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Qual é o preparo necessário para incluir um estudante com deficiência? Publicado em 28/07/2017 por RAQUEL PAGANELLI Apesar do consenso de que a participação das pessoas com deficiência é um direito inquestionável, muitos professores e gestores escolares ainda resistem, declarando-se despreparados para concretizá-la. Até mesmo educadores que se dizem favoráveis à inclusão de pessoas com deficiência admitem exceções, alegando não terem o “preparo necessário”. Já em 1994, a Declaração de Salamanca Site externo enfatizava de forma quase redundante que “educação para todos efetivamente significa para todos”. Requisitos, restrições e exceções são inerentes à lógica da integração. Na inclusão, todos têm direito à educação. E “todos” significa todos. Simples assim. E não se trata só de acesso. A Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência Site externo, ratificada no Brasil com equivalência de emenda constitucional em 2008, garante participação efetiva, sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades, para o pleno desenvolvimento do potencial do educando. Mas tal garantia não indica que a escola saberá, de antemão, como fazer isso. Até porque isso nem seria possível. Durante muito tempo, acreditava-se que era possível generalizar pessoas e, assim, padronizar estratégias terapêuticas e pedagógicas a partir de um mesmo quadro diagnóstico. Atualmente, já sabemos, por experiência, que essa noção é no mínimo simplista. Ainda que apresentem pareceres diagnósticos absolutamente iguais, duas pessoas podem reagir às mesmas intervenções de maneiras (bem) diferentes. Ou seja, a ideia do preparo prévio nada mais é que um mito. Não há “receitas prontas” nesse sentido. O ativo é a presença. Ou seja, a escola não tem mesmo como saber, antecipadamente, como proceder com uma criança ou adolescente com base em seu diagnóstico. E isso não se aplica somente a pessoas com alguma deficiência, já que a diferença é própria da condição humana. O processo de aprendizagem de cada estudante é singular. O mito do preparo A ideia de que a escola precisa, antes, estar pronta, para depois receber os alunos com deficiência é baseada em uma expectativa ilusória de um saber pronto capaz de prescrever como trabalhar com cada criança. Vygotsky enfatiza que a condição humana não é dada pela natureza, mas construída ao longo de um processo histórico-cultural, pautado nas interações sociais realizadas entre o homem e o meio. Ou seja, o preparo do professor no contexto da educação inclusiva é o resultado da vivência e da interação cotidiana com cada um dos educandos, com e sem deficiência, a partir de uma prática pedagógica dinâmica que reconhece e valoriza as diferenças. Não há especialização capaz de antever o que somente no dia a dia poderá ser revelado. Além disso, a insegurança expressa no argumento da falta de preparo revela, muitas vezes, a fragilidade da escola em lidar com a diferença. Por trás do discurso aparentemente “responsável” de que as escolas não estão prontas para receber determinados alunos por serem incapazes de suprir suas necessidades, de lidar com as suas dificuldades e de oferecer recursos ou pessoal adequados, está, muitas vezes, a noção de que alguns estudantes não são ou não estão aptos a frequentá-las devido a suas condições, o que remete à lógica da integração. Como incluir um aluno que desafia a escola? A educação inclusiva é um processo contínuo e dinâmico, que implica a participação de todos os envolvidos, inclusive do próprio educando. Por isso, é importante, antes de qualquer coisa, garantir sua presença na escola. Para que a equipe pedagógica possa conhecê-lo bem e assim buscar identificar meios de garantir sua inclusão efetiva. Em uma das respostas à pergunta “Como fazer adaptações curriculares para alunos com deficiência intelectual?”, do fórum da Comunidade DIVERSA, a assessora em Educação Inclusiva Marília Costa Dias enfatiza a importância de isso acontecer de modo colaborativo. Todos os envolvidos, inclusive a família, precisam participar desse processo investigativo. Marília aponta também a importância de “oferecer apoios aos estudantes que precisam de algum tipo de ajuda para realizar as propostas” a fim de garantir o “direito à igualdade de oportunidades”, reiterando que “é preciso conhecer muito bem os alunos para saber qual é o apoio que necessitam”. A propósito, a Convenção da ONU, já mencionada, garante medidas de apoio para pessoas com deficiência, no âmbito do sistema educacional geral, objetivando sua “inclusão plena”. A principal medida de apoio é o atendimento educacional especializado (AEE). Uma escola inclusiva é uma escola que inclui a todos, sem discriminação, e a cada um, com suas diferenças. Perseguindo a aprendizagem de forma ampla e colaborativa, oferecendo oportunidades iguais para todos e estratégias diferentes para cada um, de modo que todos possam desenvolver seu potencial. Raquel Paganelli é mestre em educação inclusiva pelo Instituto de Educação da University College of London, atua nas áreas de consultoria e formação de professores e faz parte da equipe DIVERSA. © Instituto Rodrigo Mendes. Licença Creative Commons BY-NC-ND 2.5 Site externo. A cópia, distribuição e transmissão dessa obra são livres, sob as seguintes condições: Você deve creditar a obra como de autoria de Raquel Paganelli e licenciada pelo Instituto Rodrigo Mendes Site externo e DIVERSA. TAGS Tag 2 7 O que fazer quando não há atendimento educacional especializado (AEE) na escola? Publicado em 15/06/2018 por RAQUEL PAGANELLI Desde a publicação da Política nacional de educação especial na perspectiva da educação inclusiva, a inclusão de estudantes com deficiência na escola remete, quase que automaticamente, ao atendimento educacional especializado (AEE). E não por acaso. Trata-se do principal recurso da educação especial para a equiparação de oportunidades. Além disso, havendo ou não diagnóstico, o AEE é direito garantido aos alunos com deficiência, transtorno do espectro autista (TEA) e altas habilidades/superdotação. No entanto, sabemos que grande parte das escolas ainda não dispõe do serviço. Nesses casos, a primeira medida deve ser procurar a Secretaria de Educação para pleitear a instalação de uma sala de recursos multifuncionais (SRM) na unidade ou para identificar outro espaço onde o estudante possa ser atendido. Trata-se de uma obrigação do poder público. E se a instituição é particular, é preciso exigir o atendimento educacional especializado junto à própria gestão da unidade. Preferencialmente no contraturno escolar. Quem pode frequentar o AEE? A Política nacional deixa claro o caráter complementar ou suplementar do AEE. Trata-se de um serviço de apoio. E, apesar de ser garantido a todos alunos com deficiência, nem todos são obrigados a frequentá-lo. A oferta é compulsória, mas a frequência é facultativa. Idealmente, o critério de escolha deve ser o processo de inclusão de cada estudante em sala de aula. Por exemplo, se o objetivo do atendimento educacional especializado é eliminar as barreiras para a plena participação e aprendizagem com autonomia, um aluno cego que domina o braille, participa de todas as atividades da escola, locomove-se de forma independente e aprende não precisa frequentar o AEE. Ainda que pareça paradoxal, o grande objetivo do atendimento educacional especializado é que não se precise mais dele. E é assim porque o lugar de todos os alunos, inclusive dos com deficiência, é por direito a sala de aula. A evolução do campo dos direitos humanos trouxe à tona o paradigma da inclusão. Essa proposta é orientada pelo direito que todos os estudantes têm de frequentar a escola comum, aprendendo e participando, sem nenhum tipo de discriminação. Os alunos com deficiência são “responsabilidade” do AEE? Se o lugar de todos é a sala de aula, logicamente, o responsável por todos é o respectivo professor. Há um princípio básico que fundamenta essa afirmativa: a educação inclusiva é um processo que diz respeito a todos os estudantes, nãosomente a alguns. Ela pressupõe a transformação de um modelo de educação baseado na expectativa de homogeneidade para um pautado na diversidade. Exercer a docência, assim, implica considerar todas as diferenças presentes em sala de aula. Por isso, a perspectiva inclusiva prevê o direito ao mesmo currículo e ao planejamento único para todo o grupo. Logo, o responsável por todos os alunos, com e sem deficiência, não poderia ser outro senão aquele que define os conteúdos escolares e as estratégias pedagógicas em sala de aula: o professor regente. Por que, então, tantos docentes se isentam da responsabilidade pelos estudantes com deficiência, transferindo-a para o profissional de apoio ou para o professor de AEE? Talvez por julgá-los melhor preparados ou por ainda acreditarem num “especialismo” capaz de “dar conta” de certos alunos. Mas não há como negar que tal tendência revela que as expectativas homogeneizantes e a dificuldade de lidar com a diferença ainda não foram superadas no contexto escolar. Como incluir sem o atendimento educacional especializado? Apesar de sua inegável importância, a falta do AEE não inviabiliza a inclusão de nenhum aluno. Assim como sua presença também não a garante. A principal armadilha, em ambos os casos, é o isolamento. Se o professor de sala e/ou do AEE trabalharem isoladamente, assumindo ou delegando responsabilidades sem compartilhá-las, o serviço perde o sentido, considerando sua natureza dialógica e interativa. Existindo ou não AEE, a chave é sempre trabalhar colaborativamente. Liliane Garcez, especialista em educação inclusiva, diz que é preciso coletivizar o fazer pedagógico, aproximando o discurso de que cada estudante é da escola e não só do professor às ações cotidianas. Não há como flexibilizar o currículo ou identificar as barreiras à participação sem envolver famílias e até mesmo os próprios alunos. Além de sugerir atividades e recursos, eles, outros educadores e pessoas da comunidade também podem ajudar a criá-los. Além de comprovar isso, o acervo da seção Materiais pedagógicos acessíveis apresenta possibilidades pautadas no trabalho coletivo, nos eixos de interesse dos educandos e na construção de parcerias. Essas experiências podem servir como inspiração ou referência para a concepção de novos projetos. Enfim, havendo ou não oferta de atendimento educacional especializado, é preciso procurar apoios e estabelecer parcerias dentro e fora da escola. Inclusão em escolas sem AEE na prática No DIVERSA, vários relatos de experiência que confirmam e evidenciam a importância do trabalho colaborativo na inclusão educacional de alunos com deficiência. Confira abaixo algumas histórias reais de escolas que desenvolveram projetos de inclusão sem a presença do AEE: Iniciativa dos alunos Em Itapeva (SP), os estudantes do 6º ano da Escola Municipal Dom Sílvio Maria Dário estavam incomodados com o fato de não conseguirem conversar com Rafael, colega surdo. Eles, então, procuraram a gestão da unidade propondo uma solução: aulas de Língua brasileira de sinais (Libras) para toda a turma. Todos abraçaram a causa e a escola tornou-se reconhecida pela iniciativa. Saiba mais. Conclusão Como observamos a Educação especial em sua história, passava por um abandono, a educação para pessoas com necessidades especiais era inexistente, seguido de um período de institucionalização que segregava os considerados diferentes, excluindo- os da sociedade e do convívio social. Entende-se que a relação escola-família cria compromissos, tece redes de inter-relações, reproduz laços éticos dando novos significados e abrindo horizontes para uma formação de prática pedagógica. Deixo um comentário: Professores docentes devfm ser adaptativos e comunicacionais, como fornmaçãlo continuada