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apAPA Apaixonada Pela Vida Nice Wives Finish First Patricia Phillips A VIDA LHE DEU TUDO. AMOR DURADOURO. MENOS UM. Depois de vinte e cinco anos de casamento, Ashley tem uma filha já casada e uma carreira de sucesso. Com cinquenta anos de idade, seu marido Marcus ainda é um homem atraente, ao passo que ela precisa urgentemente emagrecer e cuidar mais da aparência. Por outro lado, depois de tanto tempo juntos, será que isso faz alguma diferença?... Para Marcus, sim. Pois ele não hesita em abandonar a esposa por uma mulher bem mais jovem e sedutora. Após se recuperar do choque e da desilusão, Ashley decide recuperar a auto-estima e acordar para a vida, e sua primeira meta é realizar o sonho de se tornar estilista de moda. Sozinha e independente, ela redescobre dentro de si a mulher determinada e sensual que foi um dia, e percebe que ainda pode acalentar sonhos e esperanças para o futuro. Sucesso profissional, por exemplo... e quem sabe, talvez... por que não... uma nova paixão?... Disponibilização: Rosangela Digitalização: Joyce Revisão: Regina Celi BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 2 Capítulo I Era maio de 2003, e o tempo em Los Angeles, Califórnia, estava anormalmente quente. Como de hábito, as manhãs de maio traziam um céu carregado, com nuvens e grãos de poeira e neblina dançando a frente dos carros. Ainda assim, o calor chegava bem cedo na Califórnia, mas na casa de Ashley Lake, em Playa Del Rey, estava fresco e agradável. Ashley permanecia no centro da cozinha decorada com revestimentos de fórmica cinza e branco. Na bancada da pia podia-se ver um pote prateado para café, perto de um sino ornamental igualmente prata. Tudo na casa brilhava à luz dos raios de sol filtrados pelas grandes janelas envidraçadas. Havia silêncio também. Ashley até podia ouvir as folhas das árvores dançando sob o toque da brisa, enquanto preparava sanduíches de presunto temperados com salsa, e uma vasilha de salada de batatas suficiente para dois, tudo colocado numa bandeja a ser transportada até o pátio. Tinha utilizado sobras do jantar da noite anterior, feito em comemoração aos cinquenta anos do marido, Marcus. Cuidadosa, ela completou o lanche adicionando à bandeja dois copos de chá gelado, com fatias de limão caprichosamente inseridas nas bordas. Ashley Lake era uma mulher atraente e agradável, mas simples no pensar e no vestir. Estava um pouco acima do peso era verdade, mas já seguira diversas dietas sem conseguir emagrecer. Aos quarenta e cinco anos, por que se preocupar com o excesso de peso? Seu marido nunca se queixara disso e ela também resolvera não dar tanta importância ao fato. O vestido marrom e sem mangas que usava naquela tarde era largo na cintura e descia até bem abaixo dos joelhos. A pele levemente bronzeada ainda se mostrava suave e saudável, e os grandes olhos negros saltavam atrás dos óculos de armação metálica. Os cabelos desciam até os ombros, mas hoje estavam presos por fivelas no alto da cabeça. Não se poderia dizer que era uma mulher glamorosa, mas muitos a consideravam bonita. Ao apanhar a bandeja, Ashley sentiu uma dor no abdômen e parou onde estava. Respirando fundo, colocou a bandeja sobre a mesa e inclinou-se um pouco para frente, a fim de controlar melhor a dor. A fraqueza a dominou, mas, por sorte, a dor logo desapareceu. No instante seguinte ela endireitou as costas e saiu com a bandeja pela porta de vidro que levava ao pátio. Vanessa, sua velha amiga, ergueu-se da mesa redonda que ocupava a fim de ajudar. — Estou faminta — disse. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 3 — O seu sanduíche de presunto é delicioso. Ashley sorriu e passou à amiga um copo de chá gelado. — Viu aquele vestido horroroso que Shirley usou ontem à noite? — Vanessa foi logo dizendo. — Algumas mulheres vestem roupas estampadas com flores pequenas, mas Shirley exagera no tamanho das estampas. Parece um jardim, chega a ser desagradável. Além disso, os modelos dela sempre são tão fora de moda! — Sim, eu vi. Shirley é assim desde quando nos conhecemos. — Ashley riu. — Mas não conte a ela que estava com péssima aparência e que o marido dela não tirava os olhos de certa pessoa que conhecemos bem. Aliás, ele deixou óbvio que ainda gosta de você, Vanessa. Acho que ele nunca vai superar isso. — Já se passaram vinte anos, Ashley. Ainda estávamos no colégio. — Vanessa deu de ombros antes de observar os olhos inchados da amiga. — Você parece cansada. Está doente ou é falta de sono? Afinal, foi o aniversário de seu marido e tudo mais. Por acaso ficaram acordados até tarde? — provocou-a, piscando os olhos com ar maroto. — Nem tanto. Esta dor me impede de fazer isso. Estou velha demais para conviver com dores abdominais. — Ashley franziu o cenho, com desgosto. — Quanto mais velha, mais essas dores me incomodam. — Amiga, por que não escuta seu médico e faz a histerectomia? Sinto-me muito bem desde que tirei o útero. Sem estas dores você e Marcus teriam mais noites de prazeres. Da forma que está não é saudável para nenhum casal. — Vanessa ergueu o dedo indicador, como se repreendesse uma criança. Ashley a fitou atentamente. Para alguém de quarenta e cinco anos, Vanessa parecia jovem e radiante. Ela caminhava todos os dias a fim de manter a forma e embora fossem da mesma idade, Ashley sabia aparentar ser cinco ou seis anos mais velha que a amiga de longa data. Eram íntimas, mas de personalidades muito diferentes. — Você me ouviu? — Vanessa insistiu, ao vê-la silenciosa. — Claro, ultimamente tenho pensado na cirurgia, mas ainda não decidi. — O que há para decidir? Se não se sente bem, o que a impede? — Não sei. Já viu alguma mulher feliz ou orgulhosa por ter feito histerectomia? Sinto-me velha só de cogitar esta hipótese. — Vamos, Ashley. Também acontece com mulheres mais jovens do que você. Precisa admitir que algum benefício virá da operação. ― Vanessa limpou os dedos, dobrou o guardanapo antes de levá-lo à boca, e devolveu-o cuidadosamente à bandeja. — Marcus foi ver Larry na última sexta — Ashley contou, obviamente querendo mudar de assunto. — Onde?— A voz da outra moça denotou-lhe o interesse crescente. — No clube. Marcus disse que convidou Larry para assistir ao jogo um domingo desses, mas sabe que ele nunca virá. Tem medo de se encontrar com você. De qualquer modo, segundo Marcus, ele está bem. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 4 — Sim, espero que esteja. Sinceramente, espero que ele ache alguém que o faça feliz. Gary foi a melhor coisa que me aconteceu na vida. Desde que compramos a casa em Pasadena, sinto-me no Paraíso. O único problema é que ele é tão mais novo que às vezes fico preocupada. — Não creio que você tenha problemas com a diferença de idade. É impensável deixar que oito anos a incomodem assim.— Ashley mordeu o sanduíche de presunto. — Não sei. Às vezes pesa um pouco, mas Gary parece não se importar. Ele tem mais experiência de vida do que eu e comporta-se como um homem mais velho. Quatro anos juntos, Ashley, e ainda nos amamos. Nosso amor apenas se fortalece à medida que o tempo passa.— Vanessa suspirou, gratificada e prosseguiu: — Nunca contei a ninguém que, às vezes, eu e Larry ficávamos um mês sem fazer sexo. Comecei a perder o interesse, depois pensei que não era mais uma mulher desejável. Jamais deixe um homem fazer você sentir-se assim,Ashley. Como pode um casal dormir na mesma cama por um mês e não se tocar? — Não sei querida— mentiu ela, desviando o olhar. Não, não estava preparada para dizer que era exatamente isso que vinha acontecendo com ela e Marcus. — Ninguém sabe. E quando acontecia, não existia troca de carícias, nenhuma intimidade ou envolvimento emocional que duas pessoas que se amam devem demonstrar. Incrível, mas quando conheci Gary costumava me derreter toda vez que ele me tocava. Ainda é assim. Ashley reparou no brilho dos olhos de Vanessa ao falar do jovem marido. Naquele instante, porém, o telefone soou dentro da casa e Ashley saltou da cadeira. — Volto já. Provavelmente, é Marcus. Vanessa tirou os sapatos e esticou os pés até na cadeira que ficava do lado oposto da mesa. O pátio de Ashley sempre fora confortável e tranquilo. Relaxando, ela inalou o aroma do limoeiro próximo, das flores e do gramado verdejante impecavelmente aparado. Poucos segundos depois, Ashley retornou e acomodou-se diante dela. — Era Marcus. Ele está num bar da praia Hermosa, assistindo a um jogo no telão.— Olhou para o relógio: somente quatro e meia. — Bem, você sabe como os homens se comportam ao verem junto qualquer tipo de jogo. Ficam impossíveis, parecem crianças. Vanessa anuiu, mas não gostou muito do que ouvia. Sim, ela conhecia bem todos os sinais que estava vendo na relação de Ashley e Marcus. Já tinha vivenciado o fim de um casamento e pelo jeito o mesmo estava acontecendo com sua boa e velha amiga. Na noite anterior, lembrava-se de ter observado Marcus durante sua festa de aniversário. Por um instante, pareceu-lhe que ele estava a milhares de quilômetros dali. Os pensamentos vagavam por outras paragens e o marido de Ashley mostrava-se inquieto, agitado. Pior ainda, ele e Ash não haviam dançado juntos, nem aparentavam ter muita coisa a dizer um ao outro. Finalmente, quando a noite terminou, Marcus estava desligado por completo. O BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 5 que não era um bom sinal. Alheia ao que ia na mente da amiga, Ashley serviu-lhe mais chá gelado e esperou que Vanessa continuasse o que estava dizendo: — A verdade é que Larry tornou-se complacente demais com nosso casamento, deixava sempre tudo para depois e preferia assistir à tevê a fazer um programa mais romântico. Ao lado de Gary, sinto-me bonita e amada— confidenciou ela com um sorriso. — O sexo entre nós é ótimo, e percebi o quanto eu tinha perdido em matéria de excitação e prazer, além, é claro, de ser maravilhoso estar apaixonada depois de tantos anos. — Creio que os casais têm fases, isto é, vivem momentos diferentes do amor ao longo de suas vidas em comum — comentou Ashley, falando por experiência própria. — Talvez você esteja certa. Mas não era o que acontecia entre Larry e mim. O amor se foi e não voltou nunca mais. Conclusão perdemos o que a vida tem de melhor. Ashley suspirou enquanto ouvia Vanessa comparar o ex-marido ao atual. — Marcus está com cinquenta anos e eu com quarenta e cinco — disse ela por fim. — Somos velhos demais para sentir falta de emoção em nossas vidas. Estamos casados há vinte e quatro anos e Lori já tem vinte e três e cuida da própria vida. O que mais posso pedir? Vanessa não achou o comentário da amiga tão convincente quanto ela pensava. Há muito já notara que Ashley não parecia feliz. Mas podia ser apenas por causa daquelas dores abdominais que tanto a incomodavam, não podia? — Vamos, Ash, será que não necessita nada mais do que uma casa, um marido e uma filha? Não sente falta do resto? E Marcus? Ashley demorou alguns segundos para responder. Os olhos se estreitaram quando virou-se para apreciar o céu. Por certo, ela e Marcus ainda se amavam. Sem dúvida, ainda estava apaixonada por ele. Claro que beijos longos e molhados, mãos unidas, corpos trêmulos já não existiam mais, mas ambos continuavam juntos e confortáveis com suas respectivas vidas. — Já não somos crianças, Vanessa. Temos tudo que precisamos para viver confortavelmente. Não necessito da emoção que costumávamos partilhar quando mais jovens. No entanto, continuo apaixonada por Marcus e, depois de vinte e cinco anos, não sei o que faria sem ele. A idéia de perder Marcus era tão aterradora que Ashley a baniu de sua mente o mais rápido possível. Ele ainda a amava também. Claro que amava! Não quisera que lhe dessem uma festa, mas por fim concordara como sempre fazia. Eles tinham tudo que um casal de meia-idade poderia desejar. O único problema era que ultimamente Ashley não vinha se sentindo bem. A endometriose estava causando sangramentos frequentes, e os espasmos de dor pioravam a cada dia. Marcus compreendia, pois era um homem paciente. Vanessa consultou o caro relógio de pulso. — Adorei nossa conversa, mas tenho de ir. Gary vai chegar cedo e também tenho BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 6 de madrugar, amanhã. Em pé, a anfitriã recolheu os pratos e, com a mão livre, apertou o ventre. Vanessa levou a jarra de chá e ajudou a amiga a colocar tudo na pia. Depois, tocou o ombro de Ashley. — Se quiser, fico com você até Marcus chegar. — "Sabe Deus a que hora isso acontecerá", ela pensou, mas continuou ali, solícita e sorridente. — Não acho certo deixar você sozinha, nesse estado. — Pousou a mão espalmada na testa da outra. — Parece que está com um pouco de febre, Ashley. — Não, vou ficar bem. Já parou de doer. A dor, pelo menos, vem e vai rapidamente. — É melhor procurar seu médico e tratar de fazer a histerectomia. A vida é curta demais para ser levada com dor e desconforto. — Vou marcar para esta semana, sem falta. Pare de se preocupar tanto. As duas trocaram um abraço na soleira da porta. — Ligo amanhã — anunciou Vanessa. — Se eu não estiver em casa, telefone para o escritório. — Combinado. Agora, vá se deitar e descanse um pouco. Praticamente passou a noite em claro. — A visitante sorriu e afastou-se, revelando um sugestivo decote nas costas, que era bem típico de sua personalidade extrovertida. Assim que a porta do pátio foi trancada, Ashley tratou de ligar a lava-louça e seguir para seu quarto. Eram apenas cinco da tarde, mas ela despiu-se, desabou na cama e ligou o aparelho de tevê, com uma revista nas mãos. Assistiu alguns programas e leu alternadamente, até adormecer. Às oito e meia, ela escutou Marcus girar a chave na fechadura. Nunca dormia serenamente enquanto ele não chegava em segurança em casa. Havia pensado que, com sua filha Lori morando fora, não teria mais esse problema. Mas tinha, ficava ansiosa até que o marido entrasse em casa e lhe desse um beijo de boa-noite. Marcus ouviu a televisão ligada e foi direto ao quarto. Da porta, contemplou Ashley demoradamente. — Foi cedo para a cama hoje. Algum problema? — Ainda estou cansada da festa — contou ela. Sentando-se, recostou-se na cabeceira e observou Marcus despir-se e colocar os sapatos no closet. Ash estava exausta, ponderou Marcus, mas ele não fizera a menor questão daquela festa. Fora tudo idéia dela, portanto, não poderia culpá-lo por isso, poderia? Uma noite tranquila, com um bom jantar e um bom filme na tevê, a seu ver, teria sido mais do que bom para comemorar seus cinquenta anos. — Vou à saleta para ver tevê sem perturbá-la. Durma de novo — falou, começando a sair do quarto carregando o volumoso guia da tevê nas mãos. Pensando na conversa que tivera com Vanessa, Ashley permaneceu sentada na cama, mas esticou a mão na direção do marido. — Pode assistir aqui mesmo, Marcus. Fique por favor. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 7 — Não, querida. É melhor você descansar. Por alguma estranha razão que não soube ao certo como definir, talvez por puro comodismo mesmo, Ashley não o contradisse. Logo que ele saiu, ela voltou a deitar e deveria ter adormecido em seguida, pois apenas pestanejou quando Marcus se acomodou na cama, pouco depois das dez horas. Na manhã seguinte, foi ele quem se levantou primeiro. Havia tomado banho e estava quase todo vestido no momento em que Ashley acordou. Como sempre, Marcus lhe trazia o café na bandeja assim que ela saía do chuveiro, e depois trocavam um beijo na face e prosseguiam com suas rotinas. Naquela manhã as coisas pareciam que não seriam diferentes. Ashley saboreou o desjejum apoiada na cabeceira da cama, enquanto Marcus se examinava no espelho do quarto. Gostava de vê-lo vestir-se, sempre com esmero, combinando os tons de todas as peças e acessórios que usava. Naturalmente, os sapatos eram bem lustrados também. Marcus Lake era um homem muito elegante e, ao contrário da esposa, preocupava-se com sua aparência. — Você não dormiu direito, Marcus. Está cansado? — ela perguntou, questionando-se se sua preocupação não seria exagerada. — Tem tido problemas de sono nas últimas duas semanas. — Cansaço — Marcus riu. — Provavelmente preciso de umas férias. — Podemos ir para algum lugar agradável, se você quiser. Faz dois anos que não viajamos juntos, desde o funeral de sua tia em Dálias. — E você, sente-se melhor? — Ele não comentou a sugestão de viagem. — Ou já pensa em fazer a cirurgia? — Tenho refletido sobre o assunto, mas não estou doente. Podemos viajar, se você puder livrar-se dos compromissos. No meu escritório, o ritmo está tranquilo e não haverá problemas se eu sair por alguns dias. Novamente ele não respondeu. Parecia entretido com o nó da gravata. Mas era um homem gentil, preocupado com ela e apegado à família, não? Nunca deixara faltar nada a ela e a filha. Ashley sentia-se afortunada por ter um bom marido como aquele. — Só viajaremos quando você estiver melhor, querida. — Estou bem, Marcus. Não se aflija por mim. Dando o assunto por encerrado, ela foi até o armário e escolheu uma conjunto de saia e blusa cinza, que vestiu no mesmo instante. Então, de repente, notou que o marido a observava com o cenho franzido. Ah, sim, Marcus detestava as cores que usava. Ele odiava marrom, cinza e preto. Quando lhe comprava roupas de presente, escolhia sempre tons alegres e coloridos. Consciente de que sua aparência o desagradava, Ashley trocou o terninho cinza por um vestido lilás que ganhara da filha dois anos antes. — Marcus, tem certeza de que está bem? — perguntou, quando ele não fez qualquer comentário sobre a troca de roupa, o que por si só já era estranho, pois ele sempre a elogiava quando vestia o traje lilás. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 8 — Claro, não se preocupe por tão pouco. Esta noite dormirei bastante e amanhã estarei novo em folha. — Ele recolheu a bandeja e rumou para a cozinha. Ashley observou os ombros largos e a postura imponente enquanto ele saía. Marcus parecia irritado naquela manhã, mas vinha trabalhando além do expediente e assumindo mais responsabilidades do que o normal. Imaginou-o na cozinha, contemplando o pátio pela porta envidraçada. Aos cinquenta anos, era mais bonito do que fora dez anos antes. Os cabelos grisalhos nas têmporas lhe davam um ar de distinção. Os olhos eram penetrantes e o corpo, mantido em boa forma graças a longas sessões de ginástica na academia da empresa em que trabalhava como diretor de marketing estava mais forte e definido do que quando haviam começado a namorar. Ainda estava pensando em como o marido era atraente quando ouviu a porta da frente sendo fechada. Surpresa, ela deu-se conta de que Marcus havia partido sem se despedir. Deveria estar mesmo muito apressado. Balançou a cabeça, relembrando o tempo em que ele não saía sem dar-lhe um beijo de despedida, depois suspirou ao recordar a época em que faziam amor todas as manhãs e se atrasavam para o trabalho. Ah, agora parecia que isso acontecera há uma verdadeira eternidade! Talvez Vanessa estivesse certa, afinal. Ela poderia mesmo marcar a cirurgia para tirar o útero, e então teria a chance de trazer aqueles dias felizes de volta a seu casamento. Suspirando, Ashley pegou a pasta, a bolsa e as chaves do carro. Tomou um último gole de café e correu para a garagem. O percurso até a empresa de seguros na região oeste de Los Angeles demorava vinte minutos. Ela trabalhava lá há dezoito anos, como gerente de planejamento estratégico, e, como tudo o mais em sua vida, o trabalho já havia se transformado em uma rotina bastante previsível. Nada de surpresas. Era sempre a mesma coisa. Mas era bom que fosse assim, não? Para que mudar quando era mais fácil mover- se em um ambiente perfeitamente controlável? Quem garantia que poderia ser mais feliz se ousasse se arriscar um pouco mais? Pela primeira vez em anos, Ashley não estava tão certa de que rotina e comportamentos previsíveis poderiam ser sinônimos de felicidade. Talvez, mudanças não fossem de todo ruim... Ao meio-dia, ela concluiu que não suportaria ficar no escritório o dia inteiro. Sentada a sua escrivaninha, sentiu espasmos no baixo-ventre e a coluna parecia ter sido quebrada em dois. Para piorar, tinha de ir continuamente ao banheiro. Aborrecida consigo mesma, colocou alguns relatórios dentro da pasta e avisou a secretária que estava saindo e que não voltaria. Na rua, decidiu ligar para Marcus. Ele parecera preocupado naquela manhã. Se telefonasse para o escritório e Julie dissesse que ela tinha ido embora por sentir-se mal, o marido por certo viria correndo para casa, a fim de vê-la. Mas não queria preocupá-lo por nada; assim, pegou o celular e discou a conhecida sequência de números. Como o celular de Marcus estivesse ocupado, Ashley deixou mensagem na caixa postal: só estava cansada e ele não deveria ficar aflito. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 9 Quando ela chegou em casa, o carro do marido estava estacionado na entrada da garagem. Deduziu imediatamente que ele ligara para a empresa e tinha vindo constatar se o estado dela não era grave. Em vez de parar na entrada, obstruindo a passagem, Ashley estacionou na rua. Marcus precisaria sair, e ela não gostaria de manobrar seu carro. A dor parecia aumentar, mas, como sempre, não durava muito. Ela apressou-se a seguir casa adentro e encontrou o marido no quarto, arrumando roupas numa mala grande que jazia no centro da cama. — Vai viajar de novo, a trabalho? Você esteve na Flórida há menos de um mês. — O desapontamento era evidente na voz dela. Ele continuou a aprontar a mala, sem ousar encará-la. — Não é a trabalho, Ashley. — Marcus havia amado a esposa durante muitos anos, mas agora as coisas eram diferentes. Por isso, não conseguia encará-la. Alguns segundos se passaram antes que alguém falasse. — Se não é a trabalho, então o quê? — Ela mostrou-se confusa. — Ashley... — Já sei! — Entusiasmada, ela avançou e beijou-o na face. Sentia-se alegre, exceto pela sensação de culpa por ter estragado uma surpresa, ao chegar mais cedo. — Você tem duas passagens para a Flórida ou outro lugar em que possamos ficar juntos e descansar um pouco, não é? Ela exultava ao falar, pensando num recanto romântico no qual estariam sozinhos por alguns dias. Mas Marcus não respondeu. — Ah, que bom! — Ashley não cabia em si de felicidade. — Também preciso disso, querido. Desculpe-me por ter vindo derepente e estragado a surpresa. Quando fomos a San Francisco, você também fez as malas, a sua e a minha, na hora em que cheguei do trabalho, como hoje. Estou feliz e te amo muito, Marcus. Ashley o beijou de novo, e ele meneou a cabeça. Aquilo seria mais difícil do que havia imaginado mais difícil para ambos. Suspirando, segurou as mãos dela entre as suas. — Escute Ashley. Não vamos juntos a lugar algum. — As unhas bem-feitas comprovavam a vaidade de Marcus Lake. — Estou deixando você. Preciso partir. Temos de terminar este casamento que, para mim, já não funciona mais. — Fez menção de prosseguir, mas notou o tremor que a percorreu de alto a baixo. Ashley continuava parada onde estava fitando-o como se não houvesse compreendido nada. Então, lentamente, fechou os olhos escuros, sentindo como se o mundo tivesse desabado sobre seus ombros. Perplexa, esperou que Marcus continuasse, mas ele limitou-se a fitá-la em silêncio. Será que tudo não passava de um pesadelo? Aquele era seu marido! — Marcus, o que você está dizendo? — Sentia-se confusa, mas, ao mesmo tempo, a raiva começava a crescer em seu peito. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 10 — Não! Meu Deus, isto é real! — exclamou para si mesma. — Você enlouqueceu? — Olhou em torno do quarto e, pela primeira vez, notou que duas outras malas fechadas estavam ao lado da porta. Ele não respondeu. Havia ternos empilhados sobre a cama e caixas com sapatos devidamente separadas, mas nenhum vestido dela. Tudo pertencia a Marcus e ele ia abandoná-la. A imagem das roupas ficaria para sempre em sua memória. Sem conseguir encarar o marido, Ashley fechou os olhos outra vez, tentando recordar a conversa daquela manhã. O que lhe escapara durante o diálogo? O que existia de diferente com relação a Marcus? Não era porque ele tinha dormido mal nem porque estava cansado do trabalho. Estava cansado, sim, mas era de viver com ela. — Não entendo Marcus. Por quê? — indagou mortificada pela idéia de viver sem ele. — Ashley, você é uma boa esposa e uma excelente mãe para nossa filha. Mas preciso mais. A emoção, o arrebatamento se foram, não sentimos mais o coração disparar quando nos beijamos. Ficou só um grande vazio. Não deseja mais do que isso para você mesma? — Não, Marcus, não desejo. Tenho tudo o que sempre quis como esposa e mãe. — A voz soou trêmula e baixa. — Sinto muito. Eu quero muito mais do que isso para mim. — A dor no rosto de Ashley apertou-lhe o coração. Marcus detestava magoá-la. Por outro lado, ela se tornara inteiramente previsível, e nada fazia para mudar isso. O mesmo penteado, as mesmas roupas escuras e sem graça, a mesma posição ao fazerem sexo, com ele por cima. Para ela, tudo era perfeito do modo como estava e como havia estado por vinte e cinco anos. E ele queria mais, muito mais! Ao vê-lo encará-la com pena, Ashley estremeceu, sentindo a dor no ventre voltar. — É outra mulher, não é? Pode me contar. Alguma vadia que o enfeitiçou. Diga, Marcus. Quem é ela? — O tom de Ashley subira até se tornar um grito. — Quem é essa mulher por quem está me abandonando? Ela apareceu para arruinar nossas vidas! Sem responder, Marcus permaneceu observando-a, como se esperasse dela um soco no peito, para que igualmente experimentasse a dor que a acometia. Em seguida, sentiu mais pena dela ainda. Afinal, era um homem bastante controlado, até naquela situação difícil e tinha certeza de que Ashley o odiava por ser sempre tão calmo. — Existe outra mulher, sim. Mas não é por isso que estou partindo. Ela apenas me fez perceber que não sou feliz o bastante para ficar com você. Mesmo que terminasse com a outra, eu não conseguiria continuar aqui. Ainda amo você, Ashley, mas já não estou apaixonado. Nós dois merecemos muito mais. — Faltaram-lhe palavras. Nada mais havia a ser dito. Assim, Marcus pôs-se em pé outra vez, pronto para sair. — Você é um canalha! Como pôde, Marcus? Tenho quarenta e cinco. Dei-lhe os melhores anos de minha vida. Como é possível descartar vinte e cinco anos de casamento? Vinte e cinco anos que o amei. Você esperou eu ficar velha para me BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 11 abandonar! — Sou mais velho do que você, e nunca pensamos igual. Tenho cinquenta, mas não me sinto velho. Estou na idade em que preciso me apaixonar e viver feliz o resto da vida. Eis a diferença. — Ele meneou a cabeça. — Não temos mais nada em comum, Ashley, e certamente você é capaz de entender isso. — Nada em comum? — ela gritou. — Olhe a sua volta, Marcus. Temos esta casa, uma filha e vinte e cinco anos juntos. O que mais você quer? — Ashley abriu o primeiro botão do vestido lilás, que a apertava na região do pescoço. Mas logo soube que o incomodo não era causado pela roupa, mas sim por seus nervos. — Correção — ele se pronunciou. — Temos uma hipoteca em comum, uma filha já adulta que tem sua própria vida. O que você falou não basta para me convencer. Deixe estar, Ashley. Naquele momento, ela desejou morrer. — Bem, Marcus. O ônus de sair de casa agora é todo seu. — Ashley segurou o rosto entre as mãos. Com clareza, compreendeu que tudo havia acabado. Ele fechou a última mala e foi naquele exato momento que Ashley se deu conta de que se chegasse no horário de costume do trabalho, não o teria visto partir. — Covarde! Você ia embora sem ao menos me comunicar! — falou levantando um braço na direção dele. Ele a segurou pelo pulso. — Estava fazendo as malas para levá-las sem que você visse. Seria mais fácil assim. Mas pretendia voltar e contar-lhe tudo. — Nada havia saído como desejara, e Marcus só a estava magoando cada vez mais. — Seria mais fácil? Como? Você disse que não me quer, isso é tornar as coisas mais fáceis? Já não sei quem você é, Marcus, mas eu te odeio de qualquer forma. — A frase saiu por entre os dentes, sussurrada. Como fazê-lo entender? Como fazê-lo ficar? Como impedi-lo de despedaçar seus sonhos daquela maneira? Desconsolada, fechou os olhos e foi chorar nos ombros largos. Talvez, pela força do hábito. — Marcus, posso perdoar você, porque todos erram. Posso mudar, fazer tudo o que quiser. Apenas reconsidere e fique comigo. Marcus apertou-a contra si. — Por favor, Ashley. Você está tornando tudo mais difícil do que já é. — Retirou os braços dela de seu pescoço. — Agora preciso ir. Desconcertada, ela deu um passo atrás e deu-lhe um tapa no rosto. Surpreso, Marcus recebeu o golpe e empurrou Ashley para longe. — Lamento muito — disse ele com raiva, apanhando duas malas e saindo bruscamente pela porta. Voltou minutos depois a fim de recolher o resto da bagagem. Desta vez, ela o seguiu até os degraus da varanda. — Vá embora — bradou atrás dele. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 12 — Corra para ela. Para sua amante. Nunca mais quero vê-lo, Marcus Lake. Ouviu bem? Vai se arrepender disso. Vá, e jamais se atreva a voltar. — A despeito do tom alto, ele a ignorou. Nem mesmo lhe dirigiu um olhar. Ashley correu de volta para dentro de casa, jogou-se na cama e chorou enquanto escutava o carro do marido afastar-se. Na verdade, chorou horas a fio, e a noite caiu antes que ela decidisse erguer-se e fechar as janelas. Vagou pelos aposentos como um zumbi. A certa altura, apanhou um copo d'água e o levou para o quarto, depositando-o no criado-mudo. Ainda completamente vestida, retornou à cama, para debaixo dos lençóis. Chorou de novo até sentir-se exausta e por fim adormeceu, às quatro da manhã. Acordou ao som de passos. "Graças a Deus,Marcus voltou", pensou. Mas, antes de virar-se na cama, percebeu que tinha sido apenas um sonho. Um calafrio a percorreu e, de súbito, a dor no ventre voltou a torturá-la, mais forte do que nunca. Estava transpirando e a dor foi substituída por uma sensação quente e estranha. Sentia-se zonza e o quarto parecia girar enquanto ela tentava se pôr em pé. Removeu o edredom e gritou quando viu o sangue que descia por suas pernas até o lençol azul. Fraca demais para erguer-se, Ashley desabou na cama outra vez. A dor agora era quase insuportável. Tentou alcançar o telefone, porém estava longe demais. Reunindo as últimas forças, ela se levantou, notando o sangue escorrer em profusão, e caiu no carpete. Puxou o telefone pelo fio e conseguiu discar o número da Emergência. — Estou sangrando — murmurou ofegante. — Há sangue por todo lado. — Sua voz era pouco audível e Ashley teve de repetir o nome e o endereço duas vezes para a atendente. Sabia que tinha de arrastar-se até a porta principal, para abri-la quando o socorro chegasse. Assim, foi até lá lentamente, deixando uma trilha vermelha por onde passava. Destravou a porta com grande esforço. De repente, sua cabeça pendeu para trás. A casa inteira rodava. — Marcus! — ela gritou, ao dar-se conta de que estava irremediavelmente sozinha. Era terça de manhã, e Ashley ouviu uma voz feminina vinda de algum ponto distante. — Acorde, Sra. Lake — pediu a enfermeira com suavidade. Ela não conseguiu abrir os olhos, pois a luz do quarto do hospital era forte demais. Percebeu passos e movimentos a seu redor, depois alguma coisa como plástico sendo ajustada a seu braço. Chamou por Marcus mais de uma vez, mas então lembrou-se da mancha de sangue no carpete e da inesperada partida do marido. Sim, Marcus a deixara e ela estava internada, sozinha. "Por que acordei?", pensou. Sentindo como se o mundo tivesse terminado, Ashley apertou os olhos para esquecer sua triste realidade. Queria fugir, para onde não sabia, mas queria muito fugir para bem longe de tudo e todos! Logo, impelida pela dor e pelos medicamentos, mergulhava num sono profundo outra vez. Ali, pelo menos, a dor de ter sido traída e abandonada não era tão insuportável. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 13 Ashley só voltou a despertar na tarde de quarta-feira, agora ao som das vozes de sua mãe, Dóris, e da filha Lori. As duas mulheres mais importantes de sua vida ocupavam cadeiras ao lado da cama e esperavam que a paciente acordasse. Afinal, ela tinha dormido por mais de vinte e quatro horas seguidas e, cada vez que acordava, dizia o nome de Marcus. — Mamãe, como se sente? — indagou Lori, curvando-se em sua direção. — Já chamei papai, mas ele não retornou a ligação. Não compreendo. Tinha certeza de que ele estaria aqui. — Está fora da cidade — interveio Dóris, tentando ser prática. — Mas deveria interromper a viagem e vir imediatamente. O que aconteceu entre você e ele, Ashley? Por certo, não era uma boa hora de relatar os fatos a Lori, e menos ainda de ter sofrido uma histerectomia, quando o marido acabara de deixá-la por outra mulher. Sentindo-se velha e rejeitada, Ashley levou as mãos ao ventre, apenas para lembrar- se de que também estava muito acima do peso. — Marcus e eu não vivemos mais juntos — tomou coragem e revelou a verdade. — Acho que ele ainda está na cidade, mas sabe que não o desejo por perto. Portanto, não liguem mais para ele, sim. Lori inclinou-se para a mãe, beijando-a na testa. A jovem de vinte de três anos era alta e magra, com a mesma compleição física harmoniosa do pai e os mesmos cabelos castanhos, escorridos até os ombros. Costumava manter a cabeça bem erguida, com orgulho, mas agora se assemelhava a uma criança ferida. — Por quê, mamãe? Não acredito! Você e papai, separados? — Voltou o olhar para a avó, ciente de que o casal às vezes discutia, mas nada de grave. — Onde ele foi morar? — Não sei Lori e também não quero saber. — Ele voltará em uma semana — sentenciou Dóris, querendo tranquilizar a neta. — Sua mãe e seu pai nunca se separaram em vinte e cinco anos de casamento. Aposto que Marcus estará em casa quando Ashley tiver alta. Mas Ashley não queria dar falsas esperanças à filha. — Ele nunca voltará, portanto não contem com isso. — Doía-lhe ver a tristeza nos olhos expressivos de Lori. — Você só fala assim porque não está bem — decretou Dóris. — É verdade, mãe. Não quero ver Marcus nunca mais. Nem mesmo pronuncie o nome dele na minha presença. — Apesar de imobilizada no leito do hospital, Ashley parecia estar à beira da histeria. Passou a tossir, e isso lhe causou dores abdominais, levando-a a chamar a enfermeira pela campainha. Com horror, Lori acompanhou o sofrimento da mãe. A enfermeira entrou apressada no quarto, colocou um travesseiro extra atrás da cabeça de Ashley, mais um sobre sua barriga, e deu-lhe um copo d'água tão logo a tosse passou. — Quando tossir, aperte o travesseiro contra o ventre. Isso ajudará a reduzir a BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 14 dor. Amanhã, você estará melhor. — Saiu do quarto como entrara, rapidamente, talvez para evitar perguntas incômodas. — Mamãe, por que não esperamos um dia ou dois e avisamos papai? — Lori escolheu as palavras a fim de não irritar Ashley. — Quer que eu traga algumas revistas, ou qualquer outra coisa? Posso voltar aqui. — Não, Lori. Não preciso de nada. Fique em casa e eu dormirei bem, aqui. Venha amanhã. — Ela não desejava conversar sobre Marcus, e sim dormir o resto da vida, se possível. — Você também, mamãe. Volte amanhã. Nenhuma das duas pretendia aborrecer Ashley, portanto obedeceram e saíram tranquilamente. Uma vez no corredor, o diálogo foi inevitável. — Ela precisa ficar sozinha, Lori. Quanto à dor, a enfermeira lhe dará um sedativo, além de uma pílula para dormir. Acho que sua mãe necessita de tempo e sossego para pensar. — Dóris disfarçou sua preocupação a fim de poupar a neta. — Estou certa de que Marcus voltará para casa. — E se não acontecer, vovó? — Lori parou à porta do elevador. — Acontecerá, querida. No fim da semana ele estará em casa e tudo voltará ao normal. — Algo muito sério aconteceu, vovó, e acho que as coisas entre eles jamais voltarão a ser como antes. Caladas, as duas mulheres entraram no elevador tentando compreender o que havia acontecido com Marcus e Ashley naquele final de semana. Como, de uma hora para outra, o casal simplesmente dizia estar separado? Bem, uma coisa parecia certa, a vida dos Lake estava prestes a mudar radicalmente, se é que já não tinha mudado Agora se era para melhor ou para pior, era muito cedo para saber... — Você está acordada? — perguntou Vanessa, sentando-se na cadeira ao lado da cama do hospital. — Sim, estou. — Ashley arregalou os olhos e sentiu a boca seca. A amiga lhe passou o copo d'água que estava na mesinha-de-cabeceira. — Que horas são? — Cinco e meia. Tentei vir mais cedo, mas o trânsito... Por que não me chamou quando passou mal, Ashley? Eu teria vindo com você ao hospital. — Não houve tempo. O pessoal da emergência me trouxe para cá e o cirurgião logo disse que precisava tirar o útero para estancar a hemorragia. Deveria ter escutado você e feito a operação meses atrás. — Ashley imaginou se isso teria feito alguma diferença em sua vida conjugal. — Ainda bem que deu tudo certo... Mas, sabe, fiquei surpresa com o recado que você deixou sobre Marcus. Sabe alguma coisa dele? — Não, nem quero saber. — Ela começou a chorar de repente. — Também não sei por que ainda choro. É tarde demais.— Tem certeza, Ashley? BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 15 — Tenho. Marcus estava me enganando, Vanessa. Nunca poderei voltar para ele. Acho que você sabia, não? — Não, mas suspeitava. Conheço os indícios. Sinto muito que tenha acontecido com você. — Gostaria que tivesse me alertado sobre esses indícios, Vanessa. — Bem, nunca vi Marcus com outra mulher. Não podia especular nem acusá-lo. Você me conhece. — Vanessa reparou que o rosto da amiga estava mais afilado depois da cirurgia, e com olheiras. Ela enrugava a testa a cada movimento e seguia secando os olhos com lenços de papel. A bandeja com comida também estava intocada na mesinha ao lado. — Sei que foi um choque para você, Ashley, mas tudo vai melhorar quando for para casa. — Ir para casa? O que vou fazer lá? Apenas me lembrar de Marcus fazendo as malas e me deixando? O médico entrou e Vanessa prudentemente afastou-se até a janela. Vestia uma roupa justa que lhe destacava as curvas generosas. Suas sandálias eram brancas e um par de brincos de pérola lhe enfeitavam as orelhas. Não podendo se conter, o jovem médico lançou um olhar de apreciação para a fogosa visitante. — Sra. Lake — ele emendou logo depois, fazendo um esforço óbvio para se concentrar — , os exames de sangue mostram que seu organismo, no momento, é uma bomba-relógio prestes a explodir. Vai ter de se cuidar. Perplexa, Ashley tentou se sentar. — Como assim? — Colesterol e pressão muito altos. A senhora está acima do peso e isso é um perigo. Vou prescrever as medicações e uma dieta rigorosa. É preciso prevenir um ataque cardíaco, já que passou por uma cirurgia delicada. Entende o que estou dizendo? Lágrimas voltaram a rolar. Ashley não só compreendia como tinha a sensação de que sua vida havia acabado. Estava velha, doente e sem marido. O que mais poderia dar errado? — Sim, doutor. Entendi tudo. Quando começo minha dieta? — Já instruí a enfermeira. Além da alimentação controlada, a senhora deve praticar exercícios, no mínimo longas caminhadas. Mas comece logo, Sra. Lake. Amanhã passarei para vê-la, outra vez. — O que achou? — Ashley perguntou a Vanessa assim que o doutor se despediu e saiu do quarto. — O melhor que pode fazer por você é ficar boa, amiga. Há uma vida inteira pela frente. Só tem quarenta e cinco anos. Perdendo peso e melhorando a aparência, você se sentirá bem. Mas leve os conselhos do médico a sério. Hipertensão não é brincadeira. — Sim, mas me sinto uma velha, sabia? — Soluçou e fechou os olhos novamente. Quando os abriu, teve de secá-los com mais um lenço. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 16 — Se soubesse que Marcus não me amava mais! Ele disse que a emoção em nossa vida conjugal havia acabado, e que não tínhamos mais nada em comum. Eu queria morrer, Vanessa. Foi horrível! — Balançou a cabeça, numa ênfase desnecessária. — Não foram palavras cruéis, mas me machucaram do mesmo modo. Impossível esquecê-las, mesmo que Marcus resolva voltar. Realmente acabou! — Eu sei, querida. Mas você precisa ir em frente. Quando estiver mais forte e retomar seu trabalho, verá que a vida não é tão sombria. E conte comigo para sair, conversar ou ir ao cinema. Deus sabe que você sempre me amparou, sem jamais me julgar. — Todos os dias, eu vinha do trabalho para casa, preparava o jantar para mim e Marcus, tomava um banho e lia um bom livro ou via televisão, antes de dormir. Qual será minha rotina daqui por diante? — Qualquer uma que lhe traga satisfação. Você não precisará mais cozinhar, lavar ou arrumar a cama se não quiser, Ashley. Morar sozinha tem suas vantagens, sabia? — Vanessa abraçou a amiga. — Agora coma o que a enfermeira trouxe e trate de ficar boa logo. Lembre-se de que amanhã é um outro dia. Capítulo II Na quarta-feira de manhã, Ashley acabara de se vestir quando a mãe e o pai chegaram para buscá-la. Já guardara a camisola e o roupão de banho que Lori lhe trouxera um dia depois da cirurgia e estava pronta para partir. Daniel, o pai, entrou primeiro, e Ashley notou o chapéu marrom que ele usava. Nunca saía de casa sem um boné ou chapéu, e a cor do complemento combinava com a de sua camisa. Era um homem grande, de ossatura larga, e por isso os quase cem quilos não o faziam parecer gordo. Era apenas forte e alto. — Pronta para enfrentar o mundo lá fora, Ash? — ele perguntou à filha, que, a julgar pelas olheiras e movimentos lentos, parecia de fato doente. Ah, se encontrasse BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 17 Marcus na rua, apertar-lhe-ia o pescoço com as duas mãos. Não podia admitir que alguém magoasse sua menina daquela forma! — Sua mãe arrumou seu quarto com esmero, filha, mas sem mudar nada do lugar. Ashley sentou-se na beirada da cama, não se arriscando a andar. — Obrigada, mas planejei voltar para minha casa, papai. Tudo de que preciso está lá. A correspondência, uma porção de comida no refrigerador, enfim... — Posso ficar com você na casa — disse Dóris sem hesitar. — Se é mais confortável para você, para mim não há problema. — Não se importa mesmo, mamãe? — Claro que ela não se importa! — Daniel respondeu por Dóris. Era outra de suas manias: tomar decisões pela mulher, sem consultá-la. — Claro que não — Dóris repetiu palavra por palavra, recolhendo as revistas espalhadas pelo quarto. — Bom. Papai pode ficar conosco se quiser. Sobrou muita carne desfiada da festa de Marcus. Daniel ergueu uma das mãos, recusando a oferta. — Obrigado, mas só estou comendo carnes brancas. Pressão alta, segundo meu médico. Naquele instante, a enfermeira chegou com uma cadeira de rodas e transportou Ashley até o saguão do hospital, enquanto Daniel trazia o carro do estacionamento interno. Dóris se encarregou da bolsa da filha. — Como costumamos dizer — expressou-se a enfermeira — , espero que não volte. Siga as recomendações do médico, Sra. Lake. — A jovem de branco não aguardou resposta e voltou a entrar no hospital. Daniel ajudou Ashley a se acomodar no banco do passageiro. — Muito simpática — ela elogiou a enfermeira. — Ao contrário, pareceu-me fria e arrogante – comentou Dóris, instalada no banco traseiro. — Você se sente bem, filha? Daniel, dirija devagar. — Estou bem, mamãe, e não se preocupe com o motorista. Surpreendentemente, Ashley viu-se ansiosa por chegar em casa e ocupar seu velho quarto, onde se sentia confortável. Tinha muita coisa em que pensar: o tratamento da hipertensão, a dieta, as caminhadas, o que fazer com o resto de sua vida. Não podia ficar pensando em Marcus e nos muitos anos que tiveram em comum. Apesar da dor e desilusão, era preciso seguir em frente. "Sim, a vida continua", Ashley repetiu para si mesma enquanto o carro deslizava pelas ruas movimentadas de Los Angeles. Daniel destrancou a porta para que Ashley e Dóris entrassem na casa. — Sente-se e descanse, querida — pediu Dóris, indicando o sofá. Ashley olhou em torno de si e constatou que a casa estava na mais perfeita ordem. — Você fez um belo trabalho, mamãe, limpando a sujeira que deixei. Sinto muito BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 18 que tenha visto meu sangue. — Não sinta, menina. Eu e Daniel viemos ontem aqui e cuidamos de tudo. Agora, pretendo fazer o almoço. Deve haver mais do que a carne que sobrou do churrasco na geladeira, não? Daniel ocupou um lugar no sofá, deixando o chapéu na mesa de centro.— Bem, pegue o que quiser — recomendou Ashley. — Acho que ainda há peru fatiado. — Movendo-se lentamente, ela rumou para seu quarto e deixou a bolsa sobre a cama vazia. De repente, lembrou-se de que fora ali que vivera seus anos mais felizes. A dor e a solidão a atingiram em cheio. Uma lágrima escorreu-lhe pelo rosto e ela a enxugou com mãos trêmulas. Nesse instante, o som estridente do telefone ecoou por toda casa, tirando-a de seus devaneios. Deu passo à frente para atender a extensão que ficava no quarto, mas, antes que pudesse fazê-lo, o telefone parou de tocar. Era óbvio que sua mãe já havia atendido na sala. — É Marcus — anunciou Dóris, entrando no quarto pouco depois. — Quer falar com você. O coração bateu mais rápido no peito dela, mas sabia que de nada adiantava ter falsas ilusões; por isso, falou simplesmente. — Diga a ele que não temos nada para falar. — Filha, Marcus parece preocupado com você. Ouça seu marido. — Por favor, mamãe. Diga que já falamos tudo o que precisava ser dito. — Temia cair em pranto se ouvisse a voz de Marcus outra vez. — Ashley! — Dóris a repreendeu. — Deixe a menina em paz — interveio o pai, parando no corredor. — Se não quer falar com aquele filho da... — Parou ao perceber lágrimas no rosto da filha. Ashley tinha vontade de sair correndo dali, mas estava física e emocionalmente impossibilitada de fazê-lo. Por que a mãe não acreditava que seu casamento havia terminado? Finalmente, Dóris pareceu entender que estava pedindo demais; em silêncio, deixou o quarto e retornou alguns minutos depois. — Bem, dei o recado — anunciou a senhora de cabelos grisalhos e olhar penetrante. — Ele mandou dizer que, se precisar de alguma coisa, basta ligar. — Sim, claro — Ashley ironizou. — Seria a última pessoa no mundo para quem eu ligaria. — Não fale assim, filha. — Dóris baixou a voz a fim de que o marido não a escutasse. — Por que não? É o que penso e sinto. — Ela passou a correspondência da cama para o criado-mudo, ainda sem abrir nenhum envelope. — A senhora, mamãe, pode ficar no quarto de Lori. Preciso descansar um pouco. — Na verdade, desejava ficar sozinha e refletir sobre o novo rumo que precisava dar BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 19 à sua vida, mas não podia dizer isso sem suscitar novas perguntas. O telefone tocou no final da tarde. Era Lori. — Adiantei meu trabalho, mamãe, e passarei aí para vê-la. — Certo. Estarei em casa. Não pretendia mesmo ir fazer compra no shopping — Ashley sorriu pela primeira vez em dias e recostou-se na cama que um dia dividira com o marido. Os comprimidos que tomava para dor tinham um efeito relaxante e, antes que pudesse se dar conta do que acontecia, já tinha pegado no sono. Só voltou a acordar quando ouviu o som da porta sendo aberta. Piscando os longos cílios castanhos, Ashley se virou a tempo de ver a mãe entrando no quarto, acompanhada de perto por Lori. — Nossa! Por quanto tempo dormi? — indagou, sentando-se na cama. — Duas horas. Como se sente? — Lori quis saber, ajustando o travesseiro atrás de sua cabeça a fim de deixá-la mais confortável. — Contente por estar em casa. Mas ainda é difícil me movimentar. Parece que um trator passou por cima da minha barriga. Não é uma sensação muito agradável. — Bem, o importante é que se recupere. Posso ficar com você pelo tempo que desejar — atalhou Dóris e sentou-se na poltrona, enquanto Lori se acomodava ao pé da cama. — O que está cheirando tão bem, mamãe? — Ashley respirou fundo e virou-se na direção da cozinha. — Não vá me dizer que fez aquela torta de legumes que adoro? — Acertou. O médico disse que precisa comer coisas saudáveis. Vou buscar um pouco para você. — Gratificada e orgulhosa pelo elogio, Dóris apressou-se em rumar para a cozinha. — Estou furiosa com papai — falou Lori, assim que a avó saiu. — Não sei se quero vê-lo novamente. Ashley fitou a filha com carinho. — Não quero que fique zangada com ele, Lori. O que aconteceu entre nós não diz respeito a você nem a suas relações com seu pai. — Claro que diz! — a jovem protestou. — Ele arruinou nossa família! — Não. Marcus sempre foi um bom pai para você. Certamente, é a pessoa que ele mais adora no mundo. — Como pode elogiá-lo, depois do que fez a você? — E justamente por que Marcus fez para mim, não para você. Está indo atrás da felicidade, e não se pode culpá-lo por isso. Quanto a mim, conseguirei me virar sozinha. Você fique fora disso, por favor. Pode ouvir dele o outro lado da história, porque ainda é seu pai. Mas não o estou defendendo nem jamais o perdoarei. — Tem certeza? — Sim. Não estrague o que vocês, pai e filha, têm em comum. Quantas crianças são abandonadas pelo pai ainda pequenas? Marcus pelo menos teve a decência de esperar você crescer e se tornar alguém na vida. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 20 — Do que vocês estão falando tanto? — Dóris interrompeu, retornando com um prato nas mãos. — Nada de muito importante — Ashley mentiu, forjando um sorriso. — Só estávamos lembrando qual foi a última vez que se comeu tão bem nesta casa, vovó — Lori riu e pegou o prato das mãos da avó ajudando Ashley a se servir. A velha senhora ocupou a poltrona vaga e estudou as feições da filha e da neta. Certamente, elas deviam estar falando de Marcus. O que mais poderia fazê-las parecer tão infelizes, embora tentassem sorrir? Um suspiro escapou dos lábios de Dóris e ela rezou secretamente para que a filha conseguisse superar tudo o mais rápido possível. Não ia ser fácil, mas Ashley era mais forte do que aparentava. Ela conseguiria. Era só uma questão de tempo. Marcus Lake não tinha o hábito de beber duas xícaras de café em menos de uma hora. Mas naquela manhã ele tinha pedido à filha Lori para passar em seu escritório, a caminho do trabalho. Afinal, a filha era repórter do tribunal de justiça, que ficava a poucos quarteirões da empresa em que ele trabalhava; portanto, não a estava tirando de seu caminho habitual. Sentado diante da escrivaninha suntuosa, Marcus batia nervosamente com a caneta sobre o tampo de mogno. Havia ligado para Lori na noite anterior, e ela se mostrara distante, zangada, dizendo com clareza que não queria falar com ele. Contudo, Marcus insistira em explicar que a separação de Ashley nada tinha a ver com o relacionamento deles como pai e filha. — Papai? — Lori surgiu na soleira da porta, tirando-o de seus devaneios. — Entre, querida. — Ofereceu-lhe a cadeira em frente à escrivaninha. — Você parece uma mulher de negócios com esse tailleur verde. — Também se parecia cada vez mais com a mãe quando jovem, pensou ele, mas não ousou verbalizar o que tinha em mente. — Como está Ashley? — Ante o olhar reprovador da filha, ele emendou: — Estou falando da cirurgia. Ela precisa de alguma coisa? — Não. Vovó Dóris tem ajudado, e eu passo por lá todas as tardes. — Boa menina. Sei que você tem somente alguns minutos, mas gostaria de dizer que lamento muito o que aconteceu entre mim e sua mãe. — Lamenta mesmo? — Lori cruzou os braços e o encarou com ar beligerante. — Quando se é jovem e apaixonado, o casamento é algo maravilhoso. Mas, às vezes, o encanto dura pouco e exige certo esforço para mantê-lo. Alguns casais se distanciam, vivem uma farsa. E quando os filhos partem, nada mais resta para uni-los. Foi o que aconteceu comigo e sua mãe, Lori. Não é culpa de ninguém, e sinto muito que tenha acontecido. — Por que não recomeçam? Você ainda a ama, papai? — Sim, mas não para vivermos juntos. Não me entenda mal, Lori. Ashley é umapessoa incrível, uma mãe extraordinária, mas é tarde para nós, como homem e mulher, quero dizer. Os olhos de Lori ficaram marejados de lágrimas. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 21 — Não quer tentar mais, é isso? — Já tentei antes, estes anos todos. — Ele se levantou e foi fechar a persiana, a fim de barrar o sol que entrava no escritório. — E quanto a nós? — Lori questionou. — Quero dizer, e se casar de novo e eu não gostar de sua mulher ou vice-versa? Marcus calou a filha com a mão levantada, ante a pergunta infantil. — Espere um pouco. Você não tem motivo para ficar com raiva de mim. Está bem- casada com Keith, trabalha e leva sua vida. É feliz, por isso talvez seja difícil me compreender. Honestamente, fui um bom marido e um bom pai. Nosso relacionamento não precisa mudar, Lori. Você sempre veio em primeiro lugar para mim e sua mãe. Lori escutou tudo, admitindo que Marcus havia sido um excelente pai. Mas agora as coisas haviam mudado inteiramente, e ela não sabia como lidar com a situação. Jamais lhe ocorrera ter pais divorciados. — De novo, e se sua nova mulher não gostar de mim? — Até parece que vou me casar amanhã! Nem mesmo entramos com os papéis do divórcio. Só você está falando em casamento, Lori. — Ele aproximou-se e segurou as mãos da filha entre as suas. Ela teve vontade de chorar, mas precisava mostrar ao pai que não era mais uma criança. — Está bem, papai. Acho que, com o tempo, vou me acostumar. Por enquanto, o fato de ter abandonado mamãe me perturba. Foi tão repentino. E você a deixou por causa de outra mulher. — Soluçando, Lori voltou o rosto para a janela, sem encarar Marcus. Gentilmente, ele a segurou pelo queixo, virando-a para si e beijando-a na testa. — Sinto muito se a magoei, querida. Também detesto ter magoado sua mãe, mas, às vezes, não temos escolha. É o preço de ser feliz. Marcus era esperto o suficiente para não apresentar e nem falar de outra mulher à filha naquele momento. Era cedo demais, e ele se mudara para um pequeno apartamento alugado. Caso Lori, fosse visitá-lo, mais adiante, e encontrasse sua namorada, tinha certeza de que ela aceitaria o fato. Afinal, ele era humano. — Preciso ir, papai — ela anunciou após consultar o relógio. — Talvez na próxima semana possamos jantar juntos, Keith inclusive. Para desgosto de Marcus, a sugestão soou apenas como obrigação filial. Lori realmente necessitava de mais tempo para assimilar o fim do casamento dos pais. De qualquer forma, o primeiro passo já tinha sido dado. Sentia-se mais aliviado. Era como se tivesse tirado um peso de seus ombros. Verdade que pedira a separação, mas jamais conseguiria viver longe da filha, Lori era o que mais amava na vida e queria que ela entendesse isso. — Mamãe, pare de me vigiar — pediu Ashley a Dóris. — Estou me cuidando. Há tanta comida no freezer que você já pode deixar de cozinhar para mim. — Vou ficar aqui até amanhã, mas receio que você pare de fazer sua dieta quando BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 22 eu for embora. Daniel irá se zangar comigo. Ashley pôs de lado a colher com a qual tomava uma sopa de legumes. — Você está se preocupando por nada, mamãe. Estava quente demais para tomar sopa; além disso, a cicatriz da operação doía, assim como todos os ossos do corpo. Impossível sentir-se confortável nessas condições. Ashley só desejava ficar sozinha e ter tempo para pensar no que faria com o resto de sua vida. Quando casada, nunca havia pensado nisso. "Primeiro erro", ela pensou. E o segundo tinha sido entregar-se nas mãos de Marcus, fazendo-lhe todas as vontades. Céus, será que alguma vez tinha sentado serenamente e pensado no que queria para si? Não, claro que não. Tudo o que conseguia pensar era em tornar o marido e a filha felizes. Como fora idiota! — Bem, fique por mais um dia, mamãe. Mas amanhã à noite gostaria de estar sozinha. Acredite, se precisar, eu telefono. Você e papai poderão vir me ver e checar se estou bem. Agora, coma um prato de sopa você também. O telefone tocou próximo de Ashley e ela atendeu. Ficou contente ao ouvir a voz melódica da filha. — Lori, eu estava justamente dizendo a sua avó que, a partir de amanhã, cuidarei sozinha de mim. — Fui ver papai, hoje. Ashley engoliu em seco. — Ah, e como foi? — Bem. Terei de me habituar à situação, a não ser que vocês voltem. Mas parece que ambos já decidiram. — Lori gostaria de chorar, mas reteve o pranto enquanto a mãe estivesse ao telefone. Na noite anterior, seu marido Keith ficara chocado com a notícia. Seus pais haviam conseguido manter a infelicidade escondida de todos. — Não voltaremos, Lori. Sinto acabar com suas esperanças. Seu pai e eu vamos viver separados, de agora em diante. — Já sei, mamãe. É melhor eu retornar ao tribunal agora. — Está bem, querida. Até mais. Dóris viu a filha colocar o aparelho no gancho e dar um longo suspiro. — Sabe, Ash. Casais rompem o tempo todo e se reconciliam. Marcus voltará para você, porque este é o lar dele. Não está acostumado a dormir fora. Ashley teve vontade de rir alto diante do comentário ingênuo. Era óbvio que a mãe não estava entendendo direito o que tinha acontecido com ela e Marcus. Mas, afinal, por que recriminá-la? Ela era um mulher doce e servil que estava casada há mais de cinquenta anos com um homem que, apesar de mandão, a amava e respeitava como poucos faziam. — Mamãe, chega de falar de reconciliação. Se houvesse alguma chance de isso acontecer, eu teria atendido os telefonemas dele ou ligado. Acabou. Marcus disse com todas as letras que não me ama mais. Está apaixonado por outra. Por isso, jamais o aceitarei de volta. Acabou, entende? BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 23 — Mas vocês precisam conversar a respeito disso. Talvez mude de idéia. Marcus é seu marido... — Por favor, me escute. — Ashley encarou a mãe com firmeza. — Pela terceira vez, acabou, e você está me dando dor de cabeça por insistir em falar sobre o assunto. — Sem pensar, levantou-se bruscamente e o local da operação doeu, obrigando-a colocar a mão espalmada sobre a barriga. — Oh, desculpe, querida. Eu a aborreci. — Tudo bem, mamãe. Apenas não toque mais nesse assunto. Acho que vou me deitar um pouco. — Rumou para o quarto e fechou a porta. Ashley passou o resto do dia enclausurada, fingindo dormir. Notou que seu pai passara pela casa, por alguns minutos, mas não saiu do quarto para vê-lo. Às oito da noite, tomou um rápido banho, ingeriu os comprimidos prescritos pelo médico e retornou à cama, rezando para que finalmente adormecesse. Na manhã seguinte, ela acordou com o cheiro de café na cozinha. Usou o banheiro, lavou-se, vestiu o robe e, ao espelho, murmurou desalentada que aquele seria mais um dia de solidão. Sem alternativa, rumou para a cozinha. Dóris havia preparado a mesa com café, leite gelado, cereais e torradas. — Como você não jantou — disse à filha assim que esta entrou — , achei que estaria com fome. — Obrigada, mamãe. É verdade. Adivinhe! Pesei-me no banheiro e perdi três quilos desde a cirurgia. Meu rosto está mais magro? — Sim, e mais bonito. Notei ainda ontem. — Dóris serviu-se de uma xícara de café. — Mais quatro ou cinco quilos e ficarei como quero. O mesmo peso de quando me casei. — As palavras soaram tranquilas, sem rancor. — Ainda tenho de controlar a pressão e o colesterol. — Sim, mas não deixe de comer bem. Corte apenas as gorduras e o açúcar. Não desejo vê-la doente outra vez. — Vou superar isso logo, mamãe. — Ashley mostrou-seanimada. Tinha se descuidado e, por certo, Marcus notara o desleixo com a aparência. Claro que ela nunca imaginara que o casamento terminaria. Era triste, mas admitia ter sido cega e surda aos sinais que pipocavam por todos os lados há muito tempo. — Esperarei até o final da tarde para ir embora, filha. Assim terei certeza de que você está bem. — Sinto-me melhor hoje, mamãe. Incansável, Dóris arrumou toda a cozinha após o café-da-manhã, e ainda lavou roupa, incluindo as toalhas do banheiro de Ashley. Depois, fez o almoço. Às cinco, Daniel passou de carro para levá-la embora. Ashley teve de prometer que telefonaria caso precisasse de alguma coisa. Naquele momento, porém, ela só desejava ficar sozinha e repensar os rumos que daria a sua vida. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 24 Capítulo III Cinco semanas após a cirurgia, Ashley sentia-se significativamente melhor. Nas últimas quatro semanas, Dóris e Daniel a visitavam durante o dia, enquanto Lori via a mãe na volta do trabalho. Na última semana, porém, Ashley dispensara a presença constante dos familiares. Em seu quarto, defronte ao enorme espelho que Marcus insistira em colocar no closet do casal, ela admirou seu novo corpo. A barriga ainda estava um pouco flácida, por causa da intervenção cirúrgica recente, mas havia emagrecido quase oito quilos e estava orgulhosa de si mesma por tal façanha. Se tivesse se cuidado melhor antes, talvez Marcus não tivesse ido embora. Dentro de casa, dia e noite, Ashley ganhara condições de pensar livremente no ex-marido e no que ele poderia estar fazendo. Será que também pensaria nela, sentindo-se culpado? — Tente esquecer, tente esquecer! — repetiu para si mesma, mas sabia que a ferida causada pela rejeição ainda era muito recente para ser ignorada. De súbito, o som estridente da campanhia ecoou por toda casa, trazendo-a de volta à realidade. Deveria ser Vanessa. Não via a amiga há duas semanas, pois esta tinha viajado com Gary para Nova York e só voltara na noite anterior. Estava feliz com a possibilidade de ter alguém com quem conversar; por isso, apressou-se em atender. — Olá, menina, entre. Estava aguardando você. Como foram as férias? — Divertidas. Comemos muito e atravessamos as madrugadas andando de um lugar para outro. E você, como se sente? Parece estar bem. — Sim, finalmente melhorei. Tenho suco de maçã, ou prefere um refrigerante light — Suco. Isto é para você. — Vanessa estendeu um pacote de presente em direção à amiga. — Há tantas lojas boas em Nova York! Ashley abriu o presente rapidamente e deparou-se com uma linda bolsa dourada. — Nossa! Exatamente o que eu queria. Você se lembrou de que eu precisava de uma bolsa dourada para combinar com meus sapatos. Obrigada, querida. — Sim, lembrei. Mas, diga-me, quantos quilos perdeu? Está parecendo bem mais jovem. Ashley girou o corpo a fim de mostrar como o vestido justo lhe caía bem. — Que tal? — perguntou com uma ponta de orgulho. — Você está ótima, menina! Nem parece que esteve doente. Se não soubesse que precisou fazer uma cirurgia, diria que esteve num spa. As duas riram e Ashley a puxou para a cozinha. — Venha tomar seu suco. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 25 Acomodaram-se nos banquinhos diante do balcão e serviram-se do suco. — Ainda falta um pouco para eu chegar a meu peso ideal — disse Ashley. — Mas já me sinto outra pessoa. — Observou Vanessa, sempre glamourosa, bem- vestida e, pela primeira vez, acreditou que também poderia ficar bonita. — Ninguém vai reconhecê-la quando voltar ao trabalho — comentou a amiga. — Não sei se vou retornar a meu antigo emprego, Vanessa — Ashley confessou pela primeira vez. — Desde que voltei do hospital, estou tentando decidir o que fazer do resto de minha vida. Lembra de quando fomos para a faculdade? Eu tinha um certo talento para desenhar roupas e até pensei em ser estilista, mas desisti e concordei com Marcus quando ele achou preferível seguir uma carreira mais sólida na área de seguros. Creio que ele não me considerava capaz de tocar um negócio próprio. Já você me disse no hospital que eu poderia fazer o que quisesse, lembra? — Sim. — Vanessa tomou um longo gole de suco de maçã. — Pois bem, vou fazer o que quero, amiga. Tenho tempo e vontade para isso. Vanessa riu ao ver que ela falava com uma autodeterminação bastante rara. — Fico contente por você, Ashley. Já era hora. Vá em frente. — Posso usar parte de minha poupança para começar meu novo negócio. Estou ansiosa. — E eu, orgulhosa de você. — Melhor esperar um pouco para ver. Ainda não fiz nada. Naquele instante, o telefone tocou e Ashley levantou-se para atender. — Com licença. Minha família parece achar que não sou capaz de me cuidar sozinha. Ligam a toda hora. De onde havia sentado, Vanessa podia ver a cozinha e parte da sala. Na mesa à direita do sofá, notou que estava faltando a foto emoldurada do casamento de Ashley e Marcus, substituída pelo retrato de Lori. Já era um bom sinal ver que a amiga estava se livrando daqueles pequenos objetos que poderiam mantê-la presa ao passado, impedindo-a de ver o presente e o futuro. — Era um colega de trabalho — explicou Ashley ao retornar. — Como dizia, espero começar logo minha nova atividade. Quero e vou ser estilista. Pelos olhos da amiga, Vanessa concluiu que ela não vinha dormindo bem. As pálpebras inchadas a denunciavam. Mesmo com a empolgação pelo novo trabalho, os olhos permaneciam tristes. — E tenho certeza de que vai ser um sucesso, mas Ash, você parece um pouco pálida. É bom perder peso, mas, tem se alimentado direito? — Claro. Faço dieta, mas sem muito rigor. O problema é que, em certos dias, é difícil engolir qualquer coisa. Minha vida mudou, também nesse aspecto. Estou muito ansiosa com a possibilidade de começar algo novo e chego a perder a fome. — Você despertou em tempo. — Ninguém me compreende como você, Vanessa. Lori pensa que posso apertar um BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 26 botão e trazer o pai dela de volta. Já minha mãe prefere me ver quieta, mas também conta com o retorno de Marcus, sem levar em conta meu amor-próprio. A verdade é que, para ser honesta, embora ainda sofra, nem eu o quero de volta nem ele virá. Só desejo recobrar minha paz interior e esquecer Marcus. — Bem, querida. Receio que você nunca o esquecerá completamente, mas lembrar- se dele vai magoá-la cada vez menos, com o passar do tempo. Mas começar seu próprio negócio vai ajudá-la muito a não pensar no assunto. — Já almoçou? — perguntou Ashley, mudando o rumo da conversa. — Não, e você? — Posso fazer alguns sanduíches. — Ela ergueu-se, com o copo de suco na mão. — Não, não. Você fica sentada e eu faço os sanduíches. Sei onde encontrar os ingredientes. — Vanessa levantou-se e começou a se mover pela cozinha como se estivesse em sua própria casa. — Em três meses, irei a um jantar de gala com Gary. Talvez você possa desenhar meu vestido. Acha que dará tempo? — Claro. Só preciso de um bloco de desenho e uma máquina de costura. A que eu tinha enferrujou e foi descartada. — Tenho a tarde toda para ouvir seus projetos, Ashley. Você me deixou empolgada e feliz. Lembra-se daquele amigo de Gary, chamado Thomas? — Pois é. Morreu de infarto agudo, aos cinquenta anos. Portanto, aproveite a vida enquanto puder. — Bem observado — ela concordou com uma careta. As duas riram e conversaram até as quatro da tarde. Depois de colocar os pratos na lavadora, Vanessapartiu. Ashley trancou a porta e seguiu para os fundos da casa. Uma vez ali, inspecionou as rosas que brotavam e ouviu o doce gorjear dos pássaros. Era uma bela tarde de verão e ela se sentia viva e feliz como há muito não se sentia. Sentando-se em uma das enormes espreguiçadeiras do jardim, fechou os olhos e deixou que o sol e a brisa lhe acariciassem corpo e alma. Então, à medida que pensava sem seus planos para o futuro sentiu o sono chegar e com ele muitos sonhos. No entanto, o mais surpreendente de tudo era que Marcus não fazia mais parte desses sonhos. Sete semanas após a cirurgia, Ashley enviou uma carta de demissão à empresa em que trabalhava e concentrou-se em reunir tudo o que precisava para começar sua nova carreira. Naquele dia, procurava por uma boa máquina de costura em Santa Mônica, onde também ficava o consultório do médico que acabara de lhe dar alta dizendo que ela estava pronta para começar vida nova. "E olhe que o bom doutor nem faz idéia do quão verdadeiras são suas palavras!", pensou ela, manobrando o carro e parando no estacionamento de uma revendedora Singer. Logo foi atendida por uma vendedora simpática, que lhe mostrou, e deixou experimentar, um modelo bastante eficiente e prático de máquina de costura. — Vocês entregam? — ela perguntou, assim que se decidiu pela compra. BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 27 — Sim, claro. Que tal sábado de manhã? — Está ótimo para mim — disse rindo e entregando seu cartão de crédito à jovem vendedora. Sentia-se nas nuvens com o primeiro passo dado rumo a sua nova carreira. De volta ao estacionamento, congratulou-se pela coragem em mudar de vida aos quarenta e cinco anos. Espantou-se com o fato de estar sorrindo, e não chorando. A caminho de casa, tomou um desvio à esquerda e saiu no Bulevar Slauson. Decidira fazer uma visita a Vanessa. Afinal, não havia ninguém a sua espera. Então por que se apressar? Com uma animação que há muito não experimentava, ajustou os óculos de sol no rosto e ligou o ar-condicionado do carro. Dez minutos depois, parou em frente a um restaurante chinês e pediu almoço para viagem. — Ei! — Ashley chamou a amiga que surgira na soleira da porta. — Entre, entre! — Vanessa falou sorrindo feliz com a surpresa. — Acabo de ligar para sua casa, e aqui está você! O que há na sacola? — Arroz, frango xadrez e rolinhos primavera. Estou faminta. Ela invadiu a cozinha de Vanessa com a mesma familiaridade que a amiga mostrava na sua. Sabia onde estavam guardados os pratos, talheres e guardanapos de papel. — O médico disse que eu já posso trabalhar e fazer tudo o que fazia antes da cirurgia. Na saída do consultório, comprei uma máquina de costura nova. — Isso é bom, amiga. E você está com ótima aparência. — Vanessa deixou de lado um catálogo que consultava e examinou o vestido floral de Ashley, seu penteado mais arrojado que o habitual e o discreto salto que usava a fazia parecer mais alta e elegante. Embora não estivesse maquiada, Ashley parecia jovem e bonita. Satisfeita com aquela transformação, Vanessa tirou dois refrigerantes light da geladeira, ligou a secretária eletrônica e sentou-se. — Vamos comer. — Bonita esta pantalona que está vestindo, Van — Ash comentou. — Sabe que nenhuma de minhas roupas me serve mais? Preciso comprar números menores e renovar o guarda-roupa. Ou melhor, pretendo costurar. Adquirir tudo me custaria os olhos-da-cara. Só não sei o que fazer com os cabelos. Vanessa ficou contente por Ashley ter mencionado o assunto do cabelo, sempre quisera lhe dar algumas sugestões mais modernas. — Tem de voltar cedo para casa, Ash? — Não propriamente. Por quê? — indagou ela, estreitando os olhos. — Pois bem, quando terminarmos de almoçar, falarei com Charlie, meu cabeleireiro. Ele fará maravilhas por você. — Verdade? Seria ótimo. Preciso me sentir viva de novo. — Oh, Ashley. Dará tudo certo. Trazer comida chinesa foi uma boa idéia, mostra que você está bem, cheia de iniciativa e que já retomou as rédeas de sua vida. É isso aí amiga. Acredite em si mesma e tudo dará certo. Vanessa fez as apresentações, e Ashley inspecionou o salão, onde três BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 28 esteticistas trabalhavam e quatro mulheres estavam sentadas debaixo de secadores. Charlie devia ter a idade delas, era pequeno, de cintura fina, cabelos castanhos repicados e adorava falar da mulher e das duas filhas já adultas, contrariando o estereótipo de que todo cabeleireiro é gay. — Sempre usa esses óculos? — ele perguntou à recém-chegada. Vanessa tossiu a fim de alertar o cabeleireiro. Ashley poderia tomar a questão como um insulto, embora tivesse sido prevenida de que Charlie falava o que lhe vinha à mente. — Não me dou bem com lentes de contato — Ashley respondeu, dando de ombros. — Mas estou planejando fazer uma cirurgia para corrigir a miopia e eliminar os óculos de vez. — Não sabia disso, querida — Vanessa interveio. — Quando resolveu fazê-lo? — Ontem mesmo. Eu te disse que queria um novo visual. — Bem, deixe-me dar uma boa olhada em seus cabelos. — Charlie rodeou a nova cliente, tocando os fios de leve e depois desfazendo o coque, quando então introduziu os dedos até o couro cabeludo e afofou as madeixas escuras. — A franja pode ficar, desde que você a escove com regularidade. Quanto ao resto, tenho um belo corte em mente. Vou deixar seus cabelos um pouco mais curtos, mas ainda poderão ser presos no alto da cabeça, se quiser. Charlie gabou-se de seu trabalho com o penteado de algumas celebridades e logo se pôs a trabalhar. Vanessa instalou-se na área de espera, com uma revista no colo. — É casada, Ashley? — indagou o cabeleireiro, obviamente querendo entabular uma conversa normal e despretensiosa. — Separada, a caminho do divórcio. — Ela suspirou, julgando-se repetitiva. — Fui casada por vinte e cinco anos. — É triste. A verdade é que está cada dia mais difícil encontrar um homem decente. Sei disso porque minha filha foi abandonada três meses atrás e, pasme, por causa de outro homem, acredita? — Charlie abriu uma gaveta e pegou uma nova escova. — É penoso viver sozinha, numa casa vazia, depois de morar com alguém por tanto tempo. Espero que seu marido volte. Achando que talvez fosse hora de interferir, Vanessa descartou a revista e veio até a cadeira da amiga. — Vou dar uma volta lá fora e ver as vitrines — anunciou. — Não me apareça com novas roupas — provocou-a Charlie, rindo. — Não. Só pretendo dar uma olhada por aí, enquanto você cuida de Ashley. Ela saiu e o cabeleireiro olhou firme para Ash. — Conheço Vanessa. Voltará com alguma novidade, mas, como sempre digo, seja boazinha consigo mesma, menina. — O que o levou a ser cabeleireiro, Charlie? — Ashley puxou conversa. — Gostava de ver cabelos bonitos desde criança, depois descobri que isso BESTSELLER – ROMANCES CONSAGRADOS 87 – Apaixonada pela vida – PATRICIA PHILLIPS 29 poderia se tornar um bom meio de vida. As mulheres gastam mais do que podem com a aparência. Você não consegue se olhar no espelho se seus cabelos estão mal-cuidados, não é? — Sim, tem toda a razão — ela concordou, lembrando-se de que até pouco mais de um mês atrás não costumava nem mesmo se olhar no espelho direito. Só agora entendia que isso era porque tinha medo de encarar a figura matronal em que se transformara. Passou-se uma hora. Ashley ficou nervosa ao ver seus cabelos caindo no colo e no chão. Charlie não estaria cortando demais? Quando ela começava a se preparar para dizer alguma coisa, Charlie deu o