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Aula 2 - Texto complementar

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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO 
DEPARTAMENTO DE AGROTECNOLOGIA E CIÊNCIAS SOCIAIS 
FILOSOFIA DA CIÊNCIA E METODOLOGIA CIENTÍFICA 
PROF. REMERSON R. MARTINS 
 
O texto seguinte foi retirado do livro A redação de trabalhos acadêmicos: teoria e prática, de Claudio Cezar 
Henriques. É um texto muito leve e gostoso de se lê. (Re)Leia-o com atenção e responda as questões inseridas ao 
longo e ao final do texto. Bom trabalho. 
 
A linguagem e a norma 
Claudio Cezar Henriques 
(...) Deixa que eu seja o céu 
E receba o que seja seu. 
Anoiteça e amanheça eu. (Beija eu, Marisa Monte) 
Pro pessoal sacar logo de cara que língua a gente precisa botar no papel na hora que a coisa vale nota, vou 
dizer o seguinte: quando tiver que entregar uma parada por escrito pra alguém, o negócio é maneirar no português. 
Falou? 
Você entendeu o que escrevi no primeiro parágrafo? Qualquer que seja sua resposta, por favor continue lendo, 
pois essa história de “maneirar no português” não significa simplesmente dizer: “capricha na gramática!” ou “escreve 
complicado!” O assunto tem repercussões muito mais importantes do que isso. 
1. Todo texto possui uma mensagem, pensando nisso marque entre as opções abaixo aquela que melhor descreve a 
mensagem presente nos dois parágrafos acima. 
a) O autor afirma que não é preciso conhecer a gramática para escrever um texto que “vale nota”. 
b) Ao contrário do item anterior, o autor afirma que é necessário conhecer muito bem a gramática (“capricha na 
gramática!”) para se escrever um texto que “vale nota”. 
c) O autor escreve com estilos diferentes como forma de mostrar que há mais de uma maneira de se comunicar 
na língua portuguesa. 
d) O autor escreve o primeiro parágrafo de forma mais informal para chamar a atenção do leitor jovem, que está 
cada vez mais distante dos livros. 
 
O professor Evanildo Bechara não foi o primeiro a dizer, mas certamente foi ele quem popularizou nos 
estudos lingüísticos a afirmação: “É preciso que o indivíduo seja um poliglota em sua própria língua”. A frase, não 
exatamente com essas palavras, está no livrinho Ensino da gramática: opressão? Liberdade? E envolve uma polêmica 
muito importante para nossa vida em sociedade. Afinal, a língua que a escola ensina é a língua culta, a língua da classe 
dominante? A leitura do texto introdutório deste livro poderá fornecer um bom material para a discussão desse e de 
outros temas correlatos. 
Aqui, vamos falar um pouco dos textos científicos que o aluno de graduação ou pós-graduação vai escrever 
durante sua vida acadêmica, que são escritos num registro de linguagem equivalente ao dos livros e artigos técnicos 
que ele lerá ao longo de sua formação. Esse é o habitat da linguagem científica, que não pode ser confundido com o 
do bate-papo, da música popular, da literatura ou do jornal. Para conviver nesse ambiente, como em qualquer dos 
demais, é preciso entender as regras do jogo – neste caso, lingüístico. 
 
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2. Marque entre as opções abaixo aquela que melhor corresponda às palavras a serem sublinhadas no parágrafo 
acima. 
a) “textos científicos que o aluno de graduação ou pós-graduação vai escrever durante sua vida acadêmica”, 
“linguagem equivalente ao dos livros e artigos técnicos que ele lerá ao longo de sua formação”, “habitat da 
linguagem científica”, “preciso entender as regras do jogo”. 
b) “textos científicos”, “aluno”, “escrever”, “linguagem científica”, “regras do jogo”. 
c) “textos científicos que o aluno de graduação ou pós-graduação vai escrever durante sua vida acadêmica”, 
“linguagem equivalente ao dos livros e artigos técnicos”, “habitat da linguagem científica”, “não pode ser 
confundido com o do bate-papo, da música popular, da literatura ou do jornal”, “é preciso entender as regras 
do jogo – neste caso, lingüístico”. 
d) “textos científicos”, “graduação ou pós-graduação”, “vida acadêmica”, “habitat”, “confundido”, “bate-
papo”, “jogo”, “lingüístico”. 
 
Em primeiro lugar, vamos explicar que a expressão língua culta não é das mais felizes. Melhor seria dizer 
língua padrão, pois emprega o adjetivo “culta” pode contribuir para reforçar o preconceito lingüístico da sociedade. 
Está no Dicionário Houaiss: 
Culto: (...) Adj. 7. Que se cultivou; cultivado; 8. Que alcançou estágio superior de civilização: civilizado, avançado; 9. 
Por metáfora, que tem cultura (cabedal de conhecimento): cultivado, ilustrado, instruído; 10. LING, que segue o padrão 
formal, erudito – por oposição a corrente; 11. SLING, próprio das pessoas cultas, escolarizadas (...) [ETIM. lat. cultus, a, 
um „culto, cultivo‟ (...)] Ant. analfabeto, desculto, desletrado, iletrado, incivilizado, inculto (...) 
Observe então que as pessoas podem achar que essa norma culta de que se fala em provas, editais e que se 
estuda nas salas de aula é uma espécie de sonho de consumo para qualquer indivíduo. Afinal, por que alguém não 
gostaria de, em sentido geral, “alcançar um estágio superior de civilização” e de, numa acepção sociolingüística, usar 
uma língua que seja “própria das pessoas cultas, escolarizadas”? 
Esse raciocínio talvez ajude a explicar a espécie de complexo de inferioridade que campeia em muitas 
sociedades. No imaginário da nossa, por exemplo, parece predominante a idéia de que as pessoas não sabem 
português, que a nossa língua é muito difícil, que foi o brasileiro que deturpou a língua portuguesa... 
Agora, pense nas pessoas cultas, escolarizadas, que você conhece e se lembre do modo como elas falam ou 
escrevem. As palavras e estruturas sintáticas que elas empregam é que caracterizam na prática o que se poderia 
chamar de a verdadeira língua culta da sociedade brasileira contemporânea, um “modelo” que não é levado em conta 
no ensino da língua portuguesa – e dificilmente poderia ser posto em prática, por motivos que não cabe aqui enumerar. 
Isso significa então, de um certo modo, que as pessoas cultas não empregam a chamada “língua culta”. Para 
ilustrar a afirmação, recordemos quantas foram às vezes em que precisamos “tirar uma dúvida de português”, 
consultar uma gramática ou um dicionário, etc. isso quando não recorremos aos especialistas de plantão, disponíveis 
em seções especializadas (ou seriam sessões?) de jornais, em consultórios gramaticais (e até em lanchonetes), todos se 
apresentando como suprema autoridade a respeito dos fatos da língua. 
Vamos correr atrás do prejuízo? Não, dizem os donos da língua, porque ninguém quer o prejuízo, mas o lucro. 
E o cidadão pergunta: Por que eu não posso correr atrás do prejuízo do mesmo jeito que posso correr atrás do ladrão: 
só para pegá-lo/prendê-lo e acabar com ele/entregá-lo à polícia? Ou será que alguém poderia literalmente “correr atrás 
do lucro”? Isso é apenas um exemplo de como é perigoso acreditar nas afirmações que nos passam. Os gramatiqueiros 
anticonotativistas e os anarquistas vanguardeiros estão em toda parte: é preciso ficar alerta e analisar com 
conhecimento de causa o que nos dizem a respeito dos usos de linguagem – inclusive aqui neste livro. 
 
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3. Todo texto possui uma idéia central, mesmo dentro de um parágrafo isso existe. Marque a opção que melhor indica 
qual é a frase/idéia central do parágrafo acima. 
a) “Vamos correr atrás do prejuízo?” 
b) “Por que eu não posso correr atrás do prejuízo do mesmo jeito que posso correr atrás do ladrão:” 
c) “Isso é apenas um exemplo de como é perigoso acreditar nas afirmações que nos passam.” 
d) “é preciso ficar alerta e analisar com conhecimento de causa o que nos dizem a respeito dos usos de 
linguagem” 
 
Agora... Só é possível adquirir esse conhecimento de causa sobre a língua padrão com a continuidade dos 
estudos de gramática, o hábito da leitura e da interpretação crítica e com a prática da produção detextos de formatos e 
modalidades variados. Não é admissível que alguém ainda ache que as pessoas devem escrever do jeito como falam. E 
também que precisam falar da mesma maneira como deveriam escrever. 
4. Marque a opção que melhor esquematiza o parágrafo acima. 
a) 
b) 
c) 
d) 
 
Por esses motivos, o trabalho acadêmico não depende apenas do domínio do conteúdo a ser exposto. Depende 
também do domínio das estruturas sintáticas do português, do enriquecimento do vocabulário e da capacidade 
expressiva. 
A língua padrão é uma norma como outra qualquer e, no caso dos textos científicos, é a forma praticada para a 
comunicação. Aliás, na evolução da língua, é a forma padrão a que mais lentamente se modifica. A definição do 
Dicionário Houaiss diz: 
Padrão: S.m.1. base de comparação, algo que o consenso geral ou um determinado órgão oficial consagrou como um 
modelo aprovado; (...) 5. Regra ou princípio usado como base de julgamento; (...) LING. modelo de uma estrutura da 
língua; esquema (...) [ETIM. Lat. Patronus, i’ patrono, protetor dos plebeus; advogado, defensor; fig. Arrimo, apoio] (...) 
Sin.\Var. ver sinonímia de modelo. 
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A confecção do texto acadêmico é, em última análise, um aspecto formal e, nesse sentido, deve ser tratado 
com o rigor das situações formais. Isso significa saber quando usar (ou por que não usar) longos vestidos rodados, 
perucas coloridas, sombrinhas ou pince-nez... microssaias, badulaques, tatuagens e piercings... 
A dosagem poderia ficar assim resumida: 
 Escrever o texto observando regências e concordâncias, colocações e tratamentos, não abusando das repetições 
nem dos chavões, alcançando coerência e coesões, parágrafos argumentativos e arrazoados dissertativos, atacando 
ou defendendo, lendo e relendo, mas sempre expondo de forma crítica o conteúdo propriamente dito; 
 Levar em consideração, também, os níveis de linguagem, as variações individuais, sociais e regionais, de modo a 
concretizar a gestão orgânica do trabalho a ser avaliado; 
 Ter em mente que esse tipo de texto inclui a figura de um leitor marcado, que, contrariando a estética da recepção, 
não tem nada de hipotético e diante do qual o autor do trabalho acadêmico precisa assumir todos os prós e contras 
decorrentes dessa ostensiva presença; 
 Observar, mas sem exageros, as zeugmas e as elipses, as ressalvas e os “não-pretendemos”, avaliando até que 
ponto se pode adotar o que chamo de estilo preventivo, com o qual é possível recorrer a um estoque de expressões 
de postergamento (ex.: este é um trabalho preliminar acerca de...), autodefesa (ex.: não é nosso objetivo, neste 
trabalho,...) ou neutralidade (ex.: opiniões defensáveis, que comprovam como este assunto é controvertido...). 
Friso ainda a atenção que se deve dar as registros normalmente inseridos em trabalhos de graduação e de pós-
graduação: citações, ilustrações, notas bibliográficas e pessoais, etc. Costuma-se, para esses itens, seguir uma série de 
outras determinações. Muitas delas tomam, às vezes, ares de paranóia formal e, por esse motivo, se juntam 
harmoniosamente aos ataques psicóticos naturais daquelas regras obsessivas impostas pelos detentores da presumida 
sabedoria universitária e gramatical. 
5. A opção que melhor resume o parágrafo acima é: 
a) Os trabalhos de graduação e de pós-graduação possuem registros normalmente inseridos como citações, 
ilustrações, notas bibliográficas e pessoais, etc. Para esses itens há uma série de outras determinações. Muitas 
delas tomam ares de paranóia formal e se juntam aos ataques psicóticos daquelas regras obsessivas impostas 
pelos detentores da sabedoria universitária e gramatical. 
b) Os trabalhos acadêmicos devem seguir regras próprias sobre a redação de trabalhos científicos. Essas regras 
obedecem às normas estabelecidas pela ABNT para elaboração de citações, referencias bibliográficas, etc. 
Sendo tão importantes quanto as regras gramaticais. 
c) Existe muita gente na universidade que se acha dono da verdade. Eles ficam cobrando regras absurdas acerca 
da gramática ou da redação de trabalhos científicos, sempre procurando obsessivamente erros nos trabalhos 
dos outros. Essas pessoas, que se julgam detentores da sabedoria universitária e gramatical, deveriam se 
preocupar mais consigo mesmo e menos com a vida alheia. 
d) Nos trabalhos acadêmicos devem-se estar atento também às regras para as citações, ilustrações, notas 
bibliográficas ou pessoas, etc. Essas regras podem se juntar às regras gramaticais, assumindo uma conotação 
obsessiva ou paranóica por aqueles que se presumem portadores desse saber. 
 
Menos mal que já se constata nos meios acadêmicos de hoje um tratamento mais pedagógico do que carcerário 
quanto à padronização dos trabalhos acadêmicos, o que garante alguma tranqüilidade para o estudante-autor. Porém, 
acrescento que, se no ensino médio a gramática não podia mesmo ser enfocada unicamente como um estudo 
metalingüístico, exceto nas ocasiões explícitas de necessidade, o mesmo não se pode dizer em relação aos 
profissionais das mais diversas áreas, que precisam utilizar a língua portuguesa como uma das ferramentas para sua 
carreira. 
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E, por fim, se este texto, que se aproxima de seu desfecho, puder servir para alguma coisa, que seja pelo 
menos para exemplificar uma modalidade de expressão dotada de “estruturas bem formadas”, adequadas 
gramaticalmente aos seus objetivos – caso explícito de metalinguagem, mesmo que artesanal e de valor discutível... 
Tipo Marisa Monte. Tipo Pixinguinha. Falou? 
(...) Depois de remir seus desejos 
Em nuvens de beijos 
Hei de envolver-te até meu padecer 
De todo fenecer. (Rosa, de Pixinguinha e Otávio de Souza) 
6. Agora após a (re)leitura de todo o texto e respondido as questões acima escreva um pequena resenha desse texto no espaço 
abaixo (é melhor fazer um rascunho primeiro e só depois passar a limpo aqui). Utilize a internet para descobrir que é o autor 
desse texto. 
 
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____________________________________________________________________________________________Referência Bibliográfica 
HENRIQUES, C. L. C. A linguagem e a norma. In: HENRIQUES, C. C.; SIMÕES, D. (Ed.). A redação de trabalhos 
acadêmicos: teoria e prática. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2008. Cap.1. p. 23-29.

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