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PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Registro: 2018.0000278786 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000, da Comarca de Bauru, em que é peticionário DAYANA CRISTINA BARBOZA. ACORDAM, em 4º Grupo de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "JULGARAM IMPROCEDENTE a ação revisional. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FREITAS FILHO (Presidente), REINALDO CINTRA, MARCO ANTÔNIO COGAN, GRASSI NETO, RICARDO SALE JÚNIOR, ALCIDES MALOSSI JUNIOR E ALBERTO ANDERSON FILHO. São Paulo, 1º de março de 2018. OTAVIO ROCHA RELATOR Assinatura Eletrônica PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 2 VOTO nº 6349 Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 Comarca: BAURU Peticionário: DAYANA CRISTINA BARBOZA Revisão criminal Sentenciada condenada pela prática de homicídio triplamente qualificado Ação revisional visando a desclassificação para o delito de lesão corporal com base em suposta “desistência voluntária” ou “cooperação dolosamente distinta” (art. 29, § 1º, do Código Penal). Pleitos subsidiários de reconhecimento de reconhecimento da “participação de menor importância” e afastamento da qualificadora do “emprego de fogo” Desistência voluntária que não restou demonstrada nos autos Provas amealhadas aos autos que demonstraram que a peticionária agiu como coautora dos delitos, o que inviabiliza a aplicação dos institutos dos §§ 1º e 2º do art. 29 do Cód. Penal Precedentes Qualificadoras comprovadas Soberania dos veredictos do Tribunal do Júri A Revisão Criminal, fundada no inciso I do artigo 621, do Cód. de Proc. Penal, somente é cabível para reformar decisão que contenha flagrante erro judiciário, não possuindo a natureza de uma segunda apelação ou 'terceira instância' de julgamento Decisão que não se revela 'contrária à prova dos autos' Amplo entendimento jurisprudencial no sentido de que é inviável o redimensionamento das penas por meio de Revisão, salvo nas hipóteses de erro técnico na sua aplicação ou flagrante injustiça Ação revisional improcedente. Trata-se de ação revisional proposta por DAYANA CRISTINA BARBOZA, que foi condenada (Processo Criminal nº 0029484-66.2008.8.26.0071) ao cumprimento de 18 anos de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática do delito do artigo 121, § 2º, incisos I, III e IV, cc. art. 29, ambos do Código Penal, cujas razões jurídicas foram apresentadas pela i. Defensora Pública que a assiste por meio da peça de fls. 11/19. PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 3 Pleiteia a i. Defensora Pública a desclassificação da conduta da peticionária sob a alegação de que a mesma teria desistido voluntariamente da empreitada criminosa. Subsidiariamente, pugna pelo reconhecimento de que “a requerente participou de crime menos grave [de lesão corporal]” (art. 29, § 2º, do Cód. Penal); pela aplicação da “participação de menor importância” (art. 29, § 1º, do CP), com a consequente redução máxima da reprimenda; e, ainda, pelo afastamento da qualificadora (valorada como agravante genérica) referente ao “emprego de fogo, visto que quando a vítima foi incendiada já estava morta” (fl. 18v.). A E. Procuradoria de Justiça Criminal manifestou-se pelo não conhecimento do pedido e, no mérito, por seu indeferimento (fls. 22/29). É o relatório. O pedido revisional, fundado unicamente no artigo 621, I, do Código de Processo Penal, em princípio, não mereceria ser conhecido. É que a revisão, embasada no artigo 621, inciso I, do CPP, como ação destinada a rescindir a coisa julgada, viabiliza-se apenas quando a condenação houver sido lançada contra a prova dos autos, caracterizando evidente erro judiciário, o que não se vislumbra no presente caso, que encerra simples pedido de reexame de provas. Precisa a lição de JÚLIO FABBRINI MIRABETE a propósito do PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 4 tema, quando afirma que sentença contrária à evidência dos autos é aquela que "não se apoia em nenhuma prova existente no processo, que se divorcia de todos os elementos probatórios, ou seja, que tenha sido proferida em aberta afronta a tais elementos do processo", observando ainda que, "A eventual precariedade da prova, que possa gerar dúvida no espírito do julgador na fase de revisão, não autoriza a revisão em face de nosso sistema processual"1. Sobre a natureza da ação revisional, ensina ainda GUILHERME DE SOUZA NUCCI2 que “O objetivo da revisão não é permitir uma 'terceira instância' de julgamento, garantindo ao acusado mais uma oportunidade de ser absolvido ou ter reduzida sua pena, mas, sim, assegurar-lhe a correção de um erro judiciário. Ora, este não ocorre quando um juiz dá a uma prova uma interpretação aceitável e ponderada. Pode não ser a melhor tese ou não estar de acordo com a turma julgadora da revisão, mas daí a aceitar a ação rescisória somente para que prevaleça peculiar interpretação é desvirtuar a natureza do instituto”. Sem embargo da presença desta circunstância indutora do não conhecimento da revisão, conhecendo-a, todavia, para dar máxima amplitude ao direito de defesa, o resultado é o indeferimento, eis que a respectiva peça de sustentação não apresenta qualquer causa jurídica capaz de motivar a alteração do édito condenatório, já reexaminado por este Egrégio Tribunal de Justiça em sede de apelação, ocasião em que foi negado provimento ao recurso defensivo (v. Acórdão às fls. 296/308 autos principais). 1 Código de Processo Penal Interpretado. São Paulo: Atlas, 1994, págs. 724/725. 2 Código de Processo Penal Comentado, 14ª ed. São Paulo: Ed. RT, págs. 1239/1240. PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 5 De fato, analisando-se os argumentos deduzidos pela i. Defensora Pública, neles não se identifica qualquer base sólida para motivar a reforma da decisão combatida. Depreende-se dos autos que a DAYANA, “em concurso com o menor Paulo (...), agindo com ânimo homicida, por motivo torpe, com emprego de fogo e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, matou Maria Nilcéia Barbosa, sua genitora. Segundo o apurado, policiais militares foram acionados para comparecer ao local dos fatos, tendo em vista notícia de incêndio em residência. Chegando lá, observaram um corpo parcialmente carbonizado caído na cozinha, sendo que em sua cabeça havia uma poça de sangue. Observaram, também, que no quintal da casa havia 2 pedaços de madeira com manchas de sangue e uma garrafa contendo álcool. Ocorre que passados alguns minutos, o cachorro pertencente à ofendida dirigiu-se [a um] matagal na beira de um riacho próximo ao foco do fogo, onde os milicianos encontraram uma sacola contendo um par de chinelos, uma calça e uma blusa jeans sujos de sangue, tendo o menor Thalis, filho de Maria [vítima], confirmado que os objetos pertenciam à [DAYANA, sua irmã]. Assim, diante das evidências, concluíram os policiais que a denunciada foi a autora do crime, tendo esta confessado, posteriormente, perante a Autoridade Policial. Evidenciou- se que DAYANA perdeu a guarda de seu filho Ryan, de 3 anos, para a vítima, sua genitora, com quem tinha frequentes desavenças e discussões, de modo que resolveu matá-la com a ajuda de Paulo. Dessa forma, pela manhã, após mais uma briga, colocaram em execuçãoa intenção homicida, surpreendendo a ofendida do lado de fora da residência, com pauladas em sua cabeça, deixando-a PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 6 desacordada e carregando-a para o interior do imóvel, até a cozinha, onde tentaram simular um acidente doméstico ou suicídio, despejando líquido inflamável sobre o corpo dela e incendiando-a, tudo com a finalidade de ocultar o crime” (fl. 1-D). No caso sub examen, verifica-se que, uma vez cumpridas as fases processuais antecedentes e realizado o julgamento em Plenário, os jurados entenderam que os elementos de convicção que lhes foram apresentados conformavam fundamento suficiente para a condenação e o reconhecimento das qualificadoras articuladas na denúncia (“motivo torpe”, “emprego de fogo” e “recurso que dificultou a defesa da vítima”) (fls. 230/231-ap). A sentenciada, perante a Autoridade Policial, disse que tivera diversos desentendimentos com sua mãe e que brigavam muito por conta da guarda de seu filho Ryan, que fora concedida à sua mãe. Falou sobre a briga para Paulo, seu cunhado, que disse-lhe que precisavam “resolver a situação”. Paulo dormiu em sua casa, que ficava nos fundos da casa de sua mãe e, no dia seguinte, após uma briga, Paulo investiu contra sua mãe com um pedaço de pau e passou a golpeá-la. A vítima caiu ao solo, ensanguentada, ocasião em que ela [DAYANA] e Paulo levaram-na até a cozinha, tendo então Paulo dito que “agora que começou, tem que acabar, porque senão ela vai atrás e ficar com a guarda do Ryan e você está acabada, ela vai te por na cadeia”. Por esse motivo, jogou uma garrafa de álcool sobre a vítima e acendeu vários cigarros e jogou no local. Quando o corpo da vítima estava em chamas, ela tentou se levantar e acabou derrubando parte da pia. Após, trocou de roupa e foi trabalhar, sendo que na volta levou PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 7 sua roupa suja até a beira do rio (fls. 9 ap). Em juízo, modificou parcialmente sua versão, dizendo que sua mãe, durante uma discussão, passou a bater nela com um pedaço de pau, momento em que entraram em luta corporal. Seu cunhado acordou e as separou, passando a chutar a vítima e a agredi-la com um pedaço de pau. Paulo disse que teria que terminar o que havia começado e que caso ela o “caguetasse” seria morta, tendo segurado seus braços e a agredido. Paulo então jogou álcool na vítima e ateou fogo. Ato contínuo, Paulo foi embora e então foi trabalhar. Negou, finalmente, que arrastou o corpo da vítima e nele ateou fogo (fls. 87/88 e 211/228 ap). A versão apresentada por DAYANA em juízo, contudo, não encontrou respaldo nas provas produzidas, restando isolada nos autos. O laudo do exame de corpo de delito realizado no dia dos fatos em DAYANE (fl. 79 ap) revelou “ausência de lesões corporais”, tendo o i. expert concluído que ela “não apresenta[va] lesões de interesse médico legal no momento do exame”, contrariando a versão por ela apresentada em plenário no sentido de fora agredida por Paulo. O próprio Paulo Soares da Silva, ouvido na fase do sumário da culpa, negou a autoria do crime, dizendo que sequer estava presente no dia dos fatos e que tampouco sabia que a vítima e a ré viviam discutindo (fls. 144/145 ap). Já as testemunhas Marcelo Alexandre Dal Medico e Roberto do PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 8 Carmo Filho, policiais militares, quando ouvidos na fase do judicium accusationis, informaram que foram acionados para atender a uma ocorrência de incêndio e, ao chegar ao local, encontraram um pedaço de madeira com sangue e um frasco de álcool perto da casa, o que despertou-lhes a atenção. Encontraram uma sacola com roupas de DAYANA sujas de sangue, sendo certo que ela, instada sobre o ocorrido, acabou confessando a autoria do delito, afirmando que o praticara em razão das constantes brigas com sua mãe decorrentes da disputa pela guarda do seu filho (fls. 3, 5, 70 e 84 ap). Por vez, Celina de Lourdes Honório de Araújo e Osnivaldo de Oliveira Santos disseram que o irmão de DAYANA, na ocasião, prontamente reconheceu as roupas sujas de sangue localizadas pelos policiais como sendo da peticionária (folhas 6, 8, 72 e 73 ap). A testemunha Neiva Barbosa, irmã da vítima, disse ter ouvido DAYANA confessar a prática do crime na Delegacia. Na oportunidade, DAYANA afirmou que seu cunhado golpeou a vítima com um pedaço de pau e que ambos a levaram para a cozinha em seguida, onde foi colocado fogo no corpo dela. Disse, ainda, ter conhecimento de que a vítima e DAYANA brigavam muito (fls. 85 e 189 ap). Ante esses elementos de convicção, constata-se que a tese de desistência voluntária não encontra mínimo amparo fático-jurídico, não havendo nos autos, realmente, nada que indique que DAYANA tenha desistido de prosseguir na execução do crime após ter dado início às agressões ou procurado impedir que o resultado se produzisse (art. 15 do Cód. Penal). A prova oral tampouco permite a conclusão de que PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 9 DAYANA tenha sido coagida por Paulo (ou qualquer outra pessoa) a praticar a ação delitiva. Revela, apenas, que ela o auxiliou no transporte da ofendida do quintal até a cozinha, bem como o auxiliou a atear fogo no seu corpo. Também, contrariamente ao que argumenta a i. Defensora Pública, não é possível o acolhimento da tese de que a atuação da peticionária no episódio caracterizou participação de menor importância (art. 29, § 1º, do Código Penal) ou cooperação dolosamente distinta (art. 29, § 1º, do Código Penal). É que DAYANA não atuou como partícipe na empreitada criminosa, senão como coautora, praticando atos executórios que abrangeram não apenas a idealização do crime determinante, portanto, da sua prática , como também outros atos executórios que conduziram ao resultado morte da vítima, resultado esse que, à toda evidência, era o único pretendido por ambos os executores do delito. Segundo MIRABETE3, “a participação de menor importância só pode ser a colaboração secundária, dispensável, que, embora dentro da causalidade, se não prestada não impediria a realização do crime. Não deve ser reconhecida a causa de diminuição de pena quando o agente participou da idealização do crime, forneceu instrumento indispensável à prática do ilícito etc”. E do acima dito não diverge a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, a saber: 3 MIRABETE, Julio Fabbrini, Manual de direito penal, volume 1: parte geral, arts. 1º a 120 do CP. 31ª ed. São Paulo: Atlas, 2015, pág. 224. PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 10 AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 619 DO CPP. OMISSÃO NO JULGADO. INEXISTÊNCIA. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. NULIDADE DO RECONHECIMENTO PESSOAL. SÚMULA 283 E 284 DO STF. COOPERAÇÃO DOLOSAMENTE DISTINTA. NÃO INCIDÊNCIA AOS CO-AUTORES. MODIFICAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. CONSUMAÇÃO DO CRIME DE LATROCÍNIO. SÚMULA 610/STF. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. POSSIBILIDADE. GRAVIDADE CONCRETA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (...) 4. As figuras descritas nos §§ 1º e 2º do art. 29 do Código Penal são destinadas aos partícipes - participação de menor importância (§ 1º) ou de punição por crime menos grave quando constatado que o réu não aderiu sua conduta ao delito mais grave efetivamente ocorrido (§ 2º). 5. A condenaçãopor co-autoria afasta, por si só, a incidência do art. 29, §§ 1º e 2º, do Código Penal. (...) 9. A gravidade concreta da infração enseja maior reprovabilidade da conduta a autorizar a fixação da pena-base acima do mínimo legal. Precedentes. 10. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1417364/SC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 18/12/2014, DJe 04/02/2015) RESP CRIMINAL. ART. 29, CAPUT, DO CODIGO PENAL. PARTICIPAÇÃO NO CRIME E CO-AUTORIA. - AQUELE QUE DA COBERTURA AO ASSALTO, E EM ATITUDE QUE DEMONSTRA EMPUNHAR UMA ARMA OCULTA, EM EXPECTATIVA DE EVENTUAL INTERVENÇÃO E INTIMIDAÇÃO AS VITIMAS, NÃO PODE SER CONSIDERADO NIMIO PARTICIPE, COM ATUAÇÃO DE MENOR IMPORTANCIA PARA INCIDIR O PAR. 1. DO ART. 29, DA LEI PENAL. NO CASO, CONFIGURADA ESTA A CO-AUTORIA. - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (REsp 109.021/DF, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 25/02/1997, DJ 14/04/1997, p. 12779) Em realidade, no caso em apreço, pode-se afirmar que os jurados, ao condenar a peticionária, realmente optaram por uma das versões disponíveis acerca de como exatamente ocorreu o episódio. Mas o só fato de terem adotado como verdadeira a versão apresentada pela acusação não conduz à conclusão de que eles excederam os limites de apreciação da causa a eles reservado pela Constituição. É dizer, não decidiram arbitrariamente, mas apenas diversamente do pretendido pela defesa, e de modo condizente com as provas colhidas ao longo do processo. Desse modo, impende concluir que a condenação da apelante encontra amplo apoio na prova produzida nos autos, muito mais do que o mínimo suporte probatório que já seria suficiente, em consonância com a jurisprudência dominante, a justificar o afastamento da alegação de contrariedade à prova dos autos, em respeito ao princípio constitucional da soberania dos veredictos. PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 11 Nesse sentido, entre outros, os seguintes precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça: “HOMICÍDIO QUALIFICADO (ARTIGO 121, § 2º, INCISOS III E IV, DO CÓDIGO PENAL). TRIBUNAL DO JÚRI. CONDENAÇÃO. APELO DA DEFESA. VEREDICTO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO À PROVA PRODUZIDA NOS AUTOS. PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO DOS PACIENTES. IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO DOS JURADOS QUE ENCONTRA AMPARO NAS PROVAS PRODUZIDAS NO PROCESSO. INOCORRÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1. Interposto recurso de apelação contra a sentença proferida pelo Tribunal do Júri sob o fundamento desta ter sido manifestamente contrária à prova dos autos, ao órgão recursal se permite apenas a realização de um juízo de constatação acerca da existência ou não de suporte probatório para a decisão tomada pelos jurados integrantes do Conselho de Sentença, somente se admitindo a cassação do veredicto caso este seja flagrantemente desprovido de elementos mínimos de prova capazes de sustentá-lo. 2. No caso dos autos, a Corte de origem, ao negar provimento à apelação interposta pelos pacientes, acentuou que a decisão proferida pelo Tribunal do Júri somente poderia ser anulada se estivesse em total dissonância com o conjunto probatório produzido durante a instrução criminal, o que não se verificaria na espécie, pois os jurados julgaram com base nas provas colhidas sob o crivo do contraditório, aptas a atestar a autoria e a materialidade do crime pelo qual foram condenados” (STJ, HC nº 287982/SP, 5ª Turma, Rel. Min. JORGE MUSSI, Dje em 22/04/2014). “PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. JÚRI. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. APELAÇÃO. DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. PROVIMENTO DO TRIBUNAL. DECOTE DA QUALIFICADORA. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA À SOBERANIA DOS VEREDICTOS. CONTRARIEDADE AO ART. 593, § 3º, DO CPP. OCORRÊNCIA. 1. Esta Corte Superior já firmou o entendimento no sentido de que não se pode admitir a desconstituição parcial da sentença proferida pelo Tribunal Popular quanto às qualificadoras ou às privilegiadoras, sob pena de ofensa ao princípio da soberania dos veredictos (art. 5º, XXXVIII, da Constituição Federal de 1988) e ao disposto no art. 593, § 3º, do Código de Processo Penal, que determina a submissão do réu a novo julgamento quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária à prova dos autos” (STJ, AgRg no REsp nº 1378097/SP, 6ª Turma, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Dje em 02/10/2014). De outra parte, não há que se falar no afastamento da qualificadora (utilizada como agravante genérica) referente ao “emprego de fogo”, uma vez que, como já assentado pela E. 14ª Câmara desta Corte por ocasião do julgamento do apelo contra a decisão do Tribunal do Júri, “O emprego do fogo igualmente restou comprovado nos autos. Ainda que a morte da vítima não tenha decorrido dele, isso não permite afastar a qualificadora, cumprindo destacar que a própria ré disse que a mãe ainda gemia quando colocou fogo em seu corpo” (fl. 307-ap). Assim, é forçoso concluir que, especificamente em relação ao reconhecimento da mencionada qualificadora, não decidiram os PODER JUDICIÁRIO Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 12 jurados arbitrariamente, mas sim de forma condizente com as provas do processo, e porque entenderam ser essa a solução mais justa e adequada ao caso que lhes foi submetido à apreciação, não merecendo sua decisão qualquer alteração também quanto a esse aspecto. Enfim, feitas estas ponderações, não se pode deixar de observar que a propositura da presente ação revisional assim como de muitas outras, diga-se parece ter derivado simplesmente da ânsia do revisionando de alcançar um eventual beneplácito deste E. Sodalício. Daí, aliás, sua inconsistência. Ocorre que a jurisprudência brasileira já assentou que a tal não se presta o instituto da Revisão, como exemplificam as ementas a seguir reproduzidas: REVISÃO CRIMINAL ROUBO QUALIFICADO Absolvição Impossibilidade Pretensão de que sejam reapreciadas teses já enfrentadas no julgamento anterior Descabimento A revisão criminal é ação autônoma, que visa desconstituir os efeitos da coisa julgada nas hipóteses previstas no art. 621 do Código de Processo Penal, não podendo ser utilizada como "segundo apelo" ou "terceira instância" de julgamento Condenação mantida Regime fechado inalterado. PEDIDO REVISIONAL INDEFERIDO. (TJSP, Revisão Criminal nº 0026041-19.2014.8.26.0000, Relator(a): Cesar Mecchi Morales; Comarca: Praia Grande; Órgão julgador: 2º Grupo de Direito Criminal; Data do julgamento: 24/05/2016; Data de registro: 25/05/2016) REVISÃO CRIMINAL Roubo majorado Pretensão de desclassificação para exercício arbitrário das próprias razões Inviabilidade Matéria analisada nos dois graus de jurisdição Condenação calcada no exame da prova Hipótese que não se enquadra na previsão do art. 621, I, II e III, do CPP Mera pretensão, aqui, de modificação do julgado, com manejo da ação revisional como se de nova apelação se tratasse Impossibilidade Cabimento de revisão apenas nas hipóteses taxativamente enumeradas e em que há evidente erro judiciário Pedido não conhecido. (TJSP, Revisão Criminal nº 0034292-26.2014.8.26.0000, Relator(a): De Paula Santos; Comarca: Sumaré; Órgão julgador: 7º Grupo de Direito Criminal; Data do julgamento: 12/05/2016; Data de registro: 16/05/2016) "Na Revisão Criminal o reexame da prova dos autos é vedado e não se insere no propósito assentado pelo legislador, de assegurar um remédio eficaz que assegure a revisão daqueles casos teratológicos que desembocam no erro judiciário" (TACrimSP, Revisão 322.476/4, 7º Grupo de Câmaras, Rel. Rui Stoco, j. 23.06.98). E desse entendimento não diverge a doutrina, como exemplifica PODER JUDICIÁRIOTribunal de Justiça do Estado de São Paulo Revisão Criminal nº 0056793-37.2015.8.26.0000 13 o ensinamento de MIRABETE4, para quem “a revisão não pode ter a natureza de uma segunda apelação, pela própria característica que apresenta de rescisão do julgado, caso contrário haveria uma superposição do recurso de apelação, objetivo não pretendido pelo legislador processual, porque haveria uma reapreciação da prova já examinada em primeiro grau ou até mesmo em segunda instância (RT 717/401)”. Assim a prova, e considerando a ausência de qualquer argumento do requerente quanto aos requisitos dos incisos II e III do artigo 621 do CPP que de resto não afloram do exame do processado , a ação deve ser julgada improcedente, mantendo-se intocada a justa e correta decisão criticada. Ante o exposto, pelo meu voto, CONHEÇO e JULGO IMPROCEDENTE a ação revisional proposta por DAYANA CRISTINA BARBOZA. OTAVIO ROCHA Relator 4 Código de Processo Penal Interpretado. 8ª ed. atual. São Paulo: Ed. Atlas, 2001, pág. 1354.
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