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O PAPEL IMUNOLÓGICO DO ANEL LINFÁTICO DE WALDEYER

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O PAPEL IMUNOLÓGICO DO ANEL LINFÁTICO DE WALDEYER 
Autor(es): JAIR CORTEZ MONTOVANI-1 
AFONSO DO CARMO JAVARONI-2 
Resumo: 
A entrada de muitos agentes infecciosos é feita pelas vias aéreas superiores, com o 
envolvimento da mucosa respiratória e do anel linfático de Waldeyer. Este é constituído, 
basicamente, por tecido imunologicamente competente. Por sua localização anatômica e 
devido ao contato íntimo e constante com o meio externo, constitui sítio primário de 
exposição para os antígenos. 
 
Introdução 
 
A resposta imune caracteriza-se por uma série de fenômenos, iniciados pela interação entre 
o antígeno e a célula imunocompetente (4). Basicamente, há dois tipos de resposta imune: 
celular, associada com linfócitos timodependentes (T) e humoral, mediada por anticorpos 
produzidos por plasmócitos, oriundos dos linfócitos B (4). 
 
Gell e Coombs, em 1963, conforme citação de Altamann (2) propuseram um esquema para a 
classificação das respostas imunitárias, proporcionando um substrato para compreensão dos 
mecanismos de hipersensibilidade e das doenças em que intervêm os processos imunológicos 
(2). 
 
A função de defesa do organismo, há muito tempo, tem sido atribuída ao sistema 
retículoendotelial (SRE), cujos componentes se situam em diversos níveis:. linfo-epitelial 
(anel linfático de Waldeyer, placas de Peyer); linfo-intersticial (glânglios linfáticos regionais e 
vias linfáticas) e linfo-hemático (timo, baço e medula óssea) (12). 
 
Esta revisão tem o propósito de relatar a importância da participação do anel linfático de 
Waldeyer nos mecanismos de imunidade. 
 
Anatomia do anel linfático de Waldeyer 
 
O termo amígdala (do grego amendoa) é empregado para denominação das formações 
linfóides situadas no istmo da garganta e, convencionalmente, esse termo é utilizado para 
denominar outros conglomerados do anel, ainda que nem ao menos lembrem a morfologia de 
uma amêndoa (7). 
 
O anel linfático de Waldeyer compõe-se das. seguintes estruturas: amígdalas palatinas, 
amígdalas faríngeas (ou de Luscka) , amígdalas tubáricas (ou de Guerlach), amígdala lingual, 
amígdala laríngea e formações linfóides difusas nas paredes da faringe (8, 13). 
 
A amígdala palatina é órgão par, localizado no vestíbulo da faringe, dentro da loja 
amigdaliana, limitada pelos arcos palatoglosso, palatofaríngeo e pela língua (5). 
 
Participa, ao mesmo tempo, do processo respiratório e da deglutição. Apresenta sulcos e 
criptas revestidos por tecido epitelial pavimentoso estratificado. Essas criptas põem em 
contacto o antígeno com o parênquima. Esse conteúdo pode ser espremido pelos movimentos 
de deglutição e ser removido pelo fluxo salivar (13). 
 
A adenóíde (ou amígdala faríngea) é uma massa de tecido linfóide, incrustada na mucosa da 
parede posterior da nasofaringe (5). Como, quase sempre, a adenoidectomia é feita em 
conjunto com a amigdalectomia, pouca informação existe sobre aspectos clínicos, 
imunológicos e epidemiológicos (referentes ás adenóides) (8). 
 
A mucosa nasofaríngea, as amígdalas palatinas, e a adenóide estão repletas de tecido 
imunocompetente e, portanto, possuem elementos para a formação de anticorpos (1) e 
células imunocompetentes. 
 
A população celular consiste de células linfóides (80-90%), células plasmáticas (5-20%) e 
um pequeno número de monócitos e polimorfonucleares. Os linfócitos podem ser 
diferenciados em duas subpopulações: linfócitos B e linfócitos T (8, 16). 
 
Para a maioria dos autores (4, 12), os tecidos linfáticos do anel não possuem vasos linfáticos 
aferentes. Por esta 'razão, as criptas e os sulcos levam ao aumento da superfície de contato 
para aumentar a possibilidade de estímulo antigênico, pois a cripta é o local de contato entre 
o antígeno procedente da cavidade oral ou nasal e o anticorpo específico, produzido pela 
célula imunologicamente competente da amígdala (11). 
 
Fatores de proteção da mucosa e estimulação antigênica da amígdala 
 
A mucosa respiratória não constitui uma simples e inerte barreira mecânica a invasores mas 
um sistema complicado para a defesa do organismo contra agressões externas; as defesas 
da mucosa são representadas por (9): 
 
- filme mucoso: com atividade mecânica de fixação por viscosidade, ou químico pela ação de 
fulcomucinas, lisosimas, interferon, enzimas como amilase salivar; -movimento ciliar; -
epitélio e membrana basal; lâmina própria; 
 
- linfócitos T e B e demais células do sistema retículo-endotelial; 
 
- fatores específicos como: IgA, IgG, IgM, IgE (9). A IgA encontrada na amígdala é do tipo 
secretor 11S, embora 7S também possa ser detectado (8). A IgA é a primeira linha de defesa 
e é o mais importante dos anticorpos locais (1, 8, 9). É produzida no plasma e, na célula 
epitelial, é conjugada com a peça secretora, formando a IgA 11S (3), o que facilita sua 
passagem pelas barreiras e lhe confere maior resistência à atividade proteolítica (9). Ora 
(1I) mostra que as IgA, IgG, IgM, localizam-se preferencialmente ao nível das criptas. 
 
Segundo Hong (1974), citado por Suassuna (15), a "IgA é conhecida como uma 
imunoglobulina há 15 anos, atingindo pois a sua tormentosa adolescência e como uma 
adolescente neste momento, parece impossível de compreender, mas fascinante para 
estudar". 
 
A IgA secretora e a resposta mediada por célula pode ser preferencialmente estimulada 
quando o antígeno é aplicado diretamente no trato respiratório (6). 
 
Também pode responder a uma estimulação antigênica sistêmica (1), por via sangüínea. A 
amígdala participaria, como outros órgãos linfóides, na elaboração de respostas imunitárias, 
sendo os folícuios paracapsulares os preferencialmente ativados (13). Além da função local, 
elas podem ser uma fonte de mensagens imunológicas, para propagação de resposta imune 
em órgãos linfóides primitivos (8). 
 
Para Pitois (13), a amígdala se situa como gânglio satélite, tendo afluentes linfáticos 
provenientes das fossas nasais. Contrariando outros autores (4, 7, 12), esta opinião 
fundamenta-se no intumescimento da amígdala, ao longo das infecções das vias aéreas 
superiores (13). 
 
1. Desenvolvimento da reação humoral 
 
 
Citado por Orti (11), Schenk, em 1955, assinalou que a produção de anticorpos, no anel 
linfático de Waldeyer, seguia os mesmos padrões de outras estruturas linfóides do 
organismo. No primeiro contato com o antígeno, no fólículo, haveria a formação de um 
centro claro e, após um segundo contato, os linfócitos da memória imunológica levariam a 
uma reação blástica explosiva, com formação de linfócitos de memória, linfócitos KdIer e 
plasmócitos (13). 
 
Algaba (1) relata que Chiappino e Corbetta, em 1962, encontraram abundante qualidade de 
gamaglobulina nos centros germinativos, nas criptas e no tecido intercriptonodular. Rosen 
(1968) sugeria que as imunoglobulinas presentes nas secreções orais e respiratórias podiam 
ser sintetizadas localmente sem entrar no pool das imunoglobulinas plasmáticas. Surjam 
(1970) demonstrou a produção de anticorpos nas amígdalas e que a produção desses 
anticorpos dependeria do lugar de administração do antígeno. A amígdala também reagiria a 
estímulos gerais, através de linfócitos mensageiros. 
 
Ogra (10) demonstrou que os níveis de IgA secretora específica para poliovírus, na 
nasofaringe, decresceram significativamente após adenoamigdalectomia, particularmente em 
crianças pequenas. 
 
Tarasow (1976), segundo Orti (11), observou diminuição das taxas séricas da IgA e IgG após 
amigdalectomia em sujeitos com tonsilite tóxica alérgica. 
 
Morag (8) considera a amígdala como a primeira linha de defesa contra infecções 
respiratórias. Estudos epidemiológicos têm, claramente, demonstrado aumento da incidência 
de paralisia por poliovírus após adenoamigdalectomia. 
 
Segundo citação de Tabata (16), Pollial, em 1973, anunciou distribuição entre linfócitos T e B 
do sangue periférico,sob microscopia eletrônica. O próprio Tabata, em 1974, relatou 
subpopulações de linfócitos na amígdala humana que seriam capazes de formar rosetas com 
hemácias de carneiro. Este autor, em 1975, realizou estudos sobre o aspecto superficial dos 
linfócitos humanos da amígdala, com auxílio da microscopia eletrônica. Demonstrou que as 
amígdalas palatinas são os principais elementos que contribuem na defesa imunológica, pela 
produção de células que contêm anticorpos específicos (16). 
 
Algaba e Grado, em 1976 (1), fazendo estudos sobre a distribuição das imunoglobulinas nas 
amígdalas palatinas, demonstraram que as amígdalas produziam todas as imunoglobulinas, 
devendo então ser consideradas como órgãos potencialmente importantes nas reações 
imunes, em infecções locais da nasofaringe ou em reações imunitárias sistêmicas. Estes 
autores relacionam, ainda, que o aumento máximo de imunoglobulinas está ligado a uma 
maior atividade defensiva, que ocorre na infância. Tal fato está relacionado na maioria das 
vezes a uma hipertrofia amigdaliana, mas não explica as crianças com hipermetropia 
amigdaliana e com resistência diminuída. 
 
2. A amígdala palatina e imunidade mediada por célula palatina participa ao piocesso de 
imunidade mediada por célula, com entrada de linfócitos e do complemento, eventualmente. 
Seja como for, a amígdala participa dentro da cadeia de reações da imunidade celular, na 
depuração de células desviadas do organismo (rejeição de enxertos, doenças auto-imunes, 
por exemplo). 
 
Moraget ali (8) sugeriram que a incidência da doença de I4odgkin deve ser mais alta entre os 
indivíduos amigdalectomizados, sendo que o mecanismo de associação não está claro. 
 
Vianna (17) descreveu que a amigdalectomia aumenta de 2,9 vezes a suscetibilidade para o 
desenvolvimento da doença de Hodgkin. 
 
Hurtado et alii (6) mostraram que os linfócitos das amígdalas possuem características 
semelhantes aos circulantes para qualquer tipo de estimulação, sendo que os resultados dos 
seus trabalhos indicam que tanto a IgA secretora como a resposta por célula podem ser 
preferencialmente estimuladas, quando o antígeno é aplicado diretamente no trato 
respiratório. Mostraram, também, que as amígdalas são a primeira estrutura linfóide a entrar 
em contato com infecção viral, localizada ou sistêmica. 
 
2. Adenóides e sistema imune: 
 
Para Morag (8), apesar das poucas informações existentes, a adenóide é submetida aos 
mesmos estímulos antigênicos da amígdala palatina, sendo imunologicamente reativas e sua 
função seria apenas a de minimizar a resposta imune no local. 
 
Rynnel--Dagoo (14) assinala que a adenóide tem mais células B que o sangue periférico, e as 
células T estão em menor quantidade, concluindo que as amígdalas palatinas, como as 
adenóides, agiriam como barreira contra infecções locais. Demonstrou, por microscopia 
eletrônica, que a adenóide possui células dendríticas, cuja função seria reter o antígeno. 
Também levantou a questão se o alto número de linfócitos B tem relação na produção de 
imunoglobulinas nas adenóides. 
 
Algaba (1) cita que Crobbe e Herimam, em 1967, descreveram que, nas vegetações 
adenóides, as imunoglobulinas G estão em maior quantidade, seguidas das IgA e IgM. Não 
encontraram diferenças segundo a idade. 
 
Branefois e Holander , segundo Rynnel-Dagoo (14), demonstraram que 
hipogamaglobulinemia é raramente encontrada nos casos de hipertrofia adenóide. 
 
Conclusão 
 
O anel linfático de Waldeyer mostra-se como um conjunto de tecido linfóide, envolvido pelas 
malhas de um retículo de elasticidade submetido constante e continuadamente a agentes 
agressores, reagindo a essas injúrias através de reposta imune, quer humoral quer celular, 
participando dessa forma do pool dos mecanismos de defesa do organismo. 
 
Portanto, a indicação da adenoamigdalectomia antes dos sete anos deverá ser muito 
refletida, não devendo constituir-se em prática diária, mas exceção.

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