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# FICHAMENTO CEVASCO, Maria Elisa. Dez lições sobre estudos culturais

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ANOTAÇÕES
CEVASCO, Maria Elisa. Dez lições sobre estudos culturais. São Paulo: Editora Boitempo, 2003.
Este livro conta a trajetória dos estudos culturais como disciplina, desde sua emergência na Inglaterra dos anos 1950, com Raymond Williams, até sua chegada ao Brasil, que contou com pensadores como Paulo Emilio Salles Gomes e Antonio Candido. A obra é dividida em dez lições que possibilitam o entendimento gradual do processo de formação dessa nova forma de crítica cultural. 
Primeira lição – O tema “cultura e sociedade”
Inicialmente, Cevasco apresenta as inúmeras atualizações que o conceito de cultura sofreu ao longo dos séculos, desde o sentido de cultivar algo – especialmente ligado à agricultura – até o sentido mais imperialista da palavra. O que se pode concluir disso é que esses vários significados são reflexos de mudanças nas configurações sociais no mundo. O termo, então, carrega também um valor social. Os estudos culturais emergiram na Inglaterra dos anos 1950 (pós-segunda guerra) e trouxeram ao centro da disciplina o debate sobre uma necessidade de re-conceituação da cultura, pois aquele era um momento de reestruturação da sociedade. A cultura como designação das artes – e da literatura – acessível a um grupo seleto de pessoas deveria começar a cair por terra. 
Raymond Williams, um dos pilares dos estudos culturais, foi quem, na década de 50, começou a levar para o debate sobre cultura as ideias de que a cultura não era algo dado por isolamento, e sim a partir de conexões com diversas esferas (economia, história, ideologia, etc.). Para o estudioso, a cultura deve ser entendida “como o sistema de significações mediante o qual necessariamente [...] uma dada ordem social é comunicada, reproduzida, vivenciada e estudada” (WILLIAMS, 2011, p.13)
Em seu livro Culture and Society, Williams mapeia as mudanças de significados que o termo cultura sofreu ao longo dos anos, mais especificamente na Inglaterra. Ele conclui que as inúmeras mudanças são reações às modificações sociais advindas, principalmente, da Revolução Industrial e da implantação do capitalismo. Nesse mapeamento, aparecem inúmeros pensadores de diversas áreas que, de uma forma ou de outra, contribuíram com a investigação daquilo que poder vir a ser "cultura". Criaram, então, uma tradição de crítica para as novas instituições (democracia e industrialismo) calcada nas velhas instituições. Esses intelectuais não atualizaram suas concepções e partiram para um conservadorismo. Um dos maiores representantes dessa tradição é Matthew Arnold, que pretendia que a cultura fosse apenas um elemento capaz de apaziguar os inúmeros conflitos sociais que estavam surgindo a partir daquela nova configuração social. A partir das ideias de cultura como instrumento de apaziguamento, forjou-se a próxima inclinação da crítica: o conformismo. 
Na versão inglesa dominante até os anos 1960, cultura significava a “alta cultura”, a grande tradição da literatura inglesa, cuja ação cultural limitava-se a difundir os produtos dessa “alta cultura” entre as demais classes. A concepção da palavra era tomada como produto separado da vida comum e dizia respeito especificamente às artes e à educação de poucos privilegiados, mero efeito da superestrutura (no conceito marxista clássico).
Em águas contrárias, a ideia de Williams é uma cultura de todos, sem classes especiais ou grupos específicos. A cultura, para ele, é criação em potencial para todos. Utiliza-se do exemplo da linguagem, porque é um instrumento comum à todas sociedades. Essa concepção de cultura comum propõe facilitar o acesso aos meios de produção cultural e ao conhecimento, além de ser uma alternativa à fragmentação de culturas que vivemos. O discurso de Williams, então, em oposição ao dos pensadores da tradição, trazia à tona as vozes que foram marginalizadas pelo o poder intelectual regente. Seguindo a lógica materialista, entendia ele que os bens culturais são resultados de meios de produção, que são materiais, que concretizam relações sociais complexas envolvendo instituições, convenções e formas. O materialismo cultural tem como meta tornar a história cultural em material.
Como mostra Cevasco, na década de 60, o termo "cultura" sofreu uma nova virada semântica, obviamente atrelada às mudanças sociais (modos de comunicação de massa, transformações econômicas e transformações políticas). Assim, atualmente não se fala mais em cultura hegemônica, mas sim em cultura (s). Isso significa disputas entre nacionalidades, etnias, sexualidades, etc. Ainda segundo a autora, essas disputas entre culturas acabam por fazer esquecer os reais articuladores das mudanças sociais a favor de determinados interesses. O domínio da economia e a coerção do poder do Estado são deixados de lado por uma "causa", sendo que eles é que constituem os campos em que as batalhas serão travadas.
Segunda lição – Antecedentes: o inglês
As práticas sociais trazem, em sua maioria, processos de naturalização em suas formações. Esses processos respondem a ideologias específicas de um momento histórico que procuram a manutenção de valores, tentando, dessa forma, eternizá-los. Segundo Cevasco, a disciplina de literatura inglesa seguiu esse raciocínio. 
Ao que parece, o estudo da literatura inglesa começou a se estabelecer como disciplina na segunda metade do séc. XIX e procurou recuperar o caráter mítico e transcendente da religião. Isso ocorreu porque nessa época os avanços tecnológicos e as descobertas científicas colocaram a religião em crise. Ora, a religião era utilizada justamente para manter a ordem vigente, ao interesse de classes específicas. A disciplina de literatura inglesa surge, então, com o mesmo propósito, como assinalou Matthew Arnold. Para ele, a disciplina deveria manter a paz entre as classes. O problema é que ela silenciava algumas delas. A ideia de oferecer as então "belas artes" no intuito de tornar todas as classes "iguais" é um projeto de alienação de determinadas classes (a saber, as subjugadas), posto que estas nunca teriam suas vozes representadas e, portanto, não teriam contato com diversos pontos de vista.
A disciplina de literatura inglesa foi oferecida, primeiramente, aos grupos marginalizados da Inglaterra, em uma clara tentativa de alienação e manutenção do status quo. Nesse sentido, a literatura inglesa serviu para os ingleses subjugados de forma análoga à catequese serviu para os índios do Brasil. Tudo sob uma desculpa de "civilizar" os considerados inferiores. Foram os estudantes dessa disciplina, entretanto, que exigiram que a literatura fosse discutida em face à vida real (contextos e experiências). 
A institucionalização da disciplina de literatura inglesa atendeu à uma função social específica: ativar o sentimento nacional após a Primeira Guerra Mundial. Após essa institucionalização, a primeira providência foi criar um método de leitura, de crítica. Esse método foi criado por I.A. Richards e é chamado de Practical Criticism. Richards postulava uma leitura literária (principalmente poética) descolada do contexto sócio-histórico e da biografia do autor, e sim levar em conta simplesmente e somente as palavras na página.
Expansor do projeto de Richards, Leavis acreditava que a leitura das palavras na página (close reading) era uma forma de ativar valores humanos fundamentais. Ou seja, não importaria o contexto, haveria valores comuns à humanidade e eles estariam presentes nas obras literárias como heranças passadas de sociedade para sociedade; seria uma ligação humana com um suposto "mundo de valores". Leavis, portanto, formulou uma concepção de literatura como uma espécie de conexão à valores passados, valores estes imutáveis e só acessíveis através da literatura. Um crítico, segundo essa perspectiva, além de decidir aquilo que é ou não literatura, passa seu "conhecimento" a poucos que julga capazes de compreendê-los. A literatura, assim, vira um mito, descolada dos movimentos naturais da sociedade. Cevasco tece, então, críticas a essa visão de Leavis e a aproxima do sistema dacrítica de gosto. 
Conclui-se, logo, que Leavis tinha uma visão sobre cultura completamente dissociada da materialidade. Isto é, a cultura, para ele, era um campo restrito de ideias, que nada tinha a ver com a civilização/sociedade e não impactava a economia nem a política. A autora argumenta que seja talvez esse caráter não-revolucionário um dos maiores motivos pela perspectiva de Leavis ter se tornado tão aceitável, afinal, nada que revolucione e proponha mudança nas bases é tão divulgado e bem aceito. Porém, apesar das limitações presentes nas proposições de Leavis, concentradas apenas no comercialismo e nos meios de comunicação de massa (e da suposta "cultura inferior" advinda dela), Leavis foi pioneiro e abriu espaço para que a crítica pudesse questionar a situação vigente, e é exatamente esse espaço que os estudos culturais irão ocupar, só que com um conceito de cultura muito diferente.
Terceira lição – Contrapontos teóricos: cultura de minoria x cultura comum
Williams criticou a tradição britânica por esta colocar em um pedestal o crítico e vulgarizar a população; essa tradição vinha da concepção de que a cultura estaria desassociada do mundo real, do mundo material de produção, e que na verdade era um meio de preservação de valores humanos comuns e abstratos – como vimos nas ideias de Richards e Leavis.
Leavis basicamente transpõe para a literatura os deveres que Arnold acreditava que a cultura em geral deveria exercer; ele acreditava, portanto, que o valor da literatura estava na riqueza espiritual que esta poderia trazer. A isso se opunha a sociedade da civilização, que apenas produzia riqueza material. Leavis elitizava e dava à literatura o papel de mudar por completo as estruturas humanitárias de uma sociedade; o exemplo da Segunda Guerra Mundial veio para desmistificar esse pensamento, visto que muitos combatentes eram literatos. Onde estavam os valores humanos passados a eles através da literatura? Mas, como já foi dito, nem tudo no trabalho de Leavis deve ser desconsiderado. Seu maior legado é o de crítica ao sistema vigente, à uma sociedade de massas altamente industrializada e mecanicista.
No final dos anos 50 dominavam duas posições bem parecidas sobre a cultura: a de minoria, de Leavis, e a do T. S. Elliot, que pensava que a democratização da educação iria destruir a ideia de cultura. Williams propunha então uma versão democrática de cultura, que acabasse com as divisões sociais e impactasse a sociedade. Ou seja, uma concepção revolucionária de cultura. Dadas as grandes mudanças sociais da época, o conceito de cultura já não fazia sentido; era necessário recriá-lo dentro dessa sociedade, e não mais desassociá-lo. Contrária a concepção de cultura de minoria, essa seria a chamada cultura comum. Williams democratiza a atribuição de valor cultural às coisas. Parte do pressuposto de que, se cultura deve ser tudo aquilo que forma a maneira de viver de uma sociedade específica, as modificações históricas desse modo de vida devem ser valorizadas tanto quanto as grandes obras. A ideia de cultura comum, pois, não desconsidera as artes e sim reelabora seus conceitos: localiza a arte ao lado da vida social e como dependente dos meios sociais de produção de sentido (e não como ideias elevadas, de transmissão de valores humanos/espirituais imutáveis). O que os tradicionalistas como Leavis e Eliot viam de ameaçador do passado nos meios de comunicação de massa, Williams enxerga como benefício de desespecializar o acesso às obras de arte.
A cultura comum ainda não existe porque não há condições no atual sistema de estratificação social e relações de poder; a difusão de valores, nesse contexto, sempre será da classe dominante. A única possibilidade de atingir a cultura comum (baseada na solidariedade e no coletivismo) é permitir com que TODOS sejam potenciais produtores de cultura, e não somente consumidores passivos. Williams define que a cultura é um campo de luta válido porque chega à conclusão que também é um meio, tão eficaz quanto os outros, de dominação e alienação. Dessa forma, o ideário de cultura comum é também o ideário de sociedade comum, sem distinção de classes ou qualquer tipo de desigualdade. Os estudos culturais foram formulados a partir dessas percepções, ou como diria o teórico, são essas percepções transformadas em disciplina. Como não houve mudanças estruturais na sociedade, a institucionalização dos estudos culturais não significou a existência de uma cultura comum, muito menos de uma sociedade comum. Os discursos sobre cultura de minoria ainda persistem, vez ou outra, no debate cultural.
Quarta lição – A formação dos estudos culturais
A relação entre arte e sociedade não é novidade. Mas a forma com que se dava essa relação foi o diferencial dos estudos culturais: neles, arte e sociedade formam um conjunto, onde são tidas como processos que se impactam mutuamente. Segundo a autora, “uma das tarefas teóricas dos estudos culturais no momento de sua formação é justamente juntar sua teorização à de outros pensadores influentes do marxismo cultural e refinar os modos de pensar a determinação da cultura pela base econômica”. (CEVASCO, p. 66).
Os movimentos revolucionários e o ciclo expansivo do capital no pós-Segunda Guerra deixaram o ambiente favorável à ascensão dos estudos culturais. Esse sentimento de mudança sentido no pós-guerra refletia as modificações estruturais no sistema do capital, o qual podemos chamar de “capitalismo tardio”. O capitalismo tardio se refere ao momento em que a industrialização ultrapassa a mera produção de mercadorias e passa a atingir todos os setores da existência, inclusive a cultura. 
Os estudos culturais não partem do pressuposto de que são os únicos combatentes do sistema de dominação, mas são parte importante, como teorização, da organização de uma percepção, uma consciência sobre a experiência de vida contemporânea e de todos os seus problemas e paradoxos.
Após os anos 60 houve uma interrupção na onda revolucionária e isso atingiu os movimentos operários; dessa forma, a WEA (escola em que Williams e companhia botavam em prática seus propósitos) perdeu espaço político e seus professores foram integrados em grandes universidades. Assim, a disciplina dos estudos culturais se propagou, apesar de encontrar dificuldades em formar um programa acadêmico sólido. De qualquer maneira, muitas coisas foram repensadas e o objeto passou a ter um valor menor na análise: os estudos culturais se importam muito mais com a forma de olhá-lo e com o porquê de olhá-lo. O método de análise dos estudos culturais se dá em três níveis: o da experiência vivida, o das formalizações das práticas culturais em produtos simbólicos e o das estruturas sociais mais amplas que determinam esses produtos.
Com os estudos culturais já devidamente formados (e institucionalizados), o futuro que Raymond Williams previu é o de sempre almejar levar trabalho intelectual a quem não faz da intelectualidade um modo de vida. Isso se faz necessário para que haja tomada de consciência social e política.
Quinta lição – Formações intelectuais: a nova esquerda 
A base sócio-histórica dos estudos culturais é a Nova Esquerda (New Left), movimento que a partir dos anos 50 reuniu intelectuais britânicos em torno de novas formas de pensar e de se fazer política. 
A partir de uma "crise" na esquerda, advinda das decepções em relação à União Soviética, intelectuais e trabalhadores se desassociam do Partido Comunista Britânico e passam a integrar a Nova Esquerda; outro aspecto relevante para o surgimento da New Left foi a crise econômica e política dentro da própria Inglaterra, que agora não ocupava mais o lugar de liderança mundial.
O desafio da New Left era repensar as estruturas de forma histórica e atualizada, isto é, diante das mudanças sociais, os intelectuais da Nova Esquerda deveriam recolocar as proposições de Marx de maneira revisionada, correspondente àquele momento. (OBS.: No meu ponto de vista, o marxismo deve ser SEMPRE revisionado e desenvolvido de acordo com os contextoshistóricos nos quais está se tentando inseri-lo ou retomá-lo).
A New Left tem como distinção da esquerda do Partido Comunista o fato de que não considera o capitalismo apenas sob a ótica política e econômica, mas também cultural. Assim, buscava compreender a realidade a partir da experiência histórica do país sob o sistema capitalista. Os estudos culturais foram, portanto, disseminadores das ideias da New Left e "recrutadores" de novos socialistas.
A New Left se organizou em uma revista, em 1960, chamada New Left Review. Sob a direção de Stuart Hall, abordaram temas como arte contemporânea, cultura popular e análises de conjuntura. Depois, Perry Anderson assume a diretoria e abre mais a revista para a tradição marxista europeia. Assim, a revista foi instrumento de releitura do marxismo britânico daquela época, atualizando-o a partir de leituras do marxismo ocidental, bem como de análises do momento histórico.
Apesar da New Left ser um movimento de intelectuais, seria simplificá-lo ao reduzir seus ecos apenas às instituições acadêmicas. A participação ativa na política de intelectuais pode se dar justamente a partir das ideias que apresentam a quem de fato as executa, bem como a demonstração de erros e falhas que estes podem estar cometendo. Falando restritamente do mundo acadêmico e intelectual, esses pensadores mudaram a perspectiva limitadora e sem comunicação com o social, perspectiva essa que dominava a o debate britânico anteriormente; a ideia dos estudos culturais de ler os textos e as demais expressões culturais a fim de reconhecer as estruturas sociais e a forma com que elas podem ser transformadas é a principal herança que leva do marxismo ocidental.
Uma das grandes contribuições do culturalismo (estudos culturais), tem sido a visão da cultura como instrumento de descoberta, interpretação e luta social, expresso, entre outras coisas, por meio do esmaecimento das fronteiras impostas entre a cultura de massas e a alta cultura. Cevasco vê que o ponto fraco da ascensão dos estudos culturais é a supervalorização da cultura e o silenciamento da política. Muitos críticos mantém a política subjugada à cultura, esquecendo-se das diferenças entre elas. 
Sexta lição – Posições sobre cultura: o materialismo cultural
As proposições teóricas dos estudos culturais refletiram o desenvolvimento e as transformações da sociedade da época. Isso abarcava o capitalismo tardio e a nova organização dos meios de comunicação de massa. Stuart Hall fala de dois paradigmas que norteiam os estudos culturais: o culturalista, que vê a cultura como um todo social e instrumento de luta; e o estruturalista, que busca na cultura uma manifestação das estruturas sociais vigentes em determinada sociedade.
O paradigma estrutural tomou conta do Centro e teve como seu principal pensador Louis Althusser. O conceito chave para quem segue seu pensamento é a "ideologia". Para ele, ideologia se tratava de modos de representação de determinada sociedade; é o modo como o humano representa o mundo para si mesmo, dentro de uma existência e um papel histórico em determinada sociedade, e não a representação do mundo real, tal como ele é. É esta relação que está no centro de toda representação ideológica. Os indivíduos pouco compreendem o quão material é a relação deles com o real. E é nesse ponto que o paradigma estruturalista se difere do culturalista: os culturalistas tinham a representação e a experiência vivida como real.[1: O Centro de Estudos Culturais Contemporâneos foi fundado em 1964 na Universidade de Birmingham, na Inglaterra. O local funcionava como centro de pesquisas para reunir grupos de trabalho, para doutorado, em torno de diferentes áreas para explicar os fenômenos sociais.]
Os culturalistas colocavam os seres humanos como agentes das modificações sociais, ao contrário dos estruturalistas, que achavam que o centro das modificações seriam condições pré-determinadas. Além disso, os culturalistas aliam seus trabalhos intelectuais com militância efetiva, enquanto os estruturalistas forjavam uma "alta teoria" e acreditavam que suas formulações teóricas, por si só, já significavam a prática.
Os conflitos internos entre o paradigma estrutural e o cultural foi "interrompido", segundo Hall, pela irrupção do feminismo, movimento que trouxe pelo menos 4 consequências importantes para os estudos culturais: a inserção do pessoal no político, expansão da noção de poder, a centralidade nas questões de gênero e o retorno das questões do sujeito e da subjetividade. As questões de raça, igualmente ao feminismo, trouxeram novos ares ao debate dos estudos culturais.
Alguns teóricos do Centro se organizaram em torno da revista Screen, concentrada em crítica cinematográfica. Essa revista tinha como base o marxismo estrutural de Althusser, o que significava que exerciam uma crítica mais formalista, interessada pela forma. A tradição britânica reagiu à essa "instrumentalização" que a teoria presente em Screen propunha, dizendo que se tratava de uma retomada à alta teorização, afastando-a daqueles menos especializados.
Raymond Williams irá repensar a tradição britânica e retirar do lugar de destaque de crítica marxista o pensamento estruturalista de Althusser. Para isso, primeiramente teve que reformular a cultura e a ideia de ação/política cultural. A concepção de cultura de Williams passa a ser a de que cultura é um modo de vida, e isso é algo comum a todas as sociedades. Toda sociedade tem um modo de vida, significados e valores que organizam a vida. Tudo isso para Williams é cultura, e não apenas as grandes obras – embora elas não deixem de representar determinada cultura. Dessa maneira, a ação/política da cultura passa a ser aquela que abre o debate de maneira igualitária, que facilita o acesso às obras e que está aberta a interpretações divergentes. Defende-se aqui a ideia de "letramento cultural", ou seja, fazer com que o indivíduo seja capaz de interpretar e utilizar elementos formadores da cultura. Williams vai além da ideia de cultura presente em Marx e a coloca como elemento fundamental na organização de uma sociedade e, sendo assim, torna-a um campo de luta para a modificação dessa mesma sociedade. Por conseguinte, ele coloca a cultura como agente, e não apenas como efeito.[2: A sociologia marxista gira em torno de dois conceitos importantes: a infraestrutura, composta pelos meios materiais de produção (meios de produção e força-de-trabalho), e a superestrutura, que compreende as esferas política, jurídica e religiosa, ou seja, as instituições responsáveis pela produção ideológica (formação das ideias e conceitos) da sociedade. Segundo a sociologia marxista, a superestrutura é determinada pela infraestrutura, ou seja, a maneira na qual a economia de uma sociedade é organizada irá influenciar nas ideologias presentes na sociedade.Tudo o que não pertence à esfera da produção de mercadorias (infraestrutura) pertence ao que Marx chama de superestrutura (instituições jurídicas e políticas, representações mentais, etc.). Nesse sentido, a cultura seria um efeito das superestruturas (arte, religião, etc.) porque elas têm suas raízes nas condições de existência material de uma sociedade. Ou seja, a cultura não pode ser pensada de forma abstrata, e sim em prática social.]
Williams chega à conclusão de que a ideia de Marx se tornou insuficiente no capitalismo tardio. Isso porque as organizações econômicas (para Marx, as infraestruturas) não se dão mais separadamente da atividade cultural: com o rádio, a TV, o cinema, etc., esses aspectos se interligaram em modos de produção econômica e cultural. Até mesmo as artes, na perspectiva do materialismo cultural, devem ser entendidas como partes integrantes do processo social. No intuito de complementar o legado de Marx, Williams postula a relação mútua entre cultura e determinação econômica e social: ao passo que a arte está sujeita sim a organizações econômicas e sociais, da mesma forma a cultura produz significados e valores capazes de interferir e moldar novos rumos para essasorganizações. A contribuição de Williams foi, portanto, situar a cultura como agente ativo na sociedade, e não mais um mero efeito de superestruturas e uma instância autônoma.
Sétima lição – Diálogos pertinentes: marxismo e cultura
Nos anos 30, o primeiro diálogo entre cultura e marxismo se deu como um desencontro. As ideias de Leavis eram dominantes, isso significa ver a realidade social desassociada da cultura. Para os seguidores dessa corrente, a cultura se dava de maneira independente da economia e da sociedade. Isso os colocava em combate direto com a concepção de cultura marxista, que via a cultura como parte do mundo real e material. Apesar desse idealismo, eles acertavam em identificar algumas deficiências marxistas, principalmente no campo da crítica literária. Os críticos marxistas acabavam por aplicar de forma mecânica as categorias de análise político-econômica à literatura, excluindo a experiência humana. Dessa maneira, nesse momento, o debate foi ganho pelos seguidores de Leavis, que, apesar do idealismo retrógrado, conseguiram persuadir e apontar os erros do marxismo da época. Williams aponta que o idealismo de Leavis venceu o marxismo da época porque tinha capacidade de detalhar as análises, a partir de experiências e consciências. Já o marxismo partia de esquemas simplificados e reducionistas de relações de infraestrutura (base) /superestrutura.
Nos anos 70, o materialismo histórico surge com o intuito de refazer um encontro entre marxismo e teoria da cultura. Trazendo um marxismo mais analítico, o materialismo cultural retira a cultura do papel secundário que exercia no marxismo, passando a entender que a cultura é essencial para uma mudança social radical. Nas teorizações, o materialismo cultural surgiu com o intuito de ir contra as proposições do marxismo estruturalista francês, tirando a centralidade do debate de estruturas políticas e linguísticas externas. O sujeito passa a ser mais determinante, bem como a ideologia é quem passa a ser instrumento para a reprodução de superestruturas. A busca dos estudos culturais, portanto, é a busca das estruturas e dos elementos emergentes; isto é, de possibilidades de novas formas de organização social.
A teoria, com pouco consistência, afastou-se aos poucos da prática e hoje só logra resultados acadêmicos. Além disso, não luta mais pela inclusão e a igualdade social de todos, e sim por uma "aceitação do diferente". Assim, o exemplo usado é muito bom: pode-se expor a cultura mexicana como uma coisa excêntrica e aceitável nos EUA, mas não se pode regularizar a situação trabalhista de milhares de imigrantes mexicanos no país. E nada é devidamente feito nem discutido para mudar essa realidade. Acabou-se confinando os debates sobre cultura à academia.
Oitava lição – Estudos literários x estudos culturais
Inicialmente, a ideia de cultura (ligada ao ensino de literatura inglesa) era uma ideia de exclusivismo e elitismo, onde a sua principal ferramenta era a preservação de valores humanos tidos como essenciais e imutáveis; com os estudos culturais, especialmente as teorias de Williams, a ideia passou a ser a de cultura comum, em que os valores e significados seriam processos a serem construídos por todos e não por uma minoria. Daí, sairia uma cultura plural e diversificada, sem previsão. Seria, então, uma concepção de cultura atrelada à luta e à mudança social, mais democrática e igualitária.
Para Williams, a solução não estava na separação das culturas (defensores da alta cultura x defensores da dita cultura "popular"), e sim em encontrar um mecanismo - política cultural - que garanta o acesso à todas as formas de cultura para todos. Ainda que uma cultura seja mais fabricada e consumida por determinada classe social, ela é herança cultural de todos os seres humanos. Posto isso, Williams afirma que isso só aconteceria mediante uma profunda mudança nas organizações econômicas da sociedade.
Nesse contexto de debate ideológico, que teve início nos anos 60, os estudos literários entram em embate com os estudos culturais. A visão de que a literatura era uma alta cultura, detentora de valores humanos essenciais, que iria contra os novos meios de comunicação de massa (que os teóricos idealistas chamavam de meios de "vulgarização" da cultura) se opunha à visão dos estudos culturais que viam justamente nesses novos meios uma construção de novos valores e significados para a sociedade do momento. É interessante ressaltar que, se os defensores da alta cultura diziam que a arte, em especial a literatura, era o total oposto dos meios de produção, os estudos culturais vieram para mostrar que no mundo moderno (com TV, cinema, rádio, etc.), os mesmos produtores de valores e significados são os produtores de capital. Isso mostra que a cultura não poderia mais ser desligada das reais organizações econômicas e sociais.
O interesse pela cultura em geral expandiu o campo dos estudos literários, possibilitando com que a disciplina tivesse mais preocupação com o social. Entretanto, esse movimento gerou a ideia de que a cultura popular sempre seria uma cultura subversiva. Ora, isso não é verdade. A lógica mercantil acaba por moldar muitas das produções culturais, e elas acabam que não são nada mais do que um modelo criado por aqueles que detém os meios econômicos de produção. Essa expansão no campo de estudos, tanto dos estudos culturais quanto dos estudos literários, trouxe também outros problemas. Para a literatura, por exemplo, abriu espaço para um embate muito grande entre teorias que, muitas vezes, nada têm a acrescentar na matéria. Nos estudos culturais, as críticas e suas teorias tornaram-se excessivamente rarefeitas, assim como as formas de cultura pós-modernas as quais tanto queriam se opor. 
Atualmente, mediante a todas essas teorias, o caráter objetivo da sociedade foi posto de lado, como se regredíssemos ao momento anterior dos avanços trazidos por Williams e os estudos culturais. Segundo Cevasco, essa rarefação e transitoriedade pode ser consequência do pós-estruturalismo. 
No que tange a análise literária, “os procedimentos dos estudos de cultura vão indagar as condições de possibilidades históricas e sociais de considerar esse tipo de composição como literatura, e vão observar as condições de uma prática”. (CEVASCO, p. 149). Portanto, o paradigma da crítica cultural mudou. Não se investiga mais o significado de um texto para o consumidor, e sim procura-se entender as formações sociais e culturais que se inscrevem nessa prática.
Nona lição – Estudos culturais contemporâneos 
Nos dias de hoje, como já foi mencionado, há uma grande teorização, um imenso trabalho intelectual, mas pouca prática.
Na sociedade capitalista, as pessoas e suas relações são vistas como produtos, mercadorias (processo de reificação, nas palavras de Lukács). O processo de construção identitária se complica porque, nesse panorama, as diferenças tentam ser combatidas, não convivem em harmonia. Um dos elementos que disfarça essas diferenças é a mercadoria, que se passa como unificadora. Nesse contexto, “fazer diferença e construir identidades emergentes é bem mais complicado na prática, captada pelo aparato especializado da literatura, do que nas teorias que parecem tão sofisticadas”. (CEVASCO, p. 171).
Décima lição – Estudos culturais no Brasil
A implantação dos estudos culturais no Brasil visa associar às teorias acadêmicas discutidas ao redor do mundo o nosso particularismo latino-americano, a fim nos posicionar no mundo globalizado e culturalmente pluralizado.
Uma tradição de crítica cultural no Brasil que convergiu com os preceitos dos estudos culturais britânicos se formulou na USP, em torno da revista Clima, no início dos anos 40. Eles procuravam interpretar a realidade nacional em processo de acelerada industrialização.	Para articular uma Nova Esquerda, que proporcionaria bases políticas teóricas e materiais para os estudos culturais que estavam por surgir no Brasil, Paulo Emilio Salles Gomes e Antonio Candido desenvolveram uma posição de esquerda quecentralizava o engajamento social nas análises artísticas (principalmente de cinema e de literatura) e também em suas atuações políticas. Eram declaradamente antistalinistas e pró-proletariado. Essa Nova Esquerda brasileira possuiu muitas convergências com a New Left, e a crítica cultural brasileira se deu de forma análoga à britânica, procurando sempre equilibrar as formas estéticas com as formas sociais e demonstrar o poder de revelação das estruturas sociais em face aos produtos culturais. 
Por fim, como críticos literários, não devemos buscar nas obras aspectos e valores atemporais e sim o que aquela obra (forma estética e forma social) tem a nos dizer nos dias de hoje.

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