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Reconquistando o CEO Viuvo - Bruna Catein

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Título original: Reconquistando o CEO Viúvo
Copyright © 2023 Bruna Catein.
 
 
Todos os direitos reservados.
Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida em qualquer
meio ou forma – impresso, digital ou audiovisual – sem o consentimento
por escrito da autora.
 
 
 
1ª edição, maio de 2023. Rio de Janeiro.
 
 
 
Revisão: Camila Brinck.
Capa: Bruna Catein.
Diagramação: Bruna Catein.
Imagens: Adobe Stock.
 
 
SUMÁRIO:
SINOPSE:
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
EPÍLOGO
 
SINOPSE:
 
Ele não quer se apaixonar novamente. Ela está em busca de redenção. Uma comédia romântica sobre
reencontros, superação e crianças fofas.
Victória Frye e Ryan Watson namoravam na época de escola, mas quis o destino que os dois
seguissem caminhos diferentes. Ryan casou-se com outra mulher, teve filhos e construiu um império
do zero. Victória viajou pelo mundo e viveu a vida que sempre sonhou em viver. As coisas foram
boas por um tempo, até que tudo desabou.
Ryan perdeu sua esposa e se tornou um homem rico e solitário que vivia apenas para os filhos e o
trabalho. A liberdade que Victória tanto almejou acabou se transformando em solidão e ela decidiu
voltar para a sua cidade natal. A jovem mulher queria formar uma família e viver o seu próprio final
feliz, mas acabou reencontrando o ex-namorado à frente de uma grande construtora e descobriu que
iria trabalhar para ele. Ryan não queria se envolver com ninguém, mas quando a sua ex-namorada se
tornou a babá dos seus filhos, todos os seus sentimentos ficaram bagunçados.
Quando suas vidas se cruzam novamente, os dois começam a se questionar se o amor que sentiram
no passado ainda estaria vivo em seus corações. Ryan terá que se esforçar para superar seus medos se
quiser viver esse amor. Vic terá que se mostrar merecedora de uma segunda chance depois do erro
que cometeu anos atrás.
Será que ela vai conseguir reconquistar o coração desse CEO viúvo?
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Quando duas pessoas estão destinadas
a ficar juntas, elas sempre irão
se reencontrar.
 
PRÓLOGO
— Então é isso? Você vai terminar comigo?
Um peso se abateu sobre mim quando ouvi aquela pergunta. Não
posso amarelar agora, já cheguei até aqui.
Tomando coragem, olhei Ryan nos olhos e assenti pausadamente.
No fundo eu não queria fazer aquilo. Não queria terminar o meu
namoro com o garoto que eu conhecia desde sempre e que além de
namorado também era o meu melhor amigo, mas eu precisava fazer uma
escolha. Ou eu ficava nessa cidade pequena com um homem que eu amava,
mas que poderia me trocar por outra daqui a alguns anos quando eu estaria
deprimida demais para seguir com a minha vida, ou eu saía agora enquanto
eu era jovem e tinha um leque de oportunidades na palma das mãos.
Eu queria conhecer o mundo, fazer intercâmbio, trabalhar e morar
em outro país, conhecer outras culturas e outras pessoas, mas não poderia
fazer isso morando aqui, nesta cidadezinha no interior do Colorado. Ryan
sabia dos meus sonhos, no entanto, ele não tinha o mesmo desejo de sair de
Eastdale. Ao invés disso, queria seguir o legado da família e ajudar o seu
pai, que trabalhava como supervisor de construções civis.
Ryan sonhava pequeno e eu sonhava grande. Essa era a única
questão na qual éramos incompatíveis e isso me magoava profundamente.
Eu sabia que para realizar a minha vontade de conhecer o mundo o meu
relacionamento com ele teria que chegar ao fim, pois eu não queria ter algo
me prendendo aqui nessa cidadezinha. Será triste, mas eu preciso encerrar
a nossa história.
— Sinto muito, Ryan — minha voz saiu um pouco trêmula. — Você
sabe que eu tenho sonhos e agora que terminamos o ensino médio eu quero
realizá-los.
Olhei para a frente por alguns segundos, tentando recuperar o fôlego
e a coragem para seguir com aquela conversa. As luzes dos refletores
posicionados no topo das arquibancadas iluminavam a grama verde do
campo de futebol. Todas as cadeiras estavam vazias, éramos as únicas
pessoas que estavam fora da cobertura do ginásio naquela noite fria. O baile
de formatura chegou ao fim minutos atrás e eu tive que trazer o meu
namorado aqui para conversarmos a sós, longe de todo o falatório dos
outros adolescentes agitados.
Quando voltei meu olhar para Ryan, ele cerrou os punhos e se
levantou da arquibancada onde estávamos sentados. Graças as luzes que
estavam ligadas no campo, eu vi o rosto dele com clareza. Ryan estava
surpreso, irritado e terrivelmente magoado. Eu podia ver o brilho das
lágrimas querendo sair dos seus olhos castanhos.
Ele engoliu em seco, respirou fundo e pegou algo no bolso interno
do smoking preto que usava. Meu sangue gelou quando vi uma caixa
vermelha de veludo do tipo que se guarda um anel de noivado. Isso não
pode estar acontecendo.
Ryan me direcionou um olhar amargurado e abriu a caixa,
confirmando a minha suspeita de que lá dentro realmente tinha um anel.
Meus olhos arderam e eu deixei uma lágrima escapar.
— E pensar que eu ia te pedir em casamento esta noite. — Ryan
tirou o anel da caixa e o segurou entre seu polegar e indicador. — Quer
saber? Que se foda! — Ele arremessou o anel prateado o mais longe que
pôde. O brilho da joia refletiu em uma das luzes acesas antes dela perder
altitude e desaparecer do meu campo de visão para sempre. — Estou vendo
que você não sente o mesmo por mim, Victória. Estamos juntos há muito
tempo e eu ainda me lembro, como se fosse ontem, do nosso primeiro beijo,
da primeira vez que transamos, da primeira vez que dissemos eu te amo um
para o outro... Mas parece que esse tempo não significou nada para você,
então faça o que quer fazer. Vá embora dessa cidade, desse país e
desapareça da minha vida para nunca mais voltar!
Ryan deu as costas para mim e desceu as escadas da arquibancada
em passos rápidos e furiosos. Quando chegou ao corredor que dava acesso
ao interior da escola, ele correu. Correu até desaparecer do meu campo de
visão e eu ouvi o som de portas se fechando com força. O que foi que eu
fiz?
Passei a mão pelo cabelo e senti a coroa que recebi nesta noite
quando Ryan e eu fomos nomeados rei e rainha do baile. Éramos tão
perfeitos juntos. Por sorte, não haveriam mais dias de aula pela frente então
eu não teria que conviver com as fofocas dos alunos quando descobrissem
que o casal mais fofo da escola, que estava junto desde o começo do ensino
médio, não existia mais.
Acabou. Ryan e eu não somos mais um casal. Um soluço escapou da
minha garganta e eu comecei a chorar. Não tinha ninguém por perto então
não havia motivos para conter as minhas lágrimas.
Eu tinha doze anos quando o meu pai largou a minha mãe para
morar com uma sirigaita que era quinze anos mais nova que ele. Minha mãe
ficou arrasada, a vi se afundar no álcool para esquecer a dor e suportar o
peso de ter que trabalhar para criar a filha sozinha. Lembro perfeitamente
do dia em que a ouvi falando ao telefone com uma amiga, ela estava
chorando porque não estava feliz com o rumo que a vida dela tomou. Minha
mãe abriu mão dos sonhos que tinha, deixou o amor falar mais alto e se
casou com o meu pai, deu o coração a ele e o canalha a apunhalou da pior
forma possível. Naquele dia eu jurei que jamais deixaria isso acontecer
comigo, eu jamais colocaria alguém acima dos meus sonhos e daria a essa
pessoa o poder de estragar a minha vida.
Está doendo agora, mas essa dor vai passar. Eu fiz o que era melhor
para o meu futuro, agora preciso ser forte e seguir em frente.
 
CAPÍTULO 1
Minhas pernas tremeram com a ansiedade que eu senti quando desci
do táxi. A tarde estava nublada, embora já estivéssemos no início do verão.
Coloquei minha mochila de viagem surrada nas costas e olheiao
meu redor. Não fiquei nem um pouco surpresa ao ver que nada mudou por
aqui. Eastdale está do mesmo jeito que estava quando eu fui embora doze
anos atrás.
Parece que nada de interessante aconteceu durante a minha
ausência. A praça ainda tinha o mesmo chafariz de concreto, a torre do sino
da igreja estava da mesma cor e não sofreu nenhuma mudança na sua
arquitetura — assim como as outras casas e lojas da rua por onde eu
andava. Tudo estava igual, a não ser por... Parei de caminhar quando virei a
esquina e vi um prédio alto de vidro espelhado que com certeza não estava
ali doze anos atrás. Para ser sincera, aquela estrutura moderna não
combinava muito com a arquitetura boêmia da pequena cidade.
Fiquei alguns minutos observando o prédio que se destacava na
paisagem até que o celular no meu bolso vibrou. Me apressei em atender e
sorri quando vi o número que estava na tela.
— Oi, Katy. Acabei de chegar em Eastdale. Eu estou perto da praça,
onde você está? — Katy era minha amiga na época da escola. Apesar dos
anos que se passaram e da distância que havia entre nós, não perdemos o
contato.
— É segunda-feira à tarde, eu estou no trabalho — ela respondeu,
com ironia. — Podemos nos encontrar à noite, o que você acha? A
lanchonete onde a galera lanchava depois da escola ainda está aberta.
— Eu não sei. — Dei de ombros e fiz uma pausa para pensar.
Embora uma parte de mim estivesse feliz por estar de volta à minha cidade
natal, a outra parte se sentia insegura por ter que reencontrar tantas pessoas
que obviamente iriam perguntar sobre o motivo da minha volta.
Quando eu era mais nova, tagarelei por tanto tempo que queria sair
de Eastdale, dizendo que quando isso acontecesse eu jamais iria voltar.
Passei doze anos viajando o mundo, morando em alguns países pelo tempo
que o meu visto permitia e aproveitando tudo que a vida tinha para oferecer,
mas há alguns meses eu senti que estava na hora de sossegar. Viajar sozinha
tinha lá as suas vantagens, mas também era uma vida solitária.
Realizei o meu sonho de conhecer o mundo e há algum tempo outro
sonho vinha crescendo dentro de mim: o de ser mãe. Eu queria me casar
com um cara legal e formar uma família com ele, mas minhas passagens
rápidas pelos lugares impediam que eu criasse um vínculo profundo com as
pessoas. Em todos esses anos como mochileira, a coisa mais séria que eu
consegui com alguém foi um número de telefone após uma noite tórrida de
sexo. Não havia como ficar no mesmo país por muito tempo, então, não
havia como criar laços duradouros com as pessoas.
Apesar de tentar, infelizmente, eu não consegui estabelecer moradia
fixa em nenhum país que visitei. Havia muita burocracia para conseguir um
visto permanente sem ter trabalho fixo. Eu era uma jovem ingênua por
pensar que seria fácil morar em outro continente.
Depois de muito tempo tentando, Katy finalmente conseguiu me
convencer a voltar para a minha cidade natal: Eastdale. Aqui eu tinha uma
casa, pessoas conhecidas e inúmeras oportunidades de emprego. Seria fácil
encontrar um homem legal para casar e ter filhos.
— Ei, Vic? Você ainda está aí? — Katy me chamou do outro lado
da linha.
— Ah... sim, estou sim. — Suspirei, enquanto voltava à realidade.
— Ok, vamos nos encontrar na lanchonete hoje à noite.
— Perfeito! — Minha amiga ficou empolgada com a resposta que
recebeu. — E não esqueça que amanhã você tem uma entrevista aqui na
construtora.
— Como eu poderia esquecer desse compromisso? Obrigada por me
dar essa oportunidade, Katy. Meu dinheiro está curto, preciso urgentemente
de um emprego.
— Não se preocupe — ela tentou me tranquilizar. — Eu mesma me
encarreguei de entregar o seu currículo para o meu chefe, expliquei a sua
situação para ele e o homem concordou em liberar uma vaga para você. A
entrevista de amanhã será apenas uma formalidade, mas não diga a
ninguém que eu te contei isso.
As vantagens de ter uma amiga que é gerente de RH...
— Obrigada, Katy. Estou te devendo uma.
— Não há de quê, Vic. Agora vai para casa descansar, nos vemos à
noite.
— Descansar? — Eu ri. — Preciso tirar poeira dos móveis, a casa
está vazia há meses desde que a minha mãe saiu de lá.
— Agora que a filha sossegou é a vez da mãe se aventurar pelo
mundo. — Katy deu uma risadinha.
— Estou feliz que ela conseguiu realizar esse sonho depois de tanto
tempo. Minha mãe se esforçou, mas agora com a aposentadoria ela
finalmente pode relaxar e viver o que ainda não viveu.
Ouvi algumas vozes ao fundo da ligação e Katy suspirou.
— Lamento interromper a nossa conversa, Vic, mas eu preciso
resolver umas coisas aqui. Te vejo à noite.
— Sem problemas. Beijo. — Eu desliguei a ligação, guardei o
celular no bolso e voltei a andar.
Minha casa ficava a alguns quarteirões de distância, mas eu desci do
táxi nesse ponto porque queria caminhar pela vizinhança para me lembrar
dos velhos tempos. Nada mudou por aqui e de alguma forma eu me sentia
aliviada com isso. Era como se Eastdale tivesse parado no tempo
aguardando o meu retorno. Bom, agora eu estou de volta.
Quando cheguei na minha casa, a sensação de nostalgia aumentou.
Ela ainda tinha o mesmo jardim de rosas vermelhas na frente da varanda de
madeira, ainda estava pintada de branco azulado, a chave reserva ainda
estava embaixo do carpete da porta e a cadeira de balanço onde eu passava
as tardes quando era pequena ainda estava ali na varanda.
Entrei na casa e assim que fechei a porta deixei minha mochila de
viagem cair no chão empoeirado. O ar ali dentro estava abafado já que a
residência passou os últimos cinco meses fechada e sem ver uma faxina.
Desde que a minha mãe se aposentou, ela não parou mais em casa. Primeiro
saiu em um cruzeiro pela costa do país e depois decidiu que iria conhecer
alguns países da Europa. Eu estava feliz por ela e mais feliz ainda porque
agora eu teria a casa inteira só para mim.
Tomei um banho rápido, prendi meu cabelo castanho em um rabo de
cavalo e vesti roupas confortáveis. Coloquei minha playlist da Taylor Swift
para tocar na minha caixinha de som bluetooth e passei o resto da tarde
limpando cada canto daquela casa.
Quando a noite caiu, tudo já estava limpo. Fui para o antigo quarto
da minha mãe — que agora seria o meu quarto — e me deitei na grande
cama de casal. Eu estava exausta e pretendia tirar um cochilo antes de me
encontrar com Katy na lanchonete.
Quando fechei os olhos e me preparei para pegar no sono, o
despertador do meu celular tocou. Resmunguei ao ver que já era 19h30. Eu
não teria tempo de descansar, tinha que me arrumar para ver a minha amiga.
Eu estava saboreando um milkshake de morango, sentada em uma
cadeira acolchoada da mesa do Carter’s Diner — que agora, além de
lanchonete, também era um restaurante. Apesar da mudança no cardápio,
nenhuma outra alteração foi feita por aqui nos últimos doze anos. O chão de
madeira envernizada ainda era o mesmo, assim como as paredes que
sempre estavam pintadas de verde claro. As garçonetes ainda eram as
mesmas e a família Carter ainda era a dona daqui.
Sentada à minha frente estava Katy, a minha fiel e inseparável amiga
desde a época da escola. Ela não mudou muito nos últimos anos, ainda tinha
o mesmo corte Chanel em seu cabelo preto com mechas vermelhas e usava
os mesmos óculos quadrados que lhe passavam uma imagem de intelectual.
Foi maravilhoso vê-la pessoalmente depois de tanto tempo.
Já havíamos terminado de jantar e estávamos aproveitando os
milkshakes que ganhamos de brinde. Pelo visto, o Sr. e a Sra. Carter ainda
se lembravam de mim e estavam felizes com o meu retorno para Eastdale.
— E então, você ainda acha que a comida daqui é a melhor do
mundo? — Katy perguntou, enquanto bebia um gole do seu milkshake.
— Olha, sendo bem sincera, depois que eu provei a comida
perfeitamente apimentada de um restaurante na Tailândia eu mudei de ideia
— admiti. — Também fiquei apaixonada por um temaki que comi em
Tokio.
— Que mulher chique. — Ela riu. — Você precisa tirar um dia para
me contar melhor sobre todas as suas aventuras no exterior. E assim que
der, eu vou te reapresentarpara todas as pessoas com quem estudamos. A
maioria ainda mora por aqui. — Katy bebeu mais milkshake. — Lembra da
Jane e do Flinn que estudaram com a gente no último ano? Eles se casaram
e tiveram três menininhos lindos.
— Ah... acho que eu não me lembro muito desses dois — respondi e
bebi mais milkshake.
— Bom, é uma pena porque todo mundo aqui se lembra de você. —
Minha amiga suspirou.
— É claro que se lembram, eu era a única pessoa que vivia
tagarelando sobre sair de Eastdale.
— E você conseguiu.
— Mas acabei voltando para cá no fim das contas. — Encolhi os
ombros. — Devem estar caçoando de mim pelas costas.
— Deixa de ser boba, Victória! — Ela deu um tapinha na minha
mão. — Todo mundo sabe que não é fácil se estabelecer em outro país.
Você realizou o seu sonho de conhecer o mundo e agora voltou para a sua
cidade natal e vai realizar seu sonho de se casar e ter filhos.
Fiz uma careta e olhei ao meu redor. Mesmo que eu não me
lembrasse muito bem de algumas pessoas, todos os rostos que eu via ainda
eram familiares, de certa forma.
— O que foi? Por que está com essa cara?
— Acabei de perceber que eu provavelmente irei me casar com
algum cara com quem já estudamos. — Tive um pequeno choque de
realidade. — É uma cidade pequena, doze anos atrás eu já conhecia todo
mundo que tinha para conhecer aqui.
— Realmente, Vic, você pode ter estudado com o seu futuro marido.
— Minha amiga deu uma risadinha e bebeu mais milkshake.
Naquele instante, um homem alto e loiro passou pela nossa mesa.
Katy arquejou e puxou a jaqueta jeans que ele vestia. Quando ele virou em
nossa direção, notei que estava com uma garotinha loira no colo, os dois se
pareciam tanto que eu imediatamente assimilei que eram pai e filha.
— Ei, Math, olha quem está de volta! — Katy apontou na minha
direção.
O homem olhou para mim e depois para Katy. Ele ficou confuso.
— Não se lembra dela? — minha amiga questionou. — É a Victória,
estudou com a gente no ensino médio. Eu te falei que ela estava voltando
para a cidade.
O homem finalmente abriu um largo sorriso e acenou para mim com
a cabeça. Agora eu me lembro dele. Math Donovan, ele era capitão do time
de futebol.
— Victória, a ex-namorada do Ryan? — Ele passou a segurar a
garotinha com apenas um braço e me estendeu a sua mão. — Que bom ter
você de volta em Eastdale.
Eu apenas sorri, completamente sem graça, e apertei a mão dele por
um breve segundo. Ex-namorada do Ryan. Ryan... o garoto que eu amava e
abandonei para seguir o meu sonho. Me pergunto como ele está agora.
Será que ainda mora em Eastdale?
Há muito tempo eu pedi que Katy jamais mencionasse qualquer
coisa sobre o Ryan, pois só assim eu conseguiria esquecê-lo. Minha amiga
acatou a minha decisão e nunca mais tocou no nome dele, já o Math... Bom,
não posso culpá-lo, já que obviamente ele não sabia sobre isso.
Meu longo período de silêncio indicou a Math que eu não estava a
fim de conversar. Ele cochichou algo no ouvido de Katy e ela cochichou de
volta. Math me direcionou um sorriso sem graça, como se quisesse se
desculpar por alguma coisa e se despediu de mim com um aceno de cabeça.
Fiquei distraída observando o homem se afastar da nossa mesa e ir até o
balcão para fazer o seu pedido. A garotinha no colo dele acenou para Katy e
a minha amiga acenou de volta.
— Math se casou com uma garota de fora da cidade quatro anos
atrás, mas as coisas não deram muito certo. — Katy iniciou um novo
assunto e eu foquei minha atenção nela. — Os dois se divorciaram há
alguns meses e a mulher deixou a guarda da filha com ele.
— Que tenso — foi tudo que eu consegui dizer.
— Pois é. — Ela bebeu um gole do milkshake até o canudo fazer
barulho. — Posso dizer que eu acompanhei de perto todos os pontos altos e
baixos desse casamento. Math e eu somos vizinhos de apartamento, então
dava para ouvir todas as brigas. E quando ele finalmente se divorciou
daquela mulher tóxica, eu o consolei.
Arregalei os olhos.
— Mas você o consolou oferecendo um ombro amigo ou consolou
com outra coisa, Katy? — Eu arqueei uma sobrancelha. Minha amiga era
safada, ela não perdia a chance de ficar com um cara boa pinta e eu tenho
que admitir que o Math se tornou um homem bonito.
— Bom, eu diria que consolei ele dos dois jeitos. — Katy sorriu
com malícia e bebeu o último gole do seu milkshake. — E ainda estou
consolando de vez em quando.
Olhei para Math, que estava de pé em frente ao balcão esperando o
seu pedido. Ele brincava com a filha de um jeito fofo e eu não pude deixar
de sorrir.
— Você tem sorte, Katy, ele é um partidão — admiti.
— É, eu sei. — Minha amiga deu uma risadinha. — Agora eu
preciso achar um partidão desses para você.
— De preferência, um partidão que não tenha um passado
traumático.
— Isso vai ser difícil. — Katy suspirou. — A maioria dos homens
decentes de Eastdale já levaram chifre ou foram abandonados no altar.
Parece que as mulheres daqui não ligam muito para essa coisa de “até que a
morte nos separe”.
Eu fiz uma careta de culpa ao me lembrar de quando abandonei
Ryan, mas a minha amiga não reparou, sua atenção estava totalmente
voltada para Math, que já estava de partida. Ele sorriu para Katy quando
passou pela mesa e a garotinha acenou de um jeito animado.
— Parece que você conquistou o pai e a filha — falei, quando ele
saiu do estabelecimento.
Katy olhou para mim e deu um sorriso sem graça.
— Eu cuido da Hanna às vezes quando o Math precisa atender
alguma emergência durante à noite — se explicou.
— O Math é médico? — Arregalei os olhos.
— Não, ele tem um guincho. — Katy cortou as minhas expectativas.
— Mas ele também é mecânico e eu acho isso sexy pra cacete.
— Com certeza — eu concordei, com um sorrisinho malicioso. —
Mecânicos, lenhadores, bombeiros, médicos... qualquer homem que
trabalha com uma dessas coisas tem um passe VIP para a minha cama.
— E para a minha também.
Embora os nossos milkshakes já estivessem vazios, nós fizemos um
brinde. Depois que abaixamos os copos começamos a gargalhar como se
fôssemos duas adolescentes. É bom ver que algumas coisas nunca mudam.
— Ok, eu vou pedir a conta — Katy disse, se forçando a ficar séria.
— Você tem uma entrevista de emprego amanhã cedo e não pode dormir
tarde hoje.
— Mas você disse que a vaga já era praticamente minha, certo?
— Sim! — Katy ficou empolgada. — Vamos trabalhar juntas na
Construtora Watson, vai ser perfeito!
— Espera, espera... você disse Watson? — Eu arregalei os olhos. —
Por acaso a construtora é do Walter Watson?
— Senhora Carter, pode me trazer a conta? — Katy me ignorou
completamente e acenou para a mulher de meia-idade que estava no caixa.
Walter Watson, esse é o nome do pai do Ryan... Caramba! E se
nesses últimos doze anos o negócio de construções civis do Sr. Watson
cresceu tanto que ele abriu uma construtora?
— Katy! — Eu me inclinei sobre a mesa e a sacudi pelos ombros
para obrigá-la a prestar atenção em mim. — Você trabalha para o Walter
Watson? A construtora é dele?
Katy hesitou em responder, como se o que eu estivesse pedindo para
ela me revelar fosse algo estritamente confidencial.
— Me responde, Katy! — A sacudi novamente. — Seu patrão é o
Walter Watson? O pai do Ryan Watson? Você foi até ele e pediu para me
contratar?
— Não! — minha amiga negou imediatamente. — O pai do Ryan
não é o meu chefe, eu juro pela nossa amizade! Walter Watson é um sócio
da construtora, só isso. — O olhar que a Katy me lançou foi sincero e eu
acreditei nela.
Suspirei aliviada e me sentei na cadeira, ignorando os olhares que
recebi durante o meu momento de surto.
— Não me assuste assim de novo, Katy — a repreendi.
Minha amiga deu um sorrisinho sem graça e voltou sua atenção para
a garçonete que trouxe a nossa conta.
— Vamos dividir — ofereci, antes que Katy resolvesse pagar por
tudo sozinha.
Quando saímos do Carter’s Diner decidi pegar um táxi para chegar
mais rápido em casa. Eu estava tão exausta pela faxina que fiz à tarde que
quando deitei na minha cama peguei no sono imediatamente.
 
CAPÍTULO 2
Quando acordei de manhã, notei que Katytinha me enviado uma
mensagem com o endereço da construtora onde eu faria a minha entrevista
de emprego.
Eu estava nervosa — muito nervosa — e tinha certeza que isso se
devia ao fato de que o pai do meu ex-namorado era sócio da empresa onde
eu iria trabalhar. Céus, tomara que eu não esbarre com ele pelos
corredores. Não sei com que cara eu iria olhar para o Sr. Watson, que era
tão gentil comigo. Eu parti o coração do filho dele, tenho certeza que o
homem não gosta mais de mim.
Apesar do meu nervosismo e inquietação, levantei da cama e
comecei a me preparar para enfrentar o dia. Tomei um banho, escovei os
dentes, vesti uma calça social preta e uma camiseta branca de gola alta.
Prendi meu cabelo em um coque e passei um batom avermelhado para dar
um pouco de cor à minha boca.
Quando saí do banheiro, que ficava no segundo andar da casa, fui
até o meu quarto e passei um pouco do meu perfume preferido. Calcei
sapatilhas pretas, peguei minha bolsa de ombro preta e saí de casa sem me
dar ao trabalho de tomar café da manhã — eu estava tão nervosa que não
consegui sentir fome desde que acordei.
Ainda na calçada de casa, li o endereço que Katy me enviou por
SMS e decidi caminhar ao invés de pegar um ônibus, pois a empresa ficava
a apenas alguns quarteirões de distância de onde eu morava. Tive sorte de
conseguir uma oportunidade de emprego tão perto, espero que trabalhar lá
seja bom.
Por mais que eu tenha passado alguns anos estudando na Inglaterra,
eu tinha quase certeza de que não conseguiria um cargo na área em que me
formei. Uma construtora não teria vaga específica para alguém que se
formou em filosofia da arte — na verdade, nenhum lugar em Eastdale
oferecia emprego para o meu tipo de formação. A essa altura, eu já tinha me
conformado que teria que aceitar qualquer trabalho para pagar as contas.
Segui o endereço no GPS do celular e depois de dez minutos de
caminhada acabei em frente ao prédio enorme de vidro espelhado — aquele
que não combinava em nada com a arquitetura da cidade. Então aqui é a
construtora?
Minhas mãos suavam frio quando empurrei a porta de vidro e entrei
no prédio. O vento gelado do ar-condicionado fez meus braços se
arrepiarem momentaneamente enquanto eu me dirigia até a recepção para
pedir informações. Me escorei no balcão e mostrei o meu sorriso mais
simpático para o atendente que estava sentado ali. O jovem estava jogando
um jogo online no computador da recepção e fechou a janela no instante em
que notou a minha presença.
— B-bom dia, senhorita — ele me cumprimentou, envergonhado. —
Em que posso ajudá-la?
— Bom dia. — Olhei brevemente ao meu redor e depois voltei
minha atenção para ele. — Esse é o prédio da construtora...
— Construtora Watson? — ele me cortou. — Sim, você está no
lugar certo.
Watson... Cerrei os punhos. Se o pai do Ryan é apenas um sócio
aqui, por que caralhos o sobrenome dele é o nome da empresa?
— Posso ajudá-la? — o recepcionista, que tinha no máximo vinte
anos, perguntou novamente.
— Tenho uma entrevista de emprego aqui — expliquei.
O jovem mexeu no computador por um tempo e assentiu.
— Victória Frye, não é? Vá para o décimo andar, na sala do nosso
CEO e presidente. Ele mesmo fará a sua entrevista.
— Ok. Obrigada. — Meu sorriso morreu no instante em que eu me
virei para caminhar em direção ao elevador.
Eu vou ser entrevistada pelo chefe da empresa? Achei que seria
Katy quem faria a minha entrevista, afinal, ela é gerente do RH. O
nervosismo que eu sentia quando saí de casa dobrou de tamanho e a minha
garganta se fechou de um jeito que ficou difícil até mesmo para engolir a
saliva.
Os minutos que levei para chegar até a sala do presidente da
empresa foram os minutos mais agonizantes de toda a minha vida. Quando
as portas do elevador se abriram no décimo andar eu não sabia se respirava
aliviada ou se apertava o botão do térreo e saía do prédio. Mantenha a
calma, Vic. Tudo vai acabar bem.
Respirando fundo, saí do ambiente seguro daquela caixa de metal e
caminhei pelo corredor até encontrar a porta de vidro fosco com uma placa
de identificação que sinalizava a sala do presidente. Parei em frente a ela e
li em voz alta o nome que estava escrito embaixo do cargo.
— Presidente e CEO Ryan Watson. R-RYAN?! — Arregalei os
olhos. Não pode ser! Acho que li errado.
Li e reli o nome que estava escrito naquela porta tantas vezes que
até perdi a conta. Meu coração estava tão acelerado que eu podia ouvir as
batidas martelando em minha cabeça. Ryan Watson? Não é possível! Não
pode ser ele. Tem que ser outro Ryan, talvez um primo dele... Porra, não
acredito que a Katy fez isso comigo!
Se antes as minhas mãos suavam frio, agora elas tremiam — assim
como as minhas pernas que começaram a ficar bambas. Precisei me apoiar
na parede com um braço para não perder o equilíbrio. Ryan, o meu ex-
namorado, será o meu chefe? Ele é o dono dessa empresa? Não consigo
acreditar nisso. Tem que ser outro Ryan Watson!
Enquanto eu surtava em silêncio e tentava decidir se batia na porta
ou se saía correndo e ia procurar emprego em outro lugar, a maçaneta da
porta girou e ela se abriu. Fechei meus olhos por reflexo e tudo dentro de
mim congelou quando ouvi uma voz. Aquela voz cativante e sedutora que
eu não ouvia há muito tempo.
— Foi você quem me chamou? — Ryan... é ele mesmo. Mas que
porra!
Lentamente abri os olhos e encarei a figura alta e masculina que
estava diante de mim. Meu coração errou as batidas quando olhei para Ryan
depois de doze anos sem vê-lo. Ele ainda estava lindo, com os traços do
rosto mais maduros, a barba por fazer, o cabelo castanho em um corte
executivo e o corpo... bom, mesmo com o terno que ele usava era nítido que
Ryan ganhou muitos músculos desde que terminou o ensino médio.
Eu estava embasbacada enquanto olhava para o homem vestido de
terno preto e gravata cinza. Nem mesmo nos meus sonhos mais loucos eu
teria imaginado que um dia iria reencontrar Ryan Watson, quem dirá
trabalhar para ele. Se bem que eu duvido muito que ele seja o meu chefe.
Considerando o que aconteceu entre nós no passado, provavelmente Ryan
vai me humilhar um pouco e depois dizer que não sou boa o bastante para
trabalhar nessa empresa.
Merda, o que eu faço? Como falo com ele? Devo pedir desculpas
pelo que fiz no passado e implorar que ele me deixe trabalhar aqui? Não...
eu jamais teria coragem de fazer isso. Prefiro sair pela cidade e procurar
outro emprego.
— E então? — Ryan arqueou uma sobrancelha, esperando que eu
dissesse alguma coisa.
Engoli em seco. Eu não estava preparada psicologicamente para
esse reencontro.
— O-olá, Ryan. — Direcionei a ele um sorriso sem graça. — Eu...
eu estou aqui para a entrevista de emprego. Você deve se lembrar de mim,
eu sou Victória Frye. Nós...
— Não, eu não lembro — ele me interrompeu e me olhou dos pés à
cabeça. Notei que seus ombros estavam tensos. — Por que eu me lembraria
de você?
Fiquei calada diante daquela pergunta. Ryan não se lembra de mim?
De repente, o meu nervosismo se transformou em uma leve decepção.
Como assim ele não se lembra da primeira namorada? Ficamos juntos por
quase quatro anos!
Ryan me encarava com um olhar superior e levemente arrogante.
Confesso que fiquei intimidada com a postura do homem. Desviei meus
olhos para o chão e notei que o seu pé direito batia constantemente no piso
de madeira, indicando que ele estava inquieto com alguma coisa. Inquieto
ou ansioso. Ryan tinha mania de mexer o pé direito sempre que alguma
situação o deixava aflito. Parece que isso não mudou com o passar dos
anos.
— Ok, você disse que está aqui para a entrevista, deve ser a
candidata para a vaga de faz-tudo. — Ele suspirou, com uma leve
impaciência. — Venha por aqui.
Sem esperar pela minha resposta, Ryan entrou na sala e gesticulou
para que eu o seguisse. Não tendo outra opção, dei um passo à frente e
entrei na sala do CEO da empresa.
— Feche a porta — Ryan pediu, enquanto se sentava na cadeira de
couro reclinável que havia em sua bela mesa de vidro.
Atrás dele haviam longas janelas que ofereciam uma linda vista de
Eastdale.Era possível ver a torre da igreja, alguns estabelecimentos
comerciais e até mesmo a praça. Confesso que eu passaria o dia
observando a cidade daqui de cima se pudesse.
— Pode se sentar, Srta. Frye. — Ryan gesticulou para a cadeira
estofada que estava em frente à sua mesa.
Eu concordei e me sentei ali, mas não tive coragem de olhá-lo nos
olhos. Mantive a minha atenção no restante da sala enquanto tentava limpar
a mente para pensar com coerência. Se ele não se lembra de mim, então
acho que poderei trabalhar aqui sem me sentir intimidada. Ryan com certeza
me perdoou pelo que eu fiz, caso contrário, ele ainda se lembraria de mim
como a primeira mulher que partiu o seu coração.
— Posso começar a entrevista? — meu ex-namorado e futuro chefe
perguntou.
— Sim — eu respondi, enquanto me forçava a olhar para qualquer
lugar que não fosse ele.
Na parede que ficava em frente à mesa de Ryan havia um mapa
enorme de Eastdale que estava marcado em alguns pontos com alfinetes de
cores diferentes. Na parede da esquerda haviam inúmeros certificados,
incluindo um diploma de formação em Engenharia Civil pela faculdade de
Eastdale. Então ele se formou em engenharia? Comecei a divagar sobre
como Ryan teria dado início à essa empresa. Talvez o fato do pai dele
trabalhar em construções civis lhe possibilitou ter contatos na área que o
ajudaram a erguer esse negócio bem-sucedido.
— Senhorita Frye? — Ryan chamou a minha atenção. — Poderia
olhar para mim enquanto conversamos? Estou ficando com uma leve
impressão de que você não parece muito interessada pela vaga. Já te fiz três
perguntas e, aparentemente, a senhorita não ouviu nenhuma.
Oh, céus! Que vergonha!
— D-desculpe. — Encolhi os ombros e me forcei a olhar para o
homem de terno preto que estava do outro lado da mesa.
Ele ficou satisfeito com a minha atenção e eu vi o canto da sua boca
se curvar rapidamente em um pequeno sorriso — algo que eu não teria
notado se estivesse olhando para qualquer outro canto da sala. Foi estranho
ver o Ryan dar aquele breve sorrisinho e depois voltar à sua postura de
macho alfa rico e arrogante.
— Sua sorte é que não temos muitas exigências para a vaga pela
qual a senhorita está se candidatando — Ryan prosseguiu, em um tom sério.
— Essa falta de atenção já teria sido motivo para reprovação em qualquer
outra entrevista.
Porra, ele ficou completamente arrogante com o passar dos anos ou
é impressão minha?
— Desculpe, Ryan... Eu prometo que isso não vai se repetir. —
Direcionei a ele o sorriso mais simpático que eu consegui expressar.
Por mais que eu estivesse irritada com o jeito arrogante dele se
comportar, eu sabia que não podia perder a chance de conseguir esse
emprego. Seria um privilégio trabalhar tão perto de casa e não ter que
acordar muito cedo todos os dias. Eu tinha que desapegar do passado e me
concentrar em ser uma boa funcionária. O que passou, passou.
— Quer saber? — Ele tirou o celular do bolso, desbloqueou a tela e
suspirou, demonstrando impaciência novamente. — Você está contratada.
— O-o quê? — Franzi o cenho, confusa. — Assim tão rápido? Eu
nem respondi as suas perguntas.
— Você sequer ouviu as minhas perguntas, Srta. Frye — ele rebateu
e minhas bochechas queimaram com vergonha. — Recebi um pedido da
gerente do RH para que eu te contratasse e vou confiar na escolha dela.
Tenho uma reunião daqui alguns minutos, não posso perder mais tempo
com você.
Eu me senti mal pela forma indiferente com que Ryan estava me
tratando. Senti como se eu fosse uma mera formiga e ele estivesse me
esmagando com o seu sapato caro de grife. Nada mais justo, considerando o
que eu fiz com ele. Talvez, a minha rejeição o transformou em um homem
amargurado e sem amor pelo próximo. O que foi que eu fiz? Ryan era o
cara mais doce e cavalheiro do mundo quando o conheci.
— Caso não tenha ficado claro, você já pode se retirar. — Ryan
ficou de pé e começou a organizar alguns papéis que estavam em cima da
mesa. — E mais uma coisa: me chame de Sr. Watson. Não somos amigos
para você me chamar pelo primeiro nome.
Sr. Watson? Porra, Ryan, parece que a fortuna realmente subiu à
sua cabeça oca!
— Como quiser, Sr. Watson — eu concordei com o seu pedido,
apesar de estar surtando por dentro.
— Bem vinda à Construtora Watson. — Ele me estendeu a mão
direita e com a esquerda segurou a frente do terno, eu me engasguei com a
saliva ao ver uma aliança dourada em seu dedo anelar. Céus, o Ryan é
casado!
Fiquei em choque. Esqueci da forma como fui tratada por ele e de
repente, eu só sabia olhar para a mão grande e bem cuidada do homem e
para aquela aliança grossa de ouro que indicava nitidamente que ele já tinha
dona. Não sei por que estou tão surpresa, Ryan é um cara bonito que tem
dinheiro, estranho seria se ele não tivesse arranjado ninguém nesses anos
que se passaram.
Um peso se abateu sobre mim. Lembrei da noite em que terminei
com Ryan e do anel de noivado que ele iria me dar. Podíamos estar casados
à essa altura. Eu podia ser a dona da aliança que faz par com a joia que
está no dedo dele... Porra, eu não devia estar com esse sentimento de
arrependimento agora!
— Algum problema, Srta. Frye? — Ryan chamou a minha atenção e
me fez voltar à realidade.
A mão dele ainda estava estendida para mim e eu me apressei em
apertá-la para não parecer rude.
— Não, nenhum — me forcei a responder.
— Então vamos ao trabalho. — Ele soltou a mão do meu aperto e
sinalizou que eu fosse embora. — Fale com Katy Petterson, a gerente do
RH, ela vai te passar tudo o que você precisa saber sobre as suas funções
aqui na empresa.
Finalmente, chegou a hora de confrontar Katy sobre a merda em
que ela me meteu!
Levantei da cadeira na velocidade de um raio e saí da sala, eu não
estava pensando com coerência o suficiente para me despedir de Ryan. Uma
grande parte de mim não aguentava ficar mais nenhum segundo ali,
recebendo coices gratuitos daquele cavalo de terno e gravata. O tempo
passou e Ryan Watson mudou para pior. De alguma forma, eu sinto que isso
é culpa minha.
 
CAPÍTULO 3
Quando Victória saiu da sala e fechou a porta, eu deixei o meu
corpo desabar na cadeira. Que merda! Afrouxei o nó da gravata e passei a
mão pelo cabelo sem me importar que aquele gesto fosse bagunçá-lo.
Por que eu fiz aquilo? Por que a tratei daquela forma? Por que
falei que não me lembrava dela?
Eu já sabia que a mulher viria. Katy, minha antiga colega de escola,
implorou pessoalmente para que eu desse um emprego à Victória quando
ela retornasse para Eastdale. Eu relutei de início ao lembrar do que ela me
fez no passado, mas no fim, acabei concordando em contratar a minha ex-
namorada.
Não vou negar que eu fiquei nervoso pra cacete quando a vi
pessoalmente depois de tanto tempo. Victória mudou um pouco desde a
época da escola, mas as mudanças a deixaram ainda mais bonita. O seu
corpo ganhou mais curvas de mulher, seus seios cresceram e o seu quadril
ficou mais avantajado, o que deu ainda mais destaque para a cintura fina
que ela sempre teve.
Sei que eu não devia estar reparando nisso — na verdade, fazia
muito tempo que eu não reparava em uma mulher desse jeito — mas
quando vi a Vic diante de mim, eu senti uma necessidade incontrolável de
analisar cada parte do corpo dela. Infelizmente, só pude ver o que os meus
olhos permitiram já que eu não podia tocá-la, não podia mais tirar as suas
roupas e me perder no seu corpo — e Deus sabe como eu queria ter feito
isso minutos atrás, quando eu estava sozinho com ela na minha sala. Com
certeza, eu vou para o inferno por causa disso.
Katy me explicou que depois de viajar o mundo, Victória não
conseguiu se estabelecer em nenhum país e por isso iria voltar para
Eastdale. Uma parte egoísta de mim queria que ela nunca tivesse saído
daqui, mas a outra parte estava feliz por saber que ela conseguiu realizar o
sonho que tinha de conhecer o mundo. E eu também estava feliz com a vida
que conquistei depois que a Victória foi embora.
Confesso que eu senti muita raiva nas semanas após o nosso
término. Só comecei a esquecer Victória quando conhecia mãe dos meus
filhos e, com o passar dos anos, o rancor que eu sentia pela minha ex-
namorada foi se transformando em indiferença. Quando Katy veio até mim
na semana passada para dizer que a Vic estava voltando para Eastdale e me
perguntou se poderíamos contratá-la, tudo que senti não passou de uma
pequena ansiedade. Eu realmente pensei que não tinha mais nenhum
sentimento por ela, até que a vi pessoalmente. Quando meus olhos
pousaram em Victória, eu senti um calor no peito, uma inquietação, fiquei
com saudade de tocá-la e de tê-la em meus braços. Eu simplesmente não
entendia de onde veio esse sentimento incontrolável de desejo, só sabia que
não podia seguir em frente com aquilo.
Toquei minha aliança com o polegar e a girei sem tirá-la do dedo.
Sarah. Porra, eu sinto falta dela desde que a perdi para aquele maldito
câncer de mama. Faz quase três anos que ela se foi e ainda dói. Dói porque
eu sinto que não dei todo o amor que ela merecia. Eu jamais consegui amá-
la do jeito que ela me amava, jamais consegui dar a ela todo o amor que eu
dei para a Victória porque eu tinha medo que Sarah me deixasse também.
Levou anos do meu casamento para que eu conseguisse abrir o meu coração
e quando isso finalmente aconteceu, a vida me tirou a minha esposa. Jamais
irei me perdoar por não ter dado todo o amor que ela merecia.
Olhei para o porta-retratos na mesa que estava virado na minha
direção e sorri ao ver minhas amadas crianças. Sarah se foi, mas me deixou
seis lindos filhos: tinha Sam e Sophia, os gêmeos mais velhos de onze anos,
depois deles vinha Luke que tinha nove anos, então vinham os gêmeos Nick
e Rick de cinco anos, e por último, mas não menos importante, tinha Luna,
a minha princesinha que completou três aninhos há duas semanas.
Cuidar de Luna sempre foi um desafio já que ela tinha pouco mais
de um mês quando a Sarah nos deixou. A gestação dela foi muito
complicada. Minha esposa já lutava contra o câncer antes mesmo de
descobrir sobre a gravidez, ela praticamente se sacrificou para seguir com a
gestação e colocar Luna no mundo, que graças à Deus nasceu forte e
saudável.
Sarah ficou internada no hospital desde o parto da nossa última
filha, ela estava fraca demais para receber alta, mal conseguia levantar da
cama ou segurar Luna nos braços. Minha esposa acabou partindo no mês
seguinte ao dar à luz e isso me desestabilizou por inteiro. Os mais afetados
pela perda foram nossos gêmeos mais velhos. Os dois já tinham idade o
suficiente para entender o que estava acontecendo e sofreram ao meu lado
quando Sarah partiu.
Eu fui destruído duas vezes, a primeira ao perder a minha esposa e a
segunda ao ver os meus filhos chorando, implorando para a mãe voltar e eu
não poder fazer nada para ajudá-los. Foi um período difícil da minha vida
que até hoje eu não superei. Não consegui superar a morte de Sarah, sequer
tive coragem para tirar a aliança que eu usei durante os anos que estivemos
casados. Ainda me sinto ligado a ela, talvez seja pelos nossos filhos, talvez
seja por remorso ou as duas coisas.
Não consegui seguir em frente com a minha vida, não tive outros
relacionamentos desde que fiquei viúvo e tão pouco consegui sentir desejo
por outra mulher nesse período. Apesar de tudo, eu ainda era humano, tinha
dias que eu precisava me aliviar então eu me trancava no banheiro com o
celular e usava a internet para suprir meus desejos momentâneos. Mas
quando vi a Victória hoje, alguma coisa se acendeu dentro de mim. Porra,
ela foi a primeira mulher que eu senti vontade de comer desde que a Sarah
me deixou.
A voz da minha consciência insistia em repetir que o que eu senti ao
ver minha ex-namorada foi completamente errado. Eu não posso desejá-la,
não seria justo com a memória da Sarah. Deus sabe como me senti culpado
no início da minha união com a minha falecida esposa.
Sarah e eu começamos a sair depois que a Victória foi embora,
ficamos algumas vezes e ela acabou engravidando. Em um ato impensado,
pedi a mulher em casamento e ela aceitou. O início foi turbulento, mas aos
trancos e barrancos fomos encontrando pontos em comum e fizemos a
relação dar certo.
Amo meus filhos incondicionalmente desde a primeira vez que
peguei cada um deles nos braços, mas com Sarah foi diferente, o meu
coração simplesmente se recusava a se entregar completamente a ela. Isso
tinha a ver com Victória, com o modo que ela me magoou. Dei todo o amor
que eu tinha para ela e ela pisou no meu coração, o deixou em pedaços e foi
embora. Quando Sarah me conheceu eu já não era o mesmo. Havia um
buraco no meu peito que eu sabia que jamais poderia ser preenchido por
qualquer outra pessoa que não fosse a Vic.
De qualquer forma, eu veria a minha ex com bastante frequência
agora que ela iria trabalhar na minha empresa, então eu teria que achar um
jeito de não me sentir afetado sempre que esbarrasse com ela pelos
corredores. A coisa mais sensata a fazer seria pegar todos esses sentimentos
conflitantes e trancá-los no fundo do meu peito, jogar a chave fora e
esquecer que eles existiam.
Vou tratar a Victória da maneira mais profissional possível, evitar
que fiquemos muito tempo juntos no mesmo lugar e só dirigir a palavra a
ela quando for extremamente necessário. Não posso correr o risco de
sucumbir à tentação e manchar a memória de Sarah ficando com a mulher
que me fez ter medo de amar.
— Ryan? — Katy, a gerente do RH, me chamou enquanto batia na
porta de um jeito desesperado.
Fui obrigado a voltar à realidade e ignorar a inquietação que eu
sentia no peito.
— Entre. — Limpei a garganta e ajeitei minha postura na cadeira
para parecer o mais normal possível.
A porta se abriu e Katy entrou na sala em passos apressados. Ela
parou em frente à mesa e colocou as mãos na cintura.
— Disse que não se lembra dela? — Katy me questionou, sem
rodeios. — Que merda passou pela sua cabeça, Ryan? Agora eu preciso
aguentar a minha amiga surtando.
— Eu fiquei nervoso — admiti, com inquietação. — Porra, eu não
soube como reagir quando a vi depois de tanto tempo.
Katy suspirou e balançou a cabeça negativamente, me lançando um
olhar desaprovador.
— Será que você pode parar de me olhar assim? — resmunguei. —
Já te fiz um grande favor contratando ela. Garanta que a Victória fique
longe do meu campo de visão, pelo bem da minha saúde mental.
— Grande favor? — Katy riu com ironia. — Fui eu quem te fiz um
grande favor convencendo a Vic a voltar para a cidade.
— Acho que eu não entendi o que você quis dizer. — Pigarreei,
desconcertado.
— Eu sento ao seu lado em todas as reuniões. — Katy me lançou
um olhar malicioso. — Nesses últimos meses, vi você stalkeando o perfil da
Victória pelo computador da empresa mais vezes do que consigo contar.
Sua confissão me fez engasgar. Mas que porra!
— Não tente negar, Ryan, eu sei que você ainda gosta da minha
amiga. Só te fiz um favor trazendo ela para cá, para ficar mais perto de
você.
— Eu não quero a Victória perto de mim. — Me levantei da cadeira
e andei até a janela. Fiquei de costas para Katy enquanto fingia admirar a
vista da cidade para que a mulher não percebesse o meu nervosismo.
Confesso que há algum tempo eu comecei a me sentir curioso para
saber o que a minha ex-namorada estava fazendo, então eu andei
bisbilhotando o perfil da Vic nas redes sociais. As únicas coisas que me
impediam de enviar alguma mensagem e tentar reestabelecer contato com
ela eram o orgulho e o remorso que eu sentia com a perda da minha esposa.
Mesmo Katy sendo gerente do RH e estando alguns níveis abaixo do
meu na hierarquia da empresa, a nossa amizade desde a época da escola lhe
dava liberdade para subir até a minha sala e puxar a minha orelha algumas
vezes — como ela estava fazendo agora.
— Não quer a Victória perto de você? — Katy riu. — Ryan, você e
eu sabemos que ela é a melhor pessoa para ficar perto de você.
Fiquei em silêncio e serrei os punhos, eu não queria dar ideia para as
palavras da Katy. Não posso fazer isso.
— Escuta, Ryan, eu vou bancar a intrometida e meter um pouco o
meu nariz na sua vida pessoal. — Katy tocou omeu ombro e eu me assustei
ao ver que a mulher estava parada ao meu lado. — Você precisa de uma
pessoa para alegrar o seu dia, meu amigo.
— Eu já tenho seis pessoas que alegram o meu dia.
— Os seus filhos não contam! — Ela revirou os olhos. — Você
precisa de uma mulher.
— Absolutamente não — recusei aquela ideia de imediato. — Eu
não preciso de ninguém, estou bem sozinho. Agora, se me der licença,
preciso me preparar para uma reunião. — Gesticulei em direção à porta
para que ela saísse.
— Que reunião, Ryan? Não tem nenhuma reunião hoje. — Katy
estalou a língua. — Essa é a desculpa que você dá quando quer ficar
sozinho. — Ela olhou para a minha mão que estava estendida em direção à
porta e focou sua atenção na aliança em meu dedo. — Agora eu entendi o
que está acontecendo... Você realmente não superou a Sarah?
— Não quero falar sobre isso, Katy. — Coloquei minha mão
esquerda no bolso da calça. — Por favor, me deixe sozinho, eu estou com
muita coisa na cabeça. E, por favor, não deixe a Vic saber que eu me lembro
dela, vai ser mais fácil se ela pensar que é uma desconhecida para mim.
— Quer saber, Ryan? Não vou me meter nisso! — Katy levantou as
mãos em sinal de derrota. — Eu já trouxe a Victória para Eastdale, agora o
resto é com você. Faça o que quiser, só não magoe a minha amiga. — Ela
deu as costas para mim e saiu da sala.
Fiquei sozinho em frente à janela, tentando esquecer da conversa
que tive para que eu pudesse voltar ao trabalho. Katy está louca em trazer a
Victória para Eastdale com o pretexto de me arranjar uma namorada. Ah,
que se foda! Não ligo se a minha gerente de RH está tentando bancar o
cupido, isso não vai funcionar. Por mais que uma parte de mim queira, eu
não posso ficar com a Vic, sinto que isso não é certo.
 
CAPÍTULO 4
Entrei na sala do RH furiosa. Ao encontrar Katy sentada atrás da sua
mesa, fui até lá e a sacudi pelos ombros.
— O que você estava pensando? — eu gritei, aflita. — Por que não
me contou que a empresa era do Ryan? Que merda! Agora eu vou ter que
trabalhar para ele! Você jurou pela nossa amizade que a construtora não era
do Sr. Watson, disse que ele era um sócio!
— Mas eu não menti! A construtora é do Ryan e não do pai dele. E
o Sr. Watson realmente tem uma parte das nossas ações. — Katy empurrou
minhas mãos para longe dos seus ombros e se levantou da cadeira.
— Sua... Eu vou te matar! — Tentei agarrar o pescoço da minha
amiga, que riu e segurou as minhas mãos. Ela estava se divertindo com a
situação.
— Ei, espera... espera! Eu quero entender o que está acontecendo —
Katy tentou me acalmar. — Então você já encontrou o Ryan? O que ele
disse? O que aconteceu? Você passou na entrevista?
— Porra, Katy... — eu choraminguei e soltei minhas mãos do aperto
dela. Me sentei em um sofá pequeno de couro bege que havia no canto da
sala e suspirei, me dando por vencida. — Por que não me contou?
— Porque eu sabia que você jamais aceitaria esse emprego se
soubesse a verdade — ela se explicou, enquanto sentava ao meu lado no
sofá. — Me desculpa, ok? Mas em minha defesa, doze anos atrás, você
pediu que eu nunca mais dissesse nada sobre o Ryan a você. Eu só estava
fazendo o que você mandou.
— Ah, claro, você é uma amiga muito leal — respondi, com ironia.
— Nossa, eu não sei o que eu faria sem você...
— Eu sinto muito, Vic, de verdade. — Katy encolheu os ombros,
dava para ver em seus olhos que ela estava arrependida. — Não fique com
raiva de mim.
Eu apenas suspirei e puxei a minha amiga para um abraço apertado.
Mesmo que eu quisesse sentir raiva da Katy, eu não conseguia. Passamos
por muita coisa e eu não deixaria a nossa amizade de anos acabar por causa
desse desentendimento momentâneo.
— Mas e então, como foi o seu encontro com o Ryan? — Ela se
soltou do abraço para encarar o meu rosto.
Fiz uma careta para sinalizar que o reencontro com o meu ex não foi
dos melhores.
— Ryan não se lembra de mim — desabafei. — Ele foi indiferente
comigo e autoritário. Me pediu para chamá-lo de Sr. Watson, acredita?
— Não pode ser. — Katy ficou boquiaberta com o meu relato. —
Nem eu o chamo assim.
— Sinceramente, eu estou surpresa por ter conseguido esse
emprego. Ele nem me entrevistou direito.
— Ryan deve estar tendo um dia difícil — minha amiga tentou ser
compreensiva. — Mas é estranho que ele não se lembre de você. Você foi a
primeira namorada dele... que merda!
— Exatamente — concordei com a cabeça.
— É sério, nenhum cara na face da terra se esquece da pessoa que
fez o primeiro boquete nele.
— Só para de falar, Katy! — Eu dei um tapa nela, sentindo o meu
rosto queimar com vergonha.
Minha amiga riu e se levantou do sofá.
— Olha, vamos deixar o Ryan de lado por enquanto e focar no
trabalho, ok? — ela mudou de assunto. — Você basicamente vai ser a faz-
tudo da empresa. Vou te dar uma lista de tarefas para o dia.
— Faz-tudo? — eu fiquei insegura. O próprio nome do cargo já
dizia que eu teria que fazer tudo por aqui. — Vou ter que desentupir os
banheiros e tirar o lixo também?
Katy riu e, para o meu alívio, balançou a cabeça negativamente.
— Não, essa parte é com a equipe de limpeza. — Ela levantou do
sofá e pegou uma folha de papel que estava em cima da mesa. — Você vai
ajudar as pessoas com a rotina de trabalho delas. Vai trazer café para mim,
fazer favores para os funcionários que precisarem de ajuda, auxiliar o Todd
na recepção quando ele estiver muito enrolado..., mas não se preocupe, não
serão tarefas muito difíceis.
— Então eu serei a assistente de todo mundo?
— Basicamente, sim. — Katy me entregou a folha de papel e eu
percebi que haviam vários tópicos anotados nela. — Na verdade, não
tinham vagas disponíveis aqui na empresa, mas eu enchi o saco do Ryan
dizendo para ele contratar a minha amiga que precisava muito de dinheiro e
ele acabou inventando essa função de última hora.
— Quer dizer que foi ideia do Ryan me colocar para correr pela
empresa fazendo favores para todo mundo? — Arqueei uma sobrancelha.
— Foi sim. — Katy me direcionou um olhar de pena e afagou o meu
ombro. — Mas não se preocupe, eu sei que você vai se sair bem.
— Ainda não acredito no que está acontecendo, Katy. — Eu suspirei
e encolhi os ombros. — Trabalhar para o meu ex? Que merda, se eu
soubesse disso eu nem teria levantado da cama hoje.
— Eu sei que está se sentindo mal, mas vai passar. — Ela me
empurrou sutilmente em direção à porta. — Você é forte, amiga, vai dar
conta desse dia de trabalho e depois do expediente nós vamos até o Carter’s
Dinner fazer um lanchinho.
— Isso se eu conseguir chegar viva até o final do dia.
— Você vai. — Katy continuou me empurrando em direção à porta
até que eu estivesse fora da sala dela. — Eu tenho que resolver alguns
assuntos agora, amiga. Tenha um bom trabalho.
Katy fechou a porta da sala, me deixando sozinha no corredor do
andar de registros da empresa. Suspirei e aproveitei o momento para ler
com calma a lista que recebi. Haviam apenas 5 tarefas que eu li em voz alta:
— Passar no andar de marketing para perguntar se precisam de
ajuda, passar na recepção e perguntar ao Todd se ele precisa de ajuda, pegar
a correspondência lá fora e levar para o setor de administração, levar um
capuccino com canela para a Katy e... um copo de café expresso para o
Ryan. Porra! — Encostei na parede e esfreguei as têmporas enquanto
memorizava a última tarefa da lista. Isso só pode ser um pesadelo.
Passei o resto da manhã correndo de um lado para o outro pela
empresa. Quando passei na equipe de marketing para perguntar se
precisavam de ajuda, praticamente todos os trabalhadores do setor vieram
em cima de mim com pedidos de café, água ou que eu opinasse sobre os
seus projetos. Ryan devia estar com muita vontade de ferrar alguém quando
inventou essa função de faz-tudo. Se o homem se lembrasse de mim eu até
diria que ele me colocou nessa vaga por vingança pessoal.
Por sorte, tive direito ao meu horário de almoço, assim como todos
os outros funcionários. Sentei na cantina ao lado de Katy e fofocamos um
pouco enquanto saboreávamos a nossa refeição antesde voltarmos ao
trabalho.
Depois do almoço, fui até a recepção e fiquei aliviada quando Todd
— o rapaz que me atendeu mais cedo quando cheguei na empresa — disse
que estava tudo sob controle. Peguei a correspondência e enquanto eu
levava as cartas para o setor da administração, um grupo de estagiários me
cercou pedindo que eu desse a minha opinião sobre a maquete de um
projeto de restauração que estavam montando.
Parece que, na metade de um dia, o assunto de que eu estava
disponível para ajudar todos os funcionários já se espalhou pela empresa. A
parte boa era que eu estava me enturmando rapidamente com os
trabalhadores de todos os setores, mas em contrapartida eu não tinha tempo
de ficar parada. Cada vez que eu sentava para tirar uns minutinhos de
descanso algum funcionário me chamava pedindo café ou algum outro
favor. Era exaustivo.
No final do dia, os funcionários finalmente me deixaram em paz. Eu
havia acabado de entregar o capuccino da Katy e me preparava
mentalmente para ir até a sala de Ryan entregar o seu copo gigante de café
expresso. Só falta essa tarefa. Só mais alguns minutos de tortura e eu vou
poder ir embora.
Entrei no elevador segurando o copo de café e apertei o botão do
décimo andar. Eu tinha acabado de pegar a bebida na cafeteira da cantina,
estava tão quente que eu precisava passar o copo de uma mão para outra
para não me queimar.
Quando cheguei no andar onde ficava a sala de Ryan, respirei fundo
e caminhei em passos confiantes até a porta dele. Eu bati duas vezes antes
de receber uma resposta.
— Entre — Ryan pediu, sem perguntar quem era.
Ok, isso vai ser rápido. Vou entrar na sala, deixar o café na mesa
dele e depois me encontrar com Katy para irmos embora juntas. Com esse
pensamento, abri a porta e entrei. Ryan estava de pé, analisando o mapa de
Eastdale que ficava colado na parede. Assim que notou a minha presença,
ele se virou e ficou de frente para mim.
— A-aqui o seu café, Ry... Sr. Watson. — Decidi andar até ele e
entregar o copo nas suas mãos ao invés de deixá-lo sobre a mesa.
Fiquei tão distraída encarando o rosto do homem que me esqueci de
olhar para o chão enquanto andava. Tropecei no pé da cadeira e o meu
corpo cambaleou para a frente. Ryan agiu rápido e me segurou antes que eu
caísse, mas o seu movimento brusco ao me pegar e segurar o meu corpo
contra o seu me fez derramar o café que estava no copo.
Ryan gemeu com desconforto e se desvencilhou de mim tão rápido
quanto se aproximou. Ele tirou o paletó do seu terno de um jeito
desesperado e o jogou no chão. Foi quando eu percebi o que aconteceu: o
café quente que eu derrubei caiu todo no peito dele. Merda!
— Ryan! — eu gritei, preocupada. — Caramba, me desculpa... —
Levei as mãos ao rosto enquanto pensava no que fazer.
— Porra, essa merda dói! — Ryan sacudia o tecido da sua blusa de
botões, em uma tentativa falha de se livrar do líquido quente que escorria
pela sua roupa.
Olhei para cada canto da sala e tudo que consegui encontrar para
enxugar o café foi o paletó que ele jogou no chão. Peguei a roupa preta e
virei o lado que não estava molhado.
— Eu vou ajudar. — Parei na frente dele e comecei a secar o café
quente que derramei em seu peito, o líquido já estava escorrendo em
direção ao seu abdômen. — Me desculpe, eu não vi o pé da cadeira e
tropecei.
— Deixa isso comigo. — Ele tentou tirar o paletó das minhas mãos,
mas eu não permiti e continuei o secando.
— Fui eu que derrubei o café, então preciso dar um jeito nessa
situação — expliquei, enquanto secava a blusa dele.
Ryan estava tenso, eu podia sentir seus músculos se contraindo sob
o meu toque enquanto eu limpava a região do seu peito. Pobre homem, ele
deve estar incomodado com o café quente.
— Eu sinto muito mesmo — me desculpei novamente.
— Já chega, não precisa me secar. — Ele tentou pegar o paletó da
minha mão outra vez, mas não teve sucesso.
— Fique quieto — resmunguei. — Estou tentando te ajudar.
Eu estava prestes a descer a mão para secar o café que escorria pelo
seu abdômen, quando ele segurou a minha mão com firmeza.
— Chega, Victória — a voz firme de Ryan me impediu de continuar
secando.
Ergui meu rosto até nossos olhos se encontrarem e engoli em seco.
Naquele instante eu percebi o quanto estávamos perto um do outro, minha
outra mão estava espalmada no peito dele enquanto a outra estava presa
pelo seu aperto firme. A última vez que ficamos tão próximos foi quando
dançamos no baile de formatura, horas antes de eu terminar com ele.
Ficar tão perto assim de Ryan estava me desestabilizando mais do
que eu gostaria de admitir. Passei tempo demais me perdendo nos seus
olhos castanhos, tempo demais sentindo o músculo do seu peito relaxar sob
o meu toque. Isso é perigoso. Sei que deveria me afastar, mas não consigo...
Eu simplesmente não consigo.
Durante esse tempo todo que passamos nos encarando, Ryan
também retribuiu o meu olhar, ele ficou imerso em pensamentos enquanto
seus olhos se perdiam nos meus. Eu tive quase certeza que ele se lembraria
de mim naquele momento, mas isso não aconteceu.
De uma hora para a outra, Ryan começou a se contorcer, como se
estivesse com um formigueiro dentro da calça. Ele soltou a minha mão,
interrompeu a nossa troca de olhares e se afastou.
— O que houve? — indaguei, preocupada.
— O café... — Ryan respondeu com desconforto e sacudiu a calça.
— O café chegou na cueca.
— Céus! — Levei uma mão até a boca e olhei involuntariamente
para o meio das pernas dele. A situação acabou de ficar ainda mais
constrangedora.
— Porra, ainda está quente!
— O-o que eu posso fazer para ajudar? — ofereci, na hora do
desespero.
— Saia da sala, eu preciso secar esse café. — Ele sacudiu a calça
outra vez e apontou para a porta. — Não vou tirar a calça com você aqui.
Sai!
Não tem nada aí que eu já não tenha visto antes. Eu pensei em
dizer, mas me contive.
Ryan não estava irritado, só desconfortável. Isso era um milagre
considerando que eu derramei café na roupa dele e, por minha culpa, agora
ele iria ficar com a pele vermelha por alguns dias. Melhor sair daqui antes
que as coisas se compliquem ainda mais.
— E-eu vou embora — me despedi, um pouco sem jeito, e entreguei
o paletó para ele. — Desculpe, eu não fiz por mal.
Ryan apenas acenou com a cabeça e começou a desabotoar a sua
blusa branca que agora estava com uma grande mancha marrom. Arregalei
os olhos discretamente e me virei para ir em direção à porta antes que eu
visse algo que não devia. Aconteceu tanta coisa hoje e é apenas o meu
primeiro dia de trabalho, tenho medo do que virá pela frente.
 
CAPÍTULO 5
Passei as primeiras horas da manhã seguinte meditando e me
preparando mentalmente para qualquer situação que pudesse acontecer no
trabalho envolvendo Ryan e eu. Depois do episódio do café, eu não fazia
ideia se receberia um puxão de orelha ou se o homem simplesmente
deixaria a situação passar. De qualquer forma, eu já tinha me conformado
que veria Ryan todos os dias, já que eu era a funcionária e ele era o meu
chefe.
Preciso admitir que, no fundo, me senti feliz por saber que ele
voltou para a minha vida. Durante a noite até divaguei um pouco sobre,
talvez, conseguir me aproximar dele novamente, mas então eu lembrei que
Ryan era casado. Recordei-me da aliança que vi em seu dedo e confesso
que me senti um pouco mal. Acho que uma pequena parte minha, bem lá no
fundo, esperava que pudéssemos recomeçar de onde paramos doze anos
atrás. É loucura pensar nessa possibilidade, já que eu fui embora e parti o
seu coração.
Eu estava tão imersa em pensamentos quando entrei no prédio
espelhado e passei pela recepção que levei um susto ao ouvir Todd me
chamando.
— Victória? Bom dia! — Ele acenou para mim. — Poderia me fazer
um grande favor?
Sem pensar muito, concordei com a cabeça e me aproximei do
balcão. Como eu era a faz-tudo da empresa, não tinha para onde correr
quando me pediam favores.
— Bom dia, Todd. Em que posso ajudar? — Apoiei um braço no
balcão de informações.
— São oito horas da manhã e já está um caos lá em cima. — Ele
suspirou. — Surgiu umareunião de última hora com um cliente importante
que quer modificar o orçamento da construção. Tenho que falar
urgentemente com o Sr. Watson, mas o telefone dele só dá caixa postal.
Preciso da sua ajuda.
— Pode contar comigo — falei, sem pensar. — O que precisa que
eu faça?
Todd me direcionou um sorriso agradecido e anotou alguma coisa
no bloco de notas que estava sobre o balcão. Quando terminou de escrever,
ele tirou a folha e me entregou. Franzi o cenho ao perceber que Todd me
deu o endereço de alguém.
— Eu preciso que vá até a casa do Sr. Watson e avise a ele sobre a
reunião. Os clientes já chegaram e estão impacientes.
— O-o quê? — engasguei com a saliva. Eu ouvi direito?
— A casa do Sr. Watson fica a uns cinco minutos daqui.
Infelizmente não posso sair da recepção agora, senão eu mesmo iria até lá.
— Todd me lançou um olhar de cachorro sem dono. — Por favor, Victória.
Isso é muito importante.
Vou ter que ir até a casa do Ryan chamar ele para uma reunião?
Que merda, eu não me preparei para isso!
— Se quiser, eu posso ficar na recepção enquanto você vai até a
casa dele — sugeri, na esperança de me livrar daquela tarefa. O que o Ryan
iria pensar se eu aparecesse às oito da manhã na porta dele?
— Não dá, tem algumas coisas aqui que apenas eu sei fazer e levaria
muito tempo se eu tivesse que parar para te explicar tudo. Será mais fácil se
você for até a casa dele. — Dava para ver que Todd não iria mudar de ideia.
— Por favor.
Suspirei, inquieta, e passei a mão pelo meu cabelo que hoje estava
solto ao redor dos ombros. Bom, eu sou a garota dos favores, não tenho
outra escolha a não ser aceitar a tarefa que me foi dada.
— Tudo bem. Eu vou até lá — concordei, por livre e espontânea
pressão.
— Obrigado. — Todd sorriu, agradecido.
Eu sequer consegui retribuir o sorrido dele, apenas me virei e saí do
prédio em passos apressados.
Todd não mentiu quando disse que Ryan morava perto da empresa.
Depois de cinco minutos de caminhada, eu cheguei ao endereço que o
recepcionista me deu e fiquei surpresa ao ver a casa onde o meu chefe
morava. Não era uma residência tão grande quanto eu imaginei que seria,
mas ainda era bonita e luxuosa. A fachada da casa de dois andares possuía
uma decoração rústica de tijolos vermelhos que combinava com a
arquitetura do restante da cidade. Eu não me lembro dessa residência estar
aqui doze anos atrás, então concluí que ela foi construída depois que saí de
Eastdale. Provavelmente, Ryan a construiu quando já tinha a empresa.
Havia um gramado gigante em frente à casa e, enquanto eu
caminhava por ele para ir até a porta da frente, não deixei passar
despercebido alguns brinquedos que estavam espalhados pela grama. Quase
tropecei em uma bola de futebol e precisei desviar de duas bicicletas de
rodinhas que estavam jogadas no meio do caminho. Ryan tem filhos. Engoli
em seco, sentindo um aperto no coração.
Quando cheguei na varanda da casa, toquei a campainha e mordi os
lábios com insegurança. Será que a esposa dele está aí? Céus! O que a
mulher vai pensar quando vir que uma funcionária da empresa veio buscar
o marido dela em casa? Espero que ela não entenda mal...
Uma parte de mim ficou um pouco triste ao saber que Ryan se
tornou pai e que eu não era a mãe dos filhos dele. Voltei para Eastdale com
a intenção de construir uma família e quando reencontrei Ryan, por um
instante, eu pensei que poderíamos reatar a relação. Fui uma tola. O que eu
estava pensando? Eu terminei com ele e fui embora, cometi um erro.
Jamais posso culpar o Ryan por seguir com a vida dele e me esquecer
completamente.
Enquanto eu chorava em pensamentos pelo leite derramado, a porta
da casa se abriu de repente. Fiquei confusa ao perceber que não havia
ninguém no meu campo de visão, mas quando inclinei o meu rosto para
baixo, dei de cara com um garotinho loiro de cabelo arrepiado que vestia
um uniforme escolar e parecia ter oito ou nove anos de idade. Não precisei
olhar por muito tempo para saber que ele era filho do Ryan, os traços do
rosto da criança eram idênticos aos do pai. Caramba, é como olhar para o
Ryan mais novo de cabelo loiro.
— O-olá. — Esforcei-me para deixar a surpresa de lado e me
concentrar no motivo da minha visita. — O Ryan Watson está em casa?
— Está sim. Ele é o meu pai. — O garotinho cruzou os braços
diante do peito e me olhou de cima a baixo com um olhar curioso. — Você
é a nova babá? O meu pai te chamou para cuidar da gente?
— O quê? Não, eu...
— AAAH! — O garotinho me interrompeu com um grito, enquanto
olhava para dentro da casa.
Levei as mãos ao peito e dei um pulo para trás com o susto. De onde
eu estava, olhei para dentro da residência para tentar descobrir o motivo da
gritaria, mas não consegui ver nada suspeito. Tudo que estava em meu
campo de visão era uma lareira apagada e os degraus de uma escada de
madeira envernizada que levava até o segundo andar.
Quando o garotinho parou de gritar e se preparou para correr, ele
olhou na minha direção.
— Pode entrar, moça. — Após dizer isso, ele saiu em disparada e
desapareceu do meu campo de visão, em seguida, outro garoto um pouco
maior cruzou a sala segurando uma arma de brinquedo que atirava dardos
de plástico. Ele foi na mesma direção que a criança anterior.
Então o Ryan tem dois filhos.
Hesitei por um tempo, mas no fim, acabei entrando na casa e me
peguei admirando o lugar. O interior era aconchegante e ao mesmo tempo
luxuoso. Havia uma TV gigante na parede e de frente para ela estava um
tapete bege felpudo e um conjunto de sofás de couro branco que tomava a
maior parte do espaço do cômodo. Do outro lado da sala havia uma lareira
que estava apagada — já que era verão — e uma escadaria de madeira
nobre que levava até o andar de cima. Também havia um corredor que dava
para outra parte da casa. Tomei coragem e decidi seguir por ali enquanto
chamava pelo Ryan.
— Sr. Watson? — falei hesitante, enquanto avançava pelo corredor.
— Sou eu, Victória, a faz-tudo que foi contratada ontem. Precisamos de
você na empresa... — Parei de falar quando o alarme de fumaça começou a
apitar.
Apertei o passo e quando saí do corredor me vi em uma cozinha
enfumaçada com um cheiro forte de queimado. Ouvi uma garotinha tossir e
quando olhei para o fogão, vi duas crianças tentando preparar o café da
manhã. Uma garotinha de cabelos castanhos encaracolados tentava raspar a
comida queimada da frigideira, enquanto um garotinho menor, que estava
apenas de falda, a assistia na ponta dos pés.
— Ei? Se afastem daí! — Quando percebi, eu já estava correndo até
eles. Tirei a frigideira das mãos da garotinha e desliguei o fogo. — É
perigoso!
Céus, onde o Ryan está? Essas crianças são dele também?
Olhei brevemente para a garotinha de cabelos castanhos, ela já era
grandinha, devia ter pelo menos uns onze anos de idade. A criança que a
acompanhava era um menininho gordinho de bochechas rosadas e cabelo
loiro escuro. Ele parecia ter uns 5 anos.
— O que estão fazendo? Onde está o pai de vocês? — Eu estava
preocupada, mas não deixei de notar o quanto aquelas duas crianças
também se pareciam com o meu ex-namorado.
— Quem é você? — A garotinha franziu o cenho. — Outra babá?
— Babá? Não, eu sou...
— Você não consegue me pegar! — O garotinho que me atendeu na
porta entrou correndo na cozinha e começou a correr em volta da ilha de
mármore. A menina com quem eu falava deu alguns passos para trás para
sair do caminho dele.
Eu me virei na direção do corredor por onde vim e quase trombei
com o garoto que segurava a arma de brinquedo. A fisionomia e o tamanho
dele se assemelhava muito com a da garotinha que também estava na
cozinha. Acho que eram gêmeos.
— Sam, por que ainda não vestiu o uniforme da escola? — a
garotinha o repreendeu. — Já estamos atrasados!
— Eu não quero ir para a escola hoje. — Sam atirou um dardo de
plástico nela e ela gritou.
— PAI! — A garotinha bateu os pés no chão, embirrada. — O Sam
está atirando dardos em mim de novo!
— SAM? — Era a voz do Ryan. A julgar pela distância do som eu
diria que ele estava gritando do segundo andar.— Pare de importunar a sua
irmã e vá se arrumar para a escola!
Eu não pensei muito bem. Apenas dei as costas para as crianças e
corri de volta para a sala. Preciso falar com o Ryan. Subi as escadas em
passos apressados e quando cheguei no segundo andar, vi o mesmo
garotinho de fralda que estava na cozinha. Como foi que essa criança
chegou aqui em cima antes de mim? Ele estava no meio do corredor,
brincando de cabo-de-guerra com um labrador adulto.
Parei de andar e observei a cena. O garotinho puxava a ponta de
uma toalha enquanto o cachorro de cor bege mordia a outra ponta e puxava
a toalha na direção oposta. Os dois estavam tão distraídos com a brincadeira
que sequer notaram a minha presença. Será que essa casa é assim todos os
dias? Ao fundo, eu pude ouvir um choro de criança.
— Ryan? — chamei outra vez, sem tirar os olhos do garotinho e do
cachorro no meio do corredor. — Você está aqui?
Não obtive resposta, então continuei andando. Algo me dizia para ir
em direção ao choro e foi isso que eu fiz. Desviei do garotinho que brincava
com o labrador e caminhei pelo corredor extenso até parar diante de uma
porta que estava enfeitada com nuvens coloridas e exibia um nome em
destaque: Luna. O choro vem daqui.
Girei a maçaneta e entrei no quarto. Ryan estava lá dentro e
segurava uma garotinha no colo que parecia ter, no máximo, uns 3 anos. A
criança chorava e ele a balançava suavemente na tentativa de acalmá-la. O
homem estava tão focado em fazer a filha parar de chorar que mal notou a
minha presença.
Fiquei em silêncio por um longo tempo, enquanto pensava no que
poderia dizer. Ryan estava evidentemente exausto. Ele usava uma calça
cinza de moletom e camisa branca folgada, o cabelo dele estava
despenteado e haviam olheiras enormes ao redor dos seus olhos. Pobre
homem. Não tem ninguém para ajudá-lo a cuidar dessas crianças? Será
que a esposa dele está viajando? E onde estão o Sr. e a Sra. Watson?
Ryan tirou um termômetro debaixo do braço da menina e olhou para
ele com uma expressão preocupada no rosto. A bebê está doente? Senti um
peso no peito e não consegui impedir minhas pernas de caminharem até lá.
— Shh... não chore, pequena. — Ele deitou a cabeça da filha no seu
ombro. — A febre está baixando, você já vai melhorar.
— Ryan? — eu finalmente revelei que estava ali.
O homem levou um sustou quando ouviu a minha voz e me encarou
de olhos arregalados.
— V-Victória? — Ele gaguejou. — É você mesma ou o sono já está
me causando alucinações?
— Sou eu mesma. — A minha boca se curvou em um sorriso tenso.
Por que motivos o Ryan me veria em uma alucinação? — Cheguei em uma
hora ruim, não foi?
— Não... as minhas manhãs costumam ser agitadas assim mesmo.
— Ryan me direcionou um sorriso cansado. — Mas hoje as coisas estão
mais complicadas que o normal.
Sem saber o que responder, eu apenas assenti.
— Aliás, o que você está fazendo aqui? — ele perguntou, ao se dar
conta da realidade. — Quem te deixou entrar?
— Estou aqui porque precisam de você lá na empresa. Surgiu uma
reunião de última hora com alguns clientes e...
— Eu não vou — Ryan me cortou de repente. — Não posso ir, a
Luna está com febre desde ontem à noite.
— Oh... Luna é a bebê? — eu me referi à garotinha que estava no
colo dele.
Ryan assentiu.
— Segui as recomendações do pediatra e agora preciso esperar a
febre cessar por completo. — Ele suspirou. — Não posso deixar as crianças
sozinhas em casa. Os meus pais estão viajando e nenhuma babá da agência
quer tomar conta dos meus filhos.
— Sério? Por que não? — Eu achei aquilo estranho.
— Porque todas elas conhecem a reputação das minhas crianças —
Ryan respondeu, com um sorriso envergonhado. — A última babá que
cuidou deles saiu daqui com o cabelo em chamas.
— Não pode estar falando sério. — Eu deixei uma risada escapar,
mas fiquei séria ao perceber que aquilo não era uma brincadeira. Ok,
melhor voltar o foco para a minha missão principal. — Bom, eu lamento,
Ryan, mas realmente precisam de você na empresa. Estavam tão
desesperados que me mandaram até aqui para te chamar pessoalmente.
Ryan suspirou e afastou a filha do seu corpo para olhá-la. A
garotinha já havia se acalmado e estava ficando sonolenta.
— Tem alguma experiência com crianças, Victória? — Ele voltou
seu olhar até mim.
— Por que quer saber?
Ryan ignorou a minha pergunta e colocou Luna no berço. A
garotinha se mexeu até encontrar uma posição confortável e fechou os
olhinhos.
— Já que precisam tanto de mim na empresa, eu vou me arrumar. —
O homem estava relutante, mas sabia que não tinha outra opção. Ele veio
até mim e parou a alguns centímetros de distância, fazendo o meu coração
acelerar. — Por favor, cuide das crianças até o final do dia.
— O quê?! — Arregalei os olhos.
— Vou levar os três mais velhos para a escola, já que é o mesmo
caminho da empresa. Às quatro da tarde o ônibus os deixa aqui na porta de
casa. — Ryan seguiu com aquela ideia absurda. — Os gêmeos de cinco
anos ficam quietos se você deixar os dois na frente da TV. Você precisa
cuidar da Luna e seguir à risca tudo que o pediatra recomendou. O horário
dos medicamentos e os cuidados que você precisa ter com ela estão
anotados na agenda em cima da cômoda.
Olhei para a cômoda do quarto e percebi que havia uma agenda
aberta ali.
— Ryan, eu...
— Vou anotar o meu telefone ali também — ele me cortou. — Se
alguma coisa acontecer, me liga. Ok?
— Ryan, eu não posso ficar com os seus filhos — me posicionei. —
Tenho o meu trabalho na empresa, as pessoas devem estar precisando de
mim.
Naquele instante, o garotinho loiro de cabelo espetado entrou no
quarto. Ele parecia mais calmo agora e bebia um suco de caixinha. Ao ver
que o pai estava ocupado, ele ficou em silêncio e aguardou que os adultos
terminassem de conversar.
— Seu trabalho hoje será cuidar dos meus filhos — Ryan decidiu,
em um tom sério. — Será a babá deles por um dia.
— Babá? Isso é loucura! — Balancei a cabeça negativamente.
Comecei a me sentir aflita com a possibilidade de ter que passar o dia
naquela casa cuidando de crianças tão agitadas. E se alguém se machucar?
E se a febre da bebê aumentar? Ryan vai botar a culpa em mim! — Por que
eu tenho que cuidar das suas crianças? E a sua esposa? Ela também trabalha
ou está viajando?
— A minha mãe morreu — disse uma voz, atrás de mim.
Fiquei em choque quando ouvi aquela frase. Voltei meu olhar para o
garotinho de cabelo espetado e torci para ter entendido errado.
— O que você disse? — indaguei, com um olhar aflito.
— Eu disse que a minha mãe morreu — o garotinho repetiu a frase.
— Já faz alguns anos.
Céus... Olhei para Ryan que estava em silêncio. Isso é verdade? A
esposa dele está... morta? Ele é viúvo e cuida dessas crianças sozinho?
Eu estava prestes a abrir minha boca para fazer uma das perguntas
que pipocavam em minha mente quando o homem saiu do cômodo em
passos apressados.
— Ryan? — chamei, no calor do momento.
Ele parou no batente da porta e virou seu rosto na minha direção.
— Cuide deles direitinho, ok? — Ryan me deu uma piscadela e
depois olhou para o filho. — Luke, nós vamos sair em dez minutos.
— Ei, Ryan, espera... — Era tarde demais. O homem fechou a porta
e me deixou sozinha com a bebê e o garotinho de cabelo espetado.
 
CAPÍTULO 6
— Essa não — resmunguei em voz alta, enquanto passava a mão
pelo cabelo. — O que eu vou fazer?
Olhei para a bebê dormindo no berço e senti uma mão cutucando o
meu braço. Era o menino de cabelo espetado.
— Quer ajuda? Eu posso te ajudar — o garotinho se ofereceu.
— Obrigada, mas pelo que eu entendi você tem que ir para a escola
daqui a pouco — suspirei.
— Antes de sair, eu posso explicar como as coisas funcionam por
aqui.
Sabendo que não havia como sair daquela situação, eu balancei a
cabeça em concordância. Eu é que não vou recusar ajuda nesse momento.
— Está bem. Seu nome é Luke, não é?
O garotinho assentiu.
— Ok, Luke, me mostre como as coisas funcionam na sua casa —
pedi, já aceitando que eu não tinha para onde correr. Terei que cuidar dos
filhos do Ryan o dia todo. Bem, com tanto

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