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viagem no tempo

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Viagem no tempo
A teoria geral da relatividade de Einstein permite a existência de buracos de
minhoca por onde é possível viajar para o passado. No entanto, essa revelação
traz implicações interessantes, como paradoxos que podem ser bastante diver-
tidos. Por exemplo, há o paradoxo do avô, em que o viajante do tempo pode
impedir seu próprio nascimento matando seu avô. Como ele teria viajado ao
passado se jamais nasceu? Curioso, não é?
Aqui, com a intenção de explicar recentes desenvolvimentos de computação
quântica em postagens futuras, apresento uma situação engraçada, mas que rev-
ela um tipo de objeção quanto à possibilidade clássica de viajar para o passado.
Considere um indivíduo que sai de casa às oito horas da manhã para ir trabal-
har. Trabalha até as cinco da tarde e entra no buraco de minhoca que o leva
de volta à esquina de casa, às oito da manhã do mesmo dia. Ao sair do buraco
de minhoca, encontra-se com ele mesmo indo ao trabalho e trocam olhares, sem
que sua versão mais jovem o reconheça. Então, nesse momento, o viajante do
tempo se lembra de ter mesmo visto a si próprio de manhã, sem se dar conta de
que era ele mesmo, saindo de um buraco de minhoca na esquina. Sabendo tudo
o que vai acontecer a partir daí com sua versão mais jovem, o viajante do tempo
volta para casa e dorme o dia todo e a noite toda. Acorda no dia seguinte e
vai trabalhar de novo, sem jamais voltar a entrar em um buraco de minhoca.
Durante um período de tempo, ambas as versões do mesmo indivíduo dividem
o mesmo presente.
Agora vou considerar um pouco mais de detalhes nessa situação. O nosso
viajante acorda de manhã, antes de saber que viajará no tempo à tarde, in-
deciso se usará uma camiseta vermelha ou verde. Em seu trabalho é comum
as pessoas usarem camisetas vermelhas. Quase todos lá as usam. Ele, inclu-
sive, tem apenas usado camisetas vermelhas. Cansado disso, decidiu comprar
uma camiseta verde, mas ainda não esteve suficientemente motivado a vesti-la
no trabalho. Seria uma mudança arrojada, talvez uma revolução da moda no
seu local de trabalho. Decide, então, sair vestindo a camiseta vermelha, mas
levando a verde em sua mochila, caso mude de ideia. Sua resolução é tal que,
caso encontre alguém usando uma camiseta verde, sentir-se-á mais à vontade
de trocar a camiseta também e ir trabalhar vestindo a camiseta verde, já que
alguém mais, vindo do mesmo local, já está usando a tão audaciosa cor. Agora,
se não vir pessoa alguma usando camiseta verde, está resolvido a manter-se us-
ando sua camiseta vermelha mesmo, para não ser considerado arrojado demais.
Ao passar da esquina, irá, sem saber, ver sua versão mais velha, retornando do
futuro. Qual a cor da camiseta da versão mais velha? Vejamos. Caso a versão
que sai do buraco de minhoca esteja vestindo verde, a versão mais jovem tro-
cará de camiseta, vestirá verde o dia todo e, no fim da tarde, voltará no tempo
vestindo verde, o que, ao sair do buraco de minhoca na esquina, às oito horas da
manhã do mesmo dia, causará a troca de camiseta de sua versão mais jovem, da
vermelha para a verde que estava na mochila. Alternativamente, caso a versão
mais velha esteja vestindo vermelho ao sair do buraco de minhoca da esquina,
sua versão mais jovem, de acordo com sua própria resolução, continuará usando
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a camiseta vermelha, para não se aventurar a ser um destaque de audácia entre
os colegas. Então, trabalhará o dia todo de vermelho e entrará no buraco de
minhoca com a mesma cor, causando a manutenção da vestimenta vermelha em
sua versão mais jovem quando aparecer na esquina, saído do buraco de minhoca,
às oito horas da manhã do mesmo dia. Veja, então, que há duas respostas pos-
síveis para a pergunta sobre qual camiseta veste a versão mais velha do nosso
viajante do tempo.
O que aconteceria se a versão mais jovem do nosso viajante escolhesse ir com
a camiseta verde para o trabalho? Mas vamos supor que sua resolução, nesse
caso, fosse a seguinte. Caso visse alguém também usando verde, trocaria sua
camiseta verde pela vermelha, pensando que não iria querer ser o segundo a
inovar. No entanto, caso só visse pessoas com camisetas vermelhas, continuaria
usando a camiseta verde, para ser o primeiro a inovar no trabalho com uma
cor considerada arrojada. Qual a cor da camiseta do viajante quando emerge
do buraco de minhoca e é visto pela sua versão mais jovem que está vestindo
verde? Suponha que esteja de vermelho. Então, sua versão mais jovem continua
usando verde e, no fim da tarde, viaja no tempo em verde, contradizendo nossa
hipótese. Logo, nosso viajante do tempo emerge do buraco de minhoca em
verde, não é mesmo? Porém, nesse caso, sendo visto em verde por sua versão
mais jovem, provoca a troca de sua camiseta, indo o mais jovem trabalhar
de vermelho. No fim da tarde, entra no buraco de minhoca com a camiseta
vermelha e, portanto, emerge na esquina, saído do buraco de minhoca, usando
vermelho e contradizendo nossa hipótese de novo. E agora? Paradoxal, não
é? Essa situação implica que, do ponto de vista clássico, o viajante jamais
poderia resolver ir de verde, com o proviso de trocar a camiseta caso visse
alguém também usando verde em seu caminho para o trabalho. Mas não somos
livres para escolher o que vamos fazer? Eis o impasse para viagens no tempo
clássicas. Vou parar por aqui, deixando você pensar nessas coisas. Adianto,
no entanto, que David Deutsch propôs uma solução para esse tipo de paradoxo
usando mecânica quântica.
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