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A divisão de poderes em John Locke I

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A divisão de poderes em John Locke I
22/02/2018
Introdução
MELLO, Leonel Itaussu Almeida. John Locke e o individualismo liberal. In. WEFFORT, Francisco C. Os clássicos da política. 14. ed. São Paulo: Ática, 2008.
CHEVALIER, Jean-Jacques. O Ensaio sobre o Governo Civil, de John Locke (1690). CHEVALIER, Jean-Jacques. As grandes obras políticas de Maquiavel a nossos dias. Rio de Janeiro: Agir, 1999.
Recuperação biográfica
 John Locke nasceu na Inglaterra, em Wrington, Somerset, em 29 de agosto de 1632, de família relativamente modesta
 Seu pai era funcionário da justiça de paz, e, ainda que fosse proprietário, não possuía tantas terras para ser considerado gentleman.
 Seu ambiente familiar era o de comerciante e artesãos puritanos.
 Essas origens, de que Locke se afastou tanto por suas atividades intelectuais quanto pelos meios que frequentou e a fortuna que fez, permanecerão visíveis na radicalidade puritana de suas posições.
 1685, Inglaterra, Jaime II sucedeu seu irmão. 
 Absolutista autoritário, empreende o restabelecimento do catolicismo na mesma hora em que, na França, Luis XIV revoga o Edito de Nantes. 
Os Whigs (liberais) e os Torys (conservadores) partidários das prerrogativas reais se insurgem contra as violações da Constituição e fazem apelo ao genro de Jaime II, Guilherme de Orange.
 1688, Jaime II se refugia na França.
 O trono é declarado vago em janeiro de 1689 e Guilherme de Orange torna-se rei da Inglaterra sob o nome de Guilherme III.
 O Bill dos Direitos de 1689 consagra a superioridade do Parlamento, da lei sobre o monarca e encerra a “Revolução Gloriosa”
 Locke volta a Inglaterra em fevereiro de 1689.
 No fim do mesmo ano, são publicadas três obras suas, seus três primeiros livros.
 Dois aparecem sem nome do autor: os Dois tratados sobre o governo civil e a tradução inglesa da Carta sobre a tolerância, inicialmente publicada em latim nos Países Baixos, em 1688. 
 A partir de 1691, Locke, que tem quase 60 anos, continua sua atividade em várias direções.
 Recusa funções de embaixador, mas aconselha os líderes do partido whig, participa da reforma do sistema monetário e da criação do Banco da Inglaterra.
 De 1696 a 1700, é membro do Conselho de Colonização e Comércio, que trata de promover o comércio do reino e de desenvolver as plantações e as colônias especialmente na América. 
O poder civil da commonwealth
 As ideias políticas de John Locke, publicista iluminista inglês, estão contidas em ensaios publicados, em 1690, - Dois tratados sobre o governo civil - com o intuito de justificar alguns princípios dos Whigs, consolidados pela Revolução Gloriosa.
Os whigs podem ser identificados como adeptos do progresso e das Reformas.
Sua doutrina está alicerçada na ideia hobbesiana de função social do Estado ao pretender explicar o nascimento histórico do aparato estatal através de pactum societatis.
Assim, sua teoria política começa com a descrição do estado de natureza como uma situação de liberdade e igualdade: é apenas uma condição em que os homens são livres, para decidir suas ações, dispor de seus bens e de suas pessoas e iguais.
Locke compreende a igualdade como a situação no qual a reciprocidade determina todo o poder e toda a competência, mas não é um estado de permissividade em que os homens podem pilhar uns aos outros.
Do estado de natureza
6. Entretanto, ainda que se tratasse de um “estado de liberdade”, este não é um “estado de permissividade”: o homem desfruta de uma liberdade total de dispor de si mesmo ou de seus bens, mas não de destruir sua própria pessoa, nem qualquer criatura que se encontre sob sua posse, salvo se assim o exigisse um objetivo mais nobre que a sua própria conservação. O “estado de Natureza” é regido por um direito natural que se impõe a todos, e com respeito à razão, que é este direito, toda a humanidade aprende que, sendo todos iguais e independentes, ninguém deve lesar o outro em sua vida, sua saúde, sua liberdade ou seus bens; todos os homens são obra de um único Criador todo-poderoso e infinitamente sábio, todos servindo a um único senhor soberano, enviados ao mundo por sua ordem e a seu serviço; são portanto sua propriedade, daquele que os fez e que os destinou a durar segundo sua vontade e de mais ninguém. Dotados de faculdades similares, dividindo tudo em uma única comunidade da natureza, não se pode conceber que exista entre nós uma “hierarquia” que nos autorizaria a nos destruir uns aos outros, como se tivéssemos sido feitos para servir de instrumento às necessidades uns dos outros, da mesma maneira que as ordens inferiores da criação são destinadas a servir de instrumento às nossas.
Locke demonstrou, ao contrapor-se a Hobbes, que o estado de natureza diferencia-se do estado de guerra: um é estado de paz, benevolência, assistência e conservação recíproca; o outro um estado de hostilidade, maldade, violência e mútua destruição.
Para Hobbes, no estado de natureza, a guerra era total, havendo de se identificar onde se situa o conflito, e contê-lo de forma drástica.
Assim, impõe-se a supressão em favor do estado civil, através do pacto de submissão, que deve proporcionar leis que protejam e defendam seus súditos.
No estado de Natureza, delineado por Locke, há guerra parcial e intermitente, devido à inexistência de leis positivas e de juízes competentes com autoridade para julgar.
O estado de natureza pode ser restaurado, preservando-se as suas vantagens no estado civil, mediante um poder coercitivo que recepcione os direitos naturais referentes, principalmente, à propriedade, como base de toda a liberdade, e à vida.
A partir dessas premissas, Hobbes elaborou seus teoremas que serviram de fundamentação para a construção do Estado absolutista; enquanto Locke teorizou, sob a perspectiva do individualismo possessivo, os pilares do Estado limitado.
Locke tornou-se marco teórico do Estado liberal de direito, ao preconizar o poder civil derivado do consentimento popular. Sua doutrina, ao justificar a Revolução Gloriosa, demonstrou que a liberdade só poderia existir graças à limitação do poder estatal pelo consentimento dos membros da comunidade, quando os direitos naturais individuais pertinentes à vida e à propriedade fossem, legalmente, salvaguardados e protegidos.
 Em relação ao direito de propriedade, recorda Locke que, no estado de natureza, o homem usufrui muitos direitos, mas o gozo deles é precário e constantemente exposto às invasões de outros.
 Por isso, o objetivo principal e capital da união de homens na comunidade civil e de sua submissão a governos é o gozo pacífico e seguro da propriedade, que nada mais é do que a exteriorização da personalidade humana através do trabalho.
 Dos fins da sociedade política e do governo
123. Se o homem é tão livre no estado de natureza como se tem dito, se ele é o senhor absoluto de sua própria pessoa e de seus bens, igual aos maiores e súdito de ninguém, por que renunciaria a sua liberdade, a este império, para sujeitar-se à dominação e ao controle de qualquer outro poder? A resposta é evidente: ainda que no estado de natureza ele tenha tantos direitos, o gozo deles é muito precário e constantemente exposto às invasões de outros. Todos são tão reis quanto ele, todos são iguais, mas a maior parte não respeita estritamente, nem a igualdade nem a justiça, o que torna o gozo da propriedade que ele possui neste estado muito perigoso e muito inseguro. Isso faz com que ele deseje abandonar esta condição, que, embora livre, está repleta de medos e perigos contínuos; e não é sem razão que ele solicita e deseja se unir em sociedade com outros, que já estão reunidos ou que planeja m se unir, visando a salvaguarda mútua de suas vidas, liberdades e bens, o que designo pelo nome geral de propriedade.
124. Por isso, o objetivo capital e principal da união dos homens em comunidades sociais e de sua submissão a governos é a preservação de sua propriedade. O estado de natureza é carente de muitas condições. Em primeiro lugar, ele carece de uma lei estabelecida, fixada, conhecida,aceita e reconhecida pelo consentimento geral, para ser o padrão do certo e do errado e também a medida comum para decidir todas as controvérsias entre os homens. Embora a lei da natureza seja clara e inteligível para todas as criaturas racionais, como os homens são tendenciosos em seus interesses, além de ignorantes pela falta de conhecimento deles, não estão aptos a reconhecer o valor de uma lei que eles seriam obrigados a aplicar em seus casos particulares. 
 Locke converte a ordem da propriedade burguesa como substrato natural do poder estatal fundamentado contratualmente. 
 No que se refere ao consentimento, como essência do pactum societatis, este consiste em um acordo ou convenção estipulado entre os membros da comunidade, quando estes deixam o estado de natureza, onde são livres, iguais e independentes.

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