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Pesquisa e Publicação - Tratado de Medicina de Família e Comunidade (Gusso) 2012 - Capítulos 55

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~ CAPÍTULO 55 
ORIENTAÇÕES BÁSICAS PARA 
PESQUISA QUANTITATIVA 
Paulo V. N. Fontanive 
Liége Teixeira Fontanive 
Aspectos-chave 
..,. Um dos fundamentos mais importantes em pesquisa quantitativa 
é estabelecer claramente a questão de pesquisa, os sujeitos de es-
tudos e a metodologia de mensuração (escolha das técn icas, dos 
desfechos e das variáveis em análise). 
..,. As características e os atributos essenciais de questões de pesquisa 
estão listadas na Tabela 55.1. 
Caso clínico 
..,. A pesquisa quantitativa deve considerar, em especial, a importancia 
de etapas preparatórias à execução, como o cálculo do tamanho 
da amostra, bem como avaliar o método de amostragem escolhi-
do, verificar o número de variáveis independentes mensuradas para 
montagem dos modelos estatísticos e avaliar o t ipo de desfecho ou 
variável dependente que está sendo usado (surrogate endpoínts ou 
desfechos clínicos orientados à pessoa). 
Estudo realizado por uma Unidade de Saúde do município de Florianópolis buscou informações contidas nos prontuários para avaliar os níveis 
de colesterol em uma amostra de indivíduos por meio de seus prontuários. A amostra de conveniência era de pessoas que consultavam na Uni-
dade de Saúde ao menos 2 vezes ao ano. De acordo com o SIAB, a população de 60 anos ou mais era superior a 18%, ou seja, uma população 
com características de envelhecimento. A hipótese era de que a média de colesterol total no sangue encontrado na amostra era superior a 200 
mg/dl (valor verificado em pessoas sadias). A média encontrada foi de 184 mg/dL entre os 88 indivíduos avaliados. Como pode-se considerar 
essa informação? Para isso, deve-se considerar o desvio-padrão como 45 mg/dL, um erro a de 0,05 e que o valor encontrado para o intervalo 
de confiança foi (196,3 - 174,4). 
Teste seu conhecimento 
1 O estudo realizado verificou que: 
a) A hipótese de nulidade foi aceita. 
b) A média encontrada na amostra não permitiu verificar diferen-
ça estatisticamente significativa aos parametros citados. 
c) A hipótese de nulidade foi rejeitada. 
d) Apenas se o erro t ipo a considerado fosse de 0,2, poder-se-
-ia afirmar que a amostra apresentou média estatisticamente 
inferior aos parametros. 
2 Quanto à fonte de dados, podem-se considerar: 
a) Dados primários de levantamentos contínuos. 
b) Dados primários de levantamentos ocasionais. 
c) Dados secundários de levantamentos periódicos. 
d) Dados secundários de levantamentos ocasionais. 
3 Diante das informações do caso, pode-se afirmar que o delinea-
mento do estudo em questão é um: 
a) Estudo ecológico. 
b) Estudo de caso-controle. 
c) Estudo de coorte histórica. 
d) Estudo transversal. 
4 De acordo com os achados do estudo, é possível inferir que: 
a) Em geral, indivíduos em acompanhamento em serviços de APS 
apresentavam valores de colesterol total no sangue dentro de 
níveis sadios. 
Tabela 55.1 
CARACTER(STICAS E ATRIBUTOS ESSENCIAIS DE 
QUESTÕES DE PESQUISA 
Atributo 
Factível 
Interessante 
Inovadora 
~tica 
Relevante 
Subdimensões relacionadas 
- Número adequado de sujeitos de pesquisa com po-
der (1 - ~)adequado 
- Domínio da técnica adequada 
- Viabilidade logística (tempo e recursos financeiros 
adequados) 
- Escopo manejável adequado a capacidade dos pes-
quisadores 
- Tema de interesse para o investigador 
- Confirma ou refuta achados anteriores 
- Expande conhecimentos anteriores 
- Fornece novos achados 
- A questão de pesquisa atende aos princípios éticos. 
- Para o conhecimento científico 
- Para diretrizes clínicas em saúde 
- Para direcionamentos futuros de pesquisas 
A elaboração do plano de estudo ou do anteprojeto é uma 
oportunidade para refinar e clarear as questões de pesquisa. 
, 
E nessa etapa que são vislumbrados potenciais problemas na 
execução da pesquisa. Quando a questão de pesquisa não 
atende aos atributos listados anteriormente, pode haver o uso 
de técnicas e modelos de estudo que suplantam a habilidade 
do pesquisador - limitação no número de sujeitos disponí-
veis, custo elevado ou ainda uma questão de pesquisa muito 
, 
ampla ou não factível. E importante salientar que os delinea-
mentos em pesquisa quantitativa possibilitam que esses pro-
blemas sejam contornados mediante a redução no número de 
variáveis, a redução no escopo da questão, a flexibilização 
dos critérios de escolha por meio de outras fontes de ingresso 
de sujeitos ou a redefinição dos critérios de exclusão, revisan-
do a literatura que enfoca o uso do modelo de pesquisa e das 
técnicas a serem adotados, entre outras formas de adequar 
a questão de pesquisa. Nesse sentido, pretende-se com este 
b) A distribuição da ocorrência de idosos e de crianças não se 
configura em um viés de seleção na pesquisa. 
c) A opção por uma amostra de conveniência não limita a valida-
de externa do estudo. 
d) A amostra de indivíduos avaliados apresentou o colesterol total 
dentro de limites saudáveis em média. 
P ·v 'p ·e 'p ·z ') · ~ 
seisodsa~ 
capítulo abordar inúmeras questões que são fundamentais ao 
desenvolvimento da pesquisa quantitativa voltada à Atenção 
Primária. 
Para pesquisadores com alguma experiência, as questões 
de pesquisa mais relevantes surgem de achados e de proble-
mas verificados em pesquisas anteriores. Para pesquisadores 
iniciantes, buscas na literatura mediante overviews e revisões 
sistemáticas podem ser fontes de questões de pesquisa. Outras 
fontes comumente citadas são fóruns, seminários de discus-
são, congressos e a prática clínica do cotidiano. 
~ VIESES 
A tendência a produzir resultados que se afastem sistemati-
camente dos valores verdadeiros denomina-se viés. Todo tipo 
de tendência que pode levar a conclusões que sejam sistemati-
camente diferentes da verdade como tendências na coleta, na 
análise, na publicação e na revisão de dados podem assim ser 
denominadas. Os vieses podem ser chamados também de erros 
sistemáticos. 
Viés de seleção ~ ocorre quando as comparações entre gru-
pos de pessoas diferem não pelos principais fatores em estudo, 
mas por outros, que podem afetar o desfecho, p. ex., idade, 
sexo, gravidade da doença, entre outros. 
Viés de aferição ~ ocorre quando os métodos de avaliação/ 
aferição são diversos entre os diferentes grupos de pessoas. 
Viés de confusão ~pode ocorrer em virtude da presença 
de uma variável interveniente ou confundidora, que pode estar 
mascarando o efeito de um fator em estudo sobre o desfecho. 
Dessa forma, o efeito de um pode ser confundido ou distorcido 
pelo efeito do outro. Cabe salientar que uma variável não será 
confundidora se estiver diretamente entre a causa e o efeito. 
Acaso ~ a divergência entre os resultados em uma amostra 
e o valor verdadeiro na população, devido exclusivamente ao 
acaso, chama-se variação aleatória. 
~ AMOSTRAGEM E CÁLCULO DE 
TAMANHO DE AMOSTRA 
Para que os procedimentos estatísticos sejam adequadamen-
te executados, alguns processos devem ser rigorosamente 
seguidos. A escolha pelo método de amostragem e o cálculo 
do tamanho da amostra são etapas fundamentais ao desenvol-
vimento da pesquisa quantitativa. A amostragem pode ser de 
inúmeros tipos, entre os quais pode-se relacionar: 
• Amostra de conveniência (não probabilística): é estabele-
cida mediante critérios do pesquisador. No entanto, apre-
senta limitação quanto à validade interna da população em 
estudo (representatividade) e risco para potenciais vieses. 
• Amostras aleatórias: vale-se da aleatorização da escolha 
dos indivíduos da amostra para garantir a representati-
vidade destes para a população estudada e a distribuição 
aleatória das variáveis de interesse ou intervenientes. 
Amostra aleatória simples: é obtida pela numeração 
simples da população e pela escolha aleatória dos in-
divíduos da amostra. Por exemplo, a tabelade número 
aleatórios e sorteio simples. 
Amostra aleatória estratificada: a aleatorização se dá 
após a delimitação de estratos populacionais de interes-
se para o pesquisador ou em que as incidências de agra-
vos ocorrem de formas diferenciadas entre os subgru-
pos: sexo, cor, grau de instrução e outras características. 
Amostra por conglomerados: a aleatorização se dá 
em dois momentos, após a seleção de agrupamentos 
naturais de indivíduos (p. ex., escolas, quarteirões, se-
tores censitários) e, após a listagem dos indivíduos e 
dos domicílios, uma nova seleção. O uso desse método 
é útil em casos em que a população de estudo é muito 
dispersa abrangendo grande área territorial. 
• Amostras sistemáticas: obtidas por uma amostra simples 
aleatória, apresentam, porém, um componente de perio-
dicidade pré-estabelecido. Esse tipo de amostragem tem 
como risco a ocorrência de viés de seleção em função das 
periodicidades naturais humanas que permitem atuar 
sobre o resultado da amostra final resultante (devido à 
previsibilidade). 
Para cálculo do tamanho da amostra, algumas informa-
, 
ções deverão ser delimitadas pelo pesquisador. E necessário 
saber qual o tamanho da população em estudo, qual o valor do 
erro tipo I que será usado (ou erro tipo a) e do erro tipo II (ou 
13) e por consequência o poder estatístico. Outra informação 
importante é a magnitude do evento como, por exemplo, a pre-
valência do problema que será investigado. 
Todo investigador deve partir de uma hipótese sobre a 
questão a ser pesquisada. Em geral, parte-se do princípio de 
que não existe associação entre a variável independente ou 
preditora e o desfecho ou variável dependente na população 
em estudo. Quando essa hipótese é verificada, pode-se afir-
mar que a hipótese inicial nula ou de igualdade foi aceita. 
O erro tipo I diz respeito à probabilidade de rejeitar-se a 
hipótese nula de que não existe diferença entre as populações 
estudadas quando ela é verdadeira (falso-positivo). Ou seja, 
verifica-se que há diferença quando efetivamente não há. Já 
o erro tipo II, ou 13, ocorre quando aceita-se a hipótese nula, 
quando, na verdade, ela deveria ser rejeitada (falso-negativo). 
Antes de iniciar o estudo, o pesquisador deve determinar o 
nível de significância estatística máximo tolerado (tipo I) e 
a probabilidade para o erro tipo II. A Tabela 55.2, a seguir, 
exemplifica em que condições se verificam os erros. 
As técnicas para determinar o tamanho de amostra po-
dem variar ainda conforme o delineamento de pesquisa (estu-
dos descritivos, analíticos e experimentais), conforme os tipos 
de variáveis no desfecho ou na variável preditora e conforme 
a direcionalidade dos valores encontrados para os desfechos. 
A Tabela 55.3, a seguir, sintetiza os tipos de testes estatísticos 
Tabela 55.2 
CONDIÇÕES DE VERIFICAÇÃO DE ERROS 
Resultados na 
amostra do 
estudo Verdade na população 
Associação entre 
o preditor e o 
desfecho 
Rejeitam a hipó- Correta 
tese nula. 
Não rejeitam a Erro Tipo li 
hipótese nula. 
Tabela 55.3 
Ausênc.ia de associação 
entre o preditor e o 
desfecho 
Erro Tipo 1 
Correta 
TESTES ESTATISTICOS DE ACORDO COM AS VARIÁVEIS 
Variável 
independente Variável dependente 
Dicotômica Contínua 
Dicotômica Teste do Qui-quadrado Teste t 
Contínua Teste t Coeficiente de correlação 
de acordo com as variáveis encontradas no estudo. Com esses 
testes, é possível verificar o tamanho da amostra. 
Como visto, há inúmeras maneiras de se estimar o tama-
nho da amostra, mas todas apresentam os seguintes passos em 
comum: 
• Definir a hipótese de pesquisa (nula); 
• Selecionar o teste estatístico adequado conforme a tabela 
acima segundo o tipo de variável dependente e indepen-
dente; 
• Verificar a magnitude de efeito e se possível sua variabi-
lidade; 
• Estabelecer o nível de significância estatística (a- ou erro 
tipo I) e o erro tipo 13 (tipo II); 
• Utilizar uma das fórmulas de acordo com o delineamento 
de pesquisa e com as variáveis no estudo. 
.,_ CAUSALIDADE 
É importante salientar que as variáveis estudadas pelos diferen-
tes delineamentos devem apresentar associações estatísticas e 
atender aos critérios de causalidade. As associações causais en-
contradas devem atender aos seguintes critérios conforme Hill: 
• Força de associação; 
• Consistência (refere-se à repetição dos achados para dife-
rentes populações); 
• Especificidade (uma causa é específica para um determi-
nado efeito); 
• Temporalidade (a causa deve preceder o efeito); 
• Gradiente biológico (possuir curva dose-resposta); 
• Plausibilidade (o efeito verificado é plausível à luz dos co-
nhecimentos biológicos atuais); 
• Coerência (a causalidade encontrada não entra em conflito 
com conhecimento consolidado sobre a história natural da 
doença); 
• Evidência experimental (por questões éticas, é raramente 
disponível em estudos envolvendo populações humanas); 
• Analogia (se determinado efeito adverso foi observado em 
um fármaco similar ao do estudo em questão, por analo-
gia, supõe-se que o mesmo deve acontecer com o medica-
mento em estudo). 
.- DELINEAMENTOS DE ESTUDO 
Como colocado anteriormente, a transformação das hipó-
teses conceituais em hipóteses operacionais é intermediada 
pelos desenhos de estudo. Esses desenhos têm em comum 
a observação sistemática dos eventos de interesse, o uso de 
métodos estatísticos para interpretar os resultados e a com-
paração entre diferentes grupos para evidenciar associações 
estatísticas entre as variáveis. Cabe distinguir os diferentes 
tipos de população: 
• População de estudo ou amostra: grupo de indivíduos que 
são observados ou recebem intervenções; 
• População fonte (universo amostral): população represen-
tada pelo estudo; 
• População alvo: grupo a quem se destinam as inferências 
estatísticas. 
Os delineamentos de pesquisa diferem entre si no modo 
pelo qual selecionam suas unidades de observação/análise, 
mensuram os fatores de risco ou proteção, identificam as va-
riáveis de desfechos e asseguram a comparabilidade entre os 
Tabela 55A 
TAXONOMIA DOS DELINEAMENTOS DE PESQUISA 
Controle sobre 
diferentes grupos avaliados. A Tabela 55.4, a seguir, explicita 
as características de cada delineamento de estudo. 
Estudos transversais 
O estudo em questão diz respeito à coleta de dados observa-
cionais em um único momento em que os indivíduos são se-
lecionados da população fonte inteira (esquema completo). 
Apresenta limitada capacidade de inferência causal devido 
às características das coletas. Esse delineamento é mais apro-
priado para levantar hipóteses etiológicas ou para estimativas 
populacionais como prevalências e médias. 
Estudos de coorte 
Estudo em que indivíduos sem doença prévia são alocados 
em grupos conforme o grau de exposição a fatores de ris-
co ou de prognóstico. Esses indivíduos são acompanhados 
por determinado período para comparar a incidência de 
agravos entre os diferentes grupos. Essa coorte pode ser 
fixa ou dinâmica. Toda a população predefinida é obser-
vada (esquema de seleção completo), sendo as informações 
obtidas por indivíduo e não por conglomerado. Como há 
seguimento, a observação não é pontual como nos estudos 
transversais, portanto, considera-se as coortes como estu-
dos longitudinais. 
Estudos ecológicos 
Esse tipo de estudo avalia informações obtidas de forma sec-
cional e os analisa no nível de agregados. Nesse tipo de estudo, 
não se conhece a distribuição de doença e de exposição a fa-
tores de risco no nível individual. Esse tipo de estudo permite 
o levantamento de hipóteses para novos estudos com outros 
delineamentos. 
Unidade de Alocação de Tipo de 
Subtipos de a exposição ao Estratégia de análise ou Esquema de indivíduos fatorem 
estudo fator de risco observação observação seleção entregrupos estudo 
Transversal Observacionais Não Seccional Indivíduos Completo Não 
Casos e controles Observacionais Não Longitudinal Indivíduos Incompleto Não 
Coorte Observacionais Não Longitudinal Indivíduos Completo Não 
Ecológico Observacionais Não Seccional Comunidades Completo Não 
Quase-experimentais De intervenção Sim Indivíduos Sim, sem alea-
(semi experimentais) torização 
Ensaios comunitários Sim Comunidades Sim, aleatori- Profilático 
zado 
Ensaios profiláticos De intervenção Sim Indivíduos Sim, aleatori- Profilático 
(experimentais) zado 
Ensaios clínicos terapêu- Sim Indivíduos Sim, aleatori- Terapêuticos 
ticos zado 
Estudo de casos e controles 
, 
E um tipo de estudo em que os casos de doenças de interesse 
são identificados e classificados de acordo com a exposição 
aos fatores de riscos de interesse. Como as informações sobre 
a doença e a exposição a fatores de riscos referem-se a mo-
mentos diferentes, considera-se esse delineamento como um 
estudo longitudinal. O esquema de seleção é incompleto em 
virtude de o grupo controle ser formado por uma amostra da 
base populacional. Os indivíduos são avaliados também por 
meio da classificação conforme o grau de exposição ao fator 
em estudo. 
Estudos de intervenção 
Os indivíduos são alocados aleatoriamente em grupos garan-
tindo ao indivíduos a mesma probabilidade de fazer parte de 
um dos grupos comparados. Nesse tipo de estudo, o investi-
gador controla a exposição ao fator em investigação. Dessa 
forma, esse delineamento, por questões éticas, avalia apenas 
fatores que se acredita serem protetores à saúde. 
A escolha pelo tipo de desenho de pesquisa para avaliação 
de uma hipótese varia conforme a natureza do agravo, dos re-
cursos existentes e da logística para tal, do tipo de exposição 
a fatores de proteção ou de risco e do conhecimento prévio da 
história natural do agravo. 
"' MEDIDAS DE EFEITO EM ESTUDOS 
QUANTITATIVOS 
Para comparar os riscos, diversas medidas de associação entre 
as variáveis dependentes e independentes, ou a exposição e a 
Tabela 55.5 
MEDIDAS DE EFEITO EM ESTUDO QUANTITATIVO 
Expressão Questão 
doença, chamadas de medidas de efeito, são utilizadas para 
quantificar essa relação. Essas medidas representam diferen-
tes usos para conceitos de risco diferentes. É importante sa-
lientar que a expressão mais simples de risco é delimitada pela 
incidência, que é a razão entre o número de casos novos de 
doença que surgem em um determinado período em uma po-
pulação definida inicialmente livre de doença. A Tabela 55.5 
facilita o entendimento dessas equações. 
Risco absoluto lll> é a probabilidade de um evento ocorrer 
em uma população em estudo. 
Risco atribuível lll> é a diferença verificada entre o risco veri-
ficado entre os indivíduos expostos a fator de risco e os indiví-
duos não expostos. 
Risco relativo lll> é o número de vezes que o risco é maior en-
tre os indivíduos expostos a fator de risco em relação ao risco 
entre indivíduos não expostos. 
Risco atribuível na população lll> é o resultado na popula-
ção do efeito de um fator risco sobre as taxas globais de doença 
medindo o excesso de incidência da doença em uma população. 
Odds ratio lll> é o resultado de razão da chance de adoecer no 
grupo exposto sobre a chance de adoecer no grupo não expos-
to. A vantagem do OR é que pode ser estimado diretamente 
em estudos de casos e controles, tem propriedades estatísticas 
que permitem modelos múltiplos como a regressão logística e 
modelos log-lineares. Quando a doença não é comum (preva-
lência menor que 10 % ), o OR calculado pode ser interpretado 
como a razão de riscos (Tabela 55.6). 
Definição 
Risco absoluto Qual é a incidência da doença em um grupo inicialmente livre dela? 1 = Nª de casos novos durante período 
Risco atribuível (diferença de riscos) 
Risco relativo (razão de riscos) 
Risco atribuível na população 
Fração atribuível na população 
Razão de chances (odds ratio) 
Nª de pessoas no grupo 
Qual é a incidência da doença atribuível à exposição? 
Quantas vezes é mais provável as pessoas expostas se tornarem doen- RR = IE/ 1, 
tes, em relação às não expostas? 
Qual a incidência da doença em uma população associada com apre- RAP= RA x P 
valência de um fator de risco? 
Que fração da doença em uma população é atribuível à exposição a FAP= RAp/11 
um fator de risco? 
A chance de desenvolver doença no grupo de expostos é maior ou OR = ad I bc* 
menor do que no grupo de não expostos? 
IE = incidência nas pessoas expostas; 1. = incidência em pessoas nao expostas; P = prevalência da exposiçao a um fator de risco; 11 = incidência total da doença em uma 
populaçao 
Fonte: Fletcher & Fletcher. 1 
Tabela 55.6 
CONTING~NOA PARA CÁLCULO DO ODDS RATIO 
Pessoa doente Pessoa não doente Total 
Exposto a b a+b 
Não exposto c d c+d 
Total a+c b+d a+b+c+d 
~ LEVANTAMENTO DE DADOS 
O levantamento de dados pode ser realizado de três formas 
para construção de um banco: de forma contínua, periódica 
ou ocasional. 
Levantamentos contínuos ._quando os dados vão sendo 
registrados na medida em que ocorrem. Exemplos: óbitos, in-
ternações, doenças de notificação, consultas. 
Tabela 55.7 
PROPÕSITO DE TESTE 
Propósito do teste Teste paramétrico 
Levantamentos periódicos ._são aqueles que acontecem 
periodicamente. Exemplo: os censos. 
Levantamentos ocasionais ._ são realizados por demanda 
e sem a preocupação da continuidade ou periodicidade. Exem-
plos: estudo longitudinal da saúde do adulto (ELSA), Pesquisa 
Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD). 
Com relação às fontes onde os dados podem ser obtidos, 
pode-se considerar a classificação do Quadro 55.1. 
~ AVALIAÇÃO DE TESTES ESTATÍSTICOS 
Não é necessário que uma pessoa construa um celular, conhe-
ça suas peças ou programe seu software para que possa usá-lo. 
Da mesma forma, boa parte do que foi visto em capítulo ante-
rior sobre fundamentos de bioestatística não precisam, neces-
sariamente, ser o dia a dia do clínico. 
O que é relevante saber sobre os testes estatísticos é qual é 
o melhor teste para usar em problemas comuns. Dessa forma, 
a Tabela 55.7, a seguir, sumariza o propósito do teste, os tipos 
de testes paramétricos (distribuição normal) e não paramétri-
cos (distribuição assimétrica ou anormal/polarizada) a serem 
Teste não paramétrico Exemplo 
Comparar duas amostras independentes de uma mes- Duas amostras (não pareadas) Mann-Whitney Comparar peso de mulheres e homens. 
ma população. 
Teste t 
Comparar dois conjuntos de observações em uma úni- Uma amostra 
ca amostra (teste de hipótese de que a diferença das 
médias entre as duas medidas é zero). Teste t pareado 
Teste U 
Wilcoxon 
Teste pareado 
Generalizar o teste t ou o teste pareado de Wilcoxon ANOVA usando a soma dos Teste de Kruskall-Wallis 
quando três ou mais conjuntos de observações são fei- quadrados (uma via) 
tos em uma amostra. 
Comparar o peso em crianças antes e após 
a alimentação. 
Determinar se o nível de glicose no plasma 
é maior em 1, 2 ou 3 horas após a refeição. 
Como no anterior, mas com testes de influência (e in- ANOVA (duas vias) 
teração) de duas diferentes covariáveis. 
ANOVA (duas vias) por No exemplo anterior, para determinar se o 
categoria resultado difere entre homens e mulheres. 
Teste para hipótese de nulidade de que as proporções Sem um equivalente 
das variáveis estimadas para duas ou mais amostras in-
dependentes são a mesma. 
Teste para hipótese de nulidade de que as proporções Sem um equivalente 
estimadas para uma amostra pareada são a mesma. 
Teste Qui-quadrado 
Teste de McNemar 
Avaliar a força da regressão linear entre duas variáveis Coeficiente de correlação de Coeficiente de correlação 
contínuas. Pearson de Spearman 
Descrever a relação numérica entre duas variáveisRegressão pelo método dos Sem um equivalente 
quantitativas permitindo a previsão de um valor para quadrados mínimos 
a outra. 
Descrever uma relação numérica entre uma variável Regressão múltipla pelo Sem um equivalente 
dependente e várias variáveis preditoras. método dos quadrados mí-
nimos 
Fonte: Greenhalg.2 
Para avaliar se a aceitação na faculdade de 
medicina é mais provável se o requerente 
nasceu no Reino Unido. 
Para comparar a sensibilidade e especifici-
dade de dois diferentes testes diagnósticos 
quando aplicados a uma mesma amostra. 
Para avaliar se a quantidade de HbA 1 plas-
mático está relacionado com os níveis de 
triglicerídeos plasmáticos em pessoas dia-
béticas. 
Para ver como a taxa de pico de fluxo expi-
ratório varia com a altura. 
Determinar se a idade da pessoa, a gordura 
corporal, a ingestão de sódio determinam 
sua pressão sanguínea. 
Quadro 55.1 
FONTES PARA OBTENÇÃO DE DADOS 
Dados secundários 
(fonte secundária) 
Quando os dados se originam de arqui-
vos, registros, publicações, sistemas de 
informações. Ou seja, já são existentes. 
Dados de internações do Estado do Pará 
proveniente do sistema de informações 
hospitalares (SIH). 
Dados primários 
(fonte primária) 
São dados levantados direta-
mente da população pesqui-
sada. Dados coletados em pes-
quisa de satisfação de serviços 
de Atenção Primária. 
usados e um exemplo de aplicação. Caso julgue demasiada-
mente simplificado, há a possibilidade de buscar uma explica-
ção mais abrangente em outras obras voltadas exclusivamente 
para análise estatística. 
IJJi. INSTRUMENTOS DE PESQUISA 
QUANTITATIVA EM ATENÇÃO PRIMÁRIA 
Inúmeros instrumentos de avaliação da Atenção Primária têm 
sido propostos a partir de instrumentos da área da adminis-
tração avaliando o desempenho e a efetividade de serviços de 
saúde e de Atenção Primária (5H2w, 5S, avaliação da estru-
tura processos e resultados). Esses instrumentos de pesquisa 
têm sido aplicados junto aos provedores de serviços de saúde, 
por meio de auditorias ou através de avaliações institucionais. 
Porém, poucos se fundamentaram a partir dos pressupostos 
que orientam a Atenção Primária à Saúde (APS). . 
A partir da definição de APS sistematizada por Starf1eld 
B., pode-se considerar um serviço de atenção básica como 
provedor de atenção primária quando os atributos essen-
ciais estão presentes em suas práticas. Os atributos deriva-
dos são características dos serviços orientados à APS por 
apresentarem competências como o reconhecimento cultu-
ral e comunitário. 
Os atributos da atenção primária são: 
• Acesso de primeiro contato 
• Longitudinalidade 
• Integralidade 
• Coordenação 
• Atenção centrada na família 
• Orientação comunitária 
• Competência cultural 
Pesquisas internacionais relacionam os atributos da APS 
com a efetividade e a equidade da atenção. Vários estudos 
têm sido conduzidos no país utilizando instrumentos valida-
dos para o português e adaptados à realidade da rede de APS 
presente hoje no Sistema Único de Saúde. Na literatura inter-
nacional, o PCATool (primary care assessment toai) foi desen-
volvido nos Estados Unidos da América pela John Hopkins 
School of Public Health. 
Após o processo de validação e adaptação, pesquisa-
dores têm aplicado esse instrumento para avaliar diferen-
tes serviços e sistemas municipais de saúde e até mesmo 
modelos tecnoassistencias. Esse instrumento foi chamado 
pelos pesquisadores como PCATool Brasil (primary ca~e 
assessment toai Brasil). Cidades como Porto Alegre, Curi-
tiba, Petrópolis, Florianópolis e outros grandes centros têm 
utilizado esse instrumento para avaliar seu desempenho e a 
orientação aos princípios e propósitos da Atenção Primária 
à Saúde. 
Esse instrumento foi construído para avaliar inúmeras fa-
cetas do modelo assistencial em APS. Dessa forma, há as ver-
sões da avaliação dos atributos da APS para usuários (adultos 
e crianças), da avaliação da orientação à APS por parte dos 
profissionais e para avaliação dos sistemas municipais de saú-
de (avaliação sistémica). 
O instrumento original em inglês é constituído de 77 per-
guntas distribuídas entre os atributos essenciais e derivados 
contendo uma escala do tipo likert de 4 pontos para respostas 
que variam de "com certeza não" a "com certeza sim". Cada 
uma das versões apresenta um número variável de questões de 
acordo com o processo de validação. A soma dos escores por 
atributo gera um escore geral da APS que pode variar entre O 
e 10, sendo O a ausência de qualquer orientação dos princípios 
que fundamentam a APS e 10, o atendimento pleno de todos 
os atributos para os serviços de APS. 
Serviços que apresentam valores acima de 6,6 no escore são 
considerados de alto escore, ou seja, desenvolvem suas ativida-
des pautadas respeitando os atributos citados anteriormente. 
REFERÊNCIAS 
1. Fletcher RH, Fletcher SW. Epidemiologia clínica: elementos essenciais. 4. ed. 
Porto Alegre: Artmed; 2006. 
2. Greenhalg T. How to read a paper: the basics of evidence based medicine. 2nd 
ed. London: BMJ Group; 2004. 
LEITURAS RECOMENDADAS 
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Hulley SB, Cummings SR, Browner WS, Grady D~, He.ar~t ~· Newman TB. 
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