ou iriam abandoná-lo por outra pessoa melhor. Desconfiança/ abuso Expectativa de que os outros irão machucar, abusar, humilhar, enganar, mentir, manipular ou aproveitar-se. Geralmente, envolve a percepção de que o prejuízo é intencional ou resultado de negligência injustificada ou extrema. Pode incluir a sensação de que sempre se acaba sendo enganado por outros ou “levando a pior”. Privação emocional Expectativa de que o desejo de ter um grau adequado de apoio emocional não será satisfeito adequadamente pelos outros. As três formas mais importantes de privação são: a. Privação de cuidados: ausência de atenção, afeto, carinho ou companheirismo. b. Privação de empatia: ausência de compreensão, de escuta, de uma postura aberta ou de compartilhamento mútuo de sentimentos. c. Privação de proteção: ausência de força, direção ou orientação por parte de outros. 14 Defectividade/ vergonha Sentimento de que é defectivo, falho, mau, indesejado, inferior ou inválido em aspectos importantes, ou de não merecero amor de pessoas importantes quando está em contato com elas. Pode envolver hipersensibilidade à crítica, rejeição e postura acusatória; constrangimento, comparações e insegurança quando se está junto de outros, ou vergonha dos defeitos percebidos. Essas falhas podem ser privadas (como egoísmo, impulsos de raiva, desejos sexuais inaceitáveis) ou públicas (como aparência física indesejável, inadequação social). Isolamento social/ alienação Sentimento de que se está isolado do resto do mundo, de que se é diferente das outras pessoas e/ ou de não pertencer a qualquer grupo ou comunidade. Dependência/ incompetência Crença de que se é incapaz de dar conta das responsabilidades cotidianas de forma competente sem considerável ajuda alheia. Com frequência apresenta- se como desamparo. Vulnerabilidade ao dano ou à doença Medo exagerado de que uma catástrofe iminente cairá sobre si a qualquer momento e de que não há como a impedir. Emaranhamento/ self subdesenvolvido Envolvimento emocional e intimidade em excesso com uma ou mais pessoas importantes (com frequência, os pais), dificultando a individuação integral e desenvolvimento social normal. Muitas vezes, envolve a crença de que ao menos um dos indivíduos emaranhados não consegue sobreviver ou ser feliz sem o apoio constante do outro. Pode também incluir sentimentos de ser sufocado ou fundido com outras pessoas e de não ter uma identidade individual suficiente. Com frequência, é vivenciado como sentimento de vazio e fracasso totais, de não haver direção e, em casos extremos, de questionar a própria existência. 15 Fracasso Crença de que fracassou, de que fracassará inevitavelmente ou de que é inadequado em relação aos colegas em conquistas (escola, trabalho, esportes). Costuma envolver a crença de que é burro, inepto, sem talento, inferior, menos exitoso do que os outros, e assim por diante. Arrogo/ grandiosidade Crença de que é superior a outras pessoas, de que tem direitos e privilégios especiais, ou de que não está sujeito às regras de reciprocidade que guiam a interação social normal. Envolve a insistência de que se deveria poder fazer tudo o que se queira, independentemente da realidade, do que outros consideram razoável ou do custo a outras pessoas. Tem a ver com o foco exagerado na superioridade (estar entre os mais bem sucedidos, famosos, ricos) para atingir seu poder ou controle (e não principalmente para obter atenção ou aprovação). Às vezes, inclui competitividade excessiva ou dominação em relação a outros: afirmar o próprio poder, forçar o próprio ponto de vista ou controlar o comportamento de outros segundo os próprios desejos, sem empatia ou preocupação com as necessidades ou desejos dos outros. Autocontrole/ autodisciplina insuficientes Dificuldade ou recusa a exercer autocontrole e tolerância à frustração com relação aos próprios objetivos ou a limitar a expressão excessiva das próprias emoções e impulsos. Em sua forma mais leve, o paciente apresenta ênfase exagerada na evitação de desconforto: evitando dor, conflito, confrontação e responsabilidade, à custa da realização pessoal, comprometimento ou integridade. Subjugação Submissão excessiva ao controle dos outros, por sentir-se coagido, submetendo-se para evitar a raiva, a retaliação e o abandono. As duas principais formas são: a. Subjugação das necessidades: supressão das próprias preferências, decisões e desejos; b. Subjugação das emoções: supressão de emoções, principalmente raiva. 16 Envolve a percepção de que os próprios desejos, opiniões e sentimentos não são válidos ou importantes para os outros. Apresenta-se como obediência excessiva, combinada com hipersensibilidade a sentir-se preso. Costuma levar a aumento da raiva, manifestada em sintomas desadaptativos (como comportamento passivo- agressivo, explosões de descontrole, sintomas psicossomáticos, retirada de afeto, “atuação”, uso excessivo de álcool ou drogas). Auto- sacrifício Foco excessivo no cumprimento voluntário das necessidades de outras pessoas em situações cotidianas, à custa da própria gratificação. As razoes mais comuns são: não causar sofrimento a outros, evitar culpa por se sentir egoísta, ou manter a conexão com outros percebidos como carentes. Muitas vezes, resulta de uma sensibilidade intensa ao sofrimento alheio. Às vezes, leva a uma sensação de que as próprias necessidades não estão sendo adequadamente satisfeitas e a ressentimento em relação àqueles que estão sendo cuidados. Busca de aprovação/ busca de reconhecimento Ênfase excessiva na obtenção de aprovação, reconhecimento ou atenção de outras pessoas, ou no próprio enquadramento, à custa do desenvolvimento de um senso de self seguro e verdadeiro. A autoestima depende principalmente das reações alheias, em lugar das próprias inclinações naturais. Por vezes, inclui ênfase exagerada no status, aparência, aceitação social, dinheiro ou realizações como forma de obter aprovação, admiração ou atenção (não em função de poder ou controle). Com frequência, resulta em importantes decisões não- autênticas nem satisfatórias, ou em hipersensibilidade à rejeição. Negativismo/ pessimismo Foco generalizado, que dura toda a vidam nos aspectos negativos enquanto se minimizam ou negligenciam os aspectos positivos ou otimistas. Costuma incluir uma expectativa exagerada – em uma ampla gama de situações profissionais, financeiras ou interpessoais – de que algo vai acabar dando muito errado, ou, que aspectos da própria vida que parecem ir muito bem acabarão por desabar, envolve um medo exagerado de cometer erros que podem levar a colapso financeiro, perda, humilhação ou a se ver preso em 17 uma situação ruim. Como exageram os resultados negativos potenciais, essas pessoas costumam se caracterizar por preocupação, vigilância, queixas ou indecisão crônica. Inibição emocional Inibição excessiva da ação, dos sentimentos ou da comunicação espontâneos, em geral para evitar a desaprovação alheia, sentimentos de vergonha ou de perda de controle dos próprios impulsos. As áreas mais comuns da inibição envolvem: inibição da raiva e da agressão; inibição dos impulsos positivos; dificuldade de expressar vulnerabilidade ou comunicar livremente seus sentimentos, necessidades e assim por diante; ênfase excessiva na racionalidade, ao mesmo tempo em que se desconsideram emoções. Padrões inflexíveis/ postura crítica exagerada Crença subjacente de que se deve fazer um grande esforço para atingir elevados padrões internalizados de comportamento e desempenho, via de regra para evitar críticas. Costuma resultar em sentimentos de pressão ou dificuldade de relaxar e em posturas críticas exageradas com relação a si mesmo e a outros. Deve envolver importante prejuízo do prazer, do relaxamento, da saúde, da autoestima, da sensação de realização ou de relacionamentos satisfatórios. Os padrões inflexíveis geralmente se apresentam como: perfeccionismo, atenção exagerada a detalhes ou subestimação de quão bom é seu desempenho em relação à norma; regras rígidas e ideias de como as coisas “deveriam” ser em muitas áreas da vida, incluindo preceitos morais, éticos, culturais e religiosos elevados, fora da realidade; preocupação com tempo e eficiência, necessidade de fazer sempre mais do que se faz. Postura punitiva Crença de que as pessoas devem ser punidas com severidade quando cometem erros. Envolve a tendência a estar com raiva e a ser intolerante, punitivo e impaciente com aqueles (incluindo a si próprio) que não correspondem às suas expectativas ou padrões. Via de regra, inclui dificuldades de perdoar os próprios erros, bem como os alheios, em função de uma relutância a considerar circunstâncias atenuantes, permitir a imperfeição humana ou empatizar com sentimentos.18 2.3 ESQUEMAS ADAPTATIVOS REMOTOS COM DOMÍNIOS DE ESQUEMAS ASSOCIADOS Desconexão e rejeição: pessoas com esquemas nesse domínio têm muitas dificuldades em formar vínculos seguros e satisfatórios com seus pares. Tem a crença enraizada de que suas necessidades de estabilidade, segurança, cuidado, amor e pertencimento não serão supridas. As famílias de origem costumam apresentar: Instabilidade (abandono/instabilidade); Abuso (desconfiança/abuso); •Abandono/instabilidade •Desconfiança/abuso •Privação Emocional •Defectividade/vergonha •Isolamento social/ alienação Desconexão e rejeição •Dependência/incompentência •Vulnerabilida-de ao dano ou à doença •Emaranhamento/self subdesenvolvido •Fracasso Autonomia e desempenho prejudicados •Arrogo/grandiosidade •Autocontrole/autodisciplina insuficientes Limites prejudicados •Subjugação •Autosacrifício •Busca de aprovação/reconhecimento Direcionamento para o outro •Negativismo/pessimismo •Inibição emocional •Padrões inflexíveis/postura crítica exagerada •Postura punitiva Hipervigilância e Inibição 19 Frieza (privação emocional); Rejeição (defectividade/vergonha) ou Isolamento do mundo exterior (isolamento social/alienação). Autonomia e desempenho prejudicados: autonomia é a capacidade de separar-se da família e operar de forma independente, no nível das pessoas da mesma idade. As pessoas com esquema nesse domínio nutrem expectativas sobre si próprios e o mundo de forma que ela interfere em sua capacidade de se diferenciar das figuras materna e paterna e funcionar de forma independente. Na infância, na maioria dos casos, os pais costumavam fazer todas as suas vontades ou os superprotegiam, ou, na situação inversa, raramente os cuidavam e se responsabilizavam por eles. Os esquemas associados são: Dependência/incompetência; Vulnerabilidade ao dano ou a doença; Fracasso; Emaranhamento/self subdesenvolvido. Limites prejudicados: as pessoas com esquemas nesse domínio não receberam limites externos adequados referentes a reciprocidade ou autodisciplina e podem não ser capazes de respeitar os direitos do próximo, cooperar, manter compromissos ou cumprir objetivos. Muitas vezes são pessoas egoístas, mimados, irresponsáveis ou narcisistas. Geralmente, essas pessoas crescem em famílias excessivamente permissivas ou indulgentes. São associados aos esquemas: Arrogo/grandiosidade; Autocontrole/autodisciplina insuficientes Direcionamento para o outro: a pessoa submetida a esse domínio excedem no que diz respeito a atender as necessidades do outro, esquecendo das suas próprias. Comportam-se dessa maneira por busca de aprovação, para evitar retaliação ou para manter a conexão emocional. Elas se concentram demasiadamente nas solicitações alheias, deixando as suas de lado, não tendo consciência de sua raiva e de suas preferências. Na infância, não tinham liberdade de seguir suas próprias aspirações. Na vida adulta, se voltam para fora, e não para si, e acabam por seguir os desejos alheios. Trata-se dos esquemas: 20 Subjugação (de necessidades e de emoções); Auto sacrifício e Busca de aprovação/busca de reconhecimento. Hipervigilância/Inibição: o sujeito com esquemas nesse domínio omitem suas emoções e impulsos espontâneos e se engajam a cumprir regras rígidas estabelecidas por si mesmos, passando por cima de sua felicidade auto expressão, relaxamento, relacionamentos íntimos e sua saúde. Tais características se originam de uma infância severa, reprimida e rígida, onde o autocontrole e a negação de si próprio sobrepõem a espontaneidade e o prazer. Provavelmente, essas pessoas quando crianças não foram estimuladas a ter momentos de lazer e relaxamento e sim a se manterem hiper vigilantes. Os esquemas associados são: Negativismo/pessimismo; Inibição emocional; Padrões inflexíveis/postura crítica exagerada e Postura punitiva. 2.3.1 JOÃO E O SENTIMENTO DE DESCONEXÃO João é um corretor de imóveis de 40 anos bem sucedido e relata que seu problema está no fato de conquistar várias mulheres, porém não conseguir se conectar com elas. João tem o esquema de Privação Emocional, associado a Desconexão. João acaba indo de uma mulher para outra, e relata ter a sensação de que nenhuma delas o satisfaz e que, de alguma forma, todas o desapontam. O mais próximo que ele chegou de um relacionamento íntimo, é o ato de se apaixonar por mulheres que o satisfazem sexualmente, e seus relacionamentos nunca duram. Portanto, João tem muita dificuldade de se conectar com as mulheres, pois seu interesse só se limita à fase da conquista. Esse interesse acaba quando a mulher se apaixona. Ele se incomoda com demonstrações de afeto, fato que o afasta das mulheres. Consequentemente, João sente uma solidão enorme dentro de si, e procura nessas mulheres algo que o preencha e afaste o sentimento de vazio. Por outro lado, ele acha que nunca vai encontrar essa mulher e que ficará sempre sozinho. Na sua infância, João sentia a mesma solidão: ele não conheceu o pai e sua mãe era fria e distante, não demonstrava afeto. Vemos que nenhum 21 deles conseguiu prover as necessidades emocionais de João, ou seja, ele sofreu a privação emocional desde pequeno e acaba se colocando em situações, na vida adulta, que perpetuam esse esquema. Em relação ao tratamento terapêutico, João também reproduz o esquema: passou de um terapeuta para outro. João afirma que, no início, todos os terapeutas o deixam esperançoso, mas em seguida logo se decepciona com eles. Ele demonstrou dificuldades de estabelecer um vínculo com os terapeutas e acabava encontrando falhas nos mesmos para fundamentar sua necessidade de terminar a terapia. Cada experiência mal sucedida só confirmava que João estaria sempre sozinho, e que sua vida não melhorava. A maioria dos terapeutas que atendiam João eram empáticos e compreensivos, portanto, isso não era um problema. O problema estava na atitude negativa de João, que sempre encontrava motivos para evitar a formação de vínculo com o terapeuta, porque aquilo não lhe era familiar e era desconfortável. Para que João seja capaz de combater seu esquema de privação emocional e estabelecer vínculos, era preciso que parasse de inventar desculpas e culpar as mulheres com quem saía. Ele precisava assumir a responsabilidade por seus desconfortos em se aproximar e aceitar a sua vulnerabilidade. Na última vez que procurou terapia e ela foi realmente efetiva, João foi confrontado empaticamente em relação aos seus esquemas a cada vez que tentava reafirmá-los. Foi demonstrado total compreensão e acolhimento a respeito de seu desconforto em se aproximar das pessoas, ainda mais quando eram frias. Mas, por outro lado, quando ele insistia em colocar defeitos nas mulheres com quem se relacionava, seja porque uma não era inteligente o suficiente, ou que não era certa para ele, João era incentivado a ver que essas atitudes estavam ativando seu esquema de privação emocional, se esquivando e culpando os outros para evitar seus sentimentos de afeto. Depois de um tempo de psicoterapia, João apresentava resultados muito positivos: ele passou a namorar uma mulher que considerava amável e afetiva, assumiu a responsabilidade em seu relacionamento para fazê-lo dar certo, não queria que seu relacionamento atual fracassasse e se deu conta de que ele tinha duas opções viáveis: se permitir conectar com alguém ou se entregar para o sentimento de solidão para sempre. 22 2.4 ESQUEMAS CONDICIONAIS X ESQUEMAS INCONDICIONAIS Young (2013) considera alguns esquemas como condicionais e outros como incondicionais. Assim, os esquemas mais nucleares e remotos são crenças incondicionais em relação a si mesmo e aos outros, enquanto aqueles desenvolvidos maistarde, são condicionais. Os pacientes geralmente não têm esperanças a respeito dos esquemas incondicionais, independente do que ele faça, acredita que o resultado será sempre o mesmo: ele será incompetente, sem identidade, não merecedor de amor, desajustado, ameaçado, terá sempre uma atitude pessimista e nada tem é capaz de mudar isso. Em contrapartida, os esquemas condicionais dão certa esperança, o sujeito pode mudar o resultado: pode se subjugar, se sacrificar, buscar constantemente por aprovação ou se esforçar exageradamente para atingir padrões elevados, e, fazendo isso, talvez evitar o resultado negativo, pelo menos por algum tempo. Geralmente, os esquemas condicionais desenvolvem-se como tentativas de obter alívio, denominando-se como secundários. Aqui vão alguns exemplos: Padrões inflexíveis em resposta à defectividade: a pessoa tem a crença de que se puder ser perfeita, só assim será merecedora de amor; Subjugação em resposta ao abandono: o sujeito acredita que se fizer tudo o que o parceiro quer e não ficar bravo, então ele ficará comigo; Auto sacrifício como resposta à defectividade: o indivíduo crê que se atender a todas as necessidades da outra pessoa em detrimento das suas próprias, então ela vai ser aceita apesar de seus defeitos e assim será digna de amor. É praticamente impossível cumprir as demandas dos esquemas condicionais o tempo todo. Ou seja, é difícil subjugar-se sempre e nunca ficar com raiva. Também é difícil ser muito exigente a ponto de ter todas as suas demandas atendidas ou se sacrificar para atender as demandas alheias. Na maioria das vezes, os esquemas condicionais podem maquiar os esquemas nucleares. O 23 sujeita é forçado a ficar consciente, e por consequência, a encarar a verdade do esquema nuclear outra vez. Esquemas incondicionais Abandono/instabilidade Desconfiança/abuso Privação emocional Defectividade Isolamento social Dependência/incompetência Vulnerabilidade a dano ou doença Emaranhamento/self subdesenvolvido Fracasso Negativismo/pessimismo Postura punitiva Arrogo/grandiosidade Autocontrole/autodisciplina insuficientes Esquemas condicionais Subjugação Autosacrifício Busca de aprovação/reconhecimento Inibição emocional Padrões inflexíveis/postura crítica exagerada 24 3. ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO 3.1 ESTRATÉGIAS COMUNS PARA LIDAR COM OS ESQUEMAS Existem três maneiras de um organismo responder às ameaças: lutar, fugir ou paralisar-se. Essas formas equivalem a três estilos de enfrentamento desadaptavios: hipercompensação, evitação e resignação. Ou seja, a luta é a hipercompensação, a fuga, evitação e paralisar-se corresponde a resignação. Portanto, a ameaça se apresenta como uma frustração às necessidades fundamentais de uma criança – vínculo seguro, autonomia, liberdade de autoexpressão, espontaneidade e lazer, ou limites realistas. A ameaça, por sua vez, também pode apontar para o medo das intensas emoções que o esquema ativa. Então, quando a criança se depara com esses tipos de ameaças, ela pode reagir através de uma combinação desses três tipos de enfrentamento desadaptativos: ela vai se resignar, evitar ou hipercompensar. Esses três estilos costumam se manifestar de forma inconsciente. Sabendo disso, compreendemos que a ativação de um esquema corresponde uma ameaça (a frustração de uma necessidade emocional fundamental e as emoções a ela associada) a qual a pessoa responde com um ou mais desses estilos de enfrentamento. Tais estilos de enfrentamento são considerados como adaptativos em relação ao modo de resposta de uma criança, ao decorrer de sua infância, pois são considerados mecanismos de sobrevivência saudáveis, entretanto, tornam-se desadaptativos ao longo do crescimento da criança, porque os estilos de enfrentamento continuam a disseminar o esquemas, mesmo quando as condições mudam e a pessoa dispõe de opções mais saudáveis. Esses estilos desadaptativos de enfrentamento costumam aprisionar as pessoas aos seus esquemas. Abaixo veremos as estratégias de enfrentamento: 3.1.1 SUPERCOMPENSAÇÃO A supercompensação funciona de modo que o sujeito passa a lutar contra o esquema, pensando, sentindo relacionando-se e se comportando, como se o oposto do esquema fosse verdadeiro. A pessoa se dedica a ser o mais diferente e oposta possível da criança que foi quando o esquema foi adquirido. Por exemplo, a pessoa se sentiu sem valor quando criança, e quando se tornou adulta, busca ser perfeita; ou se ela foi subjugada na infância, hoje desafia a todos; se foi controlada quando criança, hoje procura controlar a todos ou rejeita todas as formas de influência; se foi abusada, 25 abusa das outras pessoas. Superficialmente, são seguros e donos de si, mas profundamente sentem a pressão do esquema ameaçando sua “explosão”. Lutar contra o esquema pode ser saudável, desde que o comportamento seja proporcional à situação e desde que sejam levados em consideração os sentimentos de outros, e que se possa esperar de forma razoável chegar aos resultados desejados, todavia, os supercompensadores costumam focalizar o contra-ataque, com comportamentos insensíveis, improdutivos e excessivos. As pessoas desenvolvem a supercompensação porque ela oferece uma alternativa ao sofrimento causado pelo esquema. Atua como uma “válvula de escape” da sensação de impotência e vulnerabilidade que a pessoa sentiu na infância e durante seu crescimento. A seguir veremos as formas mais comuns de supercompensação: Agressão ou hostilidade: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você se verá contra-atacando através de uma postura acusatória, crítica, desafiadora ou abertamente oposicionista. Dominância ou excessiva autoafirmação: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você se verá tentando controlar os outros de modo a atingir seus objetivos. Busca de reconhecimento ou status: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você se verá supercompensando ao tentar impressionar os outros e receber atenção através de elevadas realizações e status Manipulação ou exploração: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você se verá tentando satisfazer suas próprias necessidades sem deixar que os outros saibam o que você está fazendo. Isso pode envolver o uso de sedução ou não ser completamente verdadeiro com as outras pessoas. Funcionamento passivo-agressivo ou rebeldia: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você parecerá concordar com o que lhe é dito, mas estará se rebelando através da procrastinação, reclamações, morosidade, caras feias ou tendo um mau desempenho intencionalmente. 26 3.1.2 RESIGNAÇÃO Quando alguém se resigna a um esquema, isso equivale ao consentimento em relação ao esquema. A pessoa não tenta lutar contra ele, aceitando-o como verdadeiro. Sentem o sofrimento causado pelo esquema e agem de forma a confirma-lo. Sem ter a consciência de que o fazem, repetem o padrão evocado pelo esquema de forma que, quando adultos, continuam a reviver as experiências de infância que o causaram. No momento em que encontram gatilhos ativadores, as respostas emocionais acabam sendo desproporcionais, e a pessoa vivencia suas emoções de forma integral e consciente. Comportam-se de modo a sempre escolher parceiros que tem mais probabilidade de trata-los como o pai ou mãe agressivo que conheceram na infância, agindo de forma passiva e complacente, ou até reproduzir esse modelo na relação terapêutica, onde ela é a criança e o terapeuta assume o papel de pai ou mãe agressivo. Obediência oudependência: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você se verá contando excessivamente com os outros, cedendo, sendo dependente, comportando-se passivamente, evitando conflitos e tentando agradar os outros. 3.1.3 EVITAÇÃO A evitação dos esquemas acontece quando a pessoa começa a organizar sua vida de modo a evitar que o esquema seja ativado. Tendem a ignorar a existência do mesmo, evitam pensar sobre ele, bloqueiam pensamentos e imagens a seu respeito que tendem a ativa-lo, e caso esses pensamentos surjam, a pessoa se força a distrair-se ou a repelir esses pensamentos. A pessoa evita sentir os esquemas e quando eles vem a tona, contrapõe-se a ele, por puro reflexo. O sujeito evitativo tende a fazer uso abusivo de álcool e drogas, ou ter relações sexuais promíscuas, limpar de modo compulsivo, buscar estímulo externo ou se tornar viciado em trabalho. Portanto, evitam situações que ativem o esquema, como relacionamentos íntimos ou desafios profissionais. Muitos dos “evitadores” afastam-se completamento de atividades a que se sentem vulneráveis. Por exemplo, na maioria das vezes acabam evitando a terapia, de forma a esquecer as tarefas de casa, deixar de expressar sentimentos, falar de coisas superficiais na 27 maioria do tempo, atrasar-se nas sessões ou interromper o tratamento de forma prematura. Abaixo seguem algumas formas de evitação: Distanciamento social ou autonomia excessiva: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você se verá isolando-se socialmente, desconectando-se e afastando-se dos outros. Você pode aparentar ser excessivamente independente e autoconfiante, ou você pode se engajar em atividades solitárias, como ler, assistir TV, usar o computador ou ter um trabalho solitário. Busca compulsiva por estimulação: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você se verá buscando excitação ou distração por meio de compras, sexo, jogo, ou atividade física compulsiva. Autoconsolo aditivo: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você se verá buscando excitação com drogas, álcool, comida ou autoestimulação excessiva. Distanciamento psicológico: Se você usa esse comportamento de enfrentamento em resposta a um evento ativador do esquema, você se verá fugindo através da dissociação, negação, fantasia ou outras formas internas de distanciamento. 3.2 COMO EVITAMOS ENFRENTAR OS ESQUEMAS Um dos processos que criam problemas é a “esquiva do esquema”. Isto significa que você tenta evitar enfrentar quaisquer questões que toquem seu esquema. Digamos que você tenha um esquema de fracasso; sua ideia é de que, no fundo, você deve ser realmente incompetente. Uma maneira pela qual você pode evitar testar esse esquema é nunca encarar tarefas desafiadoras ou abandonar as tarefas rapidamente. Ou, digamos que você tenha um esquema que lhe indique não ser digno de amor ou não ser atraente. Como você evita enfrentar o esquema? Você pode evitar contatos com as pessoas que pensa que não irão aceitá-lo. Você pode evitar namorar, pode evitar telefonar aos amigos, pois assume de antemão que as pessoas acham que você não tem nada a oferecer. Ou, digamos que você tenha medo de ser abandonado. Você poderia evitar esse esquema não permitindo 28 aproximar-se de ninguém, ou poderia romper com a outra pessoa precocemente para não ser rejeitado mais tarde. Outra forma pela qual as pessoas evitam os esquemas — quaisquer que sejam eles — é por intermédio de fuga emocional com uso de substâncias ou comportamentos extremos, como beber muito, usar drogas para aliviar sentimentos, comer compulsivamente ou mesmo atuar sexualmente. Você pode sentir que lidar com os sentimentos é tão doloroso que precisa evitá-los ou fugir deles com esses comportamentos que viciam. Tais comportamentos “escondem” de você seus medos subjacentes, pelo menos enquanto se alimenta compulsivamente, bebe muito ou usa drogas. É claro, os sentimentos ruins voltam novamente, pois você não está realmente examinando e contestando os esquemas subjacentes. E, ironicamente, esses comportamentos que viciam se inserem nos esquemas negativos, fazendo-o sentir-se ainda pior em relação a si mesmo. 3.3 COMO COMPENSAMOS NOSSOS ESQUEMAS Se você tem um esquema sobre uma questão específica, pode tentar compensar essa vulnerabilidade. Por exemplo, se você tem um esquema de fracasso ou indicando que estar na média seja ruim, você pode optar por trabalhar excessivamente — neste caso, você está tentando compensar a percepção de que pode acabar sendo inferior ou não ter um desempenho à altura de seus padrões de perfeição. Você pode compensar checando seu trabalho repetidas vezes. Como consequência as pessoas podem vê-lo como muito absorvido no trabalho. Você pode encontrar dificuldades em relaxar, pois se preocupa por não estar trabalhando o suficiente, que algo deixou de ser feito, ou que está perdendo sua motivação. Se seu esquema é de abandono, você pode compensá-lo dedicando todo o tempo a seu parceiro ou parceira. Você pode temer ser assertivo, pois teme ser abandonado. Ou você pode constantemente buscar um reasseguramento junto a seu parceiro de forma a sentir-se seguro, mas isto não dura muito tempo. Você continua vendo sinais indicando que seu parceiro irá embora. Outra forma de compensar o esquema de abandono constituir relações com pessoas que não satisfazem suas necessidades, mas com quem deseja estar ligado porque não quer ficar sozinho. Ou permanece em relacionamentos muito além do ponto que parece razoável, pois pensa que não vai suportar ficar sozinho. Como você pode ver, tentar compensar os esquemas subjacentes pode criar problemas adicionais. A ”compensação” pode levá-lo a sacrificar suas necessidades, trabalhar compulsivamente, buscar relacionamentos 29 desvantajosos, preocupação, exigência de segurança e outros comportamentos problemáticos. E o fato mais importante sobre essas compensações é que você nunca realmente aborda seu esquema subjacente. Por exemplo, você pode nem mesmo questionar sua crença de que tem de ser especial, superior, evitar ficar na média, evitar ficar sozinho, etc. Portanto, você nunca realmente modifica o esquema. Ele continua lá — pronto para ser ativado por certos acontecimentos. É sua vulnerabilidade contínua. 3.4 COMO ACABAMOS “ACEITANDO” NOSSOS ESQUEMAS Uma das formas desadaptativas de enfrentamento, conhecida como resignação, acontece quando você aceita os esquemas como verdadeiros e absolutos, não enfrentando ou não lutando contra eles. Você acaba sentindo diretamente o sofrimento causado pelo esquema, porém age de maneira a confirma-lo. Por exemplo, se você tem um esquema de privação emocional, e você está num relacionamento com um parceiro que não atende suas necessidades emocionais, sendo essa uma experiência recriada da sua infância. Percebe então que já se acostumou a esse tipo de relacionamento, aceitando essas atitudes de maneira passiva e complacente, perpetuando o esquema. Ou, suponhamos que você tenha um esquema de fracasso, e vá fazer uma prova. Você acaba nem estudando pois acredita que não é capaz de ir bem no teste, já que sempre ouviu isso de terceiros. Quando sai o resultado, consequentemente ruim, você não se espanta, pois vê o resultado como uma reafirmação de que não é bom o suficiente. 30 4. RESPOSTAS DE ENFRENTAMENTO As respostas de enfrentamento referem-se a comportamentos específicos, por meio dos quais os estilos de enfrentamento são expressos. Todas as respostas a ameaças que compõem o repertório comportamental do sujeito, todas as formas únicas e singulares com queo sujeito expressa a supercompensação, evitação ou resignação são respostas de enfrentamento. Quando a pessoa opta por determinadas respostas de enfrentamento, elas se associam e acabam por formar “estilos de enfrentamento”. O estilo de enfrentamento é definido como um traço, enquanto uma resposta de enfrentamento é um estado. Um estilo de enfrentamento é composto por um grupo de respostas que a pessoa costuma usar com o objetivo de evitar a resignação ou a supercompensação. Portanto, uma resposta de enfrentamento é um comportamento específico, ou estratégia, que a pessoa manifesta em certo momento. Por exemplo: um paciente faz uso de determinada forma de evitação em quase todas as situações em que seu esquema de abandono é ativado. Quando sua esposa ameaçou a terminar o casamento ele foi para o bar e bebeu até desmaiar. Nessa situação, a evitação é o estilo de enfrentamento do sujeito para abandono, e beber foi sua resposta de enfrentamento perante essa situação. 4.1 A CURA E AS RESPOSTAS DE ENFRENTAMENTO A cura do esquema é visto como objetivo central da terapia voltada a pacientes em nível relacionado a personalidade. Entretanto, a cura voltada para a eliminação das respostas de enfrentamento desadaptativas é quase impossível sem a mudança dos esquemas que as provocam. Além do mais, como os comportamentos de enfrentamento não são tão estáveis quanto os esquemas, pois mudam em conformidade com o esquema, a situação e estágio de vida que se encontra o paciente, os sintomas e até o diagnóstico parecerão se alternar na medida em que tentarmos muda-los. 31 4.2 POR QUE É TÃO DIFÍCIL MUDAR ESSES ESQUEMAS? A essa altura, depois de identificar os diversos tipos de esquemas, como eles surgem e as formas equivocadas de enfrentamento, você deve estar se perguntando a questão acima. Bom, há uma explicação para isso: os esquemas lutam para sobreviver. Isso resulta da necessidade instintiva que os seres humanos tem de coerência, ou seja, o esquema é tudo o que ele conhece. Apesar de causar sofrimento, o esquema é familiar, confortável, e tudo o que traz esse sentimento de conforto e familiaridade, pode passar a falsa sensação de bem-estar. Portanto, as pessoas acabam se sentindo atraídas por eventos que ativem esses esquemas. O esquema é responsável por prejudicar o nosso senso de self , nossa saúde, nossos relacionamentos com os outros e diversos outros aspectos de nossa vida – trabalho, felicidade, humor – enfim, toca em vários pontos. Somado a isso, os nossos esquemas foram desenvolvidos na nossa infância como uma forma de adaptação para lidar com os conflitos familiares aos quais fomos submetidos. Mas não se preocupe! A psicoterapia na abordagem cognitiva pode te ajudar a aprender mecanismos para lidar de forma saudável e adaptativa a esses esquemas e ter uma vida mais tranquila. 4.3 MODOS DE OPERAÇÃO DOS ESQUEMAS Em suma, os modos de operação dos esquemas são os estados emocionais e os estilos de enfrentamento, sejam eles adaptativos ou desadaptativos, que vivenciamos a cada momento. Na maioria das vezes, nossos modos de esquema são ativados por situações de vida as quais somos vulneráveis, funcionam como um botão emocional. O objetivo do terapeuta é auxiliar o paciente a transitar de um modo disfuncional a um modo funcional, como elemento do processo de cura. O estado ou humor predominante em que estamos no momento é conhecido como modo de esquema. Para definir um modo de esquema, podemos nos fazer uma pergunta: neste momento, que conjunto de esquemas ou operações de esquemas o paciente se encontra? 32 4.4 SOBRE O CONCEITO DE MODO Em síntese, um modo de esquema refere-se aos agrupamentos característicos de esquemas e respostas de enfrentamento. Existem dez modos de esquemas que podem ser agrupados em quatro categorias gerais: modos criança, modos enfrentamento disfuncional, modos pais disfuncionais e modo adulto saudável. Os modos criança são considerados inatos e universais, sendo toda a criança capaz de expressá-lo. Existem quatro tipos de modo criança: criança vulnerável, criança feliz, criança indisciplinada/impulsiva e criança zangada, sendo essas dominações termos gerais. Os esquemas nucleares geralmente se manifestam em forma de criança vulnerável: a criança abandonada, abusada, rejeitada ou privada. Vejamos a seguir sobre cada uma delas: A criança zangada: é a parte que está com raiva por não ter suas necessidades emocionais atendidas e que tem as atitudes pautadas nessa raiva, desconsiderando as consequências; A criança impulsiva/ indisciplinada: expressa emoções, age de acordo com os seus desejos e segue vontades naturais de momento a momento de maneira irresponsável, sem considerar as consequências para si e para os outros; A criança feliz: é aquela cuja as necessidades emocionais básicas foram devidamente atendidas. Além do mais, foram encontrados três modos de enfrentamento disfuncional: o capitulador complacente, o protetor desligado e o hipercompensador. Tais modos correspondem aos três estilos de enfrentamento de resignação, evitação e supercompensão. A seguir veremos suas características: O capitulador complacente: submete-se ao esquema, retornando a ser a criança passiva e desamparada que tende a ceder aos outros; O protetor desligado: desliga-se psicologicamente do sofrimento do sofrimento causado pelo esquema, afastando-se emocionalmente, 33 muitas vezes fazendo uso abusivo de álcool ou drogas, se auto estimulando, utilizando as pessoas e buscando outras válvulas de escape; O hipercompensador: costuma reagir, seja maltratando as pessoas ou comportando-se de formas extremas, em uma tentativa de contestar o esquema de uma forma que acaba apresentando-se disfuncional. Todos esses três modos atuam de forma a perpetuar os esquemas. Existem, também, dois modos de pais disfuncionais: o pai/mãe punitivo e o pai/mãe exigente. Dentro desse conceito, o paciente se assemelha ao pai ou mãe internalizados. Eles se caracterizam como: Pai/mãe punitivo: pune um dos modos da criança por se comportar mal; Pai/mãe punitivo exigente: empurra e pressiona a criança a cumprir padrões ideias e elevados. O décimo e último modo, é o do adulto saudável. Refere-se aquele que tentamos fortalecer na terapia, auxiliando e ensinando o paciente a moderar, cuidar ou curar os outros modos disfuncionais. 34 5.COMO A TERAPIA PODE AJUDAR? A Terapia Cognitiva pode ajudá-lo de várias maneiras importantes: • Aprendendo quais são seus esquemas específicos. • Aprendendo como você compensa e evita os esquemas. • Aprendendo como os esquemas são mantidos ou reforçados pelas escolhas que você fez ou as experiências que teve. • Examinando como seus esquemas foram aprendidos. • Contestando e modificando os esquemas negativos. • Desenvolvendo novos esquemas, mais adaptados e mais positivos O enfoque dessa proposta de Terapia mescla elementos das escolas cognitivo-comportamental, de apego, da gestalt, de relações objetais, construtivista e psicanalítica em um modelo conceitual e de tratamento rico e unificador. O autor desenvolveu a terapia do esquema como uma abordagem sistemática que amplia a terapia cognitivo-comportamental, integrando técnicas derivadas de várias escolas diferentes de terapia. A terapia do esquema pode ser breve, de médio ou de longo prazo, dependendo do paciente. Ela amplia a terapia cognitivo-comportamental tradicional ao dar ênfase muito maior à investigação das origens infantis e adolescentes dos problemas psicológicos, às técnicas emotivas, à relação terapeuta-paciente e aos estilos desadaptativos de enfrentamento. 5.1 O PROCESSO TERAPÊUTICO O primeiro objetivo da Terapia do Esquema é auxiliar o pacientea tomar consciência psicológica, ou seja, ajuda o paciente a tornar conscientes as memórias, sentimentos, sensações corporais, cognições e estilos de enfrentamentos de sua infância, que muitas vezes são inconscientes. Tendo essa percepção, o paciente torna-se capaz de exercer controle sobre suas respostas aos esquemas, aumentando sua liberdade de escolha perante esses esquemas. Portanto, ao longo do tratamento o terapeuta visa o aumento de 35 controle do paciente sobre eles e trabalha para auxiliar a enfraquecer as memórias, sensações corporais, emoções, cognições e pensamentos associados a eles. A terapia aqui é vista como uma guerra aos esquemas, sendo o terapeuta e o paciente aliados para derrota-lo, engajados para que eles desapareçam, ou, quando aparecerem, a intensidade e duração dos seus efeitos sejam menores. O tratamento inclui intervenções cognitivas, afetivas e comportamentais. Sendo assim, a medida que se cura um esquema, mais difícil fica dele ser ativado posteriormente. Caso ele seja eventualmente ativado, a experiência é menos sufocante e o paciente tem uma recuperação rápida. Quando o paciente se encontra na fase de mudança, o terapeuta mescla estratégias cognitivas (procurar evidências concretas que afirmam ou refutam aos pensamentos distorcidos) , vivenciais (imagens mentais, diálogo, dramatização), comportamentais (exercícios comportamentais) e interpessoais de forma flexível, de acordo com as necessidades do paciente. 5.2 TÉCNICAS UTILIZADAS NA TERAPIA DO ESQUEMA TÉCNICAS COGNITIVAS No que diz respeito as técnicas cognitivas – que se dão no nível do pensamento consciente - partimos do pressuposto de que, enquanto o paciente acreditar piamente na validade de seus esquemas, não serão capazes de mudar e vão manter suas visões distorcidas sobre si mesmo e os outros. Sendo assim, os pacientes aprendem a argumentar contra os esquemas, contradizendo sua realidade de modo racional apontando todas a evidências ao longo da vida que confirmam e as que não confirmam o esquema, então, paciente e terapeuta avaliam as evidências. Porém, nem sempre as evidências são suficientes para refutar os esquemas. Por exemplo: os pacientes podem ter realmente resultados ruins no trabalho ou nos estudos (fracasso) como resultado de procrastinação e evitação, não tendo desenvolvido as habilidades necessárias para obterem sucesso no trabalho. Se não encontrarem evidências, os pacientes podem avaliar de que forma podem mudar esse âmbito de suas vidas para melhorar. Assim, o terapeuta auxilia o paciente a desenvolver habilidades profissionais que sejam efetivas para a melhora na vida profissional. 36 TECNICAS VIVENCIAIS Sabemos que o paciente luta contra os esquemas de modo emocional. Por isso, o terapeuta utiliza a técnica vivencial em forma de imagens mentais, e diálogos, que servem como meio para o paciente expressar sua raiva ou tristeza sobre o que lhe aconteceu na infância. As técnicas de imagens mentais possibilitam ao paciente enfrentar um de seus pais ou figuras que foram importantes durante sua infância de modo a proteger e confortar a criança vulnerável. Eles expressam suas necessidades, falam daquilo que não lhes foi suprido quando crianças. Associam imagens da infância com imagens atuais que lhe são desconfortáveis, confrontam os esquemas, lutando contra eles e agem com oposição. Treinam dar respostas a pessoas significativas em suas vidas atuais através de imagens mentais e dramatizações, o que os dão suporte para romper com a perpetuação dos esquemas em nível emocional. TAREFAS E EXERCÍCIOS COMPORTAMENTAIS O terapeuta auxilia na elaboração de tarefas e exercícios comportamentais com o objetivo de substituir respostas desadaptativas a respostas novas (novos padrões de comportamento) e mais adaptativas. O paciente toma a consciência a se torna capaz de visualizar como certas escolhas em relação a parceiros ou decisões de vida perpetuam os esquemas e passa a fazer escolhas mais saudáveis para romper com os padrões negativos. Ele recebe orientação e auxílio para planejar e se preparar para as tarefas de casa, ensaiando novos comportamentos por meio de imagens mentais e dramatização nas sessões. O terapeuta utiliza técnicas de cartões e imagens mentais para auxiliar o paciente a enfrentar as dificuldades relacionadas a mudança de padrões comportamentais. Após realizar as tarefas, o paciente e o terapeuta discutem os resultados e avaliam o que o paciente aprendeu nesse período. No decorrer do tratamento, ele vai abandonando os padrões de comportamento desadaptativos e adquire padrões adaptativos. Para que isso seja possível, o paciente precisa estar disposto a abrir mão dos estilos de enfrentamento apreendidos anteriormente para que possam mudar. 37 5.3 RELAÇÃO TERAPEUTA-PACIENTE O terapeuta tem a função de avaliar e tratar os esquemas e estilos de enfrentamento conforme eles vão surgindo na relação terapêutica. A relação terapeuta-paciente, serve como um “antídoto” parcial aos esquemas do paciente, sendo que ele internaliza o terapeuta como o “adulto saudável”, que luta contra os esquemas e busca por uma vida emocionalmente satisfatória. A postura do terapeuta é de confrontação empática: demonstra empatia pelo esquema do paciente ao mesmo tempo que mostra que eles são disfuncionais ou distorcidos, resultando nos seus estilos de enfrentamento. Ele também realiza a reparação parental limitada, isto é, prover, com o vínculo apropriado da relação terapêutica, aquilo que o paciente necessita, que não receberam de seus pais durante a infância. 5.4 A TERAPIA DO ESQUEMA COMO UM MODELO AMPLO E INTEGRADOR Como mencionado anteriormente, a Terapia do Esquema mescla elementos das abordagens cognitivo-comportamental, de apego, da Gestalt, das relações objetais, construtivista e psicanalítica em um modelo conceitual e de tratamento rico e unificador. Young (1990, 1999) desenvolveu a terapia do esquema para tratar pacientes com problemas caracterológicos (traços da personalidade) crônicos, que não estavam sendo resolvidos pela terapia cognitivo-comportamental tradicional. Ele desenvolveu essa terapia como uma abordagem sistemática que amplia a terapia cognitivo-comportamental, integrando técnicas provenientes de várias escolas diferentes de terapia. A ampliação é vista no sentido de dar ênfase mais apurada e profunda à investigação das origens infantis e adolescentes dos problemas psicológicos, às técnicas que envolvem a emoção, à relação terapêutica e aos estilos desadaptativos de enfrentamento. Essa abordagem mostrou-se exitosa no tratamento de depressão e ansiedade crônicas, transtornos alimentares, problemas difíceis de casal e dificuldades duradouras na manutenção de relacionamentos íntimos positivos, além disso, também foi útil ao tratamento no abuso e álcool e drogas. 38 5.5 “A TERCEIRA ONDA DA TERAPIA COGNITIVA” A terapia do esquema é conhecida como a terceira onda da terapia cognitiva, idealizada por Aaron Beck, nos anos 60. Foram incorporados vários aspectos dessa terapia na Terapia Focada em Esquemas. A ideia fundamental da Terapia Cognitiva é a de que a forma como interpretamos ou compreendemos os eventos e situações influencia de forma direta no modo como nos sentimos. Ela parte do pressuposto de que pessoas com problemas emocionais tem a tendência de distorcer a realidade. Utilizando o exemplo que vimos lá atrás, F. aprendeu com os pais que andar de ônibus é perigoso. Portanto, os esquemas nos fazem ver as situações de forma equivocada. Eles são os responsáveis por apertar o nosso “botão cognitivo”. Por isso, os terapeutas cognitivos acreditam que se auxiliarem os pacientes a perceberem o modo como interpretam assituações do dia-a-dia que lhe causam sofrimento, possa ajuda-los a se sentirem melhor. Por exemplo, se auxiliarmos F. mostrando que existem maneiras seguras de andar de ônibus, ela sentirá menos temor e terá uma vida melhor. Beck sugere que inicialmente analisemos os nossos pensamentos de forma mais lógica, pois muitas vezes temos pensamentos equivocados (Ex: Não tirei nota máxima na prova, por isso não sou uma pessoa inteligente), e que na maioria das vezes existem outras conclusões ou explicações mais razoáveis. Em seguida, ele aponta para a importância de confrontar os pensamentos negativos através de experimentos. Por exemplo, seria adequado pedir à F. que ande de ônibus num dia e horários mais tranquilos, para perceber aos poucos que não há o que temer. A terapia cognitiva comportamental combina técnicas cognitivas e comportamentais o que auxilia os pacientes a treinarem algumas habilidades pouco comum em seu dia a dia, como, relaxamento, assertividade, regulação emocional, resolução de problemas e habilidades sociais. 5.6 OS ESQUEMAS DE YOUNG: OUTROS CONCEITOS O autor desenvolveu seu conceito de modo para fazer a diferenciação de esquemas de estilos de enfrentamento como traços – padrões duradouros e constantes – e esquemas e estilos de enfrentamento na forma de traços – padrões instáveis de ativação e desativação. Portanto, o conceito de modo de esquema aqui é visto como um conceito de dissociações de estado de ego. Ele atribui um papel central dos estilos de enfrentamento dentro da terapia do esquema, de modo a trabalhar em relação a sua perpetuação. Outra característica fundamental na terapia do esquema é o enfoque na 39 infância do individuo, período este onde os esquemas são originados e desenvolvidos através das relações parentais e posteriormente, com outras figuras significativas. Assim, Young defende a modificação dos condicionamentos do paciente, incluindo os esquemas, para assim se alinhar melhor com a realidade ou com as evidências concretas da vida do paciente, durante o tratamento. Ademais, ela é uma terapia com grande foco na psicoeducação, ou seja, ensina ao paciente os conceitos atrelados a terapia, para que consiga praticar os exercícios e tarefas dadas pelo terapeuta. A relação terapeuta-paciente se baseia em um processo estritamente colaborativo e horizontal, isto é, eles são dois iguais dentro do processo. 5.7 A TERAPIA DO APEGO DE BOWLBY E NECESSIDADE DE VÍNCULO O trabalho desenvolvido por Bowlby e Ainsworth (1991) resultou na teoria do apego, ideia incorporada por Young no desenvolvimento da terapia do esquema, principalmente no que tange o esquema de abandono e em sua concepção de transtorno de personalidade borderline. O principal pressuposto de Bowlby é de que os seres humanos e outros animais, possuem um instinto de vínculo que tem por finalidade estabelecer um relacionamento estável com a figura materna, ou outra figura de vínculo. Foi incorporada a ideia de mãe como base segura no desenvolvimento da terapia do esquema e a ideia de reparação parental limitada. Quase todos os pacientes com o esquema no domínio de desconexão/rejeição, demandam que o terapeuta represente essa base segura. Assim como na teoria de Bowlby, no modelo de esquema, o desenvolvimento emocional da criança avança do apego à autonomia e à individuação. Portanto, a ideia central é a de que um vínculo estável com a mãe – ou outra figura significativa – é uma necessidade emocional básica que precede e possibilita a independência. 40 6. BIBLIOGRAFIA J. E. YOUNG; J. S. KLLOSKO; M. E. WEISHAAR. Terapia do esquema: Guia de técnicas cognitivo-comportamentais inovadoras. São Paulo: Artmed, 2008.
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