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Insercao Profissional do Psicologo em Or (1)

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Inserção Profissional do 
Psicólogo em Organizações 
e no Trabalho 
José Carlos Zanelli 
Antonio Virgflío Bittencour1 Bastos 
Nem sempre as pessoas, em seu dia-a-dia se dão 
wnta do quantu a vida lie cada um é afetada por ca-
racterlsticas, evelllOS e processos que acontecem, 
caracterizam e transformam o mundo do trahalho e 
as organizaçfles humanas voltadas p1f'J produzir bens 
e serviços soc'ialmente demandados. Ao longo da his-
t6ria, os processos de socialização foram sendo de-
legados a instituições e organizações sociai~ . Cada 
vez mais cedo as pessoas entram na escola e nela 
pUSs,1m parte ,ignific3tiva de ~lIas vidas preparando-
se para ocupar um papel social. Crianças freqUentam 
creches e orfanatos. Crianças, jovens, adultos e ido-
S(l~ passam por postos lie saúde e I'0~ hospitais quan-
do cnfH'ntam problemas de saúde . l'esSOl!S ingres-
sam em (,rg.;lIIizações soc iais para hUarem por cau-
sas coletivas e atingirem ohjetivos relevantes para a 
comunidade. Idosos vivem em instituições especiais 
voltadas para o seu atendimento. Além disso, traba-
lhadores, ainda em proporção significativa, passam 
o seu dia em organizações, produzindo bens que to-
dos consomem. Esse dia-a-dia é repleto de deman-
das, desafios, e:'lpectativas,tensôes, realizações, ale-
grias, sofrimentos que, inevitavelmente, se interligam 
e se estendem para a vida I,xa do trabalho. As pesso-
as perdem o emprego e, muitas vezes, perdem a pos-
sibilidade de trabalhar. Há algo que afete mais forte-
mente a viJa de um indivíduo e da sua famflia? Tal 
questionamento, por si, justifica a inserção do psicó-
In!!" em organizaçõcs e no trabalho. 
O trab~lhn e aS organizações de tnrbalho estão 
r"c~cntcs lia vida de tod"s. Qunnto do l'otidiano de 
cada um n~() é ou f,)i aretadu diretamente pelo funci-
onamento dessas organizações sociais'l Quanto do 
hem-estar, qualidade de vida e problemas enfrenta-
dos pelas pessoas não estão relacionados com a di-
nâmica das organizaçôes e com a forma que o traba-
lho e a sua organização assumem na sociedade? 
Em face disso, a Psicologia, tradicionalmente, 
ocupou-se em compreender e intervir sobre fenôme-
nos e processos relativos ao Illundo do trabalho e das 
organizações. De forma crescentemente e:'lplícita, se 
dá conta de que não se pode reproduzir, no eampo 
científico e profissional , a seraraçãl1 operada entre a 
c~ fera trabalho (' as dcmais esferas da vida pessoal. 
A cOlllpreellsã" integral dI) ser humano, portanto, 
depenele de uma compleensão da sua inserção no 
mundo do trabalho e das relações que são criadas no 
interior das organizações em que trabalha , 
t\ idéia de organização, sob esse olhar, é in-
clusiva e nãu está, por decorrência, restrita à pro-
dução de bens no vasto mercado da compe-
titividade globalizada; abrange também a presta-
ção de serviços em sentido 3mplo, que vai, por 
exemplo, de hospitais a s ind icatos. Além disso, as 
atividades profissionai,; ultrapassam as fronteiras 
das organizações em si, quando são e:'lercidas no 
mercado informal de trabalho, no universo do 
subemprego e do desemprego ou, ainda quando 
lidam com ocupações ('u profi ssões. 
E~sa é a tarefa central ou a missão que caracte-
riz.1 es~c 3mplo espaço de ação <la Psiwlogia - ex-
plorar, nnatisar , cOlllpre,:nde, C\lIllU interagem as 
Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil 467 
, , 
múltiplas dimensões que caracterizam 'a vida das 
pessoal. dos grupos e dAS organizações,em um mun-
do cre!CCtltemente complexo e em ~ansformaçiio, 
construindo a partir daí estrat6gias o procedimentos 
que possam promover, preservar/e restabelecer a 
qualidade de vida e o bem-estar das pessoas. 
É objetivo central do capítulo e:'laminar uma 
visão ampla de como se configura a área da Psico-
logia Organizacional e do Trabalho, como campo 
de atuação profissional, reconstruindo sua trajetó-
ria histórica, tanto no plano internacional como 
nacional. Tal retlexão se revela indispens~vel para 
o objetivo de refletir sobre as tendências inovado-
ras na área, considerando o conjunto de transfor-
mações que estão marcando o mundo do trabalho, 
Tendo em vista esse objetivo, o capítulo está 
estruturado em quatro segmentos principais. O pri-
meiro descreve o desenvolvimento histórico da Psi-
cologia Organiz~ional e do Trabalho como área de 
conhecimento e como campO de aplicação, dando 
ênfase às relações entre características dos.conte:'ltos 
sociais e demandas que se apresentam, tanto no ce-
nário internacional como nacional. Essa perspectiva 
histórica procura fortalecer a compreensão de como 
se estruturou o modelo clássico de atuação e produ-
ção de conhecimento neste espaço de ação da Psico-
logia, O segundo segmento apôia-se em uma rápida 
reflexão das transformações em curso no mundo do 
trabalho, visando de.'Icrever as tendências de mudan-
ça na forma como a,Psicologia Organizacional e do -
Trabalho está lcdefinindo suas temáticas, seus pro-
cedimentos de investigação e, especiahnente, suas 
atividades profissionais. A terceira parte volta-se para 
a descrição do campo atual da Psicologia Orga-
nizacional e do Trabalho, buscando revelar a ampli-
tude da.~ .questões que ocupam pesquisadores e pro-
fissionais, os diferentes âmbitos de análise implica-
dos na sua atuação e as necessárias interfaces que 
constrói com outros domínios do conhecimento hu-
mano. Renexões sobre a identidade deste psicólogo, 
sobre o futuro da Psicologia Organizacional e do Tra-
balho e uma síntese encerram o capítulo. 
CONSTITUIÇAO HISTÓRICA E 
ATUAÇAo cLASSICA 
O desenvolvimento da Psicologia Orga-
nizacional e do Trabalho no Brasil acompanhou, 
em compasso sllbordin~do, as ocorrências mllndi-
. ais relativas li área. Isso pode ser visto elll lll11<1 
, 
breve reconstituição hist6rica e revisão das práti -
cas tradicionais no contexto internacional e, pos-
teriormente, em uma síntese do desenvolvimento 
dos fatos históricos e práticas no àmbito nacional. 
Desenvolvimento Internaclonat 
O aparecimento da Psicolog,ia OrgalliLaciollal 
e do Trabalho está claramente associado à crescente 
industriali7.ação que ocorreu nos países dominantes, 
do cenário ocidental, no run do século XIX c inicio 
do s~culo XX, Coincide CIlIll o l"'~p(lntar da I'rúpria 
Psicologia como campo gcral de estudlls e aplicação. 
A busca de critérios e procedimentos para aten-
der, principalmente, às finalidadcs de avaliação e 
seleção de empregados para as indústrias em expan-
são e de militares para os cx.ércilos lá. com que os 
métodos e as teorias tivessem seus I'rirmír dills na (1T.:3. 
O desempenho no trabalho e a eliciência organiza-
cional constituíram, desde n principio, preocupações 
que orien,am as atividades dos p~ icólogos nas orga-
nizaçiies. 
Um. psicólogo pioneiro na :írca, Wa\tcr Dill 
SCOIl, em 1903, publicolI 11111 livro sobre a Psicolo-
gia da Publicidade: Tlte ,lteory of ad"rrtisi/l): . Uma 
década depois, em 1913, Hugo MUnsterberg publi-
cou o que pode ser considerado li primeiro com-
pêndiu da área, intitulado Psyc/w/tlgy mui i/ldus-
trial efficiency, Ambos eram psic61ogos experimen-
tais e ensaiavam os primeiros passo, li;' aplicação 
dos conhecimentos da PSÍl'olngia Nu (' :ISO Ih, livro 
de MlInsterberg, o interesse localizava-se ellltOnlO 
daquilo que viria a ser, por 11111 lungo perí, ,do, a 
atividade mais característÍ<:a e dominante da Psico-
logia aplicada ao trabalho: a se\cç:ill tle pessoal e o 
uso de testes psicológicos com a finalid;ulc de 
maximizaro ajuste das pessoas ans cargos. 
As raízes que vincul;un a Psicologia com o 
mundo do trabalho são encontradas no final d, I sécu-
lo XIX, fora dos Estados Unidos da América. Em 
1889, Patrizi criou o Laboratório de Psicol"gia do 
Trabalho em Modena, Itália. Kraeplin, na Alemanha, 
e Mosso, na Itália,nos anos 90 do século XIX, in-
vestigaram aspectos psicolisio""gicos associados à 
fadiga e a cargas de trabalho. Outro autor cntre os 
pioneiros, Prederick Winslow Taylor, engeohcil o em 
sua formação hásica, teve notável inOuência sobre o 
campo da Psicologia Organizacional c do Tr ,,1>;,1110 
(Spect(lr, 2002) e em outras tire'l'; de l'I ,nh~ l' ir"cntll 
que inOuenciullI a Adll1inblra~' ;;o Ill'\l' n\'ol\"'" 1\ qnc 
46H Z.llldli, 1II ''1 ~ ,' ~-A lldl ade, lla~t()s & l:ols , 
de .-1 .. "111 111 de l\d llli lli stl:II;:1t 1 Cientíl'il'a.l:Olll o ob , 
jeti vo de est<tbdcccl prindpios pura orientar as prá-
ticas OI ganizaci{lll:,is e aum<:ntar a produtividade. O 
li vro de Taylur que constitui difundida rererência 
des~e pedl)(.!.'. a partir de 1991 . é Tlte prilll Iples uf 
:ll'iell(iflc Illal ltl.';l..'fllenl. 
A paltir de idéi as de Taylor, Frank e LiHian 
Uilbrelh (ele engenhciro. ela psicóloga) dedlcaram-
se a inveslig:u a ru, ma pela qual as tarefas sf10 exe-
culadas pelas pC '.~.()as. desenvolvendo o que veio a 
ser chamado (IL: "cstudo do lempo e movimento", 
Es~es e~tudus. u.:ntC de uma perspecliva laylurista 
para maximizM a diciêllcia do desempenho I1U lra -
balho. estiver:uII na !J:lse du .:ampo denominado Fa-
l<lres IllImanos, ,·ohadu para analisar e projdar am-
biell les de trah:dh .. c lc"nolugias que levas, el1l em 
l'onsidnuçào as 1 • • 11 :lclerísticas humanas. D~puis. () 
avanço du cam!," o"orrcu de modo tflo rápido quan-
lo as c~ i gél1(i . " d. " .lClll Il Cl'i mcntos do mundll im , 
pW.CI ,UH , l '!) I1\! ' !I,I', dll.I>. ( il;l!\iks ( hu;n a~ na llllHiCII,' 
IIICla"c ti:, stcull I \ X. ' 1".llldullS Icstes p~ico l tÍ glCIJS 
li veralll e)\tell~1I U,ll e d.:scnvolvimento, para aten-
der às sulicitaç,jl;~. de seleção de recrutas. 
A atribui~'ã" de sislematicidade aos processos 
de avaliação e o 11'Lonhccimento progressivo das ela-
borações cienlíll.:as da Psicologia auxiliaram as ati-
vidades dos psit:"logos dirigidas para a análise de 
características du trab,tlho que contribuÍlam para o 
aumenlo de eflcil'nc ia organizacional. O âmbito de 
atuação foi semi.) alllpliado para outras atividades. 
corno o treinamenlo dos cmpregados e a anjlise de 
f:tton:s do ambienle que afet.u1\ o trabalho. 
As invest ig<lç[,es de Ellon Mayo na \testem 
,·tric Complll/y. que fi caram largamente cnnheci-
·"IS como os estudos de Ilawthome (um b:l ilTo da 
cidade de Chicat;o). marcaram as décadas de 1920 e 
1930 e revelaram a i/l1p"ltânda de considerar os fa-
tores sociais illll'lit:dd(,s em uma situação de Ilaba-
lho, As Ciências .In COlllpoll:tmcnto (com hase na 
I'sicologla. na S, ,, ioh'gia e lia Antrol)(llogia). desde 
então. alçaram , dc,,;'nci:, no /I1undo dos negócios. 
Mayo divulgou 'lhe 11111111111 plvblems Df i/ldustrial 
cil'i/iwtio/l. em 1933. uma obra que sinletizou as 
descobertas daqueles estudos e deu impulso à Era 
das Relações Ilumunas, 
O campo de aplkaçãu, até meados da década 
de 1930, princip..i.llrnente nas organizaçõcs de traba-
lho dus I!stados Unidos:centrava-se em estudos e 
intervençõcsjunlO aos in"nllvos financeiro~ como, 
por exemplo. trcinamento n"trabalho. fadig .• e 010-
1l1lIoni:I.lullIinos lllade e vcntilação.lcstes de utllllis-
são, estudos de tempo e movimentos, \Umos de tra-
balho, segurança e disciplina . Nas décadas seguin-
tes . expandindo-se também nos demais países indus-
triali zados. as atividades do psicólogo e de outros 
prolissionais ligados às Ciências do Comportamen-
to dirigiram-se para os incentivos não-financeiros 
como liderança e SUpel visão, relações intcrpessoais, 
atitudes dos empregados. moral no trabalho, avalia-
ção de executivos. relaçücs homem-máquina. elllre-
vislas C aconselhamento. 
Até a metade do século XX. sob clescente pres-
são dos sindicatos p:u a gar:lIItir os dileilos dos traba, 
Ihadores. FOI am se acentuando as inquielaçõcs com 
prátic'ls organizacilll1ais p"niti vas e d iscriminatórias. 
que cl'locavam em I isco a liberdade e os valores pes-
soais . Os dirigenles tiveram que rever procedimen-
IllS adnlillistrativl1s de retrihuição ao trabalho que le-
v:I·.·.\ lII l' lII nmta apl'lPs as nl:cc,~irlades illdividuais 
n "11' I·.I'"·." (" IIII~·. "'~lll allça. ~;Iude clt: ) 1'.II.ilcla-
meute aos a avançus da tecnologia. ao ullmel\lll do 
tamanho tI:t s organizaçõcs. à explosão populacional 
e imposição tlc novos valores, as necessidades soci-
ais. de auto-cstima c autu-realização foram trazidas 
pala a pauta adminislrativa. 
Na década de 1950. acompanhando as novas 
demandas . entre as várias teorias de motivação que 
vinham sendo propostas. ganhou destaque o estudo 
de Abraham H. to. 1aslow. publicado em 1954. sob o 
título de Motil'lltioll (/lId persollality. no qual é pro-
põe uma hierarquia das necessidades humanas. Pou-
cos anos depois. dcslxlIltou a reflexão de Douglas 
McUregor sobre us pressupostos que os adminislra-
dores estabelecem para as pessoas, divulgada em 
1960 "OlHO Teoria X (tradicional) e Teoria Y (emer-
gente) . na obra 77/C 11111111111 side of elltelprise. As ca-
raClel bticas que rcladonam sistemica'mcnte os indi-
víduos. os grupos e a própria organização comll um 
todo. sub ti controle lJe fatOles internos c ex ternos ao 
sistema organizacional. passaram a ter relevância na 
interpretação do comportamento humano. Questiies 
tradicionais. como lIC(uelas relativas a reautamcnto, 
testagelll, seleção: treinamento, análise tle tarefas, 
incel;1 ivos. condições de trabalho e outras passaram 
a ser vinculadas :\0 sistema social da organização 
como um todo(Schein. 1982). A segunda metade do 
s4ulo XX foi marcada por intenso desenvolvimento 
tecnológico e movimentos que culminaram no que 
tem sido comum chamar de novas prá\lcas de ges-
lãu; po r exemplo, a gt:Slão da qualidade tlllal, a l"Il l-
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tUla dc aplcndiz.lgl'lIl. " C/lI/J<IJI ·t'I/JI':/l t . o Ilab:tlh" 
em equipe,. aS célulJs de produção, a produçãujllst-
i/l -time e outras . 
ljll': suas produções e~lral'(J I ;l m. via de I cgra. o 
âmbito do que é convcncionado como cu nhccimento 
psicológico. O Qu .. dro 15.1 apresent., as pl ineipais 
Clllll rihuições dos ;.utores I\lencionado~ . Muitos au\l)lcs c tc,lrias admi nistr alivas. SOl'1 
o!ógicas e psicológicas ror;un ou lêm sido desen-
volvidas para ampliar os horizontes e:l:plicativos da 
organização comu um fClIlllncllo psiCOSSllCi'll. En-
tre os pcs!(lIisatlol es da Psicologia. merecem ser 
lembrados. além daquek s all!t:r!nnnt:nte rekridll'. 
sob risco dI: omitir imp" rla nll:s l'olltrihlliçüt:s: KlIlt 
LewlIl . Rcnsis Likert . I/arold J . Le:l vill. ElllolI 
Jaqucs , Ffl:derid: E. EIII/: ry. Eric L TlI st. (icllfges 
FriedmJIlII . C III i, !\rgyl i, . WillTCn fknni,. Gt:cll 
lIo Fstcdc c 1't1~:1I 11. Sdll· lI1 . l~ impollallle ressa!lar 
Examinandu essa rápida retlUspectiva hi , lúllca 
de constituição do campo da Psicologia Organizacio-
nal e do Trabalho, fica evidl"nte que ele se dcsenvol-
~eu buscando dar lespostas a desafiüs específicos 
postos pelos clmtextos sociais. econômicos. políti-
cos e tecnológicos que marcaram o século XX l'dl,1 
uma visão de conjunto de,~e processo. 'l\ Qu"dn ' $ 
15 .2. 15.3 c 15 .4 sintellzam a análise Icalilada por 
SllIl\\rnin e Slncn ( 1998) que. apcsarde Icmllhe<.'eIl'f11 
a al1ificia lidad,> em f.lzcr reclllles de eSI;Í gio, Clll 11111 
QUADRO 15.1 Plincipals contnlJuiç:i)es de p, ";óI090S Jestac ados na lonstrução da Adlll nls lr ilção 
no século XX 
AUTO[!ES 
Kurt L UWill 
Rensis Lik" rt 
Harold ~ . Leavill 
~II~!~~~~ _~~~~~~~QES _____ . _ _ _ . ______ _ 
- Desenvolveu eSludos Experimentais do CO/"portamcnto de pequenos grupos 
, Deu origem nos Grupos T (ela treinan len o) e aos Laboratórios Núcionals 
do Tlelnamonto(EUA). 
- Fundou O tns tilllla lor Social Research (EUA). lIIn relevallle celltlo de 
Investigaçâo da área. 
, Rovelou a importância da participação IIOS sistemas gerenciaiS. 
., Realizou axperiências em torno dos prln ·~lpios fundamentais du Psicolo-
gia Organizacion31. 
Demonstrou a supcnoridade da comunh :ação biclirecionalllar, lolações 
de subordinação. 
EllioU Jaques Fundou O Ta~islock tnstitute of f/uman Rolatiolls (Ingl.110rta) . 11m relu-
vanle cenlro de investigação da área. 
• Aplicou métodos psicanaliticos 80 estud) dos confiilos orgalllzJcloll81S 
Frederick E Emery: Elic L. 111s1 • Delanl origem à Escola Sociotécnlca (Ingl~terra). que coloca em /elevo os 
cOllleudas da Imbal/lo. 
Desenvolveram a idéia de que a l/In si~tema lécnico de Irabalho cor· 
respondo", articulações sociais valÍadas. 
Georges Flledmunll • Teceu criticas s!Jveras às bases psicológicas dos plincfpios laylolis:as 
Ap:olundou a pelspuctiva social ti histórica da organizaçlio do trabalhO. 
Chris ArgYl is De"lacou a responsabilidade da organização em assegurar quo o po len-
cial das pessoas sela realizado. 
• FOI Unl dos outores quo mais impulSionaram os estudos sobro a prolldl 
za ~;dm organizacional. 
Vlarren Bennis Fundou o Inslituto de Liderança (EUA) e desenvolveu a idéia da lideran -
ça como uma aplldã(J acessivel. 
• Desonvolveu a noção do gerenclamenlo Bd hoc como anUdolo à burocracia 
Geort Holslede ' Colocou ênfase na diversidade cultural e Influenciou tortemellte os estu, 
dos de administração cultural. 
• Estabeleceu categorias que distinguem as cultUlas nacionais e marcou 
os ostudos transcullurais. 
Edgar H. Schein • Corno Uni prticursor, tove lorte Inlluencla no desenvolvimento do compo 
<.la Psicologllj Organizacional. 
Fontes Schel(1 , 1990. C/ :linf!( 1 ~l l f ! 1 
ESlabeleceu polo menos doia conceitos inovadores: cUllurQ cOlporal/va 
e âncoras do carlrma 
11 
\1
'1 
. ~ 
!s. 
470 ZaneIli, Borges-Andrade, Bastos & cols. 
QUADRO 15.2 Síntese da constituição histórica do campo - primeiro período 
Primeiro período: estabelecimento da profissão (até 1945) 
Desafios e oportunidades 
Respostas aos desafios 
Abordagens teóricas 
e métodos de trabalho 
o Expansão colonial, crescimento da indústria e do comércio, emprego de no-
vas fontes de energia, invenção de novas máquinas, desenvolvimento de 
novos meios de comunicação e transporte. 
o Avanço das ciências naturais e biológicas (Darwin) desafia crenças 
estabelecidas sobre a natureza humana. 
o Pressão por reformas sociais, luta contra a exploração do trabalho humano 
(Marx) e por políticas públicas na saúde e na educação. Cresce a demanda 
por educação. 
o Na indústria, a progressiva mecanização demanda racionalização. A produ-
ção em massa e a expansão do mercado de consumo colocam o desafio da 
produtividade crescente. Surgem as linhas de montagem, consolidando o 
paradigma taylorista/fordista de organização do trabalho. 
o A Primeira Guerra Mundial coloca problemas práticos para os psicólogos 
(novas e específicas ocupações e o impacto das horas de trabalho sobre o 
desempenho, no caso das fábricas de munição). 
o O período de depressão econômica (década de 1930). A emergência do nazi-
fascismo e a fuga de cérebros alemães para os Estados Unidos (Kurt Lewin). A 
Segunda Guerra Mundial coloca o desafIO de seleção e treinamento de recrutas. 
o Neste período, consolida-se a consciência de que a Psicologia pode contri-
buir para a solução de importantes problemas práticos. 
• Lahy (França) - um dos primeiros a utilizar testes para seleção de trabalha-
dores para postos de trabalho decorrentes dos avanços da tecnologia (dati-
lógrafos, motoristas de trem, operadores de telefone). 
o O laboratório de Harvard (Münsterberg) e os testes vocacionais - surge a 
Psicotécnica. Esse movimento cresce e se espalha em vários países do continente 
europeu. Vários encontros científicos são realizados. Surge uma rede de entidades 
profissionais e as tentativas de demarcar territórios de competências reconhecidas. 
o O campo não se tornou exclusivo de psicólogos. Profissionais de outros do-
mínios (médicos e engenheiros) se integram ao movimento. 
o A psicofísica clássica é utilizada para construção de 
testes que avaliam o potencial de ajustamento de trabalhadores para postos 
específicos. 
o Os testes de inteligência e de características vocacionais entram em cena 
nos processos seletivos. Cresce o número de testes de atitudes, interesses 
e atributos de personalidade. 
o Na Alemanha surge o interesse por analisar a estrutura profunda da persona-
lidade ao lado das medidas psicométricas mais usuais. Situaçãés quase reais 
e avaliações "clínicas" são introduzidas nos processos seletivos. 
• "Human Engineering" - o desenho de equipamentos para o uso humano 
(incluindo armamentos que eram uma demanda dos períodos de guerra). 
Esse movimento associa-se às práticas decorrentes do modelo de adminis-
tração científica de Taylor. 
A análise dos fatores sociais ganha impulso inicial com os estudos de 
Hawthorne (década de 1920 e 1930). O "efeito de Hawthorne" torna-se foco 
de interesse para a pesquisa e para o trabalho de psicólogos. Novo impulso 
vem da teoria de campo de Kurt Lewin e seu uso para os processos de 
dinãmica de grupos. O foco nos pequenos grupos consolida-se como uma 
perspectiva influente de análise e intervenção. 
o Junto com as demandas educacionais, cresce (também em função da guerra, 
devido ao ingresso de novos trabalhadores) a necessidade de aperfeiçoar. os 
métodos de treinamento no trabalho. 
Fonte: Criado a partir de Shimmin e Stein. 199B. 
Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil 471 
QUADRO 15.3 Síntese da constituição histórica do campo - segundo período 
Segundo períodO: expansão e consolidação pós-guerra {até a década de 1960} 
Desafios e oportunidades 
Respostas aos desafios 
Abordagens teóricas e 
métodos de trabalho 
o Pós-guerra - período de reconstrução da economia, das cidades e de rein-
tegração dos veteranos de guerra à vida civil. 
o Os avanços tecnológicos geraram novos trabalhos, novos produtos, novas 
formas de comunicação e de transporte. As pessoas mudaram suas ex-
pectativas e aspirações. Há o sonho de uma sociedade mais igualitária. 
o Fim do colonialismo. Independência de colônias africanas. 
o A Guerra Fria, com o mundo dividido entre duas superpotências (comunis-
mo e capitalismo). 
o Surge o "Estado de bem-estar social" - responsável pela saúde, pelos ser-
viços sociais e pelo apoio ao desempregado. Qualidade de vida e qualida-
de de vida no trabalho passam a ser valores importantes. 
o Expansão industrial, crescimento do setor de serviços, população de imi-
grantes e novos desafios de produtividade ressaltam a importância do trei-
namento geral e do treinamento gerencial. 
o Crescem o interesse e os recursos para a pesquisa das ciências 
comporta mentais e sociais. A Psicologia se expande significativamente e a 
Psicologia Organizacional e do Trabalho acompanha esse crescimento. 
Surgem fi se fortalecem entidades específicas em vários países da Europa 
e nos Estados Unidos. 
o Os psicólogos organizacionais tornam-se consultores para uma gama de 
problemas organizacionais - desde o desenho de postos de trabalho, pas-
sando por seleção, treinamento, introdução de novas tecnologias e desen-
volvimento organizacional. 
o Interesse pelas questões de estrutura e funcionamento organizacional : 
Likert, em seus estilos de liderança, aponta a importância da participação 
e da democracia. O comportamento gerencial torna-se o foco principal da 
atenção. 
o A área se diversifica - o rótulo Psicologia Industrial, usado no Annual Review 
of Psychology antes de 1961, torna-se restritivo. Aparecem revisões de 
várias subáreas. Em 1967 aparece o primeiro capítulo de Psicologia 
Organizacionalnesse importante periódico. 
o A seleção de pessoal continua sendo uma das principais 
atividades. 
o Cresce a atenção dada ao treinamento - a necessidade de novas habilida-
des em função das novas tecnologias e o desenvolvimento de habilidades 
de supervisão e gerenciamento. 
o TWI (Training Within Industry): promoção de estilos menos autoritários é 
difundida em toda a Europa abrangida pelo Plano Marshall. 
o Crescem as pesquisas sobre aprendizagem, aquisição de habilidades e 
métodos de ensino. Na década de 1960 ressurge o interesse pela instru-
ção programada. A análise do trabalho é uma técnica básica. 
o Treinamento gerencial: os processos de dinâmica de grupo e os treina-
mentos em sensibilidade (T-groups) . 
o Na Inglaterra: o Tavistock Institute of Human Relations possui uma orienta-
ção mais eclética, com influência da psicanálise. Daí surge o modelo de 
pesquisa-ação que embasa o trabalho de mudança organizacional. As pes-
quisas levam aos conceitos de grupos de trabalhos semi-autônomos e à 
noção de sistema sociotécnico. 
Fonte: Curado a partir de Shimmin e Stein. 199B. ~I- -.se .r:Io~; I r,;YUERIAL EXCLUS:VO 
~ P/\STA DE PROFESSORES 
~ DATA: __ /_, __ _ 
--~.....,.--,_ .. _-_.--
472 Zanelli, Borges-Andrade, Bastos & cols. 
QUADRO 15.4 Síntese da constituição histórica do campo - terceiro período 
TerceIro período: novas direções e reorientação (final da década de 1960 e década de 1970) 
Desafios e oportunidades 
Respostas aos desafios 
Abordagens teóricas e 
métodos de trabalho 
Abordagens teóricas 
e métodos de trabalho 
o Os indícios de transição de uma sociedade industrial para uma sociedade pós-in-
dustrial. A crescente expansão do setor de serviços e o crescimento de organiza-
ções não voltadas para o lucro. 
o O otimismo das décadas de crescimento pós-guerra cede lugar à incerteza e a 
questionamentos da ordem econômica, social e política. As tensões da Guerra 
Fria explodem em vários conflitos e guerras localizadas (por exemplo Vietnã). 
o O equilíbrio de poder entre as nações vai se alterando. A crise de energia 
revela o poder dos países produtores de petróleo e isso afeta as decisões 
geopolíticas das nações hegemônicas. 
o Os testes psicológicos são fortemente atacados (nos Estados Unidos e na 
Europa) . Eles e outras ferramentas de trabalho do psicólogo organizacional 
são criticados por servirem a estruturas de poder e dominação. O interesse 
dos estudantes de Psicologia desloca-se mais fortemente para a clínica. 
o As tensões no mundo do trabalho crescem: organizações buscam lucros crescentes; 
há fusões e redução do número de empregos com os avanços tecnológicos. Os 
ideais de humanização aparecem no movimento por "qualidade de vida no trabalho". 
o Torna-se mais visível o sucesso econômico do Japão e o tipo de relações de 
trabalho lá prevalentes. Na Europa consolidam-se formas de co-gestão. 
o Surge mais fortemente para o psicólogo o desafio de entender e lidar com 
questões que fogem ao âmbito individual de análise. 
o O campo amplia e diversifica. Em substituição à Divisão de Psicologia Industrial 
surge na APA a Divisão de Psicologia Industrial e Organizacional. O uso desse 
conceito mais amplo do campo se espalha por vários países da Europa. 
o Ao lado da seleção de pessoal, trabalhos emergentes lidam com desenvolvimento 
organizacional, resolução de conflitos, desenho de trabalho e organização. 
o Na Escandinávia, experimentos inovadores surgem no campo da humanização do 
trabalho. A experiência da Volvo e a substituição da clássica linha de montagem 
destacam-se. 
o Crescem os estudos a respeito dos efeitos de variáveis organizacionais so-
bre o comportamento dos indivíduos e a respeito dos impactos de ambientes 
cada vez mais turbulentos sobre as características organizacionais. 
o O crescimento do campo produz áreas de interface com outras disciplinas. 
Emerge a necessidade de enfoques interdisciplinares e multiprofissionais. 
o Cresce o debate sobre questões éticas que cercam o trabalho na área. Novos códi-
gos de ética protegem os clientes e enfatizam a responsabilidade social do psicólogo. 
• O desenvolvimento de teorias e a preocupação com questões 
metodológicas tomam-se mais nítidos. O crescimento da área e a interface com 
outros domínios revelam as inconsistências e a falta de integração teórica. 
o Na seleção de pessoal, continua a separação entre abordagens estatísticas 
e clínicas. Centros de avaliação valem-se de várias técnicas, entre as quais 
simulações de aspectos reais do trabalho a ser executado. 
o Os avanços tecnológicos e os desenvolvimentos das ciências da cognição 
consolidam-se em um campo interdisciplinar de "ergonomia cognitiva". 
o Estratégias de mudança centradas nos indivíduos (T-groups, por exemplo) 
dão lugar a intervenções mais abrangentes. Desenvolvimento organizacional 
é um rótulo para um conjunto amplo de estratégias voltadas para aprimorar o 
desempenho de pessoas e de organizações de forma articulada. 
o Os programas de qualidade de vida no trabalho concretizam o desejo de hu-
manização e nascem sob a influência do pensamento de Maslow e Herzberg. Do 
grupo de Tavistock surge o modelo de grupos autônomos. Nessas vertentes, a 
idéia de controle da força de trabalho dá lugar à necessidade de envolvimento 
das pessoas com o seu trabalho. Fala-se em democracia no chão de fábrica. 
• A democracia industrial torna-se tópico de interesse, levando à análise das 
relações e dos papéis das entidades sindicais nas decisões organizacionais. 
Psicólogos passam a ser, também, consultores de entidades de trabalhadores. 
As experiências de co-gestão e das cooperativas (na antiga Iugoslávia, por exem-
plo) passam a receber atenção. 
Fonte: CriadO a partir de Shimmin e Strein. 1998. 
Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil 473 
processo que é contínuo, diferenciam quatro gran-
des períodos nessa história. Vamos nos deter nos três 
primeiros, já que o último - desenvolvimentos re-
centes - será abordado mais adiante neste capítulo. 
A cada período, o conjunto de práticas profissi-
onais vinculava-se a uma base ou a antecedentes so-
ciais e culturais que não podem ser negligenciados e 
o seu desenvolvimento advém de tentativas decons-
truir novos conceitos e técnicas para lidar com os 
desafios que emergem a cada momento. Assim, para 
cada período, o quadro está estruturado em três seg-
mentos. O primeiro indica elementos do contexto 
macrossocial , político, econômico e cultural que co-
locam desafios e oportunidades para a emergência 
de respostas no campo científico e profissional. O 
segundo indica, de forma concreta, ações e produtos 
que responderam a esses desafios. O terceiro seg-
mento descreve as abordagens teóricas, os procedi-
mentos e métodos que caracterizam, dominantemen-
te, o trabalho do psicólogo naquele período. 
Desenvolvimento da psicologia 
organizacional e do trabalho no brasil 
A preocupação dos colonizadores com o que 
era percebido como ócio e preguiça dos nativos, no 
Brasil, pode ser encontrada em escritos dos tempos 
da Colônia. Outras preocupações sobrevieram para 
o controle do processo produtivo, em decorrência da 
expansão das atividades laborais que visavam aten-
der às demandas do crescimento dos ambientes ur-
banos. A elite, é claro, sempre visou à submissão dos 
trabalhadores (sobretudo índios e negros) aos valo-
res e ao poder dominante. 
Até quase o final do século XIX, a economia 
brasileira era essencialmente escravocrata. Com o 
aumento do fluxo migratório e a chegada dos imi-
grantes europeus, deu-se início ao cultivo do café 
foram incrementadas as manufaturas e pequenos ne-
gócios, sobretudo nas regiões Sul e Sudeste. Uma 
figura proeminente nesse período foi o Visconde de 
Mauá, cuja diversidade nos setores de atuação e ra-
zoável sucesso nos empreendimentos fez atrair capi-
tal estrangeiro.Contudo o modelo e os pressupostos 
de condução dos processos laborais continuavam as-
sentados na desconfiança, na forte hierarquia de con-
trole e na exploração das relações de trabalho. Em 
suma, um prolongamento do controle escravocrata. 
Mais estrangeiros acorreram ao País nas duas 
primeiras décadas do século XX. Muitos deles fica-
ram nos emergentes centros urbanos, com destaque 
para a cidade de São Paulo. Conjugados aos la-
vradores, que deram início ao movimento migrató-
rio da zona rural, passaram a constituir a mão-de-
obra necessária à industrialização nascente. 
A Psicologia aplicada ao trabalho surge no cená-
rio brasileiro nessa época, associada a tentativas de 
racionalização e à procura de um caráter científico e 
inovador no controle dos processos produtivos. Na 
esteira das idéias postuladas pela Administração Cien-
tífica de Taylor, os interesses voltaram-se para as 
possibilidades de uma maior eficiência econômica, 
sob o argumento de melhoria das condições do tra-
balho operário. Naquele período, Léon Walther trou-
xe a Psicotécnica para o País, que foi acolhida como 
instrumental para a viabilização das propostas 
tayloristas. Posteriormente, Henri Piéron desenca-
deou os estudos dos testes psicológicos, também em 
um curso sobre Psicotécnica, ministrado na Escola 
Normal de São Paulo. As primeiras aplicações de 
testes ocorreram em 1924, no Liceu de Artes e Ofí-
cios de São Paulo, sob a direção de Roberto Mange 
(Antunes, 1998). 
As aplicações de testes psicológicos ou, mais 
apropriadamente, do exame psicotécnico, com a fi-
nalidade de selecionar empregados, expandiu-se ra-
pidamente, em especial nas empresas ferroviárias. A 
psicotécnica vinha sendo desenvolvida desde a fase 
pioneira da Psicologia por alguns pesquisadores, entre 
eles, Hugo Münsterberg, discípulo de Wundt, primei-
ro na Alemanha e depois nos Estados Unidos (Zanelli, 
2002). Externo ao circuito sulista, em 1925, no Re-
cife, Ulysses Pernambuco, um neurologista e psiqui-
atra, criou o Instituto de Psicologia de Pernambuco, 
que passou a ser denominado, a partir de 1929, Insti-
tuto de Seleção e Orientação Profissional de Pernam-
buco, uma organização que produziu numerosas pes-
quisas aplicadas (Antunes, 1998; Pessoti, 1988). 
O Instituto de Organização Racional do Traba-
lho (IDORT), criado em 1930, veio atender a uma 
expectativa, então já remota, entre os empresários 
paulistas e serviu para treinar profissionais psicotéc-
nicos, em sua maioria engenheiros dedicados aos pro-
blemas de ajustamento humano ao trabalho, e passou 
a ter considerável penetração nas empresas. O IDORT 
teve importância crucial na difusão das aplicações da 
Psicologia ao trabalho no Brasil. A difusão das ativi-
dades de inserção do psicólogo aos contextos de tra-
balho no País reproduz a busca de racionalização que 
se generalizou na sociedade, sobretudo pela crença 
474 Zanelli , Borges-Andrade, Bastos & cols. 
na aplicação de testes psicológicos, com claro e res-
trito objetivo econômico de aumentar a produtivida-
de das empresas. Isso impulsionou não apenas a área, 
mas o campo de atuação da Psicologia como um todo, 
que ganhou legitimidade. A Psicologia, uma jovem 
ciência na primeira metade do século XX, passou a 
figurar entre as disciplinas que forneciam apoio e le-
gitimidade aos métodos administrativos e suas cor-
respondentes práticas. Quando a profissão foi reco-
nhecida legalmente, na década de 1960, o campo da 
Psicologia aplicada ao trabalho já estava consolidado. 
Outras instituições, com as quais a Psicologia 
de algum modo conviveu, também foram criadas e 
construíram o desenvolvimento da área no País: As-
sociação Brasileira para Prevenção de Acidentes, 
Conselho de Higiene e Segurança do Trabalho, Insti-
tuto de Administração, Fundação Getúlio Vargas, Es-
cola Livre de Sociologia e Política, Centro Ferroviá-
rio de Ensino e Seleção de Pessoal, Estrada de Ferro 
Central do Brasil, Companhia Metropolitana de 
Transportes Coletivos (CMTC), Serviço Nacional da 
Indústria (SENAI) e Serviço Nacional do Comércio 
(SENAC). Também o Laboratório de Psicologia da 
Colônia de Psicopatas do Engenho de Dentro é lem-
brado nessa construção, ao pesquisar os processos 
de seleção de aviadores para a Aviação Militar, sob a 
coordenação de Waclaw Radecki (Antunes, 1998). 
Ocorreu uma expansão das organizações pro-
dutivas brasileiras após a Segunda Guerra Mundial, 
com a instalação de multi nacionais e aumento da 
competitividade. Entretanto a mão-de-obra continu-
ava, em grande parte, desqualificada. As atividades 
administrativas mantinham-se centradas na produção, 
enquanto a qualidade dos produtos, tanto pela 
desatenção gerencial como pelas dificuldades de na-
tureza tecnológica, deixava a desejar. As preocupa-
ções com a formação profissional só começaram a 
ganhar força a partir desse momento, atraindo tam-
bém os profissionais vinculados à Psicologia. 
No período em que Getúlio Vargas esteve no 
poder, foram regulamentados direitos e benefícios aos 
trabalhadores. A gestão presidencial de Juscelino 
Kubistchek, chamada fase desenvolvimentista, me-
rece destaque porque acarretou a vinda de montadoras 
internacionais ao Brasil. Esses dois eventos tiveram 
impacto nos modelos de gestão empresarial e nas re-
lações de trabalho porque compõem a moldura de 
reconfiguração do cenário nacional. A partir daí, sur-
giram efetivamente os primeiros investimentos na qua-
lificação dos trabalhadores e as preocupações com 
métodos de gestão mais apropriados às condições e 
características da realidade brasileira, embora seja 
evidente o quanto continuam sendo reproduzidas as 
elaborações originadas nos países colonizadores. 
Roberto Mange, Emilio Mira y Lopez, Betty 
Katzenstein e Oswaldo de Barros Santos são nomes 
freqüentemente citados como profissionais psicólo-
gos daquele período. Ao mesmo tempo que manti-
nham interesses voltados para a aplicação da Psico-
logia ao trabalho, foram autores de textos que permi-
tiram a difusão do conhecimento na área, embora 
muitas vezes trabalhassem em instituições externas 
ao circuito universitário formal (Pessoti, 1988). 
Pela influência que teve na formação dos psi-
cólogos brasileiros, é necessário mencionar um livro 
de um autor norte-americano, Joseph Tiffin, publi-
cado em primeira edição no ano de 1942: Industrial 
psyclzology. A partir de 1958, Ernest J. McCormick 
compartilha a autoria na revisão do texto. Com base 
em tal revisão, o livro foi traduzido e utilizado, de 
forma ampla e duradoura, nos cursos de Psicologia 
brasileiros, a partir do final da década de 1960. 
As atividades do psicólogo brasileiro até as déca-
das intermediárias do século XX, pelo menos, tiveram 
forte tônica na seleção de pessoal . As atividades, até 
então, para grande parcela dos profissionais, não ultra-
passavam o recrutamento, a seleção, o treinamento, a 
análise ocupacional e a avaliação de desempenho. 
As décadas seguintes foram marcadas pela 
importação tecnológica e de muitos modismos ad-
ministrativos. A concorrência foi se tomando cadá 
vez mais acirrada, enquanto a informática domina-
va progressivamente os procedimentos de gestão, 
influenciando fortemente os meios para as trocas 
comerciais, a disseminação de conhecimento e para 
as relações de trabalho. 
Em um importante estudo realizado na década 
de 1980, o Conselho Federal de Psicologia traçou 
uma ampla descrição da atuação do psicólogo no 
Brasil, apontando dificuldades que cercavam o exer-
cício profissional e sinais de que transformações em 
curso estavam começando a delinear novos fazeres 
ou novas práticas nos diversos subcampos da Psico-
logia. O Quadro 15.5 sintetiza as principais informa-
ções sobre o que faziam, em grande parte, os psicó-
logos organizacionais e do trabalho. 
Os resultados desse amplo estudo revelam, cla-
ramente, o predomíniode um núcleo clássico de ati-
vidades que tradicionalmente define o espaço de atua-
ção do psicólogo nas organizações como vinculado 
to ;. :'ER1AL :=,.~f.~~ .. ~ ~::i\1 
------ --......... -
l l' PASTA DE PROFESSO;\ES DATA: I I 
. ------
Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil 475 
QUADRO 15.5 Atividades mais freqüentes entre os psicólogos organizacionais e do trabalho no 
Brasil na década de 1980 
Incidência 
Mais de 40% dos psicólogos organizacionais 
Entre 30 e 40% dos psicólogos organizacionais 
Entre 20 e 30% dos psicólogos organizacionais 
Menos de 20% dos psicólogos organizacionais 
Fonte: CFP. Quem é o psicólogo brasileiro? 1988. 
às ações de recrutamento e seleção. A esse núcleo se 
agregam outras funções clássicas da área de gestão 
de pessoas: treinamento e avaliação de desempenho. 
É perceptível, contudo, O aparecimento em percen-
tuais significativos, de algumas atividades que podem 
ser consideradas "modernas" ou, pelo menos, não vin-
culadas tão estreitamente ao modelo mais tradicional 
de trabalho do psicólogo nessa área. Entre elas: pla-
nejamento e execução de projetos, os diagnósticos 
situacionais e as funções de assessoria e consultoria. 
Tais atividades configuram um tipo de inserção pro-
fissional diferenciado por ampliarem o nível de inter-
venção frente aos problemas organizacionais, levan-
do-o a lidar com problemas mais complexos e glo-
bais das organizações. 
Outra informação importante que surge dessa 
mesma pesquisa refere-se à trajetória da carreira en-
tre os psicólogos organizacionais. Quando são com-
parados o primeiro emprego e o emprego atual des-
ses profissionais, há uma diminuição de atividades 
técnicas (recrutamento, seleção, aplicação de testes, 
análise de função e treinamento) e o aumento da in-
cidência de atividades administrativas, de planeja-
mento, consultoria, supervisão e assessoria. 
Analisando o conjunto de informações que des-
creviam a atuação do psicólogo organizacional até 
Atividade desenvolvida 
• Seleção de pessoal 
• Aplicação de testes 
• Recrutamento 
• Acompanhamento de pessoal 
• Treinamento 
• Avaliação de desempenho 
• Análise de função/ocupação 
• Planejamento e execução de projetos 
• Desenvolvimento organizacional 
• Triagem 
• Cargo administrativo 
• Assessoria 
• Análise de cargos e salários 
• Aconselhamento psicológico 
• Diagnóstico situacional 
• Supervisão de estágios acadêmicos 
• Orientação e treinamento paraprofissionais 
• Psicodiagnóstico 
• Consultoria 
os anos 80 do século XX, verifica-se a pertinência 
de algumas conclusões de diferentes autores: 
• Havia um forte viés tecnicista na atuação do 
psicólogo frente aos problemas organi-
zacionais que, de forma similar a outros pro-
fissionais que atuavam na área de gestão de 
pessoas, o tomam presa fácil de modismos e 
consumidor acrítico de modelos e pacotes 
para solução dos problemas. Como afmna 
Malvezzi (1979), esse viés consolidava a 
imagem e o estereótipo do psicólogo como 
agente de reprodução do sistema. 
• O domínio das atividades de recrutamento 
e seleção via utilização de testes psicológi-
cos constituía o traço mais característico de 
uma atuação limitada, sendo a ele atribuída 
parte do descrédito e o subemprego vivido 
pelo profissional (Figueiredo, 1988). 
Tratava-se de uma "atuação limitada" 
(Bastos, 1988): era reduzido o número de 
psicólogos que rompiam os estreitos limi-
tes que definiam tradicionalmente suas res-
ponsabilidades nesse domínio, deixando de 
contribuir mais efetivamente para a ampla 
diversidade de problemas que cercam as 
476 ZaneIli, Borges-Andrade, Bastos & cols. 
pessoas no mundo do trabalho e das orga-
nizações. 
• O psicólogo organizacional não se diferen-
ciava efetivamente de outros trabalhadores 
que se submetem a um trabalho fragmenta-
do e que não possuem uma visão da totalida-
de do contexto em que se inserem (Zanelli, 
1992). Faltava-lhe, portanto, uma visão mais 
clara do produto final do seu trabalho. 
A crítica a esse modelo clássico de atuação na 
área preparou e ajudou a consolidar linhas inovadoras 
de atuação. Essas linhas nascem, também, das trans-
formações em curso no mundo do trabalho. Na década 
de 1990, com a abertura do mercado e o aumento 
intenso da competitividade internacionalizada, as or-
ganizaçães brasileiras e a realidade de trabalho passa-
ram a exigir novas competências e formas de trabalho. 
Surgiu em 2001, sob o financiamento inicial do 
Conselho Federal de Psicologia (CFP), após debates 
entre os membros do Grupo de Trabalho em Psicolo-
gia Organizacional e do Trabalho (GTPOT), origina-
dos principalmente em simpósios da Associação Na-
cional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia 
(ANPEPP), o primeiro número da Revista Psicolo-
gia: Organizações e Traballw (rPOT) - primeiro pe-
riódico da área no Brasil. Também no âmbito das re-
alizações associadas ao GTPOT, registrou-se formal-
mente, no final do ano 2001, a Sociedade Brasileira 
de Psicologia Orgal1iYlcional e do Trabalho, com a 
finalidade de agregar os profissionais da área no País. 
Para a compreensão da dinâmica que telTl con-
duzido a um conjunto novo de fazeres, práticas e 
conhecimentos no campo, é útil examinar, ainda que 
de forma rápida, as transformações que estão 
reconfigurando o mundo do trabalho e exigindo no-
vas formas de pensar e agir sobre o que pode ser 
chamado de fenômenos organizacionais e atividades 
laborativas na passagem do século XX para o XXI. 
TRANSFORMAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO 
E PRÁTICAS EMERGENTES NA PSICOLOGIA 
ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO 
O mundo do trabalho contemporâneo compre-
ende os processos característicos do modo produti-
vo que vem sendo utilizado desde os últimos anos 
do século XX, incluindo as relações de trabalho 
instituídas dentro das novas práticas de gestão. As 
transformações têm acarretado o restabelecimento 
das políticas de gestão de pessoas, com conseqüên-
cias para o ambiente extensivo de trabalho, e evi-
denciam elementos indispensáveis para o psicólo-
go refletir sobre sua prática tradicional e buscar al-
ternativas para o exercício profissional. 
Mundo do trabalho contemporâneo 
As mudanças intensas do mundo contemporâ-
neo têm provocado impactos na dimensão social e, é 
claro, na dimensão humana individual, como já foi 
discutido no Capítulo 1 deste livro. Alguns tópicos 
que mais têm se modificado dizem respeito ao desen-
volvimento da tecnologia eletrônica e dos meios de 
comunicação, aos mecanismos de controle social mais 
sutis, ao desenvolvimento da biotecnologia, à frag-
mentação das grandes religiões, à ampliação do pa-
pel social da mulher, às alterações na configuração 
do núcleo familiar, ao fortalecimento dos movimen-
tos de conscientização de defesa ambientaI, à retração 
do Estado e consolidação das corporações transna-
cionais, à difusão da hegemonia político-ideológica, 
ao aumento da produtividade atrelado ao desempre-
go estrutural, à intensificação da economia globalizada 
e dos níveis de consumo, à expansão da violência fí-
sica em função direta do aumento da pobreza e do 
avanço da sociedade do conhecimento (Zanelli, 2002). 
As atividades de trabalho são fundamentais 
na construção das interações humanas. Isso nos 
permite afirmar que as transformações no mundo 
do trabalho, ao longo dos séculos, acarretam dife-
rentes formas de subjetivação (desenvolvimento 
emocional e cognitivo das pessoas) e de constitui-
ção dos agrupamentos humanos e da sociedade 
como um todo. No plano psicológico, além da es-
fera profissional, as pessoas são afetadas em seus 
valores, auto-estima e projetos de vida. 
As aceleradas mudanças na tecnologia, a com-
petição internacionalizada, as novas demandas dos 
clientes e a remodelagem nas relações de trabalho 
são temas recorrentes na atualidade e impõem 
direcionamentos para agestão organizacional. Con-
cepções administrativas tradicionais, como estilos 
de liderança, racionalização de processos e 
hierarquização organizacional estão dando lugar a 
novos conceitos, como capitaI intelectual, gestão do 
conhecimento, alianças estratégicas, ética empre-
sarial, organizações virtuais, tempo ocioso e outros. 
A história do mundo do trabalho durante o sé-
culo XX colocou em proeminência dois momentos: 
Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil 477 
o fordismo, introduzido por Henry Ford, a partir de 
1913, que deu início à produção em série, na trilha e 
aperfeiçoamento da administração científica; e o toyo-
tismo, da fábrica japonesa Toyota, a partir de 1945, 
uma forma de organização do trabalho que se difun-
diu rapidamente. O fordismo é um modelo de produ-
ção e gestão calcado em um sistema de inovações 
técnicas e organizacionais, levando em conta a época, 
com o objetivo de elevar a produção e o consumo 
em massa. Assenta-se no distanciamento entre a con-
cepção e a execução, no trabalho simplificado e 
fragmentado, em ciclos operatórios curtos, com pouca 
formação e treinamento dos trabalhadores. Três dé-
cadas depois, o toyotismo passou a explorar as con-
tribuições cognitivas do trabalhador, em busca de 
maior competitividade da empresa. Deu início à pro-
dução vinculada à demanda, ao trabalho operário em 
equipe e em número mínimo, ao aproveitamento má-
ximo do tempo de produção, aos estoques mínimos, 
à horizontalização do processo produtivo, à tercei-
rização e ao controle e gestão da qualidade total (Bas-
tos, 1992). 
No processo de industrialização tardia do Bra-
sil, durante as décadas de 1950 a 1970, foi fomentada 
uma conformação socioeconômica, com base em forte 
incentivo ao desenvolvimento do parque industrial, 
que fez crescer a oferta de empregos. Entretanto na 
década de 1980 deterioraram-se as condições dos 
empregos e enfraqueceram-se as possibilidades de dis-
tribuição de renda mais equilibrada. O número de 
competidores pelas vagas de emprego aumentou, 
acentuadamente, no transcurso da década de 1990 e 
início do novo século. Em muitos segmentos, há de-
manda por maior qualificação, embora o nível de pre-
paro exigido não corresponda a uma necessidade ob-
jeti va das funções. Disso derivam sentimentos de frus-
tração para quem prende-se às chances de sobrevi-
vência esperadas no emprego. 
As reconfigurações organizacionais e do traba-
lho, com o aumento do desemprego e do subemprego, 
são fonte de tensão psicossocial, tanto em suas con-
seqüências para o indivíduo como para a comunida-
de. Novos arranjos organizacionais são arquitetados 
em busca de estruturas organizacionais mais flexí-
veis. Surgem as organizações em redes e as redes 
intra-organizacionais. As estruturas burocráticas pe-
sadas ganham mais leveza com o corte de níveis hie-
rárquicos. A terceirização passa a ser uma prática 
disseminada com forte enxugamento dos trabalha 
dores centrais. As organizações passam a contar com 
grupos de trabalhadores que possuem acesso dife-
renciado a benefícios e a políticas de desenvolvimen-
to. Os processos de trabalho, sob forte impacto das 
inovações tecnológicas, alteram a relação do indiví-
duo com a atividade laboral e passam a exigir novas 
competências e habilidades. Os postos de trabalho 
se tomam mais fluidos e menos precisamente defini-
dos. Os grupos ou, idealmente, as equipes de traba-
lho e, é claro, os indivíduos são pressionados a do-
minarem uma gama cada vez mais ampla de tarefas e 
a desenvolverem competências múltiplas. Novos mo-
delos de gestão são construídos tendo em vista a ne-
cessidade de manter e ampliar níveis de produtivida-
de em um contexto cada vez mais competitivo. 
Para os que conseguem permanecer nas organi-
zações, cresce a solicitação de alinhamento dos ob-
jetivos e valores individuais aos objetivos e valores 
organizacionais e o discurso sobre a relação indiví-
duo-organização passa a ser o de parceria. A sobre-
vivência da organização é proclamada como respon-
sabilidade de todos: impõe-se agregar valor às ope-
rações. Por outro lado, o aperfeiçoamento dos pro-
cessos e os avanços tecnológicos, que substituem o 
homem no trabalho pesado e repetiti vo, levam ao de-
semprego; ao passo em que se multiplicam as con-
tratações de mão-de-obra temporária e as tercei-
rizações. 
O trabalhador, pela ameaça do desemprego e 
pela contínua solicitação de engajamento e partici-
pação, vê-se forçado a incorporar ou, no mínimo, 
instigado a aderir aos valores, crenças e propósitos 
da organização. Face às solicitações de eficiência e 
flexibilidade internas, de conexão com os eventos 
do ambiente em que se insere a unidade de trabalho 
e de ações de melhoria contínua nos processos, há 
um aumento do desgaste físico e psicológico. 
Ampliando o foco, é possível observar a orga-
nização imersa em um contexto composto pelo 
macro ambiente e, mais especificamente, por outras 
organizações de seu ramo de atuação. Todas com-
partilham clientes, provedores, competidores, agen-
tes da comunidade e outros. Para fazer frente às mu-
danças, realizam replanejamentos, revisões internas 
constantes e integram sistemas que regulam os pro-
cessos gerenciais, operacionais e informacionais, 
sob uma estrutura organizativa e uma estratégia 
(Zanelli,2002) . 
Os dirigentes são cobrados para obterem qua-
lidade dos produtos, atenderem as necessidades dos 
clientes e as expectativas dos acionistas. A rapidez 
478 Zanelli, Borges-Andrade, Bastos & cols. 
de respostas que antecipam ou direcionam as mu-
danças tem sido a grande ambição dos dirigentes. 
Para tanto, precisam estar atentos à maneira como 
são organizadas as ati vidades, o grau de integração 
entre as políticas, a estratégia geral, a estrutura, a 
tecnologia utilizada e o alinhamento das ações hu-
manas. Nessa sucessão de deveres, os dirigentes per-
cebem as organizações cada vez mais sujeitas à pres-
são de um intenso desenvolvimento tecnológico e 
às mudanças nas regras do mercado. 
Ao mesmo tempo, cresce o apelo por um ba-
lanço equilibrado entre vida profissional e familiar, 
sobre ética, transparência e busca de justiça, de di-
reito de expressão e de desenvolvimento para todos 
os participantes da comunidade organizacional. É 
essencial- até pelo que apregoam os novos modelos 
de gestão - que o administrador disponha condições 
emancipadoras e participati vas, que respeitem e pro-
movam a pessoa no âmbito do trabalho. 
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Transformações nas práticas do 
psicólogo organizacional e do trabalho 
Como qualquer prática social, a atuação do psi-
cólogo organizacional e do trabalho não fica imune 
às transformações do contexto e ao desenvolvimento 
da ciência. No cenário de início do século XXI, per-
cebe-se, quando se toma como comparação o núcleo 
básico de atividades desenvolvidas pelo psicólogo nos 
anos inaugurais de consolidação da profissão, que a 
amplitude e 9 escopo da sua atuação têm sido efetiva-
mente alargados. Essa ampliação irá trazer a necessi-
dade de intercâmbios mais fecundos com outros do-
mínios da Psicologia e com outras áreas disciplinares. 
Ao examinar as transições que marcam o campo 
da Psicologia Organizacional e do Trabalho no Brasil, 
Bastos (1992), apoiado em uma revisão ampla da lite-
ratura produzida no Brasil, estrutura tal campo da for-
ma como se vê na Figura 15.1. Representa a estrutura~o.: 
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NíveiS de Intervenção 
• Técnicas! 
Procedimentos 
til Estratégias/táticas 
• Políticas 
FIGURA 15.1 Estrutura do campo de atuação do psicólogo organizacional e do trabalho e seus subcampos. 
I 
li 
~ 
Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil 479 
do campo de atuação do psicólogo organizacional e do 
trabalho em vários subcampos (administração de pes-
soal, qualificação/desenvolvimento, comportamento 
organizacional, condições e higiene do trabalho, rela-
ções de trabalho e mudança organizacional). Cada um 
desses subcampos é integrado por um conjunto de ati-
vidades profissionais cuja disposição na figura está or-
ganizada das mais tradicionais ou clássicas até as mais 
recentemente incorporadas às preocupações ou interes-
ses do psicólogo organizacional. 
Outro elemento importante que estrutura a Fi-
gura 15.1 é a concepção de que todas as atividades 
implicam em diferentes níveis de intervenção. Um 
primeiro nível, mais superficial, é o técnico, em que 
o profissional se responsabiliza por intervir em pro-
cessos a partir de instrumentos e procedimentos co-
nhecidos e ou disponíveis. Um segundo nível - o 
estratégico - inclui a possibilidade de o profissional 
participar da formulação de estratégias que incorpo-
ram aquela atividade específica. Finalmente, o ter-
ceiro nível, indica a possibilidade de intervenção no 
plano da formulação de políticas globais para a or-
ganização, que se desdobram em ações estratégicas 
e técnicas congruentes. 
Como se observa na Figura 15.1, a atividade de 
pesquisa em contextos organizacionais e frente a pro-
blemas de trabalho é vista como uma atividade fun-
dante de todo o campo, básica para quaisquer níveis 
de intervenção e para quaisquer atividades nos seus 
vários subcampos de atuação. Assim representada, a 
pesquisa é vista como indissociável de uma prática 
profissional competente e eticamente responsável. 
A partir da representação apresentada, Bastos 
(1992) descreve um conjunto de movimentos inova-
dores na prática do psicólogo organizacional e do 
trabalho que se encontra sintetizado no Quadro 15.6. 
As transformações observadas são agrupadas em três 
grandes movimentos: dentro de cada atividade, no 
interior do subcampo e, finalmente, um movimento 
geral entre os âmbitos de intervenção. Tais movimen-
tos refletem a produção científica e a prática 
construídas na década de 1980, período fértil em re-
flexões sobre o significado social da atuação profis-
sional do psicólogo no Brasil. Caracterizam, também, 
a realidade vi vida até os anos 80 e início dos anos 90 
do século XX e, pelo dinamismo com que a realida-
de se apresenta, em alguns dos seus aspectos, já são 
perceptíveis mudanças significativas. 
Observe-se com um pouco mais de detalhes 
esses movimentos que estão reconfigurando a práti-
ca profissional do psicólogo organizacional e do tra-
balho no Brasil. O primeiro deles ocorre no interior 
das práticas tradicionais e que constituem o núcleo 
central da representação do que significa ser psicó-
logo organizacional. Embora continuem sendo prá-
ticas desempenhadas - talvez ainda sejam aquelas 
que dominantemente ocupam a maioria dos profissi-
0nais da área - todas elas sofreram importantes tran-
sições em função do desenvolvimento científico e 
das transformações nos contextos de trabalho. A allá-
lise do trabalho, atividade básica que fundamenta 
muitas outras intervenções no campo, tem recorrido, 
crescentemente, a uma multiplicidade de técnicas, 
face às transformações na natureza do trabalho hu-
mano e ao crescente impacto das novas tecnologias. 
A dinâmica de evolução do conhecimento e da téc-
nica, por outro lado, tem levado a que tais análises 
deixem de ser meras descrições do estado atual e in-
corporem uma visão prospectiva, para capturar as 
mudanças que estão ocorrendo. As atividades de re-
crutamento e seleção foram fortemente terceirizadas 
pelas empresas, sendo responsável pelo crescente nú-
mero de consultorias ou pequenas empresas presta-
doras de serviços que agregam psicólogos autôno-
mos ou contratados. As transformações organiza-
cionais e a demanda de um novo perfil de trabalha-
dor têm levado a inovações no processo de seleção, 
diminuindo o peso de instrumentos tradicionais e am-
pliando o espaço de técnicas que permitem avaliar 
habilidades e competências interpessoais, por exem-
plo. O campo de treinamento e desenvolvimento ex-
perimenta um forte crescimento pela demanda de edu-
cação continuada e pela consciência de que o conhe-
cimento e a permanente atualização é fator primor-
dial de co'mpetitividade organizacional. Outra ten-
dência importante é a de tomar o trabalhador um 
agente ativo dos processos de desenvolvimento de 
suas competências profissionais e pessoais. Finalmen-
te, a atividade de avaliação de desempenfil;J, de for-
ma congruente com as transformações em todo o sis-
tema de gestão de pessoas, experimenta transforma-
ções que a levam a ter um papel mais central nesse 
sistema, i~orporand~avalia~s de diferente~ ato ...... 
res (não apenas do supervisor ou do chefe), se VInCU-
lando mais estreitamente ao desempenho de equipes 
e grupos, além de incorporar uma dimensão que tam-
bém considera o potencial de cada trabalhador e não 
apenas o seu desempenho real. 
O segundo movimento inovador caracteriza-se 
como um alargamento do cargo. Ou seja, a inserção 
480 Zanelli, Borges-Anélrade, Bastos & cols. 
QUADRO 15.6 Movimentos inovadores na Psicologia Organizacional e do Trabalho 
Movimento 1: práticas consolidadas e tradicionais são renovadas nos seus procedimentos 
Análise do trabalho • Novas tecnologias demandam habilidades que requerem novos mé-
todos de análise (influência de elementos cognitivos). 
• Assume um caráter prospectivo - as mudanças são intensas. 
Recrutamento e seleção • Diminui o peso dos testes psicológicos e novos instrumentos são usados. 
Cresce o interesse pelo processo pré-seleção: a importância de ex-
pectativas realísticas. 
Treinamento • O conhecimento e a aprendizagem são fatores de competitividade: 
as ações de treinamento se ligam a mudanças culturais e tecnológicas 
mais amplas. 
• Autogerenciamento do processo de crescimento e desenvolvimento 
pessoal e profissional. 
Avaliação de desempenho • Ampliam o seu escopo e deixam de ser feitas apenas pelo gerente ou 
supervisor. 
• São vinculadas com o desempenho do grupo/equipe e da organização. 
• Avaliação de potencial: vínculo com planos de desenvolvimento e carreira. 
Movimento 2: novas práticas são Incorporadas, ampliando as propostas de Intervenção 
Administração de pessoal • Planejamento e enriquecimento de cargos 
• Movimentação e desligamento de pessoas 
• Remuneração e benefícios 
• Planejamento de recursos humanos 
Qualificação • Desenvolvimento de carreiras e planos de sucessão 
• Desenvolvimento gerencial 
• Desenvolvimento de equipes 
Condições de trabalho e Higiene • Segurança e prevenção de acidentes 
• Ergonomia 
• Saúde ocupacional 
• Programas de ajustamento e bem-estar 
• Assistência psicossocial ' 
Relações de trabalho • Programas de integração e socialização 
• Regulação de conflitos 
• Mudanças nos padrões de gestão 
• Mudanças na organização do trabalho 
Mudanças organizacionais • Programas de qualidade de vida no trabalho 
• Programas de qualidade total 
Movimento 3: amplia-se o nível de Intervenção frente aos problemas organizacionais e do trabalho 
• Do foco no individuohá um movimento consistente para entender e 
intervir sobre questões organizacionais mais amplas. Consideração 
da gestão de recursos humanos integrada e estratégica. 
Amplia-se o reconhecimento de que a pesquisa é uma prática indis-
pensável para fundamentar as intervenções organizacionais. Além. 
de propiciarem o conhecimento da realidade, funcionam como estra-
tégias de participação dos empregados. 
• Do plano das técnicas (aplicar instrumentos para solução de prOble-
mas específicos) a atuação evolui para os planos das táticas e estra-
tégias e, finalmente, para o plano da formulação de políticas para as 
ações organizacionais. 
do psicólogo em equipes multidisciplinares de re-
cursos humanos conduziu a que novas atividades, até 
então desempenhadas por outros profissionais, tam-
bém fossem incorporadas ao leque de competências 
do psicólogo. A inexistência de um sistema amplo 
de especialização em Psicologia Organizacional e do 
Trabalho, no Brasil, fez com que os psicólogos in-
gressassem em c,l,lfsos de especialização ou mesmo 
mestrados em administração, o que pode explicar, 
em parte, esse alargamento de competências. Na área 
de administração de pessoal, surgem psicólogos en-
volvidos com planejamento de cargos, movimenta-
Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil 481 
ção de pessoal, remuneração e benefícios e, até mes-
mo, planejamento global das necessidades de recur-
sos humanos. No campo da qualificação, aparecem 
as atividades de desenvolvimento de carreiras, de-
senvolvimento gerencial e desenvolvimento de equi-
pes, que expandem o conceito de treinamento clássi-
co. Um subcampo cresce e se consolida de tal forma 
que, neste início de século, ocupa parcela significati-
va dos psicólogos organizacionais e do trabalho: as 
condições de trabalho e seus impactos na saúde do 
trabalhador. A atenção à saúde ocupacional e à 
ergonomia se destaca nesse domínio. Apesar disso, 
os psicólogos atuam em menor proporção nas ques-
tões de acidentes de trabalho, problemas de ajusta-
mento e bem-estar e na assistência psicossocial a tra-
balhadores. O crescimento desse campo faz com que 
ele ultrapasse os limites convencionais da Psicolo-
gia Organizacional - ao extrapolar os "muros" das 
indústrias, o psicólogo passa a lidar com categorias 
ocupacionais diversas que vivem a situação de de-
semprego ou de afastamento do trabalho em função 
de problemas de saúde, o que requer novos modelos, 
novos conhecimentos e novos procedimentos de atu-
ação. O crescimento desse subcampo, novamente co-
loca o psicólogo frente ao desafio de uma compreen-
são mais ampla do que está ocorrendo no mundo do 
trabalho e de seus impactos nas organizações e nos 
trabalhadores, impulsionando contatos interdiscipli-
nares com a Sociologia do Trabalho, Teorias Organi-
zacionais, Economia, entre outros. Outra vertente de 
ampliação das atividades do psicólogo organizacional 
se dá no campo das relações de trabalho. As transi-
ções vividas pelas empresas tem levado a uma aten-
ção especial ao fenômeno cultural a às necessárias 
transformações dos padrões e pressupostos que defi-
nem a cultura organizacional. Essa atenção coloca o 
desafio de ações voltadas para a socialização e inte-
gração, para a regulação de conflitos e para a prepa-
ração de novos padrões de ação gerencial necessári-
os, visando os novos modelos de organização do tra-
balho e de estruturação das organizações. Finalmen-
te, o próprio processo de mudança organizacional 
constitui objeto privilegiado do estudo e das inter-
venções do psicólogo. 
O terceiro movimento tem um caráter diferen-
te: ele destaca transições que estão configurando uma 
intervenção do psicólogo em âmbitos mais comple-
xos da própria organização, O psicólogo passou a 
contribuir para as del.:isões em nível estratégico (Bas-
tos, 1992; Zanelli, 1994). Se administrar tomou-se 
equivalente a coordenar capacidades para construir 
comunidades de ação, em busca contínua de padrões 
coletivos de desempenho, a dimensão psicológica ou 
comportamental adquiriu novas demandas de siste-
matização e responsabilidades. O psicólogo passou 
a prestar serviços de assessoria ou consultoria inte-
grada aos procedimentos de mudança implementados 
pela organização, em um esforço para acompanhar 
as transformações à sua volta e as reações internas 
da comunidade organizacional. Mais do que acom-
panhar, a preocupação volta-se, no que se relaciona 
com a perspectiva psicológica, para firmar uma dire-
ção, construir um movimento seqüencial e relacio-
nar as partes com o todo. Sobretudo atento para pa-
drões auto-reprodutores que tendem a perpetuar o 
que está estabelecido que não mobilizam e não pro-
vocam as transformações necessárias. 
O psicólogo, para colaborar com os processos 
administrativos, depende de conhecer o processo to-
tal de trabalho, ter consciência das atribuições indi-
viduais e das unidades, bem como de articular visão, 
missão, valores, metas e estratégias organizacionais. 
Pretende aumentar a capacidade estratégica, conso-
lidar predisposições para mudanças e fortalecer a for-
mação de equipes de alto desempenho. Simultanea-
mente, visa desenvolver a capacidade gerencial de 
refletir e questionar as próprias finalidades, a forma 
de realizar os processos e a rapidez com que os utiliza. 
Nessa dimensão, é preciso compreender as 
interações sociais, sempre permeadas pelos confli-
tos de interesses, que levam a reter recursos e parti-
cipar de articulações políticas, formando coalizões 
para conquistar e ampliar o poder. É necessário or-
ganizar as ações, fornecer treinamento apropriado, 
incentivar a formação de equipes e recompensar 
justamente, como condições preliminares para que 
a disposição para mudanças passe a ser um elemen-
to definidor da cultura organizacional. 
Atuar com base nesses princípios requer per-
sistência do psicólogo e integração multi pro-
fissional. Requer ter presente que, se as organiza-
ções propõem participação, elas precisam comba-
ter autoritarismos, privilégios, preconceitos e injus-
tiças, aceitando as diferenças e conciliando tenaz-
mente os múltiplos interesses, com vistas ao bem 
coletivo. Isso pressupõe trabalhar com mudanças a 
partir do que existe. Pressupõe, ainda, compreen-
der a organização como um fenômeno psicossocial, 
482 Zanelli, Borges-Andrade, Bastos & cols. 
em todas as suas implicações - uma construção his-
tórica e social. Enfim, entender a organização como 
uma aposta de sobrevivência, com as implicações 
éticas da natureza do lucro, quando é o caso de or-
ganizações com fins lucrativos, e no que tange à 
busca de retribuição justa ao esforço no trabalho. 
Também no segmento interno das organiza-
ções, os psicólogos têm analisado as implicações 
da construção psicossocial em suas influências so-
bre a saúde do trabalhador. As políticas e diretrizes 
que se estabelecem acabam afetando os valores e 
os padrões de comportamento que se propagam no 
local de trabalho e acarretam, em maior ou menor 
grau, o desgaste físico e psicológico. Os prejuízos 
para a saúde do trabalhador, de proporções epidê-
micas no mundo de hoje, têm suas causas, em uma 
análise macro, nas tendências econômicas e tecnoló-
gicas. Repassadas para o âmbito organizacional, 
fogem ao controle das comunidades locais e são 
comandadas por uma busca desesperada de resul-
tados para a sobrevivência. Nas organizações que 
visam fins lucrativos, em grande parte, imperam 
valores que desprezam a qualidade de vida. 
Os dirigentes em nível central, também em or-
ganizações que não estão diretamente voltadas para 
o lucro, por razões diversas, mostram dificuldades 
para práticas participativas ou mesmo consultivas, 
embora as novas propostas de gestão recomendem 
com veemência o compartilhamento das decisões. O 
que se observa, com freqüência, é a delegação dos 
problemas e não a redistribuiçãode poderes para 
resolvê-los. 
O distanciamento entre as exigências dO'am-
biente de trabalho e as expectati vas e necessida-
des do trabalhador tem levado a várias dificulda-
des na vida das organizações, com prejuízos óbvi-
os para sua saúde e com mais sofrimento. Entre as 
dificuldades, talvez a mais encontrada, em todo 
lugar, é a que revela uma sensação de sobrecarga 
pelo excesso de trabalho. Também são queixas fre-
qüentes: a falta de controle sobre o próprio traba-
lho, de recompensa justa, de união entre as pesso-
as e de eqüidade (Maslach e Leiter, 1999). Isso 
faz retornar às mudanças necessárias, bem além 
do âmbito individual, mas na perspectiva da cons-
trução coletiva do que constitui uma organização. 
No segmento externo às organizações, os psi-
cólogos têm se dedicado às conseqüências do traba-
lho informal e aos efeitos sobre quem se encontra 
excluído ou sobre quem pretende reingressar no cir-
cuito das atividades formais de trabalho. Também se 
inserem aí as atividades voltadas para a formação 
profissional, escolha da profissão e reorientação de 
carreiras, entre tantas outras que focam a relação do 
indivíduo com o trabalho e ocupação, não necessaria-
mente no interior de organizações. 
Quem se encontra em situação de desempre-
go, dado o peso atribuído socialmente a essa con-
dição, vi vencia um peculiar sofrimento. Sofre pelo 
sentimento de inadequação social e pela angústia 
das perspectivas de sobrevivência. A exclusão do 
posto de trabalho ou a inclusão forçada em ativi-
dades características do subemprego, ou mesmo a 
transferência para uma posição inferior à que a 
pessoa ocupava no mercado de trabalho, têm im-
plicações óbvias na auto-estima, por sentimentos 
de falta de valia, de incapacidade e de incompe-
tência. Vale observar que tais implicações possuem 
muitos pontos de coincidência com o estado psi-
cológico que advém da aposentadoria. 
Ocorre que o desemprego é um fenômeno ge-
neralizado e suas taxas cresceram fortemente a par-
tir da década de 1990. Trata-se, sem dúvida, de um 
fenômeno complexo e que comporta o exame de 
múltiplas áreas disciplinares, com as perspectivas 
de várias áreas de conhecimento. Diversas são, por-
tanto, as explicações e buscas de determinantes para 
o fato de mesmo os países desenvolvidos, tendo 
crescimento econômico, manterem taxas de desem-
prego elevadas, segundo seus padrões históricos. 
Fala-se em desemprego estrutural, produto do ace-
lerado desenvolvimento tecnológico - claramente 
um poupador do trabalho humano. Discute-se, tam-
bém, como políticas macroeconômicas potencia-
lizam a crise do emprego. Cabe ao psicólogo ter 
uma compreensão ampla do cenário de transforma-
ções que marcam o momento atual, no qual o de-
semprego é um subproduto importante para que 
possa atuar junto à população de desempregados e 
subempregados e resgatar sua capacidade de mobi-
lizar recursos para sua reinserção no mercado de 
trabalho. 
Por fim, em qualquer opção de exercício, a 
prática do psicólogo exige busca de ética admi-
nistrativa e política, visão de mundo calcada em 
rigorosidade, pesquisa, cri ti cidade, flexibilidade, 
competência e disponibilidade para interagir em 
equipes mui ti profiss ionais. 
MA-I ERIAL t:.ACLU..)iVU 
PASTA DE PROFESSORES 
D Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil 483 
PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO 
TRABALHO: UMA VISÃO GERAL DA ÁREA 
DE CONHECIMENTO E DO CAMPO DE 
INTERVENÇÃO 
Considere-se que a denominação Psicologia 
Organizacional e do Trabalho inclui larga 
abrangência, uma vez que busca compreender o 
comportamento das pessoas que trabalham, tanto 
em seus determinantes e suas conseqüências, como 
nas possibilidades da construção produtiva das 
ações de trabalho, com preservação máxima da 
natureza, da qualidade de vida e do bem-estar hu-
mano. Es~a visão da área de conhecimento e do 
campo de intervenção tem orientado muitos pro-
fissionais, dentro ou fora das universidades . 
No senso comum, de algum modo, todas as pes-
soas elaboram teorias para entender o comportamento 
e, se não fosse assim, seria impossível interpretar a 
ação no cotidiano da convivência humana. Isso tam-
bém ocorre quando as pessoas observam o compor-
tamento humano em organizações de trabalho ou, 
simplesmente, quando observam outras pessoas tra-
balhando, em qualquer que seja o contexto. A Psico-
logia (e outras áreas de conhecimento), ao procurar 
compreender o comportamento humano no contexto 
de trabalho, também elabora teorias. Contudo tais 
teorias diferem das do senso comum, à medida que 
as interpretações são feitas com a preocupação de 
obter consistência lógica na articulação dos concei-
tos, com base em observações cuidadosas e em siste-
mática utilização dos procedimentos de pesquisa ou 
de intervenção. Isso é próprio do que é conhecido 
como disciplina científica ou como área de conheci-
mento científico e suas decorrentes atividades de' 
aplicação. Também nesse âmbito, sempre existem 
razões que explicam o comportamento, bem mais 
complexas do que os modelos do senso comum ten-
dem a estabelecer. 
Uma representação esquemática de como se 
articulam fenômenos que integram o campo da Psi-
cologia Organizacional e do Trabalho pode ser exa-
minada na Figura 15.2, construída a partir das idéias 
desenvolvidas por Drenth, Thierry e Wolff (1998). 
De um modo muito simples, o conceito de com-
portamento, transposto para a área da Psicologia 
Organizacional e do Trabalho, pode ser apreendido 
como o fazer humano no ambiente de trabalho. Não 
se restringe, portanto, àquilo que pode ser observado 
Comportamento/ 
Fazer humano 
Psicologia do trabalho 
• Mercado de trabalho 
• Análise de trabalho (cargas) 
• Desemprego 
• Desempenho/fatores 
• Saúde/estresse no trabalho 
Gestão de pessoas 
• Recrutamento, seleção 
• Educação e treinamento 
• Avaliação de desempenho 
• Planos de carreira 
• Desenvolvimento gerencial 
Trabalho 
Psicologia organizacional Âmbitos de análise 
• Atitudes, percepções, emoções • Individual 
• Motivação, satisfação • Grupal 
• Liderança, processos decisórios • Organizacional 
• Gestão, poder e conflito • Ambiental 
• Cultura organizacional 
• Processos de mudança 
FIGURA 15.2 Interfaces pertinentes ao campo da Psicologia Organizacional e do Trabalho, 
484 Zanelli, Borges-Andrade, Bastos & cols. 
diretamente, incluindo estados subjetivos. intenções. 
motivações, crenças e valores. Esse fazer humano 
implica uma unidade complexa que articula. no pIa-
no pessoal. as dimensões cognitiva e afetiva em seus 
elementos implícitos e explícitos; unidade que inte-
gra, em cada ação específica, fatores individuais. 
sociais e culturais. Vale destacar, desde já. que o com-
portamento humano no trabalho se torna foco de in-
teresse em diferentes níveis ou âmbitos de análise-
ele é tomado como objeto de estudo e de intervenção 
nos âmbitos individual. grupal e organizacional. 
O interesse pela ação humana. no entanto. ins-
creve-se no interior de dois outros fenômenos: o tra-
balho e a organização. Como três vértices de um tri-
ângulo. as interfaces entre esses fenômenos constitu-
em a superfície que delimita três subcampos dentro 
da área. O foco de interesse em compreender e lidar 
com as questões que relacionam o comportamento 
humano e o traballw (emprego e/ou tarefas) consti-
tui o subcampo denominado Psicologia do Trabalho 
que. entre vários outros objetos de investigação e de 
intervenção, estuda a natureza dos processos de or-
ganização do trabalho e seus impactos psicossociais, 
especialmente sobre a qualidade de vida e a saúde 
do trabalhador, tanto individual quanto coletivamen-
te. Esse subcampo preocupa-se em entender como o 
desempenho humano no trabalho é afetado por fato-
res pessoais, ambientais e pela forma como o traba-
lho está organizado. No entanto vai além do trabalho 
em

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