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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS ANDREZA FERREIRA MALTA, FERNANDA LUIZA CARLOS BASTOS, ISABELLE OLIVEIRA PEREIRA, JADE NUNES LINS CAVALCANTI, MARIA VITÓRIA CRUZ DA SILVA E MARINA MENDES AMORIM A PSICOLOGIA ANALÍTICA DE JUNG Belo Horizonte 2015 1. ORIGENS O principal precursor da psicologia analítica foi Carl Jung. Nascido em 1875, na Suíça, Jung cresceu num ambiente familiar religioso, o que parece ter despertado nele o interesse pela religião e a relação desta com as ciências naturais. Dentre seus interesses estavam também os mitos, fantasias e sonhos. (FERRARI, Juliana Spinelli) Em 1900, Carl Jung graduou-se em medicina com honras, mais tarde se destacando como psiquiatra e pesquisador na área. Num de seus artigos, declarou admirar algumas das proposições de Sigmund Freud, que era duramente criticado na época. Foi então que Jung e Freud se conheceram e estabeleceram uma forte relação de amizade e intimidade. Trocavam cartas, discutiam análises de sonhos e se reuniam em encontros familiares. (MARCONDES, Kathy Amorim) Freud tinha Jung como o principal herdeiro de sua teoria. “(...) De início, Freud considerou Jung não só seu discípulo mais bem-dotado como também o mais importante, seu príncipe coroado, o homem destinado a levar sua obra adiante no futuro.” (PALMER, 2001, p. 118) Em 1910, Jung foi eleito presidente da Associação Psicanalítica Internacional, posto ao qual renunciou quatro anos mais tarde devido a divergências com o pensamento de Freud: Freud não aceitava bem o interesse de Jung em investigar o espiritual, enquanto Jung discordava das teorias de trauma sexual propostas por Freud. Assim, Carl Jung se afastou da Psicanálise e de Sigmund Freud. (MARCONDES, Kathy Amorim) Jung, então, passou a estudar seu próprio inconsciente a partir da profunda crise existencial pela qual passou. Desses estudos, mais tarde, emergiriam as bases da psicologia da personalidade elaborada por ele. (MARCONDES, Kathy Amorim) Ele uniu esses conhecimentos a seu amplo conhecimento em alquimia, mitologia e das diferentes religiões, criando conceitos e tipos para caracterizar os processos psíquicos inconscientes. (FERRARI, Juliana Spinelli) O desenvolvimento da Psicologia Analítica é caracterizado pelo estudo da relação entre indivíduo e imaginação através da investigação de sonhos, desenhos e outros materiais. O enfoque da terapia junguiana é a reconciliação dos estados da personalidade, suas sensações, intuições e pensamentos. (FERRARI, Juliana Spinelli) 2. PRINCIPAIS REPRESENTANTES 2.1 Nise da Silveira (1905 – 1999) Nasceu em Maceió (AL), filha de um professor de matemática e de uma pianista. Formou-se em medicina psiquiátrica pela Faculdade de Medicina da Bahia, tendo concluído o curso com uma monografia sobre a criminalidade feminina, aos 21 anos. Nise foi a primeira a trazer a Psicologia Junguiana para o Brasil, no Rio de Janeiro. Foi pioneira na pesquisa sobre o tratamento da doença mental utilizando a técnica da arte-terapia, trabalho que foi reconhecido internacionalmente. Fundou, em 1952, o Museu de Imagens do Inconsciente, no Rio de Janeiro – um centro de estudo e pesquisa destinado à preservação dos trabalhos produzidos nos estúdios de modelagem, pintura, escultura e carpintaria de seus pacientes. 2.2 Erich Neumann (1905 – 1960) Foi aluno de Carl Jung, e trocou correspondências com ele até a morte de Neumann, em 1960. Mesmo tendo trabalhado na área de psicologia analítica até o seu falecimento, o trabalho de Neumann recebeu maior destaque quando lidou com o desenvolvimento feminino, merecendo destaque a sua obra The Great Mother. Além disso, ele lançou a obra História da Origem da Consciência, na qual relacionou a psicologia com a mitologia, sendo esta a base interpretativa para o desenvolvimento da consciência humana. 2.3 Marie-Louise Von Franz (1915 – 1998) Foi uma psicóloga analítica e colega próxima de trabalho de C.G. Jung por 30 anos. Envolveu-se nos estudos dele sobre psicologia e alquimia. Foi considerada expert no campo da psicologia e simbolismo dos contos de fadas e sonhos, no qual ela criou uma coleção de livros. Ela considerava que os contos de fadas são as expressões inconscientes da consciência coletiva e representam arquétipos na sua forma mais simples. (VON FRANZ, 1970). Ela foi cofundadora do Instituto C. G. Jung em Zurique e escreveu uma biografia póstuma sobre Jung. 2.4 Petho Sandor (1916 – 1992) O húngaro Petho Sandor foi o responsável por introduzir o pensamento Junguiano na sociedade acadêmica brasileira, desenvolvendo no Brasil pesquisas antes iniciadas na Europa, no período pós guerra, onde trabalhou com pacientes com os mais variados tipos de trauma. Ele foi o responsável por desenvolver a Calatonia - técnica de relaxamento profundo que leva à regulação do tônus, promovendo o reequilíbrio físico e psíquico da pessoa. 2.5 James Hillman (1926 – 2011) Foi um influente psicólogo analítico que fundou a teoria de “Psicologia Arquetípica” nos final dos anos 1960 e começo dos anos 1970, sendo uma psicologia pós-jungiana inspirada nos conceitos de arquétipos de Jung. Essa psicologia tem como ideia a alma não como uma substância, mas sim como uma perspectiva e os arquétipos se apresentam para a imaginação por meio de imagens. Hillman cita Jung ao afirmar “imagem é psique”, levando ao máximo a ideia de que a realidade psíquica é formada por imagens. “As imagens são o meio através do qual toda a experiência se torna possível” (HILLMAN, 1993, p. 11). Os arquétipos também estão relacionados a fantasias, sonhos, e mitos. 3. PRINCIPAIS CONCEITOS 3.1 Símbolo De acordo com Jung, um símbolo é uma expressão do inconsciente, e tem como característica básica o fato de ir além de uma compreensão racional. O símbolo é a linguagem que o inconsciente usa para se comunicar com o consciente e pode aparecer em qualquer contexto, desde sonhos até atos falhos. (JUNG, 2012) 3.2 Psiqué Jung entende a psiqué humana a partir de uma perspectiva energética. Delimita dois polos básicos - consciente e inconsciente - que interagem a partir da libido, entendida não pela concepção freudiana de desejo sexual, mas como a mesma energia que move os processos vitais do sistema corporal. A dinâmica psíquica trabalharia de forma a manter o equilíbrio energético no deslocamento de conteúdos psíquicos entre o consciente e o inconsciente, a fim de proporcionar o caminho de processo de individuação. (MARCONDES, Kathy Amorim) 3.3 Inconsciente Jung defende que temos uma evolução psíquica e a consciência é um produto dessa evolução. O inconsciente constitui-se, portanto, de uma parte mais primitiva de nossa psiqué, tendo um caráter tanto coletivo - e os símbolos daqui advindos são os arquétipos -, quanto individual - sendo aqui os símbolos chamados complexos. (JUNG, 2012) O inconsciente tem a função de equilibrar a vida psíquica do indivíduo, pois a consciência é frágil, não é capaz de guiar sozinha a construção e a manutenção de uma personalidade frente a tantos estímulos que passam pela vida diária consciente. Uma prova disso é a capacidade de atenção seletiva que o ser humano possui, não conseguindo abarcar o todo de uma só vez. Vale lembrar que quando essa atenção seletiva não é voluntária, é produto de uma dissociação psíquica, que acontece quando o inconsciente invade o consciente. (JUNG, 2012) 3.4 Arquétipo Mais especificamente, o arquétipo é uma tendência, um instinto do inconsciente a formar osmesmos temas presentes na cultura humana de um modo geral nos sonhos das pessoas. Jung exemplifica com os "irmãos inimigos" (2012, p. 83), ou "o tema universal e pré-cristão do herói e salvador." (2012, p. 90). É importante salientar que os símbolos produzidos pelos arquétipos não são herdados, são repetições, mais ou menos modificadas pela característica individual do sonhador, dos mesmos motivos encontrados em vários mitos e na cultura humana, e não necessariamente são esses motivos do arquétipo correspondentes ao que a pessoa conhece ou conheceu na sua vivência; essas representações podem ser totalmente desconhecidas dela. A única coisa herdada que Jung defende são "os esquemas de pensamento coletivo da mente humana" (2012, p. 93). Mais além, o arquétipo é como um complexo, mas aplicável à humanidade: a análise do complexo mostra repressões que o indivíduo faça, e na leitura simbólica de Jung, pode também indicar qual a solução para um problema da pessoa. O arquétipo mostra uma característica ou conflito coletivo, e por isso tem a capacidade de criar "mitos, religiões e filosofias que influenciam e caracterizam nações e épocas inteiras." (2012, p. 98). 3.4.1 Persona Persona é o arquétipo que nos propicia agir de acordo com o que se espera socialmente, adotando “máscaras” que não correspondem a nossa real personalidade (self). Antes do processo de individuação, ela atua de maneira autônoma, podendo sobrepor-se ao consciente quando necessário. Na individuação, o ser entra em contato com seu próprio self, e assim reconhece que é diferente de suas máscaras e passa a utilizá-las conscientemente como um mecanismo de defesa. (MARCONDES, Kathy Amorim; ALVES RAMOS, Luís Marcelo) 3.4.2 Sombra "A sombra [...] representa qualidades e atributos pouco conhecidos ou desconhecidos do ego." (JUNG, 2012, p. 222). Costuma aparecer personificada no sonho, geralmente sendo do mesmo sexo que o sonhador. Não é raro representar o aspecto contrário da personalidade do indivíduo, uma vez que comporta conteúdos reprovados pela consciência. O mais correto, segundo Jung, seria que o sonhador entendesse a própria sombra e a mensagem que quer passar, para atingir um conhecimento mais profundo de si mesmo rumo ao processo de individuação. (JUNG, 2012) 3.4.3 Anima e Animus Trata-se do “arquétipo oposto à personalidade sexual assumida na persona”. (MARCONDES, Kathy Amorim). Funciona como um complemento às qualidades expressas pela persona – que correspondem ao gênero – de forma a promover um equilíbrio que permite maior compreensão do próprio eu e também do outro. Assim, para a mulher, que possui uma persona emocional, o animus seria seu complemento racional. Enquanto o anima seria o complemento emocional do homem racional. O anima e o animus são moldados, respectivamente, pela primeira figura feminina ou masculina com a qual tem contato – normalmente, a mãe e o pai. Por isso é comum que, em situações de desequilíbrio psíquico, o indivíduo procure no companheiro amoroso, características de sua mãe ou pai. (MARCONDES, Kathy Amorim; ALVES RAMOS, Luís Marcelo) 3.4.4 Self Começa e continua o processo de individuação; "é possível denominá-lo também de inventor, organizador, ou fonte das imagens oníricas." (JUNG, 2012, p. 212). Na interação entre ego e self - este é a origem do inconsciente, bem como a totalidade da psique -, o ego escolhe se acata ou não os conselhos do inconsciente, os quais costumam vir em sonhos. Estes podem ser compreendidos pela sua análise, ou de modo subliminar. Nesta última maneira, sabe-se que o sonho foi compreendido quando afeta o humor da pessoa, mesmo que ela não saiba explicar em palavras o que ocorreu. (JUNG, 2012) 3.5 Complexo Segundo Jung, um complexo é “a imagem de situações psíquicas fortemente carregadas de emoção e incompatíveis com a atitude e a atmosfera consciente habituais” (JUNG apud SILVEIRA, 1992). Ou seja, o aglomerado de experiências subjetivas uma vez conscientes, mas que foram reprimidas. Esse conjunto bastante coeso teria autonomia suficiente para perturbar o equilíbrio psíquico, subjugando o consciente e agindo como uma personalidade individual, sendo que tal configuração consistiria em uma neurose. No processo de cura da neurose e do conhecimento de si próprio (individuação), seria necessário trazer esses complexos para o consciente de forma que pudessem ser assimilados pelo ser. Entretanto, apenas seu entendimento não seria suficiente: a cura dependeria também da exteriorização emocional dos complexos. Segundo Nise Silveira: A verdade é que não somos nós que temos o complexo. O complexo é que nos tem que nos possui. Com efeito, o complexo interfere na vida consciente, leva-nos a cometer lapsos e gafes, perturba a memória, envolve-nos em situações contraditórias, arquiteta sonhos e sintomas neuróticos. O complexo obriga-nos a perder a ilusão de que somos senhores absolutos em nossa própria casa. (SILVEIRA, 1992, p.28) 3.6 Individuação Processo no qual o ego interage com o inconsciente para a formação de uma personalidade. Jung defende que na observação dos sonhos de uma pessoa é possível notar tal processo no aparecimento e desaparecimento de temas e estruturas, bem como na mudança desses sistemas e estruturas como reflexo da mudança do sonhador frente ao que entende pelos seus sonhos (JUNG, 2012). Observando-se esse processo ao longo da vida de um indivíduo, nota-se uma "tendência reguladora ou direcional oculta, gerando um processo lento e imperceptível de crescimento psíquico -- o processo de individuação." (JUNG, 2012, p. 211) REFERÊNCIAS ADAMS, Michael Vannoy. The Archetypal School. Cambridge: Cambridge United Press. 1997. Associação Junguiana do Brasil: <http://www.ajb.org.br/historico.php> Acesso em 19 jun. 2015 Conselho Nacional de desenvolvimento Científico e Tecnológico: <http://www.cnpq.br/web/guest/pioneirasview//journal_content/56_INSTANCE_a6MO /10157/902821> Acesso em 18 jun. 2015 Exercícios de vida: <http://www.exerciciosdevida.com.br/servicos/calatonia/> Acesso em 18 jun. 2015 FERRARI, Juliana Spinelli. Jung e a Construção da Psicologia Analítica. Disponível em: <http://www.brasi lescola.com/psicologia/jung.htm> Acesso em 20 jun. 2015 FORDMAN, Michael. Erich Neumann (1905-1960). Journal of Analytical Psychology. Malden, v. 6, n.2 p. 157-159, jul. 1961. FRANZ, Marie-Louise Von. The interpretation of Fairytales. Boston: Shambala; Rev Sub edition, 1996. HILLMAN, James. Psicologia arquetípica: Um breve relato . São Paulo: Editora Cultrix. 1995. 9 v. MARCONDES, Kathy Amorim. Introdução à Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung. Disponível em: <http://www.portas.ufes.br/sites/www.portas.ufes.br/files/Jung.pdf> Acesso em 20 jun. 2015 NEUMANN, Erich. Historia da Origem da Consciência. 14. Ed. São Paulo: Editora Pensamento-Cultrix, 2013. NEUMANN, Erich. The Great Mother. 2ª Ed. Princenton: Princenton University Press, 1996. Schwartz, Chuck. Obituary: Marie-Louise von Franz. The Independent, United Kingdom, fev. 1998. Disponivel em: <http://www.independent.co.uk/news/obituaries/obituary-marielouise-von-franz- 1146547.html> SILVEIRA, Nise da. Jung: Vida e Obra . 21ª Edição. Rio de Janeiro. Editora Paz e Terra, 1992. JUNG, C.G. O Homem e Seus Símbolos. Tradução de Maria Lúcia Pinho. Segunda Edição Brasileira. Editora Nova Fronteira, 2012. ALVES RAMOS, Luís Marcelo. Apontamentos sobre a psicologia analítica de Carl Gustav Jung. Disponível em : <https://www.fe.unicamp.br/revistas/ged/etd/article/view/1805/1647> Acesso em: 19 jun. 2015
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