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Capítulo 2 Peculiaridades Solos Tropicais

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IDENTIFICAÇÃO DOS SOLOS TROPICAIS 
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Pavimentos Econômicos 
 2. IDENTIFICAÇÃO DOS SOLOS TROPICAIS 
 2.1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS 
No Brasil, no fim da década de 1940, o uso da Mecânica dos Solos foi introduzido na 
solução de problemas ligados à construção rodoviária. Foram encontradas várias 
discrepâncias entre as previsões efetuadas com a aplicação dos princípios 
desenvolvidos por essa especialidade e o real comportamento dos solos nas 
obras. Essas discrepâncias foram atribuídas, em grande parte, às peculiaridades 
dos solos tropicais, do ponto de vista de suas propriedades mecânicas e hídricas, e 
as que influem nos estudos geotécnicos de campo. 
A seguir, apresenta-se a Terminologia Básica para a identificação dos solos tropicais e as 
considerações sobre sua formação e as ocorrências no Brasil. 
Para o entendimento, aprofundamento nesse assunto e a verificação de mais detalhes 
sobre as peculiaridades dos solos tropicais, recomenda-se a leitura de Nogami e 
Villibor (1995). 
 2.2. TERMINOLOGIA BÁSICA 
Uma das dificuldades em abordar as peculiaridades dos solos tropicais reside na 
ausência de uma terminologia consagrada. Disso resulta que termos iguais são, 
frequentemente, usados para designar materiais bastante diferentes. Em 
contrapartida, materiais iguais acabam recebendo várias designações. De outro 
lado, o fato de que as terminologias tradicionais foram desenvolvidas para solos 
de regiões de clima frio e temperado, portanto não tropicais, tem contribuído 
para aumentar ainda mais a problemática da terminologia. 
 2.2.1. SOLOS 
Solo é o material natural não consolidado, isto é, constituído de grãos separáveis por 
processos mecânicos e hidráulicos relativamente suaves, como a dispersão em 
água com uso de aparelho dispersor de laboratório, e que pode ser escavado com 
equipamentos comuns de terraplenagem. Constitui a parte mais superficial da 
crosta terrestre. De uma maneira geral, os materiais constituintes da crosta 
terrestre que não satisfazem a condição de solo serão considerados como rocha, 
mesmo que isso contrarie as conceituações geralmente adotadas em geologia e 
em pedologia. O conceito de solo aqui adotado pode apresentar-se como 
estrutura natural ou artificial. O solo terá estrutura artificial quando transportado 
ou compactado, como em aterros, barragens de terra, reforços do subleito de 
pavimentos, entre outras, e estrutura natural quando não alterado por trabalho 
do homem. 
 2.2.2. SOLOS TROPICAIS 
Solos tropicais são os que apresentam peculiaridades – de propriedades e de 
comportamento geotécnico – resultantes do processo geológico e/ou pedológico 
em sua formação, típicos das regiões tropicais úmidas, que os diferenciam dos 
solos formados em outras regiões (Comitee on Tropical Solis of ISSMFE, 1985), 
sendo essa definição essencialmente tecnológica. 
 
 
IDENTIFICAÇÃO DOS SOLOS TROPICAIS 2 
Para tanto, tendo em vista as dificuldades de classificar e de identificar os solos 
tropicais, por meio de conhecimentos geológicos e pedológicos, optou-se pelo uso 
de uma classificação tecnológica, designada MCT, desenvolvida por Nogami e 
Villibor para esse fim. Essa classificação engloba os solos em duas classes, uma de 
solos de comportamento laterítico e outra de não laterítico, apresentadas no 
Capítulo 4. 
Geneticamente destacam-se, dentre eles, os solos lateríticos, os saprolíticos e os 
transportados. Os últimos são os menos utilizados na construção de estradas. Na 
Figura 2.1 está apresentada, de forma esquemática, a localização esperada, em 
condições naturais, desses solos. A camada de solo laterítico ocupa a parte 
superior do perfil. A camada de solo saprolítico encontra-se subjacente a uma 
camada de solo laterítico (ou transportado) e sobre o substrato rochoso. 
 
 
Figura 2.1 – Designação genética geral das camadas de solos, nas regiões tropicais. 
FONTE: Nogami e Villibor (1995). 
 
Tendo em vista a importância dos solos tropicais, em 
especial os lateríticos, na construção de estradas no 
Brasil e em países tropicais, apresentam-se noções do 
processo pedogenético de sua formação, nas 
condições de clima tropical úmido com temperaturas 
elevadas (T), ação mais intensa de chuva (C) e 
evaporação (E). Na Figura 2.2, está ilustrada a 
evolução dos fenômenos de intemperismo físico e 
químico, responsáveis pela formação dos solos 
tropicais, ressalta-se que estes processos ocorrem 
simultâneamente. 
 Inicialmente, ocorre o intemperismo físico, com 
fratura da superfície da rocha. Com o passar do 
tempo geológico, ocorre o surgimento da vegetação 
na camada superficial (A), com a formação de 
húmus; 
 Nas condições ambientais tropicais (alta temperatura, muita chuva), inicia-se o 
intemperismo químico, com a formação do ácido húmico (B); 
Figura 2.2 – Esquema simplificado da formação 
pedogenética de solos tropicais 
 
 
 
 
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 Com a infiltração do ácido húmico na rocha fragmentada, inicia-se o processo 
pedológico de laterização; 
 Após um determinado tempo geológico, ocorre a laterização, peculiar às partes 
bem drenadas do subsolo, cujo resultado final é um manto superficial de solo 
laterítico, descrito no item 2.2.2.1; 
 Entre o manto de solo laterítico e o substrato rochoso, tem-se um solo 
designado saprolítico que, tendo sofrido o processo de intemperismo físico e, 
em algumas partes em fase, de intemperismo químico, ainda apresenta 
resquícios da rocha que lhe deu origem, cujas peculiaridades serão descritas no 
item 2.2.2.2. 
Na Figura 2.3, está apresentado um perfil de solo, mostrando as camadas de 
solo laterítico e saprolítico. 
 
 
Figura 2.3 – Corte rodoviário, com camada laterítica sobrejacente à camada saprolítica 
de origem sedimentar, com as correspondestes microestruturas. 
 
Cabe, aqui, observar que o conceito de laterização empregado não coincide, 
integralmente, com aqueles geralmente adotados em pedologia (uma ciência 
natural que estuda a parte superficial do sub-solo, influenciada pela ação 
simultânea das intempéries e de organismos vegetais e animais). Portanto, a 
conceituação de laterização, adotada neste trabalho, tem objetivo essencialmente 
tecnológico e definido segundo peculiaridades mineralógicas e de microestrutura, 
já referidas anteriormente. 
 
 
 2.2.2.1. Solos Lateríticos 
As ocorrências de solos lateríticos (later, do latim: cor de tijolo) são resultantes da 
atuação dos processos de laterização, de partes bem drenadas em regiões 
tropicais úmidas. 
 
 
IDENTIFICAÇÃO DOS SOLOS TROPICAIS 2 
Esses solos, considerados maduros, associam-se a diversas 
peculiaridades. Do ponto de vista tecnológico, os 
mais importantes são o enriquecimento da parte 
fina, em especial a argila, por óxidos e hidróxidos de 
ferro e/ou alumínio e a permanência do argilo 
mineral caolinita, quase exclusivo. As placas de 
caulinita (Ø < 2,00 mícrons) são cimentadas pelos 
óxidos e pelos hidróxidos, produzindo uma 
microestrutura com aspecto de “pipoca”. Sua fração 
areia, fina e grossa, é constituída, geralmente, de 
quartzo, sendo a porcentagem dessa fração 
responsável pela ocorrência de solos, desde 
arenosos até argilosos. 
Possuem aspecto uniforme, uma estrutura porosa e 
colorações típicas devido aos óxidos presentes, 
como vermelho, amarelo, marrom e alaranjado. Na 
Figura 2.4, é apresentada a microestrutura típica de 
um solo laterítico. 
 
 2.2.2.2. Solos Saprolíticos 
Os solos saprolíticos (sapro, do grego: podre) 
resultam da desagregação/decomposição in 
situ da rocha matriz, mantendo a estrutura 
herdada. Constituem a parte subjacente à 
camada de solo superficial. Apresentam, em 
geral, uma mineralogia complexa, ao contrário 
dos solos lateríticos. Esses solos têm sido 
designados de solos residuais jovens.Geralmente, esses solos apresentam uma 
microestrutura com uma constituição 
mineralógica muito variada, com argilo-
minerais individualizados, que apresentam 
coloração variada, de cores cinzentas ou 
esbranquiçadas. As frações silte e areia 
apresentam uma constituição mineralógica 
muito variada, sendo o quartzo um mineral 
muito comum nessas frações. Na Figura 2.5, é 
apresentado um exemplo de microestrutura da 
parte fina de um solo saprolítico. 
 2.2.3. SOLOS TRANSPORTADOS 
Solos transportados resultam da deposição de material, nas regiões de baixada, 
previamente transportados pela água, pelo vento ou pela gravidade. Mas, 
dependendo do período de formação, por exemplo, se for antiga, podem ser 
encontrados até mesmo no alto de morros. A sua granulometria é bastante 
variada e muito influenciada pelo tipo do agente transportador. Quando 
2 μm 
Figura 2.4 – Fotografia de microscopia eletrônica de 
varredura da microestrutura de um solo laterítico 
 
Figura 2.5 – Fotografia de microscopia eletrônica 
de varredura da microestrutura de um solo 
saprolítico. 
 
 
 
 
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localizados abaixo do lençol freático, a influência climática tropical é 
insignificante. Nessas condições, não são considerados solos tropicais. 
Um exemplo de solos transportados, que não foram submetidos ao processo de 
laterização por tempo suficientemente prolongado, é o caso de areias de origem 
fluvial e marinha. 
 2.2.4. OCORRÊNCIA DE SOLOS TROPICAIS 
 2.2.4.1. Considerações Iniciais 
O conceito “ocorrência de solos” é frequentemente utilizado para designar um volume 
de solo em seu estado natural (objeto deste estudo) e depois de operações 
construtivas (aterros, subleito de pavimentos, etc). A área e o volume de uma 
ocorrência são fixados de acordo com as necessidades de projeto. 
Em uma estrutura de ocorrência de solos, o corte vertical é designado de perfil de 
subsolo e qualquer parte constituinte da ocorrência será designada camada. 
Um exemplo de ocorrência de solos tropicais está mostrado na Figura 2.3. Estas 
ocorrências caracterizam-se, sinteticamente, pelo seguinte: 
 grande espessura do horizonte superficial que, no caso de ser laterítico, pode 
variar de 1,0m até ultrapassar uma dezena de metros, acompanhando a 
superfície do terreno; 
 grande espessura do horizonte saprolítico que, frequentemente, atinge várias 
dezenas de metros e ocorre, geralmente, subjacente ao laterítico; e 
 presença frequente de solos transportados, ocupando posições topográficas 
diferentes das prevalecentes na ocasião da deposição. Essas ocorrências 
atualmente ocupam, com frequência, posições elevadas. 
 
 2.2.4.2. Ocorrência de Solos Finos Lateríticos no Brasil 
Tendo em vista considerações geológicas e pedológicas, estima-se que as ocorrências 
desses solos cubram cerca de 65% do território nacional. No Estado de São Paulo, 
os solos arenosos finos lateríticos ocorrem em cerca de 55% de sua área. Pelo 
exame de mapas geológicos e pedológicos disponíveis, foi possível prever a 
potencialidade da ocorrência destes solos, em grandes áreas fora do Estado de 
São Paulo, tais como nos Estados do Paraná, de Mato Grosso do Sul, de Mato 
Grosso, de Goiás, da Bahia, dentre outros. 
Na Figura 2.6, estão ilustradas as áreas de solos lateríticos arenosos e argilosos no 
território brasileiro. Nessas áreas, ocorrem jazidas promissoras de solos para 
execução de bases de solo arenoso fino laterítico (SAFL), tanto in natura como 
artificial, proveniente de material obtido por mistura. 
 
 
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Figura 2.6 – Ocorrências de Solos Finos Arenosos e Argilosos, de comportamento laterítico, no Brasil. 
 
 
Os solos arenosos finos lateríticos são caracterizados por apresentarem mais de 50% de 
fração areia. Estes solos ocorrem em mantos de espessura da ordem de 5 m, que 
acompanham, aproximadamente, a superfície do terreno. Na Figura 2.7, é 
apresentada uma jazida de SAFL explorada para a execução de bases. 
 
 
Figura 2.7 – Aspecto de uma jazida de solo 
arenoso fino laterítico (SAFL). 
 
Segundo dados acumulados no DER-SP, os SAFLs associam-se, obrigatoriamente, às 
áreas de ocorrência e de formações geológicas, constituídas, 
predominantemente, por rochas sedimentares. No entanto, isso não implica na 
obrigatoriedade do solo arenoso fino ser residual (formado in situ). 
Esse fato pode ser constatado, com bastante frequência, na inexistência de uma relação 
genética direta, da camada de solo arenoso fino laterítico, com a rocha 
subjacente. Muitas vezes, abaixo desta camada encontram-se folhelhos e/ou 
 
 
 
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argilitos, rochas que não têm condições de fornecer solos de textura arenosa ou, 
ainda, linha de seixos indicando a existência de movimentação coluvial da camada 
a ela sobreposta. Nesse caso, a ocorrência desses solos teria origem tipicamente 
sedimentar ou transportada. 
As ocorrências naturais de SAFL apresentam uma série de peculiaridades, de interesse 
direto da engenharia rodoviária, das quais se destacam: 
Grande espessura: a camada ou o horizonte correspondente à parte laterizada 
apresenta, geralmente, espessuras superiores a 5,0 m. O limite inferior da camada 
de solo arenoso fino é, na maioria das vezes, bastante nítido, devido, 
principalmente, à mudança de cor (aparecimento de cores amareladas claras, 
esbranquiçadas, róseas claras). Às vezes, uma linha de seixos de constituição 
laterítica (concreções, canga ou tapiocanga) ou de quartzo delimita a parte 
inferior da camada de solo arenoso fino; 
Uniformidade: a camada de SAFL é, comumente, de aspecto bastante homogêneo e 
uniforme, apresentando pouca anisotropia vertical, resultante do processo 
pedológico de sua formação. As variações verticais são, geralmente, mais nítidas 
quando estão próximas da camada ou horizonte de capeamento vegetal 
sobrejacente. As variações em sentido horizontal são pequenas nas partes altas e 
planas. Em condições normais, não ocorre o lençol freático dentro da camada de 
solo arenoso fino. O que pode haver é lençol suspenso, logo abaixo do solo 
vegetal ou orgânico e anisotropia de umidade, inerente aos horizontes 
influenciados pelos processos pedológicos.

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