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PPGD 2019 - MESTRADO UNESP - PONTO 2 CONSTRUÇÃO DA ORDEM SÍNTESE

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CARVALHO, José Murilo de Carvalho, A construção da ordem: a elite política imperial. Rio de Janeiro: Relume/Dumará, 1996.
SÍNTESE
 “A construção da ordem”, de José Murilo de Carvalho, trata da organização política dos Estados, com ênfase ao Estado brasileiro, desde antes de seu surgimento. Para tal, faz um amplo estudo sobre a elite responsável por controlar o poder e promover a manutenção da ordem.
Sobre esse processo de formação do Estado e o seu controle por uma elite, o presente resumo se concentra no meio jurídico em detrimento de “outras elites” (médicos, deputados, militares, clero etc) – por motivos óbvios.
De início, o autor salienta que a construção de um Estado está intimamente ligada ao fortalecimento de determinada elite, a qual detém certa “força social” (dinheiro, terras etc), consequentemente detendo o poder de controle e decisão.
A elite brasileira contava com grande número de juristas (magistrados), que ultrapassavam o mero exercício do direito na medida em que buscavam carreiras políticas. A tradição de ingressar em carreiras políticas veio de Portugal, por conta da Universidade de Coimbra, na qual os estudantes de família mais abastadas iniciavam a formação jurídica, visando cargos políticos de alto escalão.
Nesse sentido, escreve o autor:
Elemento poderoso de unificação ideológica da elite imperial foi a educação superior. E isto por três razões. Em primeiro lugar, porque quase toda a elite possuía estudos superiores, o que acontecia com pouca gente fora dela: a elite era uma ilha de letrados num mar de analfabetos. Em segundo lugar, porque a educação superior se concentrava na formação jurídica e fornecia, em consequência, um núcleo homogêneo de conhecimentos e habilidades. Em terceiro lugar, porque se concentrava, até a Independência, na Universidade de Coimbra e, após a Independência, em quatro capitais provinciais, ou duas, se considerarmos apenas a formação jurídica. A concentração temática e geográfica promovia contatos pessoais entre estudantes das várias capitanias e províncias e incutia neles uma ideologia homogênea dentro do estrito controle a que as escolas superiores eram submetidas pelos governos tanto de Portugal como do Brasil. (p. 62)
A concentração de faculdades de direito (de início, apenas em Coimbra) integrava a política sistemática do governo português. Em não instalando estabelecimentos de ensino superior nas colônias, se garantia que os jovens de família abastada dependessem de Portugal para que pudessem ter a formação almejada, que garantia a perpetuação do patamar econômico da família.
Por outro lado, a Espanha garantiu que se criassem universidades em suas colônias, a fim de propagar a religião, o que acarretou: a) na ampla distribuição geográfica das universidades, de modo que as elites intelectuais se formassem em praticamente todas as subdivisões administrativas (que se transformaram, posteriormente, em países independentes); b) em maior difusão da educação superior. 
Vislumbra-se, com essa comparação, que a elite brasileira se formou bastante homogênea. Assim, no Brasil a distribuição da educação se deu de forma mais elitista, cerceando-se a difusão de ideias que os governos da época consideravam perigosas.
Somente após a Independência que surgiram as escolas dedicadas explicitamente à formação da elite política no Brasil: dois cursos de direito, criados em 1827 e iniciados em 1828, em São Paulo e em Olinda (que foi transferido, posteriormente, para Recife).
Não obstante a formação em direito no Brasil tenha se baseado quase integralmente na formação na Universidade de Coimbra, houve uma adaptação no que se refere ao conteúdo das disciplinas. 
Escreve José Murilo de Carvalho que:
O direito romano foi abandonado em benefício de matérias mais diretamente relacionadas com as necessidades do novo país, tais como os direitos mercantil e marítimo e a economia política. A ideia dos legisladores brasileiros era a de formar não apenas juristas mas também advogados, deputados, senadores, diplomatas e os mais altos empregados dos Estado, como está expresso nos Estatutos feitos pelo visconde de Cachoeira adotados no início dos cursos. (p. 76)
Em integrando todos os cursos de direito o mesmo “pensar político”, a homogeneidade ideológica e de treinamento da elite política egressa dos ensinos jurídicos foi muito marcante, tendo sido primordial para as tarefas e construção do poder nas circunstâncias históricas em que o Brasil se encontrava.
Outra observação relevante é que desse cedo se observou o excesso de bacharéis em relação ao número de empregos abertos na magistratura, de maneira que cresceu o número de advogados de maneira exponencial. 
Relacionando ao cunho político, os advogados estavam para o Estado Liberal à medida que os magistrados estavam para o Estado Absoluto. Os advogados, portanto, eram mais habilitados a formular suas queixas em termos políticos e a servir de instrumento a grupos de oposição, incluindo os que buscavam a queda da monarquia. Os magistrados, por outro lado, eram funcionários públicos, então além de resguardarem interesses pessoais tinham receio de se indispor com o Poder Executivo.
Conclui-se, portanto, que o ensino jurídico brasileiro de início se deu a fim de resguardar os interesses do governo, ainda que não de forma impositiva, já que o mero cerceamento da propagação de novos ideais já pode ser considerado uma forma de resguardar os referidos interesses, porém de maneira sutil.

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