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O caso Battisti

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Universidade Cândido Mendes
Aluna: Milena Kívia Guimarães Lopes
Professora: Angela B
2º Período de Direito - Manhã
O caso Battisti
Cesare Battisti, italiano, nascido aos 18 de dezembro de 1954, tornou-se figura conhecida da Sociedade brasileira após sua fuga e homiziação em nosso território.
Membro do grupo esquerdista italiano Proletários Armados pelo Comunismo (PAC),foi condenado pela Justiça da Itália pela prática de quatro homicídios, pelos quais foi condenado a pena de prisão perpétua.
Após sua condenação, Battisti fugiu para a França, país que negou pedidos de extradição para a Itália. Em 2004, ao analisar novo pedido extradicional, a França acabou por deferir a medida compulsória.
Correndo o risco de ser entregue à Justiça italiana, Battisti procedeu a nova fuga, desta feita ao Brasil. Para tanto utilizou-se de passaporte falso.
Já em território brasileiro foi preso pela utilização do documento falso (crime pelo qual foi posteriormente condenado), e viu instaurar-se contra si novo pedido extradicional encaminhado pelas autoridades italianas.
No ano de 2009 o Supremo Tribunal Federal, Corte Constitucional com competência para julgar pedidos de extradição passivos, deferiu o pedido italiano, entendo que os delitos por ele praticados em seu país natal eram crimes comuns, passíveis de extradição, e não políticos como arguido em sua tese de defesa.
A partir daí importante discussão se colocou. A decretação da extradição de Cesare Battisti pelo Supremo Tribunal Federal obrigaria o Governo brasileiro a entrega-lo às autoridades italianas?
Esse é ponto controverso na doutrina. Até então as opiniões se dividiam. Parte dos doutrinadores entendia que a decisão do STF era mandatória, de cumprimento obrigatório pelo Poder Executivo, representado pelo Presidente da República na condição de representante máximo da soberania do país perante a comunidade internacional. Outra parte entendia que o Presidente não era vinculado à decisão judicial, cabendo a ele proceder a juízo de valor quanto a conveniência política da entrega de um foragido internacional.
A decisão do STF foi proferida em 18 de novembro de 2009. Por apertada diferença, a Corte decidiu pela anulação do refúgio anteriormente concedido ao réu, e decretou sua extradição, condicionando a entrega à decisão do Presidente da República.
O acórdão, de 686 páginas, traz interessante discussão sobre o conceito, alcance e condições da extradição, bem como sobre a vinculação ou não do Poder Executivo à decisão proferida pelo STF. A análise do julgamento justificaria um livro.
 EXTRADIÇÃO. Passiva. Executória. Deferimento do pedido. Execução. Entrega do extraditando ao Estado requerente. Submissão absoluta ou discricionariedade do Presidente da República quanto à eficácia do acórdão do Supremo Tribunal Federal. Não reconhecimento. Obrigação apenas de agir nos termos do Tratado celebrado com o Estado requerente. Resultado proclamado à vista de quatro votos que declaravam obrigatória a entrega do extraditando e de um voto que se limitava a exigir observância do Tratado. Quatro votos vencidos que davam pelo caráter discricionário do ato do Presidente da República. Decretada a extradição pelo Supremo Tribunal Federal, deve o Presidente da República observar os termos do Tratado celebrado com o Estado requerente, quanto à entrega do extraditando. (Ext. 1085 – STF)
Após vários percalços processuais, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no último dia de seu governo, decidiu não proceder a entrega do extraditando, abrindo outra discussão jurídica. Ora, se o STF entendeu que o extraditando praticou crimes comuns em território italiano, e tendo o Presidente da República negado sua entrega, o que seria feito do réu? Continuaria preso por força do Mandado de Prisão para Extradição ou seria colocado em liberdade?
Com efeito, o parágrafo único do art. 84 do Estatuto do Estrangeiro dispõe que a prisão perdurará até o julgamento final do Supremo Tribunal Federal e o art. 87 diz que caso o Estado requerente não retire o extraditando do território nacional no prazo devido será o mesmo colocado em liberdade. A lei, contudo, não é clara para a situação ocorrida no presente caso.
A discussão quanto à liberação ou não do réu perdurou desde o último dia do Governo Lula, quando a entrega foi negada, até o dia 8 de junho de 2011, quando o STF decidiu soltá-lo. Mesmo essa decisão não foi unânime.
A decisão pela deportação.
A negativa da entrega do extraditando e sua libertação do cárcere trouxe ampla discussão quanto a seu status em território brasileiro.
Com efeito, Cesare Battisti é nacional italiano, condenado criminalmente em seu país, e considerado foragido internacional. O Supremo Tribunal Federal reconheceu os delitos a ele atribuídos, tendo se posicionado pela sua extradição para que responda pelos crimes.
Proibido de deixar o Brasil após sua libertação em virtude da existência de Mandado de Captura Internacional incluído pela Itália no canal Difusão Vermelha da Interpol, necessária seria sua regularização para que pudesse aqui viver e trabalhar.
O Conselho Nacional de Imigração, em decisão não unânime, decidiu conceder a Battisti visto de permanência. Para tanto recorreu a norma específica utilizada para pessoas que não preenchem os requisitos regulares para obtenção de tal visto. Com essa concessão, Battisti passou a viver legalmente em território brasileiro.
Entendendo que a lei foi contrariada, o Ministério Público Federal propôs, ainda no ano de 2011, Ação Civil Pública visando a anulação do ato de concessão do visto de permanência para Cesare Battisti, com a consequente deportação em virtude da ilegalidade de sua permanência em nosso país.
Foi essa Ação que agora recebe sentença de primeiro grau decidindo pela procedência do pedido, em virtude da contrariedade do ato de concessão do visto ao art. 7º, IV, da Lei n º 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro).
Citado artigo diz que não se concederá visto ao estrangeiro que tenha sido condenado ou processado em outro país por crime doloso, passível de extradição segundo a lei brasileira.
Ainda cabe recurso da decisão. No caso de sua manutenção, resta saber qual a medida aplicável para sua retirada do país.
A extradição, embora concedida pelo STF, não foi exaurida em virtude da ausência de ato do Poder Executivo que determine a entrega do extraditando ao país requerente.
Por consequência, a medida cabível será a deportação.
Os defensores do réu alegam a impossibilidade de deportação, posto que acarretaria a extradição indireta do Sr. Battisti. A extradição indireta é vetada pelo ordenamento jurídico de quase todos os países.
De fato, caso Battisti seja deportado diretamente para Itália, configurada estaria essa modalidade, posto que ao lá chegar seria imediatamente preso para cumprir sua pena de prisão perpétua.
O próprio Estatuto do Estrangeiro traz as ferramentas para se evitar essa medida injusta. O parágrafo único do art. 58 dispõe que a deportação será realizada para o país de nacionalidade ou de procedência do estrangeiro, ou para outro que consinta em recebê-lo.
Dessa forma, é possível coadunar a execução da medida compulsória com a decisão da não entrega do extraditando ao país que requereu sua extradição.
Como mencionado alhures, Cesare Battisti veio da França para o Brasil durante sua fuga. Logo, na impossibilidade de observar a primeira opção no artigo citado (país de nacionalidade), a segunda opção surge sem problemas.
Outro fato a apoiar a deportação a território francês foi a utilização de passaporte falso para embarcar naquele país com destino ao Brasil. Dessa forma, nenhum óbice legal resta a aplicação da medida.
A presente decisão merece ser comemorada, se não quanto a definição da questão, posto que ainda passível de recurso, mas pela discussão que levanta no mundo jurídico.
O caso Battisti continua sendo um interessante campo de estudo para os apreciadores do Direito Internacional e sua aplicação em nosso território.

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