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Bianca Mocci Passaro 
Clecia Bastos Gerardi 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Como eu vivo é a maior homenagem para 
meu filho... 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Universidade São Marcos 
São Paulo, 2006 
 
 
 
 
2
Bianca Mocci Passaro 
Clecia Bastos Gerardi 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Como eu vivo é a maior homenagem 
para meu filho... 
 
 
 
 
 
TCC- Trabalho de Conclusão de 
Curso apresentado ao curso de 
Psicologia da Universidade São 
Marcos sob orientação da Profª 
Drª Silvia Ancona - Lopez. 
 
 
 
 
 
Universidade São Marcos 
São Paulo, 2006 
 
 
 
3
Como eu vivo é a maior homenagem 
para meu filho... 
 
 
Bianca Mocci Passaro 
Clecia Bastos Gerardi 
 
 
 BANCA EXAMINADORA 
 
 
 
___________________________ 
Profª. Ivana Moraes de Alencar 
 
 
 
____________________ 
Profª. Drª Gabriela Casellato 
 
 
 
 
_______________________________ 
Profª. Drª Silvia Ancona - Lopez 
 
 
 
 
Trabalho apresentado e aprovado em: _04_/_12_/2006 
 
 
4
AGRADECIMENTOS 
 
 
A colaboradora desta pesquisa, pela sua disponibil idade e carinho em 
relatar sua experiência, permitindo que parti lhássemos de seus 
conteúdos mais íntimos, para que, de maneira ética, pudéssemos 
elaborar nosso trabalho. 
 
A nossa querida orientadora Silvia Ancona - Lopez que nos guiou nessa 
trajetória, apontando-nos sempre com precisão, cuidado e 
compreensão a uma direção a seguir. 
 
A Professora Ivana Moraes de Alencar, grande responsável por ter 
plantado o interesse e a possibil idade de levarmos à frente nosso tema. 
 
A nossa querida amiga Daniela Tramujas, por ter proporcionado o 
contato com a nossa colaboradora. 
 
Aos nossos f iéis companheiros e famil iares, que conviveram 
diariamente com as conseqüências deste trabalho. Para vocês o nosso 
profundo agradecimento. 
 
A todos os nossos amigos, que de maneira distante ou próxima, sempre 
estiveram ao nosso lado quando foi preciso. 
 
 
Bianca M. Passaro 
 e 
Clecia B. Gerardi 
 
 
 
 
 
5
 
DEDICATÓRIA - 1 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho a meus pais que sempre me apoiaram e 
acima de tudo acredi taram e embarcaram neste meu sonho. A 
vocês dois, o meu profundo e eterno agradecimento. Ao meu 
namorado Fernando Azevedo, companheiro leal , que por meio 
da sua paciência e compreensão, me ajudou a real izar esta 
obra com prazer e segurança. Agradeço em especial a minha 
amiga e parceira, por ser uma mulher de mente br i lhante e 
cr iat iva, que sempre me convidou a correr r iscos e ousar, 
d iante das dúvidas e incerteza, encontradas em nosso 
caminho. 
 
In Memória: À minha avó Aida, que ao perder seu f i lho me 
inspirou, através do nosso eterno laço de afeto. “Vó, a 
saudade é grande, mas o amor é para sempre”. Ao meu 
quer ido amigo Renato de Cicco Porto, um muito obr igado, por 
ter me ensinado a viver, apesar das barreiras e da sociedade. 
 
 Bianca M. Passaro 
 
 
 
 
 
 
6
 
DEDICATÓRIA - 2 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Dedico este trabalho ao amigo, companheiro e amado marido 
Alessandro Gerardi , por sempre estar ao meu lado. Obrigado 
pelo car inho, pela compreensão e pr inc ipalmente pela 
cumpl ic idade. Aos meus quer idos e amados f i lhos, L ino e 
Alessandro, pessoinhas que me inspiram a v iver . Aos meus 
adorados pais, pessoas que sempre acreditaram e apoiaram 
meus sonhos, por mais d i f íceis que parecessem. E, em 
especial , agradeço a minha quer ida amiga e parceira deste 
t rabalho. Pessoa maravi lhosa. Obr igada pela amizade 
incondicional e por ter apostado neste trabalho. 
 
 Clecia B. Gerardi 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7
 
 
“Cada um que passa em nossa vida, passa sozinho, pois cada 
pessoa é única e nenhuma substitui a outra. Cada um que 
passa em nossa vida, passa sozinho, mas não vai só, nem nos 
deixa sós; leva um pouco de nós mesmos, deixa um pouco de si 
mesmo. Há os que levam muito, mas não há os que levam 
nada; há os que deixam muito, mas não há os que deixam 
nada. Essa é a maior responsabilidade de nossas vidas e a 
prova evidente que duas almas não se encontram por acaso”. 
 
Antoine de Saint-Exupéry 
 
 
8
GERARDI, C. B. PASSARO, B. M., Como eu vivo é a maior 
homenagem para meu filho . Trabalho de Conclusão de Curso de 
Psicologia da Universidade São Marcos, 2006. p 114. 
 
RESUMO 
 
O objetivo deste trabalho é compreender a vivência de uma mãe 
que perdeu seu fi lho, juntamente com sentimentos e signif icados dessa 
experiência. O interesse por este tema partiu da dif iculdade que 
observamos das pessoas ao falarem da morte, principalmente quando 
se trata de entes queridos. Para conhecermos essa vivência, uti l izamos 
abordagem qualitativa, e como instrumento uma entrevista semi-
dirigida, sendo uma única mãe entrevistada, relatando a experiência de 
perder seu único f i lho. Uti l izamos uma perspectiva fenomenológica, 
seguindo as etapas de investigação apresentadas por Yolanda C. 
Forghieri, tendo como base, envolvimento existencial e distanciamento 
reflexivo, a f im de uma possível compreensão de signif icados. Por meio 
da fala dessa mãe procuramos subsídios para uma melhor 
compreensão daquilo que ela vivenciou ao perder seu fi lho. Na busca 
de um referencial teórico que embasasse nosso trabalho nos 
deparamos com alguns autores, que nos auxil iaram para uma melhor 
compreensão do tema e análise dos dados. Entendemos que para essa 
mãe a vida ganhou um novo sentido, ela vive por amor ao seu fi lho, e, 
esse amor trouxe a necessidade de comparti lhar a sua experiência com 
outras mães, levando-a a escrever um livro. Ela encontrou na religião 
apoio para aliviar seu medo e sua dor. Sentiu o despreparo da 
sociedade em lidar com a perda e também a dif iculdade em encontrar 
mais profissionais que l idem com esta questão. 
 
Palavras Chave: Morte de um fi lho, Perda, Luto. 
 
 
 
 
9
SUMÁRIO 
 
RESUMO 
 
INTRODUÇÃO 10 
 
Capítulo I 
 CAMINHO DA PESQUISA 17 
 Objetivo 17 
 1.1. – Caminhos 17 
 1.2. – Colaboradora 20 
 1.3. – Entrevista 20 
 1.4. – Trabalhando com o Depoimento 21 
 
Capítulo II 
MEDO DO DESCONHECIDO 25 
 
Capítulo III 
 POR QUE COMIGO? 30 
 
Capítulo IV 
 RITUAL: UMA DOR NECESSÁRIA 37 
 
Capítulo V 
 LUTO: PROCESSO DE ELABORAÇÃO 42 
 5.1. – Luto não complicado 45 
 5.2. – Luto complicado 48 
 5.3. – O quê acontece após o luto? 49 
 
Capítulo VI 
 ANÁLISE DA ENTREVISTA 52 
 6.1. – Encontro 526.2. – Relações: Filho e Amigos 53 
 6.3. – Sociedade e Psicoterapia 56 
 6.4. – Reações e Sentimentos 62 
 6.5. – Rituais 71 
 6.6. – O que fazer? 74 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 78 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 83 
 
Anexo I - Transcrição da Entrevista 88 
 
Anexo II - Termo de consentimento l ivre e Esclarecido 109 
 
Anexo III - Grupos de Apoio ao luto 113 
 
 
10
 INTRODUÇÃO 
 
 
ealizar este trabalho com uma mãe que perdeu seu fi lho 
signif ica uma experiência rica e penosa. Rica por entrar em 
um mundo desconhecido e cheio de sentimentos, e penosa 
por comparti lhar de uma dor considerada entre outras, a mais sofrida 
de todas. 
Para Bowlby (2004) a perda de uma pessoa amada é considerada 
uma das experiências mais intensas e dolorosas, que o ser humano 
pode sofrer. É penosa não só para quem a vivencia, mas também para 
quem está próximo. É um ato de nos confrontarmos com a nossa 
própria impotência. 
O objetivo dessa pesquisa, por meio da abordagem qualitativa, é 
chegar o mais próximo possível da vivência de uma mãe que perdeu 
subitamente seu fi lho (em um acidente de carro) e também 
compreender sentimentos e reações, para um possível entendimento do 
luto enquanto processo. Essa proximidade e a busca de compreensão 
surgiram como uma tentativa de responder a algumas questões iniciais 
que tínhamos, sendo elas: Como seria possível sobreviver à morte de 
um fi lho? O que mudaria na mãe após a perda? Quando uma mãe perde 
um fi lho, o que realmente ela perde? Após o luto, a morte ganharia um 
novo sentido? 
R 
 
 
11
O interesse sobre o tema parte também da dif iculdade que 
observamos nas pessoas ao falarem da morte, principalmente quando 
se trata da perda de entes queridos. Não se fala em morte e se pensa o 
menos possível. 
Na busca de um embasamento teórico que nos auxil iasse a 
compreender o tema escolhido, nos deparamos com alguns autores, 
entre eles Kovács (2003), Casellato e Motta (2002), Worden (1998), 
entre outros, que nos levaram a um conhecimento mais profundo sobre 
o assunto. 
A princípio é necessário entendermos que não há somente um 
tipo de morte durante o processo evolutivo. Segundo Kovács (1992) 
cada indivíduo traz consigo uma representação da morte, pois cada 
sujeito é inserido em uma cultura, em uma crendice. 
Um outro aspecto importante para autora é a representação que 
cada indivíduo atribui a morte. Freqüentemente a morte amedronta, é 
vista como fim, como perda de consciência que vem acompanhada pelo 
medo da solidão, da separação de quem se ama, o medo do 
desconhecido e muitos outros. 
A morte de um ente querido associa-se ao luto. Conforme Kovács 
(2003) o luto trata-se de um processo que afeta o signif icado que se dá 
à vida, já que nela provoca profundas transformações. De acordo com 
Kuhn (apud Parkes, 1998) o enlutado traz a sensação de que não foram 
os mortos que partiram, mas os que ficaram é que foram ejetados do 
mundo, que até então, lhes era famil iar. 
 
 
12
Kovács (2003) ressalta a idéia da perda e da elaboração como 
sendo elementos contínuos no processo de desenvolvimento humano. A 
morte nos fala de um vínculo, de uma perda real e concreta, de uma 
irreversibil idade. 
Conforme Bowlby (apud Casellato e Motta, 2002) a maneira de 
enlutar-se seria, portanto, uma resposta à separação que mudaria 
dependendo da qualidade dos vínculos estabelecidos primariamente. 
Para Bromberg e Kovács (1996): 
 
A inf luência é mutuamente recíproca entre o luto e o c ic lo 
v i ta l da famíl ia. O ajustamento à real idade após a morte de 
um dos elementos da famíl ia é um trabalho a ser resolvido a 
curto e longo prazo. (p. 116) 
 
 
Após a descrição de algumas implicações da morte e do luto, 
cabe nesse momento falarmos especif icamente da morte de um fi lho. 
Pois, há diferenças de luto a partir do t ipo de morte. 
De acordo com Casellato e Motta (2002) podem ocorrer vários 
t ipos de perda, porém a morte de um fi lho é reconhecida socialmente 
como a mais intensa, é algo inigualável. Para as autoras: 
 
Esta mãe vive um fracasso social e, sente-se cobrada em seu 
contexto social , como se t ivesse falhado em sua função 
materna de proteger o f i lho e com isso garant ir a sua 
sobrevivência a qualquer custo. (p. 101) 
 
 
Segundo Casellato (1998) quando ocorre a morte de um fi lho por 
acidente, esse evento apresenta-se precoce e inesperado, sendo um 
 
 
13
processo de elaboração bastante difíci l que causa uma potencialidade 
de desorganização, paralisação e impotência. 
Conforme Viorst (2004) a perda de um fi lho é sentida como um 
golpe. O que leva os pais a se perguntarem, como continuar a viver 
com este fato?. Neste momento a mente f ica imobil izada com o choque 
e, assim, a uma dif iculdade de compreender o sentido das palavras. Há 
uma vaga sensação de uma imensa perda, porém, será somente com o 
tempo, que a mente e a memória se reunirão, e assim, talvez 
compreenderão a verdadeira extensão daquilo que ocorreu. 
Segundo Bromberg e Kovács (1996) a morte de um fi lho tem 
efeitos sobre o sistema famil iar. O luto dos pais é freqüentemente 
misturado com a raiva, culpa e a auto-reprovação por sua inabil idade 
em impedir a morte, bem como a sensação de estarem sendo vít imas 
de uma injustiça. 
 
Sou pr is ioneira da v ida. É assim que as horas se arrastam a 
cabeça a mi l , o coração em chamas. Eu imploro para a noi te 
chegar e eu esquecer, nas poucas horas que consigo dormir , 
que estou v iva e que meu amado f i lho morreu. L indo, amado! 
(KELLER, 2005, p. 33) 
 
 
É provável, que neste momento da vida a mãe tenha uma 
sensação de fracasso, até mesmo de pecado, só pelo fato de continuar 
a viver depois da morte de seu fi lho. Não se sente merecedora de estar 
vivendo quando o seu fi lho está morto, e surge a sensação de não ter 
encontrado um meio de dar sua própria vida pela dele. 
Para Viorst (2004) a culpa é um dos sentimentos que 
possivelmente aparecem nas mães, levando-as a pensamentos de 
 
 
14
falhas em relação a pessoa amada e que agora está morta. Surge 
também uma culpa por sentimentos negativos perante o f i lho que 
morreu. Neste momento apegar-se a dor pode parecer um ato de 
fidelidade, ao passo que ceder ao tempo pode parecer uma traição. 
Como dissemos anteriormente, tudo que narramos a respeito da 
morte enquanto f initude, do luto e da perda de um fi lho, nos mostra ser 
um fenômeno importante a ser estudado, e para isso pensamos em nos 
aproximarmos de uma pessoa envolvida neste processo, para então 
questioná-la sobre o sentido particular de sua vivência. 
Encontramos na uti l ização do método fenomenológico, aplicado à 
pesquisa de caráter psicológico, uma forma de investigação que 
suspende toda e qualquer hipótese ou teoria existente sobre o assunto. 
Buscamos nos dirigir ao fenômeno, para poder entender e captar seus 
signif icados. 
A partir dessa abordagem, é necessário falarmos da preocupação 
que tivemos ao escolher essa mãe. Acreditamos que para uma melhor 
elaboração deste trabalho, partindo do princípio de sermos graduandas 
de Psicologia, seria importante que a mãe escolhida já t ivesse exposto 
de alguma forma a sua vivência, e, junto a isso, seria fundamental que 
ela já t ivesse passado por um processo psicoterápico. A partir desses 
critérios pudemos prosseguir com a pesquisa. 
Entendemos que seria possível realizar esse trabalho, mesmosabendo que é um assunto difíci l a ser tratado, por isto, mobil izamo-
nos para desenvolver esta pesquisa com tanto rigor, não apenas por 
 
 
15
ser um trabalho de conclusão de curso, mas também por considerarmos 
que chegar próximo a essa dor é também compreender o luto enquanto 
processo ocasionado após uma perda. 
Esperamos que com este trabalho possamos de alguma forma 
contribuir para a Psicologia, pois acreditamos que este assunto seja de 
extrema relevância para a sociedade que deseja compreender melhor 
essa experiência, e para os profissionais que trabalham diretamente 
com seres humanos, que a qualquer momento da vida perderam ou 
perderão alguém. Para isso, a informação e o conhecimento são 
fundamentais. 
Antecipando o que se segue, adiantamos que nosso trabalho se 
constitui a partir de quatro capítulos teóricos, no qual apresentaremos 
alguns conhecimentos que já foram expressos a respeito da morte; do 
luto materno e suas características; discutiremos também sobre rituais, 
e, f inalizando nossa parte teórica, falaremos sobre o luto e suas 
vertentes. 
Apresentaremos também um capítulo específico descrevendo a 
nossa metodologia de abordagem fenomenológica, descrita passo a 
passo, como procedemos com a pesquisa. Desenvolvemos nossa 
análise baseada nas falas da nossa colaboradora, e por f im 
apresentaremos as nossas considerações finais, onde discutiremos a 
experiência dessa mãe, juntamente com o embasamento teórico 
descrito nos capítulos a seguir. 
 
 
 
16
 
 
 
 
“O ponto de partida, na maioria das vezes não será o mesmo 
ponto de chegada. Nem mesmo pode-se esperar ser o mesmo 
ser, no ponto final da caminhada”. 
Cléa Rubiane 
 
 
17
 
 CAPÍTULO I 
 
 
CAMINHO DA PESQUISA 
 
 
BJETIVO: Buscar compreender, a partir de uma 
perspectiva fenomenológica a vivência de uma mãe que 
perdeu seu fi lho e procurar compreender sentimentos e 
reações para um possível entendimento do luto enquanto processo 
derivante após uma perda. 
 
1.1. CAMINHOS 
Inicialmente, a única certeza que tínhamos era de estudarmos o 
tema luto e também de que gostaríamos de trabalhar com pessoas e 
suas vivências. No início não havia caminhos e nem perspectivas. Foi 
por meio de muitas leituras, conversas e pesquisas que começamos a 
nos famil iarizarmos e a nos interessarmos mais pelo tema. 
Realizamos um estudo qualitativo, pois aprendemos que no 
mundo da investigação é interessante não seguir caminhos já traçados, 
como também é fundamental ter em mente a certeza do que queremos, 
deixando de lado as análises e interpretações racionais, sejam elas 
científ icas ou não. Foi assim, que nos deparamos com a 
O
 
 
18
fenomenologia, abordagem esta, que nos trouxe a clareza de como 
prosseguirmos com nossa pesquisa. 
Forghieri (1993) ressalta que em uma pesquisa fenomenológica 
existam dois momentos: o envolvimento existencial que requer que o 
pesquisador, a princípio procure colocar fora de ação os 
conhecimentos por ele já adquiridos sobre a vivência que está 
pretendendo investigar, para então nela penetrar de modo espontâneo 
e experimental. A autora (1993) descreve que: 
 
A part i r daí , é necessár io deixar surgir à intuição, percepção, 
sent imentos e sensações que brotam em uma total idade, 
proporcionando uma compreensão global, intui t iva e pré-
ref lexiva dessa vivência. (p. 60) 
 
 
Em um segundo momento deve ocorrer um distanciamento 
reflexivo, para permitir uma reflexão sobre sua compreensão e tentar 
captar e enunciar, descr it ivamente, o seu sentido ou o signif icado 
daquela vivência em seu existir. Porém, o distanciamento não chega a 
ser completo, pois ele deve sempre manter um elo com a vivência. 
Partindo da necessidade de compreensão, procuramos ir o mais 
próximo possível do fenômeno. Este é o método da fenomenologia que 
pressupõe que não haja nenhum conhecimento e nenhum conceito 
anterior sobre a questão a ser investigada, buscando-se, então, 
possíveis signif icados. Para Josgri lberg (apud, Oliveira, 2006): 
 
Retomar as coisas mesmas s igni f ica retomar onde elas são 
v iv idas e onde elas cobram sentido para a v ida e para 
existência. (p. 34) 
 
 
 
19
Segundo Forghieri (1993) o psiquismo humano é muito amplo e 
complexo, apresenta aspectos que não podem ser atingidos 
diretamente, pela observação externa. Tal é o caso da vivência, ou das 
experiências vividas, que só podem ser alcançadas diretamente, pelo 
próprio sujeito. 
Por meio da experiência vivida pela mãe entrevistada, buscamos 
compreender como ela sobreviveu a uma morte que é t ida como um 
percurso não natural da vida. A partir daí desenvolvemos capítulos, 
versando sobre: “Medo do Desconhecido”; “Por que comigo?”; “Ritual: 
uma dor necessária”; “Luto: Processo de Elaboração”. 
Conforme Noé (apud Oliveira, 2006) quando um fenômeno se 
apresenta ele ocorre sob três aspectos em relação a quem o observa: 
sua relativa ocultação, sua gradativa revelação e sua relativa 
transparência. A esses três aspectos correspondem, igualmente, três 
formas de apreensão: a vivência, a compreensão e o testemunho. 
Compreender e testemunhar são as tarefas principais do pesquisador. 
Para Forghieri (1993) o sentido que uma situação tem para a 
própria pessoa é uma experiência íntima que geralmente escapa à 
observação do psicólogo, pois, o ser humano não é transparente e para 
desvendar sua experiência o pesquisador precisa de informações a 
esse respeito, fornecidas pela própria pessoa, por isso o método 
fenomenológico é um recurso apropriado para pesquisar a vivência. 
 
 
 
 
 
20
1.2. COLABORADORA 
A fim de atingirmos nosso objetivo, foi entrevistada Márcia (nome 
fictício) de 48 anos, moradora da cidade de São Paulo. Perdeu seu 
fi lho Pedro (nome fictício) aos 23 anos de idade em um acidente de 
carro, há três anos. Conhecemos esta mãe através de uma amiga de 
sala, que nos proporcionou o contato com a entrevistada. 
Esta mãe foi escolhida por ser autora de um livro no qual relata a 
experiência que teve ao perder seu f i lho. É importante falarmos que 
esta mãe também já participou e trabalhou como organizadora de um 
projeto, onde mães e pais enlutados participam para comparti lhar suas 
vivências. Desta forma, consideramos que Márcia seria passível de ser 
incluída em nossa pesquisa sem que isso lhe proporcionasse maiores 
danos. 
O encontro ocorreu em seu apartamento, pois entendemos que 
este seria um local mais apropriado para a entrevistada narrar sua 
vivência. Procuramos esclarecer a Márcia do que se tratava, o objetivo 
da pesquisa, e o porquê da escolha do tema. Foi também explicada 
toda a questão ética que envolve o trabalho através da apresentação 
do Termo de Consentimento. (Anexo - II) 
 
1.3. ENTREVISTA 
Usamos a entrevista como procedimento, uma vez que ela explora 
a compreensão que o indivíduo tem da sua experiência e procura saber 
qual o sentido que tem para ele. Optamos pela modalidade de 
 
 
21
entrevista semi-dirigida, pois esta favorece a narrativa l ivre do 
participante, com o discernimento de manter a temática da pesquisa. 
Para que a entrevista se desenvolvesse, partimos inicialmente de 
uma única questão: Conte-nos sobre a sua vivência ao perder seu 
fi lho? A partir desta, trabalhamos os seguintes temas: Sobrevivência; 
Luto e Sentimentos. 
Segundo Queiroz (apud Oliveira, 2006) a entrevista busca o 
depoimento pessoal, o qual é definido como relato de algo que o 
informante presenciou, experimentou ou de alguma forma conheceu. 
 A entrevistafoi conduzida de modo que favorecesse a descrição 
da vivência dessa mãe, respeitando o tempo de discurso e de 
sentimentos vigentes no momento da entrevista. 
Uti l izamos como instrumento a gravação, sendo previamente 
questionada à entrevistada a autorização para tal procedimento, e se 
esta poderia ser uti l izada. A entrevista encontra-se no Anexo – I. 
 
1.4. TRABALHANDO COM O DEPOIMENTO 
Foi feita a transcrição l i teral do depoimento, para que a partir da 
textualização do conteúdo gravado pudéssemos penetrar nessa 
experiência, a f im de tentarmos entender os fatos da maneira como foi 
vivenciado. Como o discurso é apresentado tal qual nos foi relatado, 
convidamos o leitor a atribuir novos signif icados que considerem 
pertinentes. 
 
 
22
Antes de iniciarmos o processo de análise propriamente dito, 
procuramos ler atentamente o relato, fazendo assim, um mergulho nas 
falas. Colocamo-nos a mercê do discurso para acompanhar o 
movimento do outro, deixamo-nos envolver, ver e ouvir com os olhos e 
os ouvidos do outro. Para isso saímos de nós mesmas, das nossas 
idéias, sentimentos e crít icas, para podermos estar no outro, como se 
fosse um processo de identif icação com a fala do outro. A partir deste 
momento, iniciamos o “envolvimento existencial”, o pesquisador 
suspende qualquer teoria e passa a mergulhar na vivência do sujeito 
entrevistado. 
Após entrarmos em contato com a entrevista, iniciamos o 
“distanciamento reflexivo”, por meio do qual procuramos retirar daquilo 
que foi falado alguns possíveis elementos signif icativos para o sujeito. 
Buscamos também chegar o mais próximo possível dos fenômenos 
pesquisados, para então, podermos verif icar aquilo que mais se 
sobressaiu, e objetivar todo o mergulho anterior. Procuramos dialogar 
com autores cujas idéias e posições nos serviram de auxíl io à 
compreensão da vivência. 
Ao analisarmos as falas da entrevistada, elegemos temas que 
foram ligados a certos termos ou afirmações que apareciam com 
freqüência no relato. São eles: Encontro; Relações: Filho e Amigos; 
Sociedade e Psicoterapia; Reações e Sentimentos; Rituais e O que 
fazer? A organização dos temas foi uma tarefa bastante difíci l, pois em 
 
 
23
alguns casos nos atrevemos a fazer interferências, interpretações ou 
tentativas de explicação do que nos afigurava no relato. 
Após a realização deste trabalho, esperamos oferecer aos nossos 
futuros colegas psicólogos e às mães, o nosso modo de olhar e 
compreender o fenômeno, como graduandas de psicologia, objetivando 
colaborar na compreensão do tema. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
24
 
 
 
“Quando em um relacionamento estão envolvidos um conjunto 
de fenômenos psíquicos, vivenciados e experimentados na 
forma de emoções, sentimentos, com estima, apego, ternura e 
carinho, desenvolve-se o que se denomina de afeto: em 
diferentes graus de complexidade, amor e paixão. É o 
sentimento existente em relação a nosso entes queridos, 
amigos e pessoas amadas”. 
 
Dr. Lunardi (apud Ebadi, 2003, p. 45) 
 
 
 
25
 
 CAPÍTULO II 
 
 
MEDO DO DESCONHECIDO 
 
 
Todo ser humano reconhece a possibi l idade de sua 
própria morte, mas apenas em raros momentos a percebe 
como verdadeiro. Por outro lado, para não viver 
angustiado perante esta certeza, para ocultar seu destino, 
ele se volta para a vida cotidiana, ocupando-se e 
preocupando-se com seu dia a dia ( . . .) (ANCONA-LOPEZ, 
1996, p. 31) 
 
 
 
ara Kovács (1992) a morte sempre aparece envolta pelo 
medo, medo este, definido pela autora como um valor 
signif icante e uma reação emocional envolvendo sentimentos 
subjetivos de desagrado, preocupação e uma antecipação de quaisquer 
das várias facetas relacionadas à morte. 
 A autora descreve um lado vital da morte, uma presença 
necessária em certa medida, representada como uma expressão do 
instinto de auto-conservação, uma forma de proteção à vida e uma 
possibil idade de superar os instintos destrutivos. 
Segundo Coelho (2000) as pessoas gostam de estar aqui, 
conspiram-se a favor da vida, por isso, sobrevive-se a dores imensas, 
porque a vida é nosso único espaço de pertencimento. Entende-se a 
idéia de morte como não sendo bem vinda, pois ela faz f indar a vida, 
P 
 
 
26
impondo o desconhecido, a f initude, a cisão e o rompimento diante de 
cada um. A morte coloca em risco toda uma construção de vida, porque 
não diz quando chega e com isso as pessoas passam todo seu tempo 
tentando estar aptos para a vida, e não para a morte. 
Seguindo as idéias da autora, a morte é a grande angústia 
humana, l imita o existir de todos os homens e, apesar das crenças e 
religiões, coloca um limite à vida na terra da forma como foi concebida, 
é um evento universal. 
 Para Heidegger (2002): 
 
 No domínio públ ico, pensar na morte já é considerado um 
temor covarde, uma insegurança da pré-sença e uma fuga 
s in is tra do mundo. O impessoal não permite a coragem de se 
assumir a angúst ia com a morte. (p. 36) 
 
 
Viorst (2004) fala do medo da morte como sendo sem dúvida um 
sentimento que a maioria das pessoas não pode suportar. Vive-se em 
uma sociedade na qual a morte é negada, é deixada de lado, porém, 
não se nega a mortalidade. No entanto, a conscientização dessa 
mortalidade poderia enriquecer o amor pela vida, sem fazer da morte, a 
nossa morte, e sim algo aceitável, natural do ciclo humano. 
Negar a morte, conforme Viorst (2004), signif ica jamais permitir a 
nós mesmos o confronto com a ansiedade provocada por visões dessa 
últ ima separação. Esta negação facil i ta a caminhada através dos dias e 
das noites sem que pensemos no abismo diante de nossos pés. 
A autora fala também de uma dif iculdade em encarar a nossa 
própria morte sem ficarmos apavorados. Há um medo do aniquilamento 
 
 
27
e do não-ser. Temos medo de ir rumo ao desconhecido. Medo de ficar 
sozinhos e desamparados. Por isso, é tão difíci l pensar em nossa 
própria morte, e, também, a de nossos entes queridos. 
Conforme Heidegger (apud Coelho, 2000) a morte não é apenas o 
f im da existência, mas um dos elementos constitutivos da própria vida. 
Seria a única possibil idade existencial que independeria de quaisquer 
forças sociais, para atuar. Assim, a morte nos iguala a todos, é 
inexorável, irrevogável, direito e destino de todo ser vivo. É o f im 
colocando a vida enquanto existência restrita num espaço, que a 
avalia. É o l imite, que verdadeiramente ordena a ação humana no 
tempo. Para Heidegger (2002): 
 
A morte vem ao encontro como um acontecimento conhecido, 
que ocorre dentro do mundo. Como ta l , e la permanece na 
não-surpresa caracterís t ica de tudo aqui lo que vem ao 
encontro na cot idianidade. (p. 35) 
 
 
Ao se perder um ente querido, aquele de que se amava passa 
agora a ser um desconhecido, a vida toma a forma de um grande vazio 
no lugar deixado pela pessoa que não está mais presente. Nesse 
momento, aquele que partiu, pode ser visto, por muitos, como se 
estivesse descansando ou abandonando as pessoas que faziam parte 
de sua vida. Quem morre si lencia a tudo, pois a palavra não mais o 
atingirá. O morto deixa quem o amou, sem aviso, e numa hora sempre 
imprópria. 
Segundo Kovács (1989) a mortenos fala de representações que 
envolvem duas pessoas, uma que é perdida, e a outra que lamenta esta 
 
 
28
falta, um pedaço de si que se foi. O morto, em parte, é internalizado 
nas memórias e lembranças. A morte como perda supõe um sentimento, 
uma pessoa e um tempo. 
Conforme Parkes (apud, Coelho, 2000) aos enlutados caberá 
viver um difíci l momento, cumprindo as chamadas tarefas do luto, 
contando com o tempo para aplacar a dor da perda. À família caberá 
reorganizar-se, redistribuindo tarefas ou mesmo pontuando o lugar 
vazio deixado pelo membro que se foi. 
Morrer é certo. Kübler-Ross (2004) fala de uma defesa crescente 
que o homem tem contra a morte e contra a incapacidade de prevê-la, 
e precaver-se contra ela. Em nosso inconsciente não é concebida a 
idéia de morte, somente a crendice de sermos imortais. Mas a autora 
acredita que enfrentar a realidade da morte é a chave para viver uma 
vida signif icativa. Para Kübler-Ross (apud Papalia, 2000): 
 
É a negação da morte que é parcialmente responsável pela 
vida vazia e sem propósito das pessoas; pois quando você 
vive como se fosse viver para sempre, torna-se muito fác i l 
adiar as coisas que você sabe que deve fazer. Em contraste, 
quando você compreende plenamente que cada dia em que 
você desperta poder ia ser seu úl t imo dia, você aprovei ta o 
tempo deste dia para crescer, para tornar-se mais quem você 
realmente é, para estender a mão a outros seres humanos. 
 (p. 577) 
 
 
Para Leis (2003) é no meio da massa, vivendo uma existência 
inautêntica, que se aprende a não enfrentar a morte. Com isso a morte 
está frequentemente acompanhada por uma idéia. Então, ninguém 
morre sem ter uma idéia do que ela signif ica. Este mesmo autor 
descreve: 
 
 
29
Cada um tem que morrer sua própr ia morte, mas que isso só 
é possível no confronto com a cul tura de uma época que 
transforma o autênt ico em inautênt ico, na luta contra uma 
cul tura da massi f icação e do anonimato, na luta de uma 
cul tura que, a inda gostando de chamar-se ref lexiva, atenta 
permanentemente contra o desenvolv imento do eu. (p. 06) 
 
 
 
A morte faz parte da vida humana, ela é a f inalização de toda 
uma existência, é algo que não se pode fugir ou se l ivrar. Conforme 
Jamaril lo (2006) a morte é um tema profundo, dramático e misterioso, 
pois faz parte de algo desconhecido e impensável. Contudo, se o ser 
humano deseja tornar-se dono de sua própria morte, assim, como sua 
l iberdade e autonomia, é indispensável pensar previamente nela, e 
assimilá-la na vida como uma realidade presente. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
30
CAPÍTULO III 
 
 
 POR QUE COMIGO? 
 
Uma das coisas mais dif íceis de aceitar é a morte de um 
fi lho. Você cogita: por que eu? Por que ele? É um rude 
lembrete: a morte não segue horário previsível, ela 
escolhe seu próprio tempo e lugar. Embora dolorosa esta 
experiência possa ser um impulso para o amadurecimento 
dos que lhe aceitam o desafio. Há duas escolhas quando 
morre o ser amado: viver sofrendo, com remorsos e culpa 
mal distorcido por uma fachada: ou enfrentar tais 
sentimentos, superá-los e deles emergir com a aceitação 
da morte e um compromisso com a vida. (MIZE apud 
FREITAS, 2000, p. 56) 
 
 
ste capítulo discutirá algumas características do processo de 
enlutamento materno em diferentes dimensões. A partir de 
algumas leituras, deparamo-nos com o termo “mito do amor 
materno”, entendemos que seria cabível oferecer um outro olhar em 
direção ao amor de uma mãe pelo seu f i lho. 
Segundo Casellato e Motta (2002) o mito da mãe sagrada, 
devotada, unicamente ao fi lho, resisti há tempos. É algo construído 
historicamente, apesar dos insistentes movimentos das mulheres. 
As autoras descrevem: 
 
 
A maternidade é um fato social total que só se desvela se 
compreendido histor icamente nas suas vertentes bio lógicas e 
psicológicas, cul turais e sócio-econômicas e não de um modo 
essencial ista seja qual for a “essência” e le i ta ou a sua 
just i f icação. (p. 98) 
 
 
E 
 
 
31
Conforme Badinter (1985) o amor materno não é apenas 
instintivo. É um sentimento sujeito a imperfeição, dependente não só 
da história da mãe, mas também da humanidade. 
Para Casellato e Motta (2002) instaurou-se socialmente que as 
mães eram consideradas a “dona do saber”, levando-as a uma 
tendência de culpá-las por tudo de bom ou ruim que acontecesse aos 
seus f i lhos. 
Quando uma mãe perde seu fi lho, com toda essa bagagem 
emocional envolvida, o luto será determinado pelo vínculo estabelecido 
nessa relação. Entendemos que a morte de um fi lho, em geral é intensa 
e trata-se da interrupção, de um corte na seqüência esperada. 
Para Freitas (2000) o desejo dessa mãe é, então, de reunir-se ao 
f i lho querido, ou sair da vida por não suportá-la. Como houve uma 
quebra no processo evolutivo, ela se pergunta: para que continuar 
vivendo? O porquê dessa injustiça? Estas são questões que procuram 
respostas muitas vezes não encontradas. 
Segundo Casellato e Motta (2002) ao perder um fi lho, a mãe 
passará por um grande impacto que se divide em quatro dimensões: 
individual; conjugal; famil iar e social. 
A dimensão individual é uma construção subjetiva, e só 
experienciada pela mãe que sofreu a perda de um fi lho. A mãe enlutada 
perde um pedaço de si mesma, a esperança, a perspectiva de um 
futuro, a função de cuidadora e sua própria identidade. As autoras 
ressaltam que (2002): 
 
 
32
Para a maior ia das pessoas o f i lho é a cont inuidade dos pais 
e de sua imorta l idade, por meio da perpetuação dos genes. E 
o s igni f icado dessa relação será inf luenciado pela 
caracter ís t ica do sujei to e pelas projeções dos pais por ele. 
(p. 107) 
 
 
Segundo Weiss (apud Coelho, 2000) o luto individual transcreve 
três principais tarefas de elaboração: - ser capaz de conviver com a dor 
da memória; - achar meios de ter uma vida de qualidade e responder 
adequadamente a demanda dos papéis sociais a serem cumpridos. 
As autoras Casellato e Motta (2002) descrevem que na dimensão 
conjugal, a morte de um fi lho tem efeitos no relacionamento afetivo do 
casal, cada um possui uma forma de experienciar o seu pesar; 
freqüentemente, também, ocorrem problemas sexuais, e em muitos 
casos o divórcio acontece permeado por essas mudanças signif icativas. 
Estes pais apresentam uma gama de sentimentos ambivalentes, 
evidenciando que a morte de um fi lho quebra de maneira definit iva um 
padrão estabelecido pondo em risco a estabil idade possível e 
necessária para se conviver. 
Conforme Parkes (1998) muitas vezes a morte é personif icada 
como algo que foi feito para elas e procuram alguém para culpar. A 
culpa é dirigida contra qualquer pessoa que possa ter contribuído para 
o sofrimento ou para a morte. Essa forma de pensar ocorre com a 
maioria dos casais, quando um coloca a culpa sobre o outro. 
Para Casellato e Motta (2002) a dimensão famil iar também é 
afetada, pois a perda de um fi lho é uma transição que implica em uma 
reorganização famil iar. Surge a necessidade dos membros da família 
 
 
33
desenvolver regras, papéis e expectativas que refletem diretamente em 
suas crenças e principalmente nas estratégias de enfrentamento do 
luto. 
Segundo Bromberg e Kovács (1996) após a crise, mudanças 
ocorrem, surge a necessidade de um rearranjo do sistema famil iar, 
como conseqüência haverá a construção de uma nova identidade de 
cada membro e a busca eterna por um novo nível de equilíbrio. 
De acordo com Coelho (2000):Relata que algumas pessoas descobrem no processo de luto 
uma força que desconheciam ter , assim como mecanismos 
fac i l i tadores e soluções cr iat ivas podem surgir após a dor 
in ic ial da perda, como uma forma de reorganização. Na 
medida em que cot id ianamente se reage a perdas e 
frustrações; o luto é entendido como um contexto de vida e 
não um processo isolado. (p. 30) 
 
 
Seguindo as idéias das autoras, Casellato e Motta (2002), na 
dimensão social, a perda de um fi lho é um evento signif icativo, por ser 
algo ameaçador e impactante. A sociedade reage muitas vezes 
inadequadamente por não saber l idar com os pais enlutados, e por 
acrescentarem expectativas místicas erronias, em relação a qualquer 
t ipo de luto. Alguns exemplos descrevem como alguns destes mitos são 
seguidos pela sociedade: todos os pais reagem da mesma forma; o luto 
dos pais diminui com o tempo e os enlutados deveriam sentir-se melhor 
porque outras pessoas amadas estão vivas. 
 
 
34
Conforme Coelho (2000) o sofrimento do luto está relacionado às 
alterações da saúde física e mental. O luto ainda é uma dor sem nome, 
nem lugar na sociedade. 
É estritamente importante neste momento falar do sentimento de 
“culpa” que tende a aparecer ao perder um fi lho. Conforme D’ 
Assumpção (2001) a culpa frequentemente acompanha a morte e o 
enlutado. Este sentimento por vezes vem acompanhado de palavras 
infelizes, por culpar-se de ter sido incompetente para impedir a morte 
de seu fi lho, ou até mesmo por questionar a atenção que foi dada ao 
fi lho quando vivo. 
Segundo Casellato e Motta (2002) a morte desmascara a 
onipotência, atando todo e qualquer movimento da mãe em torno da 
salvação de seu fi lho. Muitas mulheres abandonam suas vidas e se 
castigam pela incapacidade de manter seu fi lho vivo e, principalmente 
por estarem vivas. 
Um outro sentimento presente no processo de elaboração da 
perda será a “raiva”. Sentimento este, que adequadamente expresso 
com o decorrer do tempo retornará a períodos de tranqüil idade, até 
minimizar esses confl i tos. 
De acordo com D’ Assumpção (2001) a compreensão da raiva 
muda com o tempo, em um primeiro momento gera-se uma carga 
emocional bastante intensa. No entanto, essa expressão deve ser 
esgotada e vivenciada corretamente para que esse sentimento não se 
 
 
35
perpetue. Caso isso não ocorra, poderá ocorrer a repressão desse 
sentimento. 
A “tr isteza”, também, é um sentimento que provavelmente 
qualquer enlutado irá sentir. Para Markham (2000) a diferença será a 
profundidade dessa tristeza e do período que ela perdura. Não se sabe 
se a tr isteza desaparece um dia, porém esta pode tornar-se mais 
suportável. O fato é que o enlutado se acostumará com esse 
sentimento permanente ou não. 
Reogarnizar a vida, de acordo com Jaramil lo (2006) é um desafio 
de reconstrução e de reaprendizagem de um ambiente que foi 
modif icado, é um compromisso que se faz para continuar a viver. O 
reinserir-se no mundo ocorre lentamente e gradativamente. 
 Conforme Tavares (2003) é na aceitação que se dá o encontro 
com a gratidão e a alegria que a presença física da pessoa que 
perdemos nos possibil i tou. A abertura é a aposta no futuro de que 
ainda é possível viver. A fel icidade é momentânea, tem aspectos 
circunstanciais. A alegria é diferente, e será nela que poderemos 
assegurar que a qualidade de vida não será apenas sobrevivência. A 
culpa, a raiva e a tr isteza são sentimentos intensos no decorrer deste 
processo de elaboração até a aceitação. De acordo com Pires (2005): 
 
A cada dia que passa a perda avoluma-se, o sofr imento 
aumenta, o vazio, a ausência e a saudade tornam-se 
insuportáveis. Temos um medo de enlouquecer, ju lgamos não 
sermos capazes de agüentar tamanho sofr imento. Parece-nos 
impossível vol tar a sair desta s i tuação. (p. 23) 
 
 
 
 
 
36
Mas, é importante saber, que aceitar todo esse sofrimento não é 
conformar-se, não é esquecer da pessoa amada, mas, sim, uma 
possibil idade de continuar a viver dignamente. 
O capítulo a seguir discutirá sobre rituais, pois acreditamos que 
este apresentará aspectos relevantes para um processo de elaboração. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
37
CAPÍTULO IV 
 
 
 RITUAL: UMA DOR NECESSÁRIA 
 
Veio à missa de um mês, é só assim que a gente se dá 
conta do tempo passando. Que horror, que susto, quando 
o Padre Franco disse a intenção da missa: levei um 
choque. Como se eu estivesse recebendo a notícia 
naquele minuto. Consegui entender porque os r ituais são 
sábios e necessários; e existem, nas mesmas épocas, em 
todas as rel igiões. Eles têm uma razão de ser; desde o 
velório, a missa de sétimo dia, de um mês, tudo. É através 
deles que a gente vai se dando conta do que aconteceu, 
vai absorvendo a tragédia, realizando a perda ( . . . ) As 
cerimônias são como um tranco que a gente leva para 
despertar para a real idade. É dif íci l demais; mas são 
importantes, já que precisamos, efet ivamente, voltar à 
realidade. (PACIORNIK; PACIORNIK, 2004, p. 55) 
 
 
 
o realizarmos esta pesquisa, nos deparamos com os rituais, 
sendo eles diferentes maneiras de concretizar a perda. Porém 
salientamos que o ritual também possui um aspecto de 
cronif icação do luto, ele pode atrapalhar dependendo do estado 
psíquico da pessoa. Uma outra questão importante a ser evidenciada é 
a dif iculdade da sociedade em suportar a morte e suas manifestações. 
Há uma supressão do luto, e também há uma exigência de domínio e 
controle desta situação de perda. 
De acordo com Firth (apud Bowlby, 2004) uma questão 
importantíssima a ser abordada são as práticas de rituais funerais, 
principalmente quando se trata de um processo de luto. O autor fala em 
A 
 
 
38
um benefício aos vivos e não aos mortos, já que são realizados para os 
que ficam. 
Para Heidegger (2002): 
 
O f inado que, em oposição ao morto, fo i ret i rado do meio dos 
que f icaram para trás é objeto de ocupação nos funerais, no 
enterro, nas cer imônias e cul tos dos mortos. E isso porque, 
em seu modo de ser, e le é ainda mais do que um instrumento 
dado no mundo c ircundante e passível de ocupação. Junto 
com ele, na homenagem do cul to, os que f icaram para trás 
são e estão com ele, no modo de uma preocupação 
reverencial . O f inado deixou nosso mundo e o deixou para 
t rás. É a part i r do mundo que os que f icam ainda podem ser e 
estar com ele. (p. 18-19) 
 
 
Segundo Firth (apud Bowlby, 2004) estes rituais proporcionam 
aos enlutados a l idar com suas incertezas, a expressar publicamente 
seu pesar e a introduzi- los a um novo papel social que passam a 
desempenhar. Permite a todos os outros membros da comunidade 
tomar conhecimento público de sua perda e também o direciona a uma 
complexa troca de papéis. 
Este mesmo autor, fala destes rituais como sendo uma 
oportunidade para os vivos ainda expressar gratidão aos mortos, e 
praticar certos atos considerados benéficos para a pessoa que se foi. É 
uma maneira de acreditar que tudo esteja conforme os desejos da 
pessoa, pois é neste últ imo encontro que ainda se tem uma presença, 
mesmo que esta já seja ausente. 
Essas práticas levam a um reconhecimento das perdas e dão o 
suporte correspondente, além de poderem expressar seu luto 
abertamente e proporcionar o tempo necessário para a compreensão de 
tais perdas. Casellato e Motta (2002) falam da importância das pessoas 
 
 
39
participarem desses rituais que envolvama perda, já que a morte física 
ou social não ocorre concomitantemente. Vivenciar um ritual 
proporciona a chance de uma despedida, um meio aceitável. É 
fundamental tanto para reorganização pessoal, quanto para a família 
em geral. 
Para Coelho (2000) o luto é um evento individual e coletivo, um 
momento de crise pessoal e famil iar que demonstra sua importância 
simbólica para a coletividade, na medida em que é ritualizado na 
maioria das sociedades. 
As autoras, Casellato e Motta (2002), abordam também a 
possibil idade de ausência de rituais. Neste caso, poderá haver um 
prejuízo ou até mesmo o adiamento do processo de elaboração da 
perda. Esta ausência, bem como a negação em participar dos eventos, 
pode oferecer um comprometimento ou dif iculdade em torno da 
aceitação ou compreensão da morte. 
Seguindo as idéias das autoras, a sociedade apresenta um 
importante papel na elaboração desta perda. No entanto, por ela definir 
a duração do luto, encorajar os enlutados a l imitar seu isolamento e 
voltar a juntar-se à comunidade, corre-se o risco de prejudicar o 
processo de elaboração desta perda. 
Conforme Tavares (2003) a criação de rituais de elaboração pode 
favorecer a cada componente da família enlutada uma singular forma 
de expressão. 
Para McGoldrick; Walsh (apud, Tavares, 2003): 
 
 
 
40
 
A perda envolve três partes fundamentais: pr imeiro um r i tual 
para reconhecer e fazer o luto da perda; segundo um r i tual 
para simbol izar o que os membros da famíl ia incorporam ou 
levam com eles da pessoa morta e o terceiro um r i tual para 
s imbol izar o prosseguimento da vida. (p. 81) 
 
 As datas possuem um importante signif icado para os 
sobreviventes em relação à pessoa falecida. De acordo com Casellato 
e Motta (2002) o luto pela morte de um fi lho reacende-se com maior 
intensidade em datas de aniversário de vida e de morte, e também nos 
encontros famil iares. Embora não seja algo que aconteça 
especif icamente na morte de fi lhos, mas também na morte de outras 
pessoas queridas. 
 Para D’ Assumpção (2001): 
 
A ocorrência dessas datas durante os pr imeiros anos de luto, 
são extremamente s igni f icat ivas af inal será o pr imeiro natal , 
o pr imeiro aniversár io da pessoa, sem a pessoa. Geralmente 
a opção das pessoas é de não comemorar aquela data; Isso 
não é o melhor que se pode fazer, pois desconhecer que é 
natal , f ingir que não é páscoa poderá ser p ior do que assumir 
a real idade dessas celebrações. (p. 51) 
 
 
Segundo Tavares (2003) não existem rituais que sejam 
considerados certos ou outros que sejam errados, as referências são 
de ações que façam sentido para que a situação possa ser 
gradualmente assimilada. 
Kovács (2003) nos fala da compreensão da função destes rituais. 
Os ritos fúnebres funcionam como uma possibil idade de exercício 
comunitário para um comparti lhamento de sentimentos, ajudando a 
compreender a separação do corpo e o do f im. 
 
 
41
Para os enlutados, a compreensão de que sua vida não será mais 
a mesma será essencial para uma boa elaboração do luto, tema 
apresentado no capítulo a seguir. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
42
CAPÍTULO V 
 
 
LUTO: PROCESSO DE ELABORAÇÃO 
 
O luto não contém fórmulas mágicas, porque elas não 
existem. Não traz regras específ icas, porque cada pessoa 
é diferente das outras. Não existem dores iguais, não 
existem sofrimentos iguais, não existem formas de 
superação da dor, também iguais. (D’ ASSUMPÇÃO, 2001, 
p. 12) 
 
 
 luto surgirá por meio de uma perda, de um rompimento 
signif icativo na vida de uma pessoa, em cada cultura e em 
cada momento do desenvolvimento individual. 
Tavares (2003) descreve o luto como sendo uma contingência, um 
processo de assimilação da perda, um ritual de expressão de alguns 
sentimentos mais profundos e íntimos de nossa existência. Está ao 
lado da morte, como evento, e também da vida, como um processo. É 
aprender a se separar sem se perder. 
Neste momento é importante falarmos do termo pesar, pois é 
necessário apontarmos a diferença que existe entre o luto. De acordo 
com Tavares (2003) o pesar é um sentimento de perda diante de uma 
conexão interrompida ou quebrada. São todos aqueles sentimentos que 
aparecem envoltos a perda. 
O pesar é uma reação psicológica da perda. O primeiro sentido 
do pesar é a perda do objeto perdido que se torna insubstituível, 
O 
 
 
43
enquanto que a dor em alta dimensão toma incontáveis espaços na 
vida do enlutado. 
Para as autoras Bromberg e Kovács (1996) o luto só ocorre 
quando houver um vínculo signif icativo que tenha sido rompido, que 
ocorrerá a partir de uma relação previamente existente que determinará 
a qualidade do luto. 
Ao falarmos em vínculos, é estr itamente importante citarmos a 
teoria do apego de Bowlby (apud Worden, 1998). Nesta construção o 
autor fala dos fortes laços afetivos que o ser humano tende a ter, e da 
forte reação emocional que ocorre quando estes laços f icam 
ameaçados ou são rompidos. 
Esses laços surgiriam de uma necessidade de segurança e 
proteção, iniciando-se cedo na vida, dir igindo-se a poucas pessoas 
específicas e tenderiam a durar por grande parte do ciclo vital. Esses 
laços, ao sofrerem situações de perigo, dariam origem a determinadas 
reações muito específicas, levando a uma resposta de intensa 
ansiedade e de forte protesto. 
Segundo Worden (1998) depois que alguém passa por uma perda, 
há certas tarefas do luto que deveriam ser realizadas para que 
houvesse um restabelecimento do equilíbrio, para então, o processo do 
luto ser completo. O essencial seria que a pessoa enlutada cumprisse 
tais tarefas antes que o luto fosse realizado. 
Para o autor estas tarefas se classif icam em quatro processos. 
São elas: “aceitação a realidade da perda”, envolvendo não só a 
 
 
44
aceitação intelectual, mas também a emocional; “elaboração da dor”, 
levando-se em conta que nem todas as pessoas vivenciam a dor na 
mesma intensidade, sendo mais difíci l de l idar na época da perda; 
“ajustamento a um ambiente onde está faltando a pessoa que faleceu”, 
há diferentes signif icados para as pessoas, isso depende da relação 
com a pessoa falecida e dos vários papéis que o morto desempenhava, 
e, por f im, o “reposicionamento da pessoa que sofreu a perda 
relacionada a termos emocionais à pessoa que faleceu e, assim, 
continuar a viver”, não signif ica que as lembranças de uma relação 
signif icativa simplesmente caiam no esquecimento. Esses processos 
não se apresentam em uma seqüência certa, eles podem ocorrer em 
uma outra ordem, o importante é que a pessoa passe por eles. 
Worden (1998) também fala de uma defesa que pode aparecer em 
todas as tarefas. Dependendo do grau, já é esperada. Porém, quando 
aparece de maneira muito intensa, pode vir a interferir no 
desenvolvimento destas tarefas. 
Achamos importante ressaltar que apresentaremos somente dois 
t ipos de lutos Luto Não Complicado, e Luto Complicado, pois estes são 
necessários ao nosso trabalho. Mas, é importante salientarmos, que há 
outros t ipos de lutos, tais como: Luto Antecipatório; Luto não 
Franqueado; Luto Crônico; Luto não autorizado, entre outros. 
 
 
 
 
 
 
45
5.1 – Luto não complicado 
 
Para Casellato e Motta (2002): 
 
As mães sentem-se roubadas e trapaceadas, exib indo como 
caracter ís t icas especialmente intensas do luto a obsessão em 
querer controlar e entender o que aconteceu; o sent imento de 
culpa, a recorrência de sent imentos de pesar, a ident i f icação 
com o f i lho morto e a necessidade de expressar a dor e fa lar 
sobre a exper iência viv ida. (p. 109) 
 
Tavares (2003) acredita que facil i tar o luto é abrir espaço, 
motivar e inspirar a troca de sentimentos favorecendo todas as 
gerações para que possam ter modelos que lhes facil i tem integrar as 
perdas posteriores. 
A mesma autora descreve que a dor de perder, não precisa ser 
sinônimo de amargura, é algo que nos atinge, nos deixa impactados, 
feridos, abatidos, e não tem necessariamente que nos derrotar. A dor 
também oferece a oportunidade de um mergulho interior, levando a 
revisão de valores, projetos e propósitos de vida. A grande 
ultrapassagem é desenvolver a capacidade de transformação dentro de 
nós mesmos, sem trapacearmos. 
Para Worden (1998) um luto não complicado engloba uma gama 
de sentimentos e comportamentos que são comuns depois de uma 
perda. Entre os sentimentos esperados estão: 
- Tristeza, é o mais comum encontrado no luto. 
- Raiva, pode ser um dos sentimentos mais confusos para a 
pessoa que ficou, derivado da frustração ou de uma vivência 
regressiva. 
 
 
46
- Culpa e auto-recriminação , freqüentemente irracional, há uma 
diminuição com o decorrer da realidade. 
- Ansiedade , pode variar desde uma leve sensação de 
insegurança a um forte ataque de pânico. 
- Solidão, sentimento freqüentemente expresso pelas pessoas 
que ficaram. 
- Fadiga, se assemelha a apatia ou indiferença, desamparo 
presente com freqüência nas primeiras fases da perda. 
- Choque, geralmente ocorre em casos de morte súbita, porém, é 
possível ocorrer em outras situações de perda. 
- Anseio, normal ao luto, quando diminui pode ser um sinal de 
que o luto está terminado. 
- Emancipação, sentimento posit ivo depois da morte. 
- Alívio, frequentemente associado à culpa. 
- Estarrecimento , funciona como uma espécie de defesa a tantos 
sentimentos que surgem ao mesmo tempo. 
Worden (1998) também fala das sensações físicas que vêm 
associadas às reações agudas ao luto. As mais comuns são: vazio no 
estômago, aperto no peito, nó na garganta, hipersensibil idade ao 
barulho, sensação de despersonalização, falta de ar, fraqueza 
muscular, falta de energia e boca seca. 
Também é importante ressaltar os pensamentos comuns nas 
primeiras fases do luto e que geralmente desaparecem depois de pouco 
 
 
47
tempo. Entre eles: a descrença, confusão, preocupação, sensação de 
presença e as alucinações. 
O autor também descreve comportamentos específicos que 
aparecem associados a reações normais do luto, sendo eles: distúrbio 
do sono ou despertar precoce; distúrbio do apetite, manifestando-se 
tanto em termos de comer excessivamente, quanto de comer pouco; 
comportamento aéreo, tendendo a esquecer das coisas, ou agir de 
forma distraída, ou fazer coisas que possam prejudicar; isolamento 
social levando a uma possível perda de interesse pelo mundo externo; 
sonhos com a pessoa que faleceu; evitar coisas que levam a pessoa 
que faleceu a desencadear sentimentos dolorosos ; procurar e chamar 
pela pessoa que faleceu; suspiros; hiperatividade, na tentativa de 
aliviar a inquietação; choro, alívio do estresse emocional; visitar 
lugares ou carregar objetos que lembram a pessoa que morreu e usar 
objetos preciosos que pertenciam a pessoa que faleceu. 
Conforme Tavares (2003) ignorar ou apressar essas tarefas é 
correr o risco de f icar preso ao luto mal elaborado. 
Para Papalia (2000) é fundamental saber que o luto assume 
diversas formas e padrões para cada pessoa. Será a partir destas 
representações que acontecerá as diversas maneiras de l idar com as 
perdas, sem fazer com que essas pessoas pensem que suas reações 
são atípicas. 
 
 
 
 
48
5.2 – Luto Complicado 
 
Segundo Casellato e Motta (2002): 
 
Todos os processos de luto contr ibuem para a reorganização 
do sujei to diante da cr ise instalada em sua v ida após a perda. 
Estes mesmos fatores inadequados ou insuf ic ientes podem 
di f icul tar o processo de adaptação e elaboração da perda, 
chegando a trazer comprometimentos psiquiátr icos que 
deverão ser cuidados por prof iss ionais da área. (p. 117) 
 
 
De acordo com Worden (1998) os fatores relacionais definem o 
tipo de relacionamento que a pessoa tinha com aquele que morreu. O 
tipo que mais impede um luto adequado é aquele que é altamente 
ambivalente com hosti l idade não-expressa, aquele que é altamente 
narcísico. Ainda, há casos, que a morte pode abrir velhas feridas. 
O autor relaciona o luto complicado a fatores circunstanciais , 
como por exemplo, a perda sendo incerta; a fatores históricos, como 
pessoas com tendência para um luto complicado; a fatores de 
personalidade , como pessoas que não toleram extremos de estresse 
emocional; e a fatores sociais, a perda seria socialmente não 
comentada, negada ou agiria como se nada tivesse ocorrido. Um outro 
fator importante, também, é a ausência de uma rede de apoio social. 
Conforme Worden (1998) as reações de um luto complicado, 
podem ser denominadas como: “crônicas”, sendo aquelas que têm uma 
duração excessiva e nunca chegam a um término satisfatório; 
“retardadas”, seriam aquelas inibidas, suprimidas ou postergadas; 
“exageradas”, a pessoa se sentir ia sobrecarregada e recorreria a 
conduta mal-adaptada, sendo possível levar a transtornos psiquiátricos 
 
 
49
maiores e as “mascaradas”, seriam aquelas mascaradas por sintomas 
físicos, ou por algum tipo de conduta aberrante ou mal-adaptada. 
 Segundo Casellato e Motta (2002) os fatores de risco de um luto 
complicado iniciam primeiramente como fatores predisponentes e 
intrapsíquicos da pessoa enlutada, juntamente com as circunstâncias 
da perda, como a causa e o t ipo de morte. Posteriormente seriam as 
características da relação prévia com a pessoa falecida e por f im a 
ausência do suporte social e a intensidade do sofrimento farão a 
diferença. 
 
5.3 – O que acontece após o luto? 
 
A partir do andamento da pesquisa, compreendemos que seria 
importante falarmos das conquistas que podem ocorrer após o luto. 
Enfatizando que sempre dependerá de como a pessoa l idará com o seu 
processo de luto. Compreendemos que é difíci l passar por ele, mas é 
necessário para uma boa resignif icação de vida. 
Conforme Jaramil lo (2006) conseguir vivenciar bem o luto implica, 
antes de mais nada, em um compromisso pessoal com a mudança na 
vida, considerando o tempo, esforço e paciência. Refazer a vida, 
recuperar seu sentido e reorganizá-la são tarefas penosas, mas 
pertencentes ao processo de luto. 
Seguindo as idéias do autor, passar por este caminho implica 
possivelmente em sentir uma nova força interior e poder arriscar e 
 
 
50
descobrir novos propósitos para a vida. O luto bem elaborado pode ser 
um fator de enriquecimento pessoal, uma possibil idade de 
transformação e uma perspectiva diferente de compreensão da vida e 
da morte. De acordo com Jaramil lo (2006): 
 
Uma tragédia é uma l ição de humildade, de f lexibi l idade, de 
humanidade, que em geral nos obr iga a reestruturar o nosso 
s is tema pessoal de crenças para inc lu ir a possibi l idade de 
perdas e da própr ia morte. (p. 215) 
 
 
De acordo com Agostinho (apud Pires, 2005) a vida passa a ter 
um outro signif icado. Aprende-se a l idar melhor com os problemas, com 
as angústias e com os medos. O sofrimento ensina a dar valor às 
pequenas coisas da vida, é importante não fugir dele, pois será através 
do sofrimento, que, possivelmente,chegar-se-á a algo benéfico para si 
e para os outros. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
51
 
 
 
 “Há duas formas de viver a sua vida. Uma é acreditar que não 
existe milagre, a outra é acreditar que todas as coisa são um 
milagre”. 
 
Albert Einstein 
 
 
52
 
 CAPÍTULO VI 
 
 
 ANÁLISE DA ENTREVISTA 
 
6.1- Encontro 
 
“A vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela 
vida”. (Vinicius de Moraes) 
 
 
 encontro com Márcia ocorreu em sua residência, em um 
final de semana, na cidade de São Paulo. Ao chegarmos ao 
local, Márcia nos recebeu com muita receptividade e 
disposição. Sua primeira fala foi: “demorei para chegar, pois passei no 
mercado para comprar algumas coisinhas para tomarmos um lanche, 
que mãe que não se preocupa com essas coisas...” 
Neste momento f icamos surpreendidas. Como uma mãe que perde 
seu único f i lho, ainda sente-se mãe? É estranho de pensar e 
principalmente de ouvir. 
Essa frase de Márcia justif ica-se por meio de uma compreensão 
que Rando (apud Fonseca, 2004), ao analisar esse tipo de 
comportamento, faz de pessoas que perdem alguém querido. Para o 
autor a pessoa que passa por uma perda necessita reajustar-se a um 
novo mundo sem esquecer-se do velho, é uma procura de adaptar-se a 
novos modos de ser no mundo, e a partir de novos conceitos buscar 
O 
 
 
53
uma nova identidade. O autor descreve esse tipo de comportamento 
como sendo uma forma saudável de l idar com a perda. 
Junto a isso, entendemos que há algo que aparece como 
irrevogável, “não existe ex-mãe, nem ex-fi lho”. Não há definição no 
dicionário para quem perde um fi lho. Neste momento, percebemos que 
Márcia não abdicou de seu papel materno. E foi a partir daí, que o 
nosso trabalho começou a ganhar sentido. 
A entrevista transcorreu tranqüilamente. Somente em alguns 
momentos Márcia se mostrou emocionada ao decorrer de suas falas. 
 
6.2- Relações: Filho e Amigos 
 
É natural que a maioria das mães sinta seus fi lhos como um 
pedaço de si, é uma relação que se pode denominar como um amor 
incondicional que acompanha toda a gestação e todo desenvolvimento 
humano. Márcia mostra-nos, por meio da sua entrevista, uma forte 
relação com seu fi lho. 
 
Para trabalhar a relação de que ele era meu filho, que podia até ser 
meu amigo, mas principalmente ele era meu filho; eu era mãe dele 
(...) O homem que eu mais amei na minha vida, incondicionalmente. 
Esse tipo de relação segundo Badinter (1985) foi construído ao 
longo da história, há uma nova concepção de mãe. A maternidade 
tornou-se um papel gratif icante na sociedade, trazendo consigo 
sentimentos de desejos, de ideais e superações, sendo, ao mesmo 
 
 
54
tempo, uma experiência complexa e repleta de sentimentos 
contraditórios. 
Mas acreditamos que o amor de uma mãe, não é somente uma 
construção social, vai muito além do que uma racionalização. É um 
amor que já faz parte de uma relação entre mãe e f i lho, é um 
sentimento incondicional, não há “por quê” e nem “para quê”. 
 
O Pedro, às vezes falava para mim: mãe me ama menos, eu não 
tenho culpa que sou só eu (...) 
Para Badinter (1985) atualmente as mães passam muito mais 
tempo com seus fi lhos do que ocorria antigamente. Estabelecem-se 
laços nestas relações que se tornam cada vez mais difíceis de serem 
rompidos. 
É neste contexto, que Márcia demonstra uma intensa relação com 
seu fi lho. Pode-se falar que essa angústia, que Pedro sentia, poderia 
ser ocasionada por questões que Márcia acreditava ter falhado, e que 
já vinha ao longo de sua história. Geralmente são questões 
psicológicas e que, dentre outros fatores, podem levar a uma relação 
excessiva de amor e culpa. De modo que Márcia ao expressar seu amor 
por seu f i lho sufocava-o. 
Entendemos que quando o amor é direcionado a alguém que não 
se encontra preparado para recebê-lo, possivelmente gera uma culpa 
por não conseguir amar de forma recíproca. 
 
 
 
55
(...) o filho tem que romper com a mãe para crescer, mas eu acho 
que é muito difícil romper com filho. 
Alguns autores, como Winnicott, falam que mães deveriam 
frustrar seus f i lhos para que eles se percebessem como sujeitos. 
Porém, fala-se pouco das dif iculdades que essas mães têm em 
executar essa tarefa, principalmente quando esse rompimento é algo 
definit ivo. 
 
Um outro t ipo de relação que aparece de maneira muito 
signif icativa na entrevista, é a relação de Márcia com os amigos de 
Pedro, principalmente depois de sua morte. Para ela, esses encontros 
tornaram-se uma possibil idade de alegrias, recordações, e 
principalmente momentos de redescobertas sobre seu f i lho. 
 
Eu falei, pô, se eles amaram tanto o meu filho, e eles são também 
importantes para meu filho, então, têm muito Pedro neles, e têm 
muito deles no Pedro, então foi uma cena “não” de substituição, 
nunca fiz isso, nunca.... 
Pires (2005) fala de um contorno e uma aceitação para se 
continuar a viver. O encontro, com pessoas que fizeram parte desta 
relação de amizade, torna-se uma maneira de recordar momentos 
vividos no passado. 
Márcia deixa claro que essas relações não substituem seu fi lho, 
mas complementam, fortalecem e distraem sua vida. Alguns pais 
 
 
56
buscam nos amigos do fi lho que faleceu, uma parte de sua história que 
para eles f icou perdida. Questionar atitudes, travessuras, momentos 
fel izes é uma das formas de manter a memória e a lembrança de seu 
fi lho ativa em sua mente. Fazendo isso, não se permite que essa 
lembrança caia no esquecimento, no vazio e na escuridão. 
 
E aí óbvio! éramos cinqüenta e quatro, e agora(...) mas têm uns 
vinte e três que são assim, dos “jantares da tia Márcia” (...) Têm 
vários tipos [pessoas] e todos eles são possibilidades de vida, né! 
então é muito bom estar com eles. [amigos] 
Para Tavares (2003) a criação de rituais pode favorecer a 
elaboração do enlutado, sendo eles uma singular forma de expressão. 
Não existem rituais que sejam certos ou errados, o importante é que 
façam sentido e assim, possam gradualmente ser assimilados. 
 
 
6.3- Sociedade e Psicoterapia 
 
Uma outra questão que aparece de forma muito intensa, é o 
despreparo da sociedade em relação às pessoas em processo de 
perda. Márcia fala da dif iculdade que as pessoas têm em lidar com a 
morte. Acreditamos que essa dif iculdade venha do próprio medo de 
morrer e também de saber que a morte é para todos, ninguém está 
desprovido dela. 
 
 
57
E, aí você começa aprender a ouvir merda e não registrar, quando a 
coisa é boa eu registro, quando não é... eu ouvi: “você parece à 
família Kennedy”, “quem mandou não ter outros filhos”, “eu acho 
que agora você não vai agüentar”, então a gente escuta isso na 
hora da fila de condolências (...) então eu ouvia e pensava... A 
pessoa está falando meleca no seu ouvido, certeza. “Ah! ele está 
melhor aonde tá”, “Deus dá, Deus tira”, então as pessoas falam, 
porque a gente não sabe lidar com a vida, imagina lidar com a 
morte, né! 
Segundo Leis (2003) no renascimento e nas primeiras fases da 
modernidade, conservavam-se os ensinamentos para aprender a morrer 
por meio da leitura de textos e tratados medievais. Incorporavam-se 
rituais, pois se acreditava que existia a arte de morrer. As pessoas 
sofriam, sentiam e reflet iam sobre a própria morte na ocasião da morte 
dos outros. Hoje, a morte é apontada em outra direção, ela é vista 
como um buraco negro, uma zona obscura e mal resolvida da condição 
humana. Com isso, a morte não foi substituída por nada,apenas pelo 
si lêncio. 
 
Eu fico ouvindo, mas eu não escuto, porque eu não consigo mais. 
A minha tolerância para a ignorância ficou, que para a pessoa não 
é ignorância, mas para mim é!(...) 
Márcia mostra-nos a diferença que faz quando ouvi e quando 
escuta. O seu ouvir está apenas na sua presença física, enquanto que 
 
 
58
o seu escutar é a junção entre a presença física e a psíquica. Quando 
se refere a sua tolerância para ignorância, percebemos que para ela, 
alguns aspectos da vida cotidiana do ser humano, não fazem mais 
sentido para sua vida. Desta forma ela nomeia essa falta de sentido 
como ignorância. 
De acordo com Coelho (2000) a vida de quem já perdeu alguém 
certamente f ica alterada. Porém, essa rotina, com o passar do tempo, e 
o distanciamento da perda, levará a mudanças de características, 
transformando-as em uma nova dinâmica e uma nova forma de existir. 
Portanto, haverá um processo de remodelação emocional e cognit ivo, 
de modo a adaptá-los à sua vida. 
 
(...) Então é muito difícil, porque as pessoas não sabem o que fazer 
com você; você não sabe o que fazer com você (...) 
 Leis (2003) ressalta que para a sociedade moderna 
contemporânea a morte esta sendo transformada numa representação 
externa ao nosso eu. Assim a morte é um espetáculo, pois evidencia a 
crescente falta de contato físico e espiritual dos seres humanos com a 
experiência da morte, ela torna-se apenas uma representação 
simbólica, onde a nossa cultura mostra uma profunda rejeição em falar 
sobre ela. 
 
Observamos também, que Márcia, pós a perda de seu fi lho, 
mudou a sua forma de relação com o mundo. Ela passou a atribuir 
 
 
59
outros t ipos de signif icados e de sentidos a fatos que antes eram 
desapercebidos. 
 
(...) depois da morte do Pedro, a morte dele teve um impacto 
tamanho na minha vida, que NUNCA mais NADA que aconteça 
comigo ou com qualquer pessoa, não que eu não tenha compaixão, 
mas até isso ficou comprometido, eu sou honesta!(...) Então você 
fica um pouco amarga, um pouco cética, e ao mesmo tempo, você 
fica vendo a vida sem cor, você não tem mais filtro, mas é isso que 
eu tenho que trabalhar em mim, porque se eu for falar tudo que eu 
penso para as pessoas na hora, eu acho que eu não teria “uma 
relação”, em termos de trabalho, de amizade, nem de nada (...) 
Para Casellato (1998) esses sentimentos que Márcia descreve, 
podem ser explicados por ela ainda não ter superado velhos padrões 
de pensamentos, e ainda não ter desenvolvido um novo tipo de relação 
com seu fi lho, dif icultando a busca de novos modelos. 
É quase inevitável que a pessoa enlutada sinta-se em certos 
momentos desesperada, pelo fato de não ter impedido a morte da 
pessoa querida, e conseqüentemente o enlutado pode tornar-se 
deprimido e apático. Isso pode implicar em uma resignif icação de si 
mesma, de sua função e de seu papel social. 
Conforme já foi visto nos capítulos anteriores, Casellato e Motta 
(2002) ressaltam que uma mãe ao perder um fi lho, perde também sua 
função de cuidadora e sua própria identidade. Acreditamos que Márcia 
 
 
60
em alguns momentos sente-se arrancada do mundo, algo foi retirado de 
si mesma. 
 
Um outro t ipo de relação que Márcia diz ser de extrema 
importância a todos que passam por um processo de enlutamento 
referente à morte, é o papel do psicólogo frente a essas situações de 
perda. 
 
Eu acho que é “ESCUTAR”. Agora, por exemplo, [acha] que os 
psicólogos poderiam ajudar escutando as pessoas. Poucas 
pessoas, tem a pré-disposição de ouvir, não é só escutar (...) É a 
nossa morte enquanto mãe, né! Então eu acho que deve ter mais 
livros, mais terapeutas que saibam da vida para poder saber da 
morte. 
 Márcia nos faz refletir sobre as questões referentes às 
experiências que apenas quando alguém passa por elas, descobre o 
seu sentido. Porém, não é necessário ter passado por algo similar, mas 
é importante pelo menos, estar abertos à questão da morte. 
Para Casellato e Motta (2002) a dor dessas mães deveria ter uma 
forma de expressão e um tipo de acesso, para que de algum modo 
pudessem ser aliviadas e atendidas por diferentes profissionais da 
saúde. Esses profissionais deveriam ser auxil iados para que de alguma 
forma aprendessem a l idar com essas mães. 
 
 
61
Kovács (2003) comenta sobre uma outra “visão” que ela traz 
desses profissionais da saúde. Eles também sofrem por não conseguir 
adiar a morte, ou por não ser capaz de aliviar o sofrimento do 
moribundo ou do enlutado. Esses profissionais vivenciam os seus 
l imites, sua impotência e sua finitude, nesse momento eles imaginam a 
sua própria terminalidade, e vivenciam a possibil idade de passar pela 
mesma situação do seu paciente, o que para ele pode ser 
extremamente doloroso. Por isso todos os profissionais, sejam eles de 
diferentes áreas, deveriam passar por um processo de reumanização 
da morte, o que na verdade é uma reumanização da vida, gerando, 
assim, uma revisão de suas práticas profissionais. 
Nesse momento, cabe dizermos que hoje, existem mais trabalhos 
nessa área, é um dos campos da psicologia que vem se desenvolvendo 
de forma intensa, porém, ainda necessita de maiores seguidores e 
aprofundamentos. 
 
(...) eu era uma sombra andando, aí eu falava assim: Eu não sei por 
que eu estou aqui? E ela [psicóloga] falava: “Nós, não sabemos, 
mas nós vamos descobrir, e aí me fala, como você está”? Ela me 
escutava. Às vezes eu nem escutava o que eu estava falando, às 
vezes eu não falava, e às vezes eu não escutava o que ela estava 
falando. Mas eu voltava, e isso me tirou de uma puta depressão (...) 
É importante falarmos do papel do psicólogo nesse caso, pois por 
meio da cumplicidade de Márcia com a sua terapeuta, ela conseguiu 
 
 
62
entender a necessidade de encontrar um espaço para a expressão de 
sua dor, e também reorganizar seus confl i tos e angústias, onde 
possivelmente poderia ocorrer uma melhor forma de elaboração. 
Kovács (2003) ressalta que após a perda de pessoas 
signif icativas, há um aumento da freqüência com que os enlutados 
procuram cuidados psicológicos e psicoterâpicos. Esses são processos 
bastante intensos, que têm de ser abordados por diversos ângulos, 
porque necessitam de apoio e ajuda no processo de reorganização e 
elaboração da perda. 
 
 
6.4- Reações e Sentimentos 
 
Achamos importante falar de reações e sentimentos, pois eles 
aparecem muito fortes no ser humano, principalmente quando se trata 
da morte e da vida. Em sua entrevista, Márcia mostra-nos sentimentos 
e reações intensas e confusas ao mesmo tempo. 
 
(...) porque o amor que uma mãe tem pelo filho, NÃO TEM 
SUBSTITUTO (...) 
 Mesmo seu fi lho não estando mais presente, Márcia não deixou 
de amá-lo. Conforme Nuno (apud Pires, 2005) nada nem ninguém 
poderá substituir um fi lho perdido, ele apenas deixará de ser algo 
concreto, mas ainda continuará existindo para ela. 
 
 
63
Márcia continua a viver mesmo sem desejar, continua a eleger 
novos objetivos, novos desejos, mas nada substituirá seu amor pelo 
seu fi lho, mesmo perdendo sua função de mãe. 
 
(...) você não quer mais viver e você está viva, você acorda e 
respira, você dorme e a última coisa que você lembra (não que 
você não lembrou o dia inteiro), a última coisa (...) 
Esta frase remete-nos a idéia de existência. Para Sapienza 
(2004) a existência é ser-no-mundo, é poder ser atingido, ser tocado o 
tempo todo por tudo. É sempre um poder adiante de um “para quê”, de 
um “a f im de quê”, e quando este se rompe, ou está ameaçado, a 
existência f ica machucada.

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