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LINGUITICA teorias linguistica

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247
Teorias Lingüísticas II
248
249
ABORDAGENS DA LINGÜÍSTICA CONTEMPORÂNEA
DA ESTRUTURA AO USO
Jan Edson Rodrigues
Maria Leonor Maia dos Santos
Introdução
Nesta disciplina, vamos estudar algumas áreas de pesquisa lingüística atuais: 
Sociolingüística, Lingüística Interacional, Lingüística Funcional e Lingüística 
Cognitiva. Cada uma será apresentada por alguns princípios básicos, aspectos 
metodológicos, e um panorama do que é feito atualmente na área. Para iniciarmos 
o estudo, é interessante tomar conhecimento da distinção entre o formalismo e o 
funcionalismo em Lingüística.
Forma e função
 Em lingüística, várias correntes são ditas formalistas, e várias outras são ditas 
funcionalistas. Algumas vezes elas são apresentadas como inconciliáveis por aqueles 
autores que optaram por alguma das duas denominações. Vamos tentar aqui apresentar 
uma caracterização geral dessas atitudes de pesquisa, a formalista e a funcionalista, 
para entender suas diferenças, e, ao final, gostaríamos de defender que, apesar de 
diferentes, ambas são úteis e corretas em Lingüística.
 Podemos nos aproximar inicialmente da oposição entre o formalismo e o 
funcionalismo em Lingüística pensando no papel central atribuído à forma ou à função 
da linguagem. Será que as línguas humanas têm uma certa forma, uma natureza 
intrínseca, e por isso servem para fazer certas coisas, ou será que as línguas têm certas 
funções, e por isso ganham determinada forma? Pense numa faca: ela tem uma forma 
de faca e por isso serve para cortar (a forma veio antes e determina o uso) ou ela tem 
a função de cortar e por isso foi feita com essa forma (o uso veio antes e determina a 
forma)? No caso da faca, que é um objeto fabricado e não da natureza, parece óbvio 
que foi o uso pretendido que motivou a forma. Mas imagine que você está num lugar 
onde não há facas, e sim muitas pedras, e precisa cortar com cuidado alguma coisa. 
Uma fruta bem grande e madura, como uma jaca, por exemplo, ou uma fruta-pão. 
Que tipo de pedra será melhor? Podemos pensar que as pedras que tiverem uma borda 
comprida e afiada serão a melhor escolha. A forma da pedra já está lá, e por isso ela 
serve para cortar a fruta. A forma, nesse caso, foi o que permitiu o uso.
Isso se parece, é claro, como lembra José Borges Neto (BORGES NETO 
2004:83) com o popular dilema do ovo e da galinha. O que veio primeiro? A forma, 
e então podemos usar algo para certo propósito, ou a função, e então modificamos as 
coisas para fazer o que queremos?
 Como o dilema do ovo e da galinha, essa é uma questão difícil de decidir, talvez 
impossível. No caso aqui, primeiro precisamos conhecer um pouco o que motiva as 
decisões dos formalistas e dos funcionalistas em Lingüística, a história dessas posições 
e o tipo de pesquisa que se faz em cada uma delas.
 Vamos começar pelo formalismo. Na verdade, há várias concepções de 
formalismo, o que é importante para entendermos as diversas reações funcionalistas. 
ABORDAGENS DA LINGÜÍSTICA CONTEMPORÂNEA
DA ESTRUTURA AO USO
Jan Edson Rodrigues
Maria Leonor Maia dos Santos
250
Se caracterizarmos o formalismo de uma maneira bem ampla como a atitude de dar 
mais importância à forma da linguagem, vemos que essa é uma posição muito antiga.
O estoicismo foi uma escola filosófica antiga, iniciada em Atenas por Zenon (ou 
Zenão) de Cítia, no início do século III a.C.
 Podemos citar como exemplo o trabalho dos filósofos estóicos, que nos séculos 
III e II a.C. se ocupavam, entre outras coisas, com o que há de comum em exemplos 
como os abaixo:
Se não temos a última aula, os alunos podem ir pra casa mais cedo. De fato, não 1. 
temos a última aula. Então, os alunos podem ir pra casa mais cedo.
Se o salário não foi depositado, minha conta está sem fundos. De fato, meu 2. 
salário não foi depositado. Então a minha conta está sem fundos.
 É claro que os exemplos dos filósofos estóicos eram outros, mas a idéia era 
encontrar uma forma comum a esses conjuntos de frases, alguma coisa como:
Se acontece ISSO, acontece AQUILO. De fato, acontece ISSO. Então acontece AQUILO.
 Eles consideravam que era a forma comum que permitia que exemplos assim 
fossem usados de maneira eficiente numa argumentação. Não importa o assunto, se 
você construir frases seguindo o esquema, vai sempre ter o que ficou conhecido como 
um argumento válido, que deveria servir para convencer alguém.
Numa definição informal, um argumento válido é um conjunto de afirmações 
seguido de uma conclusão, que tem a seguinte característica: se todas as afirmações 
fossem verdadeiras, a conclusão seria obrigatoriamente verdadeira. 
O silogismo é um tipo de argumento válido.
 Claro que você percebeu: a forma é o que permite certo uso, certa função, que 
nesse caso era uma argumentação. Aristóteles, que viveu entre 384-322 A.C e ficou 
conhecido, entre outros feitos, como o criador da lógica, também estudou formas 
semelhantes de argumentos válidos, como os seus famosos silogismos:
Todos os professores de Letras da UFPB virtual são brasileiros. Jan e Leonor são 3. 
professores de Letras da UFPB virtual. Portanto, Jan e Leonor são brasileiros.
 Também nesse caso, a idéia era encontrar a forma subjacente que faz com que o 
argumento seja válido, não importando qual assunto abordado (compare com “Todos os 
mamíferos têm coração. As girafas são mamíferos. Portanto as girafas têm coração”). 
Tanto os estóicos como Aristóteles estavam interessados em caracterizar, nesse caso, a 
forma da linguagem usada na argumentação.
 Um exemplo diferente de formalismo muito antigo nos estudos da linguagem 
– ainda definindo o formalismo de uma maneira bastante frouxa – é a descrição 
gramatical tradicional. A preocupação em descrever paradigmas de flexão e unidades 
da oração são bons exemplos de preocupações formais. De algum modo, na descrição 
gramatical tradicional, supõe-se que há uma forma inerente à língua, e que essa forma 
pode ser descrita de maneira independente das situações de uso. A forma, nesse caso, 
251
pode ser o padrão de flexão de um verbo (amava, amavas, amava, etc.), ou as partes 
da oração (sujeito, predicado, complementos, adjuntos, etc.). O que está em jogo é 
encontrar uma regularidade que já estava na língua e que não depende de estarmos 
conversando sobre futebol, preenchendo o requerimento de matrícula ou reclamando 
porque o vizinho deixou a calçada suja. Novamente, nesse caso, o que é importante é 
a forma, que existe antes da função e não é modificada pelo uso.
 Na Lingüística no século XX a situação é bastante complexa, porque nem 
todos concordam com o que é formalista e o que não é. Em primeiro lugar, vamos 
mencionar a preocupação de Ferdinand de Saussure, no Curso de Lingüística Geral, 
com a oposição entre língua e fala. A língua é geral, comum aos indivíduos de uma 
comunidade falante, em oposição à fala, que é individual e heteróclita, ou seja, 
composta por elementos variados e não homogêneos. O objeto da Lingüística, diz 
Saussure no Curso, é a língua, que não varia de uma situação de comunicação para 
outra, nem de um falante para outro. Vejamos o que diz Rodolfo Ilari acerca dessa 
opção saussureana:
“Saussure opôs claramente o sistema, entendido como 
entidade abstrata, e os episódios comunicativos historicamente 
realizados. Além disso, estabeleceu com toda clareza que o 
objeto específico da pesquisa lingüística teria que ser a “regra 
do jogo”, isto é, o sistema, e não as mensagens a que ele serve 
de suporte.” (ILARI 2004: 57-58)
 É claro que a posição de Saussure é muito mais complexa do que a simples 
definição do par língua/fala, mas a caracterização da Lingüística como o estudo 
da língua (e não da fala) pode coexistir com uma postura formalista, ou pode ser 
interpretada como favorecendo uma postura assim. Aqui, não estamos mais pensando 
no formalismo da maneira ampla que utilizamos nos parágrafos anteriores.Formalismo 
aqui já não é simplesmente a atitude de valorizar e descrever a forma lingüística, mas 
vai além disso. A forma, nesse caso, além de importante, existe fora do uso e não 
depende dele, sendo mais estável do que a diversidade de enunciados possíveis, e é 
escolhida como objeto de estudo justamente por essa relativa estabilidade.
 
É curioso observar, por outro lado, que o surgimento do funcionalismo também está 
muitas vezes associado às propostas saussureanas e aos seus seguidores, mas não 
vamos tratar disso nesta introdução.
 Como um segundo exemplo de formalismo mais próximo de nós, podemos 
lembrar o esforço dos lingüistas norte-americanos da primeira metade do século XX 
em descrever uma grande quantidade de línguas indígenas da América do Norte (como 
navajo, cherokee, choctaw, chickasaw, creek e seminole). Essas línguas eram ágrafas 
(não tinham escrita) e nunca haviam sido descritas, ou não havia descrições conhecidas. 
Um grande esforço foi feito então para elaborar métodos que permitissem aos lingüistas 
coletar grandes quantidades de dados, gravando ou anotando o que os falantes 
diziam, e depois “descobrir” a gramática da língua que estivesse sendo estudada. Por 
motivos que não vamos discutir aqui, alguns dos principais autores da época, como 
Leonard Bloomfield (1887-1949) e Zellig Harris (1909-1992), consideraram que toda 
descrição devia ser feita exclusivamente a partir dos dados, ou seja, o lingüista que 
estava estudando uma certa língua indígena não devia usar seu conhecimento de outras 
252
línguas para fazer nenhuma hipótese acerca das palavras, sons ou sintaxe da língua 
estudada.
Se você sabia, por exemplo, que muitas línguas têm uma distinção entre adjetivos e 
verbos, ou uma ordem básica sujeito-predicado, mesmo assim não podia usar isso na 
descrição, a não ser que esses padrões aparecessem nas falas que você tinha gravado 
ou anotado.
 Além disso, esses autores consideravam que o significado das palavras, frases 
e textos não devia ser levado em conta para se fazer a descrição. O lingüista deveria 
observar quais partes da língua combinavam com quais outras partes, sem precisar 
saber o significado dos enunciados, de maneira que a tarefa era perceber regularidades 
formais, sem se preocupar com a interpretação. As formas (fonéticas, morfológicas, 
sintáticas) já estavam todas nos dados coletados, era preciso descobri-las. Nem mesmo 
a significação das palavras e frases devia ser levada em conta, e portanto nada podia 
ser dito acerca do texto completo, ou de uma conversação. Mais uma vez, temos uma 
preocupação com extrair uma forma que já está na língua, e que independe do uso, da 
função.
 Você certamente notou que aqui há um aspecto do formalismo que é diferente, por 
exemplo, da gramática tradicional, ou da proposta saussureana. Nem a gramática nem 
Saussure propunham que o significado fosse deixado de lado para se fazer a descrição 
da língua. É claro que os estruturalistas norte-americanos que seguiam os métodos 
propostos por Bloomfield ou Harris sabiam que as palavras e frases têm significado, 
mas – talvez motivados pela necessidade de descrever tantas línguas diferentes – 
propunham que o estudo fosse feito sem levar isso em conta. Se o estudo devia ser 
feito sem levar em conta o significado (e muito menos as situações de uso, as intenções 
das pessoas, etc.) é claro que eles deviam pensar que a organização da língua não é 
influenciada pelo significado. Esse é um tipo de formalismo um pouco mais radical, 
porque o significado está sendo excluído do estudo.
Entretanto, isso que estamos chamando de estruturalismo americano não era um 
grupo tão homogêneo. Aqueles que seguiam Edward Sapir (1884-1939) – e entre eles 
o brasileiro Mattoso Câmara Jr. (1904-1970) – não tentavam excluir o significado das 
descrições. Além disso, tanto os seguidores de Sapir, como de Bloomfield ou Harris, 
concordavam em considerar as línguas como intrinsecamente ligadas às culturas dos 
povos.
 Outro exemplo sempre citado de formalismo no século XX é a posição de Noam 
Chomsky (1928) e dos gerativistas. Eles não estão preocupados, como os estruturalistas 
da primeira metade do século, em descrever as línguas a partir de grandes quantidades 
de dados gravados. Pelo contrário, o trabalho dos lingüistas, no gerativismo, é tentar 
propor um padrão abstrato que explique não só as sentenças que já existem, que 
alguém já pronunciou, mas também todas as sentenças possíveis na língua. Além 
disso, o gerativismo mantém a hipótese de que as línguas são a manifestação de uma 
capacidade inata para a linguagem. Essa capacidade é biológica, típica da espécie 
humana:
“vamos postular que o ser humano possui em seu aparato 
genético alguma coisa como uma faculdade de linguagem, 
253
alocada no cérebro humano, uma hipótese plausível que se 
presta a marcar a diferença fundamental entre a espécie 
humana e todos os outros seres do planeta.” (MIOTO et al. 
2007:22)
 Temos aqui então um tipo de formalismo diferente dos mencionados 
anteriormente: não só as características da linguagem são independentes do uso, da 
função, como são originadas na mente e na biologia, e não na cultura. Por outro lado, de 
uma maneira que lembra um pouco as preocupações dos estruturalistas com a exclusão 
do sentido, os gerativistas propõem a modularidade da descrição, isto é, sustentam que 
a descrição da sintaxe da língua é – ao menos na teoria – independente da fonologia e 
da semântica.
 Como você pode ver, temos grandes preocupações formais nessas três correntes 
lingüísticas estudadas. Mas formalismo não significa a mesma coisa em todas 
as ocasiões. Às vezes temos apenas uma preocupação com a descrição de formas, 
outras vezes se diz que o significado não deve ser utilizado na descrição, e outras 
vezes a natureza da língua é explicada a partir de características da mente. Os vários 
funcionalismos lingüísticos vão se opor a algumas dessas opções, ou a todas elas.
Formalismo e Funcionalismo em Lingüística
As teorias da linguagem sempre refletem concepções particulares do fenômeno 
lingüístico, concebidas em função das posturas científicas da tradição cultural em que 
estavam inseridas (o que é a língua, quem é o sujeito da linguagem, o que é lingüístico, 
o que é extralingüístico, etc.). Em cada época, as teorias lingüísticas definem, ao seu 
modo, a natureza e as características relevantes do fenômeno investigado. 
Podemos afirmar que os estudos do fenômeno lingüístico inserem-se em duas 
grandes tradições científicas, que correspondem a dois grandes paradigmas: o formalista 
e o funcionalista. O primeiro privilegia a estrutura interna da língua e o outro, cada vez 
mais forte em nossos dias, busca relacionar o lingüístico e o social.
A Lingüística do século XX teve um papel decisivo na consideração da 
relação entre linguagem e sociedade: em um momento exclui do seu método toda 
consideração sobre a natureza social, histórica e cultural na observação, descrição, 
análise e interpretação do fenômeno lingüístico (referimo-nos, aqui, à constituição da 
tradição estruturalista, iniciada por Saussure em seu Curso de Lingüística Geral, em 
1916). Em outro momento, traz para o centro dos estudos da linguagem a preocupação 
com toda sorte de fenômenos capazes de afetar, em situações comunicativas concretas, 
o uso que os falantes fazem da língua, seja a cultura, seja a sociedade, a história, a 
ideologia, etc. (esse momento corresponde parcialmente à introdução da Pragmática 
no fazer lingüístico).
A relação entre linguagem e sociedade, reconhecida, mas nem sempre assumida 
como relevante, encontra-se diretamente ligada à questão da determinação do objeto de 
estudo da Lingüística: a língua. Isto é, embora se admita que a relação entre linguagem-
sociedade seja evidente por si só, é possível privilegiar uma determinada óptica (“o 
ponto de vista determina o objeto”), e esta decisãorepercute na visão que se tem do 
fenômeno lingüístico, de sua natureza e caracterização.
Saussure define a língua, por oposição à fala, como objeto central da 
Lingüística. Na visão do autor, a língua é o sistema subjacente à atividade da fala, 
mais concretamente, é o sistema invariante que pode ser abstraído das múltiplas 
254
variações observáveis da fala. Da fala, se ocupará a Estilística, ou, mais amplamente, 
a Lingüística Externa. A lingüística, propriamente dita, terá como tarefa descrever 
o sistema formal, a língua. Inaugura-se, assim, a chamada abordagem imanente da 
língua, que, em termos saussurianos, significa afastar “tudo o que lhe seja estranho ao 
organismo, ao seu sistema”.
Saussure privilegia o caráter formal e estrutural do fenômeno lingüístico, 
embora reconheça a importância de considerações de natureza etnológica, histórica 
e política. Saussure institucionaliza a distinção entre uma Lingüística Interna oposta 
a uma Lingüística Externa. É essa dicotomia que dividirá, de maneira permanente, o 
campo dos estudos lingüísticos contemporâneos, em que orientações formais se opõem 
a orientações contextuais, sendo que estas últimas se encontram fragmentadas sob 
o rótulo das muitas disciplinas inter-relacionadas: Sociolingüística, Etnolingüística, 
Psicolingüística etc.
Dentro da perspectiva funcionalista, a língua é conceituada como forma de 
interação social realizada por meio de enunciações: é um produto sócio-histórico. 
A concepção de língua como interação social influenciou os estudos que hoje se 
desenvolvem sobre a interação verbal, como a pragmática, a teoria da enunciação e a 
análise do discurso, e que adotam o princípio de que linguagem é ação e não meramente 
instrumento de comunicação. 
Assim, os dois grandes paradigmas da lingüística (formalismo e funcionalismo) 
têm diferentes concepções sobre a natureza geral da linguagem (natureza dos dados e 
evidências empíricas), os objetivos da lingüística, os métodos de estudo da ciência da 
linguagem. 
 Segundo Leech (1983, p.46), os formalistas (como Chomsky), tendem a observar 
a linguagem principalmente como fenômeno mental. Já os funcionalistas (como 
255
Halliday) tendem a percebê-la como um fenômeno social. Sobretudo, os formalistas 
estudam a linguagem como um sistema autônomo, enquanto os funcionalistas a 
estudam na relação com sua função social.
 Para Schiffrin, o funcionalismo está baseado em duas concepções básicas:
a) a linguagem tem funções que são externas ao próprio sistema 
lingüístico;
b) as funções externas influenciam a organização interna do sistema 
lingüístico.
Para o formalismo, a língua é vista enquanto signo, sistema de regras estático, 
transparente, determinada, a-histórica, homogênea. Nesse sentido, sua unidade de 
análise é a gramatical, notadamente nos níveis fonológico, morfológico e sintático, no 
plano descritivo e explicativo das formas. Para o funcionalismo, a língua é tida como 
atividade sócio-histórica, opaca, indeterminada, heterogênea e, sua unidade de análise 
é a função que a língua exerce em contexto.
 Com isso, o objeto de estudo do formalismo é a competência lingüística, o 
papel do código na comunicação, as regularidades nas combinações dos constituintes, 
a identificação de enunciados bem formados ou não. Já o objeto de estudo do 
funcionalismo é a competência sócio-comunicativa, a análise de ações performativas 
dos usuários com um objetivo específico, em determinado contexto cultural e social, 
tendo em vista os conhecimentos partilhados. A língua, nesse sentido, não é usada 
apenas para descrever o mundo, mas para realizar ações dos usuários sobre o mundo 
ou mesmo sobre outros usuários. Não se trata apenas de atos de dizer, mas de atos de 
fazer no uso da língua.
 Ainda que os formalistas não neguem que a língua possua funções sociais 
e cognitivas, essas não interferem no sistema, nem constituem objeto de estudo da 
Lingüística. Por sua vez, ainda que os funcionalistas não neguem a forma, o discurso 
não é percebido apenas como uma seqüência de unidades lingüísticas, mas envolve, 
sobretudo, o contexto.
 De qualquer modo, os dois paradigmas ratificam uma visão dicotômica na 
relação entre forma/função; individual/social; sujeito/objeto; subjetivo/objetivo. 
Atualmente, os estudos lingüísticos e das ciências em geral buscam superar essa 
dicotomia, pleiteando uma visão holística dos fenômenos.
256
Síntese das características dos paradigmas Formalista e Funcionalista
ASPECTO FORMALISTA FUNCIONALISTA
CONTEXTO Texto Texto + informações 
extralingüísticas
UNIDADE DE ANALISE Gramatical (morfema, 
fonema etc).
Funcional (atos de 
fala)
OBJETO DE ESTUDO Competência lingüística Competência sócio-
comunicativa
AQUISIÇÃO Capacidade inata Inferência a partir do 
uso
LÍNGUA Código/sistema Atividade
UNIVERSAIS 
LINGUÍSTICOS
Decorrentes das 
propriedades inatas
Decorrentes dos usos
OBJETIVO DA ANÁLISE Descrever as 
regularidades e regras de 
boa ou má formação
Explicar a adequação 
ou inadequação
Hymes (1974) sugere que os aspectos abaixo indicados contrastam a 
abordagem estrutural e funcional:
Paradigma estrutural Paradigma funcional
1. Estrutura da linguagem (código) como 
gramática.
1. Estrutura a língua como realização 
da fala
2. Análise do código antecede a análise 
do uso
2. A análise do uso é prioritária à do 
código
3. Função referencial – preenchimento 
dos usos semânticos como norma
3. Há um conjunto de funções 
estilísticas ou sociais
4. Elementos e estruturas são 
analiticamente arbitrários
4. Elementos e estruturas como 
etnograficamente apropriados
5. Equivalência funcional entre 
as línguas. Todas as línguas são 
essencialmente iguais
5. Diferenciação funcional entre as 
línguas, variedades, estilos
6. Há relação de homogeneidade entre 
código e comunidade
6. Comunidade de fala como matriz 
do código ou dos estilos de fala 
(organização da diversidade)
7. Conceitos fundamentais como: 
comunidade de fala, ato de fala, fluência, 
funções da língua são dados como 
garantidos ou arbitrariamente postulados
7. Conceitos básicos são tidos 
como problemáticos e merecem ser 
investigados
257
 Dik (1978) também faz uma comparação detalhada entre formalismo e 
funcionalismo:
PARADIGMA FORMAL PARADIGMA FUNCIONAL
1. Uma língua é um conjunto de sentenças 1. Uma língua é um instrumento de 
interação social
2. A função primária de uma língua é a 
expressão de pensamentos
2. A função primária de uma língua é 
comunicação
3. O correlato psicológico de uma 
língua é a competência: a capacidade de 
produzir, interpretar e julgar sentenças
3. O correlato psicológico de uma 
língua é a competência comunicativa: 
a habilidade promover interação social 
por meio da linguagem
4. O estudo da competência tem 
prioridade lógica e metodológica sobre o 
estudo do desempenho
4. O estudo do sistema da linguagem 
deve estar inserido dentro do seu 
sistema de uso
5. As sentenças de uma língua devem ser 
descritas independentemente do contexto 
e do funcionamento, dada a situação em 
que estão sendo usadas
5. A descrição dos elementos 
lingüísticos do uso da língua deve 
apresentar pontos de contato para a 
descrição do seu contexto. 
6. A aquisição de linguagem é inata 
– a entrada de dados é restrita e não 
estruturada (teoria da pobreza de 
estímulo)
6. A criança descobre o sistema 
subjacente à língua e ao seu uso, 
auxiliada por uma entrada de dados 
lingüísticos extensiva e altamente 
estruturada, apresentados em contextos 
naturais.
7. Os universais lingüísticos são 
propriedades inatas ao organismo 
biológico e psicológico humano
7. Os universais lingüísticos são 
coerções inerentes aos objetivos da 
comunicação, à constituição dos 
usuários da língua e aos contextos onde 
a língua é usada.
8.Sintaxe é autônoma com respeito 
à semântica; sintaxe e semântica são 
autônomas com relação à pragmática e as 
prioridades vão da sintaxe via semântica 
em direção à pragmática. 
8. A pragmática é o esquema no qual 
a semântica e a sintaxe devem ser 
estudadas; a semântica é subordinada 
à pragmática e as prioridades vão da 
pragmática via semântica para a sintaxe.
 
258
259
UNIDADE I
SOCIOLINGÜÍSTICA
1. A sociolingüística e o paradigma funcionalista
 A Sociolingüística se posiciona no paradigma lingüístico representado pelo 
modelo teórico funcionalista. As várias definições de Sociolingüística como “o estudo 
da linguagem em relação à sociedade”; como uma “tentativa de construir um discurso 
coerente sobre o relacionamento entre uso da linguagem e os modelos sociais de 
vários tipos”; como “parte da lingüística que se interessa pela linguagem enquanto um 
fenômeno social e cultural”; como “o estudo da linguagem como fenômeno social”; 
como “o estudo das características das variedades da linguagem, as características de 
suas funções e as características de seus falantes, como estes três elementos interagem 
constantemente, mudam, e mudam um ao outro dentro de uma comunidade de discurso”; 
ou como o “estudo das várias realizações lingüísticas dos significados socioculturais 
em que a ocorrência de interações sociais cotidianas é relativa a culturas particulares, 
a sociedades, a grupos sociais, a comunidades lingüísticas, línguas, dialetos, variações, 
estilos” (Figueroa, 1994, p. 25) confirmam o objeto da Sociolingüística como sendo o 
mesmo do paradigma mencionado. 
 Desta forma, levando-se em conta a natureza social da linguagem, as áreas 
de interesse da Sociolingüística incluem alguns fenômenos sociais e culturais, tais 
como as estruturas e padrões sociais; as variedades lingüísticas, como os dialetos e 
estilos; os grupos sociais, como as comunidades lingüísticas; as funções da linguagem 
na sociedade; a mudança lingüística; o sentido sociocultural e a interação social.
 O tema da Sociolingüística é definido por Aracil (1978) como sendo o “uso 
da língua – o enfoque sociolingüístico obviamente difere daquele da lingüística 
propriamente dita, centralizado nas condições existenciais. Enquanto a lingüística 
separa a língua das estruturas socioculturais não-lingüísticas, a sociolingüística a 
relaciona com elas”. 
Do mesmo modo, Romaine (1982) escreve: “O contraste entre lingüística 
propriamente dita e sociolingüística repousa no fato de que a estrutura da língua constitui 
o tema da lingüística, enquanto o uso da língua é deixado para a sociolingüística. 
Uma teoria sociolingüística, entretanto, pressupõe uma teoria lingüística; se é para ser 
verdadeiramente interativa, deve-se relacionar estrutura e uso.”
 Ao afirmar que “o tema da sociolingüística é o uso da linguagem” Figueroa 
(1994, p. 26) ressalta também que, em sendo a sociolingüística o estudo da enunciação 
(falada, escrita, simbolizada), várias questões precisam ser levadas em consideração: 
uma enunciação é a realização da língua em um contexto particular e não pode haver 
uma descrição adequadamente contextualizada de enunciação que exclua os agentes 
que produzem a enunciação, bem como os contextos em que a enunciação ocorre. 
A Sociolingüística moderna tem base nas teorias desenvolvidas por William 
Labov, na década de 1960, no contexto cultural dos Estados Unidos da América. A 
teoria de Labov, conhecida como Sociolingüística Variacionista – porque estuda os 
processos de variação e mudança lingüística segundo uma metodologia quantitativa, 
a partir de variáveis sociais e lingüísticas – é apenas um desdobramento da 
preocupação dos estudos da linguagem a partir da realidade social. Outros teóricos, 
UNIDADE I
SOCIOLINGÜÍSTICA
260
simultaneamente a Labov, desenvolveram disciplinas sociolingüísticas, abordando 
dimensões diferentes da relação linguagem-sociedade. Um deles é Dell Hymes, que 
adota a dimensão interdisciplinar da linguagem, ocupando-se de aspectos culturais e 
etnográficos relativos aos usos lingüísticos de uma comunidade, sob forte influência da 
antropologia lingüística. Outro é John Gumperz, que se ocupa da dimensão interacional 
dos usos da linguagem, em eventos lingüísticos face a face. Essa teoria é denominada 
Sociolingüística Interacional. 
2. Premissas da Sociolingüística: 
Relativismo 1. 
cultural
Princípio que prega que uma crença e/
ou atividade humana individual deva ser 
interpretada em termos de sua própria cultura. 
Defende a validade e a riqueza de qualquer 
sistema cultural e nega qualquer valorização 
moral e ética dos mesmos
Equivalência 2. 
funcional de todas 
as línguas
A equivalência funcional entre línguas ou 
variedades significa que essas se equivalem, 
tanto em sua estrutura quanto em seu uso, ou 
seja, todas as línguas têm igual complexidade
Heterogeneidade 3. 
lingüística regular
Diferentemente do que sugerem as gramáticas 
pedagógicas, a língua não é um fenômeno 
homogêneo. A regra é a variação, a mudança, a 
heterogeneidade. 
Igualdade essencial 4. 
entre as variedades 
lingüísticas 
Não apenas as línguas são funcionalmente 
equivalentes. Dentro de uma comunidade 
lingüística, as variedades empregadas 
por grupos sócio-culturais diferentes são 
equivalentes, não podendo ser descritas como 
melhores, mais complexas ou mais bonitas do 
que outras variedades.
 Stella Bortoni aponta que o relativismo cultural é uma postura adotada nas 
Ciências Sociais, inclusive na Lingüística, segundo a qual uma manifestação de cultura 
prestigiada na sociedade não é intrinsecamente superior a outras. Quando consideramos 
que as variedades da língua portuguesa, empregadas na escrita ou usadas por pessoas 
letradas quando estão prestando atenção à fala, não são intrinsecamente superiores 
às variedades usadas por pessoas com pouca escolarização, estamos adotando uma 
posição culturalmente relativa e combatendo o preconceito baseado em mitos que 
perduram há muito tempo em nossa sociedade.
Ainda no dizer de Bortoni (1997, p. 2), desde os anos sessenta a Sociolingüística 
vem lutando em favor do que chama de igualdade essencial das variedades lingüísticas 
e teve que lidar com as correlações entre os dialetos das crianças e seu sucesso 
educacional. Como exemplo, cita a pesquisa realizada por Kelmer Pringle e associados 
(Stubbs, 1980), que trata do desempenho na leitura, abaixo da média nacional, de 
crianças consideradas de classes sociais inferiores ou de minorias étnicas. Essa pesquisa 
261
agrupou 11.000 alunos na faixa de sete anos em três grupos: leitores bons, médios e 
pobres, usando como parâmetro, sua performance no Teste de Reconhecimento de 
Palavras Southgate. A porcentagem de leitores fracos na classe alta foi de 7,1%; na 
classe média, 18,9% e na classe baixa, mais que 26,9%. O esforço da Sociolingüística 
tem sido o de tratar os conflitos dialetais como apenas diferenças e não deficiências. 
Para William Labov (1987, p. 10), no entanto, “a causa primária do fracasso escolar 
não é a diferença entre as linguagens, mas o racismo institucional”.
 
3. Dimensões da Variação/Mudança Lingüística:
Uma concepção idealizada de norma nega qualquer tipo de validação às 
variedades lingüísticas. Estas, ao contrário da norma ideal, dizem respeito aos 
parâmetros lingüísticos que cada comunidade adota em função não apenas nas 
necessidades comunicativas, sociais e contextuais, mas em respeito a regras lingüísticas 
de mudanças, que operaram no decorrer do tempo sobre os princípios gerais daquela 
língua. 
 Por exemplo, a língua portuguesa falada no Brasil sofreu, ao longo dos 
quinhentos anos de seu uso em nosso território, inúmeras transformações, seja pelo 
contato com outras línguas da colonização (as línguas indígenas, as línguas africanas, 
as línguas dos invasores), seja pelo convívio comas línguas dos imigrantes (japoneses, 
italianos, alemães), seja pela distância geográfica em relação aos centros onde as 
mudanças sociais eram mais freqüentes (os sertões em relação às capitais do Império, 
por exemplo), seja pelas necessidades de cada lugar (a instalação das indústrias no 
sudeste, a agricultura de subsistência no norte-nordeste, a produção canavieira nos 
litorais).
 Essas transformações são observadas com muita clareza no Brasil, basta que 
constatemos os contrastes entre as diversas regiões. O resultado é que temos um país 
em que a língua utilizada pela maioria dos falantes é o Português, e que no entanto, 
não se pode considerar essa língua como homogênea, já que apresenta variações que a 
tornam muito particular em relação às comunidades que as adotam. Essas variedades 
têm normas diferentes umas das outras, e essas normas são consensualmente utilizadas 
pelos falantes. Não se pode dizer, portanto, que uma variedade do português seja mais 
bem empregada do que outra, visto que seu uso é sempre coerente com a norma. 
 Variedade lingüística não é erro ou desvio. É uma forma legitima de uso de uma 
língua que sofreu processos naturais de variação e mudança no seu desenvolvimento. 
A variação lingüística não ocorre apenas no Brasil, todas as línguas do mundo passam 
por esse processo, mas é mais fácil de notá-la em um país com a dimensão do nosso, 
pois o processo de mudança não é homogêneo, ou seja, não ocorre ao mesmo tempo 
em todas as regiões em que a língua é falada. 
As variações lingüísticas são, pois, as diferentes realizações de uma dada 
língua, que resultam de fatores de natureza histórica, regional, social ou contextual. 
Essas variações podem ocorrer nos níveis fonético e fonológico (a realização efetiva 
de um determinado som na língua, por exemplo o R retroflexo, utilizado no interior 
de São Paulo, para indicar pejorativamente a fala caipira), morfológico (a realização 
de uma concordância de número, em que apenas um termo recebe a marca do plural, 
como em as meninaØ), sintático (como a colocação pronominal, amplamente usada no 
Brasil, em orações do tipo “me dá um cigarro”) e semântico (encontrada na diferença 
lexical de diversas regiões, como os adjetivos doce e melado).
O estudo da variação lingüística pode ser feito a partir da observação das 
262
mudanças sob vários aspectos: a) o aspecto diacrônico (do grego dia+kronos = ao 
longo do tempo), que explica as manifestações diferentes de uma língua através dos 
tempos. No português brasileiro, é possível observar a mudança do português colonial 
com relação ao português moderno, especialmente pela presença de dados escritos 
daquela variedade, como também pelo uso de formas típicas do português colonial, 
preservadas nas variedades de algumas regiões do Brasil. b) o aspecto sincrônico 
(do grego sy’n = simultaneidade), que explica as variações num mesmo período de 
tempo, como os usos de uma variedade da atualidade em relação a outra, a exemplo 
do português falado no sul e no nordeste. Os demais aspectos, por sua relevância na 
explicação do Português Brasileiro, serão analisados em seção própria.
 
3.1. Variação diatópica, diafásica e diastrática.
 Entre os diversos processos de variação que ocorrem em uma determinada 
língua, destacaremos aqueles que dizem respeito aos contextos sociais que impõem 
a essa língua, normas de uso específicas, diferentes de outras normas encontradas em 
outras variedades.
A variação diatópica (do grego topos = lugar), também reconhecida como 
variação geolingüística ou variação dialetal, é o tipo de processo relacionado a fatores 
geográficos, como o uso de pronúncia diferente em diferentes regiões, diferentes 
palavras para designar os mesmo conceitos, acepções diferentes de um termo de região 
para região, expressões ou construções frásticas próprias de uma região, etc.
 A variação diatópica diz respeito aos processos de identificação da norma 
lingüística com os usos aceitáveis em lugares ou regiões diferentes de onde se fala a 
língua padrão. Assim, pode-se perceber que os lugares que se afastam geograficamente 
do centro onde se usa a variedade padrão, adotam normas lingüísticas diferentes 
daquele. Isso pode acontecer por diversos motivos: as regras lingüísticas que afetaram 
a padrão podem não ter afetado essa variedade, os usos sociais da língua nessa região 
podem ser diferentes de outra, influências de outras línguas podem ser mais presentes 
no centro do que na região onde se fala a variedade não-padrão, etc. O exemplo clássico 
da variação diatópica é o falar rural em oposição ao urbano. Nesse exemplo, percebe-
se que a mudança ocorreu com menos freqüência na variedade rural, que preserva 
várias formas do português medieval, enquanto que o falar urbano sofreu influências 
de diversos tipos, como processos de industrialização, de imigração, etc.
A variação diafásica (do grego phasis = fala) é relacionada às diferentes 
situações de comunicação e a fatores de natureza pragmática e discursiva, que são 
impostos em função do contexto de uso da língua. Esses fatores levam o falante a 
adaptar-se às circunstâncias comunicativas, por meio da variação do registro de língua, 
seja para mais formal, ou para mais informal. 
Em lingüística, o termo registro designa a variedade da língua definida 
de acordo com o seu uso em situações sociais. Assim, registros lingüísticos são os 
diversos estilos que um falante pode usar em uma situação comunicativa dada. Em 
uma conversa informal com os amigos, por exemplo, utilizará um registro diferente do 
que utiliza em família, ou no emprego, ou na Universidade.
A variação diastrática (do grego stratos = camada, nível) refere-se aos modos 
de falar que correspondem a códigos de comportamento de determinados grupos 
sociais. A variedade diastrática corresponde ao uso lingüístico partilhado por um grupo 
social, cujos membros mantêm entre si relações de identidade que os diferenciam em 
relação a outros grupos (por exemplo, o uso de gírias, de jargão profissional, etc.). 
263
Entre os fatores relacionados à variação social, encontramos a classe social, situação 
ou contexto social, idade, sexo, etc.
A classe social é um fator que tem estreita ligação com a escolha de variedades 
lingüísticas de uso. Em países como a Índia, em que o sistema de estratificação social 
é bastante fechado, a língua utilizada por uma casta superior, não pode ser usada por 
uma inferior. No Brasil, alguns membros da elite intelectual insistem em identificar 
a variedade padrão da língua com a classe alta. Essa identificação não procede, uma 
vez que tal classe se define em termos de poder econômico, e não em função de 
escolaridade. Pode-se dizer que num país mais agrícola do que industrializado, como 
o Brasil, o poder econômico se concentra mais nas mãos dos grandes produtores e 
fazendeiros e dos altos empresários da indústria do que na elite intelectual. Assim, a 
variedade lingüística em torno de classes, no Brasil, é mais aberta, não podendo ser 
identificada com uma classe apenas. Assim, é importante que se compreenda que um 
falante de uma variedade social pode utilizar outra variedade para comunicação, o que 
destaca a relevância de todas as variedades e sua adequação às necessidades de uso.
A situação ou contexto social define a variedade lingüística a ser utilizada 
a partir da relação mutua entre dois falantes ao discutir um dado assunto, em uma 
dada situação. Há contextos que exigem maior formalidade, como os institucionais, 
relacionados à escola, ao trabalho, às atividades públicas; e contextos em que a 
informalidade é a regra a se seguir, como nos contextos privados. Assim, em relação à 
pessoa a quem se dirige, o falante pode utilizar uma variedade mais ou menos formal, 
dependendo se o seu interlocutor é mais velho, ou superior hierarquicamente, ou se 
trata de um par; dependendo também do lugar onde os falantes se encontram,se em um 
bar, uma igreja ou uma escola; bem como do tema sobre o que se conversa, um assunto 
sério, amenidades, etc.
No que diz respeito à variação social, segundo os fatores sexo e idade, observa-
se que alguns recursos expressivos, como o alongamento de vogais, o uso freqüente 
de diminutivos, entre outros são mais comuns na fala da mulher do que na do homem, 
enquanto que o registro social por meio de gírias, palavrões, etc. são mais freqüentes 
na variedade usada por esses. Gírias, palavrões e outras marcas do registro informal 
são também mais freqüentes nas variedades usadas por jovens (homens e mulheres) 
do que na faixa etária de mais idade. O uso de certos pronomes (como o tu) ocorre 
com mais freqüência entre jovens, enquanto certas pronúncias (como senhora, com o 
fechamento da vogal o) são mais comuns entre os mais velhos.
Categorias de análise 
da sociolingüística
Variante Identificação de formas usadas 
simultaneamente sem alteração de 
sentido
Variável Fator ou grupo de fatores que 
determinam o uso de uma variante
Variação Processo comum e natural às línguas. 
Pode ser instável ou estável.
A análise das variantes define:
A co-existência estável entre variantes – ocorre assim o fenômeno da 1. 
Variação;
264
A competição entre variantes com aumento do uso de uma delas – ocorre assim 2. 
a Mudança em curso
Variáveis sociais 
(extralingüísticas):
Sexo1. 
Idade2. 
Nível de Escolaridade3. 
Contexto Lingüístico (Região)4. 
Classe Social5. 
Etnia6. 
Rede social7. 
O peso dos fatores sociais tem sido minimizado, pois reformulações na teoria 
variacionista destacam motivações essencialmente lingüísticas para a variação/
mudança.
Diante de duas variantes, por exemplo, /cantandu/ e /catanu/ (ambas referindo-
se ao gerúndio do verbo cantar), o sociolingüista considera:
Qual o contexto social de uso de uma das variantes pelo mesmo falante• 
Em que contextos específicos uma forma tende a ser usada pela comunidade • 
lingüística 
Há diferença no uso de uma das formas, de acordo com faixa-etária do • 
falante?
Há diferença no uso de uma das formas, segundo o nível de escolaridade do • 
falante?
Há diferença no uso de uma das formas, de acordo com o nível socioeconômico • 
do falante?
Há diferença no uso de uma das formas, de acordo com o nível registro de • 
linguagem (formal ou informal) empregado pelo falante?
4. A Sociolingüística Interacional
A Sociolingüística Interacional pode ser considerada como um desenvolvimento 
contemporâneo da Sociologia da Linguagem, da Etnografia da Comunicação e da 
própria Sociolingüística do tipo variacionista da qual William Labov (1966, 1972) é o 
principal representante. Atuantes da área de Sociologia como Goffman (1967, 1974) 
e Garfinkel (1967) contribuíram para alguns dos fundamentos da Sociolingüística 
Interacional, especialmente no que diz respeito à análise da conversação. Este primeiro 
influenciou muitos teóricos da Sociolingüística Interacional através de seus trabalhos 
sobre interação social. O último também o fez através de um modo particular de 
lidar com a sociologia, ao qual ele denominou Etnometodologia. Os filósofos da 
linguagem cotidiana (ou Ordinary Language Philosophers) como Strawson (1950), 
Austin (1962) e Grice (1968), estabelecidos principalmente em Oxford e que buscavam 
esclarecimento de conceitos à luz do emprego corrente dos termos da linguagem 
comum que os designam, também tiveram grande influência na fundamentação da 
teoria da Sociolingüística Interacional, no que diz respeito à pragmática e às teorias 
sobre atos de fala. As noções de contexto e competência comunicativa desenvolvidas 
por Hymes (1962) para sua Etnografia da Comunicação também forneceram subsídios 
para a análise interacionista proposta pela Sociolingüística Interacional, mas foi John 
265
Gumperz (1971, 1982) quem desenvolveu e definiu o tipo particular de sociolingüística 
que é reconhecido atualmente como um paradigma distinto.
 Consoante Figueroa (1994) a Sociolingüística Interacional de Gumperz se 
diferencia das teorias que a precederam por ocupar-se do comportamento do indivíduo 
numa situação de comunicação face a face ao tratar a linguagem enquanto fenômeno 
social. Prática que até então não havia sido levada em conta por Labov e outros nomes 
da sociolingüística, preocupados especialmente com os “agregados populacionais”.
 Os pontos que separam Gumperz de Labov e tornam a Sociolingüística 
Interacional uma teoria distinta dos modelos anteriores são, em primeiro lugar, a escolha 
deste tipo de comunicação face a face, ou seja, um tipo que elege o indivíduo para 
ser o ponto de interesse da análise lingüística. Esta escolha exclui a análise baseada 
nas médias obtidas em comunidades de falantes, o que, na maioria das vezes, produz 
apenas generalizações estatísticas baseadas em dados coletados segundo métodos de 
inquéritos e não dados validados pela análise profunda da competência lingüística. O 
segundo ponto de divergência consiste no fato de o interesse de Gumperz concentrar-
se no conhecimento individual e suas problemáticas: o que é partilhado desse 
conhecimento, como ele é distribuído e até que ponto ele é significante e generalizável; 
esta preocupação não se verifica no nível do discurso da comunidade lingüística. 
O terceiro ponto refere-se à aceitação, por Gumperz, da teoria do ‘comportamento 
individual’ que vê na interação uma constituinte da realidade social.
 Assim, a teoria de Gumperz se situa no terreno das interações humanas onde 
os significados, ordens e estruturas não são predeterminados, mas se desenvolvem na 
interação e se baseiam num conjunto complexo de fatores materiais, experienciais e 
psicológicos (Figueroa, 1994, p.113). Gumperz rejeita a separação de língua do seu 
contexto social e se interessa pelo conhecimento de como o comportamento lingüístico 
cria interpretações, de como as intenções individuais levam ao comportamento 
lingüístico, e de como o sucesso da comunicação está relacionado ao conhecimento 
sociolingüístico.
 A teoria da Sociolingüística Interacional enfoca diretamente “as estratégias 
que governam o uso, por parte do falante, dos conhecimentos lexicais, gramaticais, 
sociolingüísticos ou de outra natureza, na produção e interpretação das mensagens em 
contexto” (Figueroa, 1994, p.113). Este processo só é possível pelo uso de pistas de 
contextualização, ou “qualquer traço de forma lingüística que contribui para assinalar 
pressuposições contextuais”, que permitem acessar a forma como a intenção do locutor 
está sendo comunicada e interpretada.
 De forma um pouco diferente dos etnometodologistas, que ao analisar um 
ato conversação, procedem à seqüenciação do ato, à verificação de como este ato é 
conseqüência de um anterior, ou como é seguido sistematicamente por outro, Gumperz 
se ocupa mais da interpretação da intencionalidade conversacional do que da análise 
estrutural de ordem social. Os etnometodologistas desenvolveram unidades de análise, 
tais como turnos, pares adjacentes, tópicos, ações de reparo, entre outros, que também 
são utilizados por Gumperz ao fazer Sociolingüística Interacional, mas este inclui em 
sua análise traços lingüísticos de ordem supra-segmental, como entoação, ritmo, que 
são usualmente ignorados pelos analistas da conversação.
 A unidade mínima de significação social de que se ocupa a análise da 
Sociolingüística Interacional é a atividade ou evento de fala, termo definido como um 
“conjunto de relações sociais realizadas segundo um conjunto de esquemas em relação 
a algum propósito comunicativo” (Figueroa, 1994, p.13). A atividade de fala pressupõe 
a análise da interação entre os participantes, porque é através dela que as expectativas 
266
dos participantes sobre as atividades subseqüentes, em relação ao curso de um evento 
de interação, são reavaliadas, desenvolvidas e até mudadas. Sendoassim, a interação 
produz um processo de interpretação de sentido dinâmico. 
 A interação produzida através das trocas conversacionais é dotada de algumas 
propriedades dialógicas que permitem ao analista chegar a processos de inferência de 
sentido. Uma destas propriedades é a possibilidade de negociação das interpretações 
entre falante e ouvinte, cujos julgamentos são confirmados ou mudados segundo 
as reações que eles produzem no interlocutor. Assim, não é possível que um único 
enunciado produzido pelo falante seja suficiente para que o ouvinte faça inferência de 
tal ou qual interpretação. A segunda propriedade é a afirmação de que a conversação 
contém em si mesma, evidências internas do que será seu resultado. Gumperz dá 
como exemplo dessa propriedade a possibilidade de os participantes compartilharem 
ou não das convenções interpretativas, ou de serem bem sucedidos ou não em atingir 
os fins da teoria comunicativa.
 A Sociolingüística Interacional, vista deste modo, é uma teoria fundamentada 
no discurso e não no nível da sentença, e se interessa mais pela comunicação de 
intencionalidade do que de gramaticalidade. Os traços básicos de uma língua são 
classificados por Gumperz como traços nucleares ou centrais e traços marginais 
ou periféricos. A Sociolingüística Interacional se concentra no estudo dos traços 
considerados marginais, que tratam da função expressiva da linguagem e envolvem 
aspectos supra-segmentais como entoação, ritmo, escolha entre opções lexicais, 
fonéticas e sintáticas, além de sempre basear sua análise em termos de linguagem 
contextualizada, servindo aos propósitos da comunicação. A teoria lingüística vigente, 
por outro lado, considera apenas os traços nucleares que carregam informações 
referenciais. Estes traços são de cunho segmental e funcionam apenas ao nível da 
sentença. São alguns deles os fonemas segmentais, os marcadores gramaticais ou 
afixos, as categorias sintáticas básicas e alguns elementos de acentuação, que tratam 
da linguagem de forma descontextualizada e idealizada.
267
UNIDADE II
LINGÜÍSTICA INTERACIONAL
1. A noção de interação na Lingüística:
O interesse pelo fenômeno da interação social na Lingüística é geralmente 
atribuído à abordagem da linguagem verbal humana, em sua modalidade oral, por meio 
da análise das ações comunicativas entre os falantes e os ouvintes. Várias correntes 
teóricas da Lingüística, como as análises do discurso, a sociolingüística, a análise da 
conversação, etc. ao abordar o fenômeno interacional renovaram o enfoque dos estudos 
da linguagem, passando a ocupar-se com a chamada gramática oral.
O funcionamento e o uso da língua em situações concretas no cotidiano dos 
falantes, assim como a função sócio-comunicativa das produções lingüísticas, nesse 
novo enfoque, passaram a ter prioridade sobre a análise formal das estruturas da língua. 
Essa mudança de foco de análise é geralmente denominada de mudança ou virada 
pragmática (do inglês, “pragmatic turn”).
Virada pragmática: na virada pragmática o funcionamento e o uso da língua em situações 
concretas no cotidiano dos falantes têm prioridade sobre a análise formal, assim como a função 
sócio-comunicativa e o enquadre cognitivo das produções lingüísticas e não-lingüísticas.
Entretanto, antes da própria virada pragmática, outras abordagens denominadas 
interacionistas já haviam se estabelecido no campo de estudos da linguagem, 
voltadas especialmente para a investigação da fala infantil (Lev Vygotsky, 1896-
1934) e dos processos sociais que motivam a produção dos enunciados verbais 
(Mikahil Bakhtin, 1895-1975).
Lev Semionovitch Vygotsky Mikhail Mikhailovich Bakhtin
A perspectiva de Vygotsky (1896-1934), 
denominada sócio-interacionismo ou 
interacionismo sociocultural, trata do papel 
das interações sociais aplicadas à gênese da 
linguagem e ao desenvolvimento cognitivo 
da criança. Em sua abordagem, a interação 
social e a linguagem são fundamentais para 
o desenvolvimento humano. O indivíduo, 
em sua opinião, não é apenas ativo, mas 
interativo, porque constrói conhecimentos e 
se constitui como sujeito a partir de relações 
intra e interpessoais. 
O desenvolvimento cognitivo se processa 
na internalização da interação social com 
os dados disponíveis culturalmente, em um 
processo construído de fora para dentro, ou 
seja, trata-se de um processo que caminha 
do plano social (relações interpessoais) para 
o plano individual interno (relações intra-
pessoais). Nessa perspectiva, internalizamos 
conhecimentos, construímos papéis e 
funções sociais, no intercâmbio com outros 
sujeitos e conosco próprios.
Bakhtin se opõe a uma noção de língua que 
seja fundada tanto em sua forma objetiva 
como na subjetividade pura. Ao invés 
disso, adota a concepção de dialogismo ou 
interação. Para o autor, a linguagem tem 
natureza sócio-ideológica. Há, portanto, 
entre linguagem e sociedade relações 
dinâmicas e complexas que se materializam 
nos enunciados constituídos em discursos.
“A verdadeira substância da língua não 
é constituída por um sistema abstrato de 
formas lingüísticas nem pela enunciação 
monológica e isolada, nem pelo ato 
psicofisiológico de sua produção, mas 
pelo fenômeno social da interação verbal, 
realizada através da enunciação ou das 
enunciações. A interação verbal constitui 
assim a realidade fundamental da língua. 
A língua vive e evolui historicamente na 
comunicação verbal concreta, não no sistema 
lingüístico abstrato das formas da língua 
nem no psiquismo individual dos falantes” 
(BAKHTIN, 1992, p. 109-110)
UNIDADE II
LINGÜÍSTICA INTERACIONAL
268
Os estudos da interação social consideram que a conversação (fenômeno 
lingüístico de base) é um dos lugares fundamentais onde se estabelecem o vínculo e a 
ordem social; onde se realiza a socialização dos indivíduos; onde os falantes adquirem 
suas capacidades comunicativas; e onde a língua é usada de maneira prototípica. Em 
razão disso, a organização da conversação não pode ser indiferente à organização 
social nem à estruturação dos recursos lingüísticos. Postula-se, então, que o fenômeno 
interacional integra, em termos lingüísticos, as dimensões pragmáticas (funcionais) e 
estruturais (formais) da linguagem.
Duas hipóteses sobre essa questão são formuladas por Lorenza Mondada, 
lingüista suíça (2001, p.15):
As formas lingüísticas são usadas como o recurso à interação. A 1. 
organização da interação explora estes recursos de acordo com suas 
especificidades e suas características formais. Em termos práticos, 
gerenciamos a interação através do emprego de estruturas lingüísticas 
(marcas sintáticas, discursivas, lexicais) que se organizam por modelos 
interativos seguidos em nossas práticas de linguagem.
As formas lingüísticas não são apenas exploradas interacionalmente, mas 2. 
são configuradas também pela interação. Sua adequação à atividade de 
conversação não seria uma mera possibilidade, mas uma conseqüência do 
fato de que os falantes estruturam os recursos da língua para a interação.
Ao propor as bases de uma Lingüística Interacional, teóricos como Lorenza 
Mondada reflete sobre as conseqüências de se adotar integralmente a dimensão 
interacional dos fenômenos lingüísticos. Algumas destas conseqüências são:
o reconhecimento do papel constitutivo da interação social na própria • 
estruturação dos recursos lingüísticos, ou seja, a interação social não apenas 
estabeleceria os modelos para o uso da língua em suas situações comunicativas, 
mas a própria escolha dos recursos lingüísticos que usamos (as estruturas, 
os sentidos, a organização sintática) seria feita de acordo com a dinâmica 
interacional.
 
o fato de que a análise interacional permite conceber um modelo de práticas • 
sociais dos falantes que expliquem os fenômenos dinâmicos e emergentes 
da linguagem, ou seja, os processos locais de variação sociale as mudanças 
lingüísticas (sintáticas, semânticas, pragmáticas) seriam decorrentes de 
alterações nos modelos interacionais utilizados nas práticas sócio-comunicativas 
dos falantes. 
Duas grandes tradições lingüísticas se estabeleceram fortemente a partir da 
segunda metade do século XX: a tradição do produto e a tradição da ação. 
269
Tradição do Produto Tradição da Ação
Iniciada ainda no século XIX com os 
neogramáticos se estendeu até Saussure 
e Chomsky, tornando-se paradigmática 
a partir do tratamento dado à língua pelo 
gerativismo, como sendo um produto bem 
definido da fonologia, da morfologia, 
da semântica e da sintaxe. Esta tradição 
tem como características o fato de que 
o aspecto estrutural é mais básico do 
que o aspecto do uso e de que a língua 
é autônoma e suficiente para centrar sua 
análise no nível da frase.
A tradição da ação foi postulada, 
sobretudo, pelos pragmaticistas, analistas 
da conversação e etnometodólogos, que 
definem o funcionamento da língua 
em níveis de ação, desde os níveis 
estritamente lingüísticos até os da 
enunciação, da modalidade, da cognição, 
da situacionalidade, etc. A lingüística 
interacional subscreve essa tradição, em 
vista de seu objeto de estudo tratar-se de 
um tipo de ação intersubjetiva.
Para Herbert Clark (1992, 1996) o uso da linguagem é, de fato, uma forma de 
ação conjunta, e por ação conjunta entende-se aquela que é levada a efeito por um 
conjunto de pessoas agindo coordenadamente em relação às outras. O uso da linguagem, 
portanto, incorpora ambos os processos individuais e sociais da interação social.
2. Objeto de Estudo da Lingüística Interacional:
A comunicação face a face• 
O que as pessoas fazem ao usar linguagem é realizar ações intencionalmente. Em 
um dado nível de abstração elas negociam e conhecem uns aos outros, etc., em outro 
nível, fazem afirmações, pedidos, promessas, pedem desculpas, categorizam objetos, 
referem-se às pessoas e situam as coisas. Todas essas ações são conjuntas. Mas, o que 
são e como funcionam as ações conjuntas?
Alguns dos traços mais elementares usados para entender a linguagem e seu uso 
como ação conjunta são apresentados por Clark (1996, p. 23), abaixo resumidos:
A linguagem é 
fundamentalmente usada 
para propósitos sociais.
O uso da língua é essencialmente performativo, 
isto é, todos os usos da língua envolvem 
atividades sociais sem as quais não haveria 
sentido em usá-la. Ilustra esta asserção o 
questionamento feito por Salomão (1999, p. 65):
“A rigor, para que existiria linguagem? 
Certamente não para gerar seqüências arbitrárias 
de símbolos nem para disponibilizar repertórios 
de unidades sistemáticas. Na verdade, a 
linguagem existe para que as pessoas possam 
relatar a estória de suas vidas, eventualmente 
mentir sobre elas, expressar seus desejos e 
temores, tentar resolver problemas, avaliar 
situações, influenciar seus interlocutores, 
predizer o futuro, planejar ações”.
270
A linguagem é uma espécie de 
ação conjunta.
Não pode haver uso solitário da língua, mas 
as ações de no mínimo dois indivíduos são 
exigidas para que as atividades lingüísticas 
tenham sentido. As ações conjuntas constituem 
a coordenação das ações individuais de pelo 
menos dois sujeitos, que podem estar face a 
face, ou distantes no tempo e no espaço.
O uso da linguagem sempre 
envolve a significação do 
falante e a compreensão do 
interlocutor
Esta afirmação põe em evidência o fato de 
que os significados não estão estavelmente 
nas estruturas das palavras, mas se revelam na 
situação comunicativa concreta. A compreensão 
lingüística depende do significado do falante 
associado às especificidades contextuais em que 
os enunciados são produzidos. Isto quer dizer 
que qualquer sentença, para ser compreendida, 
envolve o reconhecimento das intenções do 
falante dentro de um contexto situado sócio-
culturalmente.
O uso da linguagem 
geralmente tem mais de uma 
camada de atividade.
Há muitos domínios de ação em uma única 
atividade discursiva. Cada um destes domínios 
(ou camadas de atividade) é definido por 
um conjunto de participantes, um lugar, um 
tempo, e um conjunto de ações executadas. A 
conversação em sua forma mais simples tem 
apenas um domínio de ação. No entanto, no 
decurso desta atividade, os participantes podem 
introduzir novas camadas de ação quando, por 
exemplo, contam uma história, uma piada, 
imitam uma personagem ou uma terceira pessoa, 
enfim, fazem da conversação um contexto rico 
para os diversos usos da linguagem.
Para os estudos da comunicação face a face, talvez o traço mais elementar a 
partir do qual entendemos o objeto da lingüística interacional seja:
O locus básico da linguagem é a conversação face a face.
Esta afirmação aponta para o fato de que o contexto de uso da língua mais básico 
é aquele da conversação face a face. Toda uma tradição dos estudos da linguagem 
tem se voltado para a investigação deste contexto, a fim de elucidar os mais diversos 
propósitos, desde a aquisição da linguagem até os usos sócio-dialetais de variedades 
lingüísticas. 
271
Koch (1992, p. 9; 66), por exemplo, 
encara a linguagem como atividade, 
forma de ação interindividual e lugar de 
interação que possibilita aos membros de 
uma comunidade executar ações, ‘jogar 
um jogo’. 
Bange (1983, p. 3) afirma que se a 
“conversação pode ser considerada 
a forma de base da organização da 
atividade de linguagem”, tal ocorre 
porque ela é, de fato, a forma de vida 
cotidiana, interativa, inseparável da 
situação. 
Para Fillmore (1981, p.152) a língua da 
conversação face a face é o uso mais 
básico e primário da linguagem, todos 
os outros sendo mais bem descritos em 
termos do modo como se desviam desta 
base. 
Clark (1996, p. 11) também reafirma a condição da conversação face a face 
como cenário básico de uso da língua. Para ele, a conversa é universal, não requer 
habilidade especial, e é essencial na aquisição da língua materna. 
A prioridade da conversação face a face sobre os demais cenários ocorre porque 
nestes faltam traços como a imediaticidade, o meio e o controle da interação face 
a face, os quais devem ser supridos por técnicas ou práticas especiais. A natureza 
destes traços dá à conversação face a face características que faltam aos cenários não 
básicos, como a co-presença, visibilidade, audibilidade e instantaneidade no enquadre 
da imediaticidade; a evanescência, a não registrabilidade e a simultaneidade como 
característicos do meio; e a improvisação, autodeterminação e auto-expressão, no 
quadro do controle das ações da linguagem.
Traços da conversação face a face (CLARK & BRENNAN, 1991):
IMEDIATICIDADE
1. Co-presença Os participantes partilham o mesmo 
contexto físico.
2. Visibilidade Os participantes se vêem 
mutuamente.
3. Audibilidade Os participantes ouvem um ao 
outro.
4. Instantaneidade Os participantes percebem as ações 
dos demais sem atraso perceptivo.
MEIO
5. Evanescência O meio é evanescente – os sinais 
lingüísticos e não-lingüísticos 
são transitórios e desaparecem no 
espaço e tempo.
6.Não-
registrabilidade
As ações dos participantes não 
deixam marcas ou vestígios físicos.
7. Simultaneidade Os participantes podem produzir 
e receber ações lingüísticas 
imediatamente e simultaneamente
272
CONTROLE DAS
AÇÕES
8. Improvisação Os participantes formulam e 
executam suas ações de maneira 
improvisada, em tempo real. 
9. Autodeterminação Os participantes determinam por si 
mesmos quais ações são tomadas e 
quando são tomadas. 
10. Auto-expressão Os participantes atuam por 
expressão própria. 
Em nossa opinião, ao enfatizar a não exigência de habilidade especial no uso 
face a face da linguagem, Clark deixa de reconhecer que as ‘habilidades básicas’, 
presentes neste cenário, exigem um nível complexode operações cognitivas e sociais. 
O modo de interagir no contexto social não é um dado de que os falantes dispõem; eles 
o constroem no dia-a-dia de suas experiências culturais e na relação como os outros 
interlocutores. 
A habilidade da conversa face a face não exige, por exemplo, a escolarização 
formal, mas os falantes que dela fazem uso tiveram que aprender a manipular recursos 
interacionais desde cedo. Operações cognitivas como a inferência, a referenciação e a 
interpretação também desempenham papel crucial na interação face a face. Considerá-
las básicas seria negar a complexidade dos processos neurocognitivos e sócio-
cognitivos que elas executam. 
A conversa é organizada de modo que haja interação entre os participantes, ou 
seja, para que estes negociem o sentido social das atividades em que estão envolvidos. A 
organização da conversação é dotada de uma complexidade que permite conceber uma 
gramática própria: a gramática oral ou interacional. Para fins didáticos, apresentamos 
alguns itens que estruturam a gramática interacional, os quais serão tratados no decorrer 
deste capítulo:
Tópicos
Os diversos assuntos abordados pelos falantes são denominados, 
segundo a análise etnometodológica da conversação, ‘tópicos’. 
Numa situação de interação os tópicos podem continuar, mudar 
ou simplesmente chegar ao fim, pela negociação dos falantes. 
Turnos
Para falar sobre os ‘tópicos’, os participantes organizam a 
conversação em ‘turnos’, que constituem a oportunidade que 
cada um tem de dar sua contribuição para a conversação, é ‘a 
vez’ que cada falante tem de se expressar sobre dado ‘tópico’. 
Tomada de 
Turno ou 
Assalto ao 
Turno
Os turnos geralmente não são distribuídos automaticamente aos 
falantes. Um interlocutor pode, em dado momento, querer tomar 
a palavra de quem está falando e, para isso, sobrepõe sua voz até 
que o outro ceda. Este procedimento é denominado ‘assalto ao 
turno’.
Simetria 
interacional
Em ‘interações simétricas’, todos os participantes têm direitos 
iguais ao uso dos turnos; isto se verifica em conversações 
informais entre amigos ou familiares.
273
Assimetria 
interacional
Em interações consideradas ‘assimétricas’, como entrevistas 
de emprego, consultas médicas, e até em sala de aula, um dos 
integrantes da conversação possui o domínio sobre os turnos e 
os distribui a seu critério. As interações assimétricas são típicas 
dos ambientes institucionais e as relações entre profissionais 
e leigos se dão em termos de ‘pares adjacentes’, ou seja, os 
profissionais determinam os tópicos e controlam os turnos 
através de perguntas, as quais os leigos somente respondem, mas 
não opinam sobre tópico, nem fazem ‘assalto aos turnos’
Pares 
Adjacentes
São dois turnos emparelhados (do tipo bom dia/bom dia) e 
constituem principal unidade de análise interacional. São 
encontrados tanto em interações assimétricas (entrevistas 
médico-paciente; inquiridor-testemunha) quanto em interações 
simétricas, freqüentemente através de expressões cristalizadas 
(alô/alô; tudo bom/tudo bom, etc.)
Relevância 
Condicional
Nos pares adjacentes a produção de um turno condiciona a 
realização do segundo. Nos pares: pergunta-resposta; saudação-
saudação; convite-aceitação; pedido-concordância, a não-
ocorrência do segundo par, embora possível, causaria estranheza 
ou sanção social.
O contexto interacional• 
A noção de contexto tem sido abordada na Lingüística, especialmente nos campos 
da pragmática, a partir da referência ao uso da linguagem em situações interacionais. 
As escolhas lingüísticas de um falante são definidas contextualmente e são definidoras 
do contexto, ou seja, linguagem e contexto se alimentam mutuamente um do outro. 
As escolhas lingüísticas do falante são pistas de contextualização que acionam um 
conjunto de expectativas, atitudes e processos inferenciais associados com o tipo de 
atividade de que são índices. Deste modo, contexto e linguagem são concebidos como 
uma relação dinâmica e evolutiva, na qual as palavras são mediadoras de diferentes 
versões do mundo e normalmente permitem mais de uma versão co-existir em uma 
atividade de fala. 
Em seus estudos sobre o uso da linguagem e as arenas nas quais os falantes agem 
conjuntamente, Clark apresenta cenários de uso da língua, classificando-os de acordo 
com as cenas e os meios em que ocorrem, ou seja, os lugares (contextos) e os canais 
de produção lingüística (falada, escrita, gestual). Da combinação dos dois, o autor 
sugere a noção de contexto falado e contexto escrito. Clark (1996, p. 5) propõe sete 
tipos de cenários no âmbito do contexto falado: não-pessoais, pessoais, institucionais, 
prescritivos, ficcionais, mediados e privados:
274
Tipologia dos Cenários de Uso da Língua (CLARK, 1996, p. 8):
CENÁRIOS FALADOS CENÁRIOS ESCRITOS
Não-pessoais Professor A profere 
palestra a alunos B
Jornalista A escreve artigo 
informativo para leitores B
Pessoais A conversa face a face 
com B
A escreve carta a B
Institucionais Promotor A interroga 
testemunha B no tribunal
Gerente A escreve carta 
comercial a cliente B
Prescritivos Noivo A faz voto ritual de 
matrimônio a noiva B em 
frente de testemunhas C
A assina formulários oficiais 
para B em frente a notário 
público C
Ficcionais A atua em peça teatral 
para espectadores B
Escritor A escreve romance 
para leitores B
Mediados C simultaneamente traduz 
para B o que A diz a B
C, enquanto ghost-writer, 
escreve um livro de A para 
leitores B
Privados A fala consigo mesmo 
sobre seus planos
A escreve lembrete a si mesmo 
sobre seus planos
Nos cenários não-pessoais os monólogos são bastante representativos. Referem-
se à prática na qual uma pessoa fala com pouca ou nenhuma possibilidade de interrupção 
ou tomada de turno por parte dos membros da audiência. As diversas variedades do 
monólogo não excluem a presença de uma audiência, mas a natureza deste cenário não 
é conversacional: “as pessoas falam para si mesmas, enunciando palavras formuladas 
por elas para a audiência a sua frente, e da audiência não se espera interrupção”. 
Os cenários pessoais, por sua vez, são típicos da conversação face a face, e 
mesmo da conversação telefônica. Trata-se de trocas de turno relativamente livres 
entre os participantes, que são no mínimo dois, e constituem a unidade básica de uso 
da linguagem. O cenário pessoal, de fato, inclui os demais cenários, já que se trata de 
uma modalidade em que as características sócio-interacionais da linguagem parecem 
se atualizar com muita freqüência. Os demais cenários são sempre definidos com 
relação ao modo como compartilham características dos cenários pessoais e ao modo 
como diferem destes.
Nos cenários institucionais, por exemplo, os participantes se engajam em trocas 
discursivas que lembram a conversação cotidiana, face a face, mas estas trocas são 
limitadas por regras da instituição controladora (conjunto de coerções construídas 
anteriormente às atividades de fala) – o uso da língua na sala de aula enquadra-se 
também neste tipo de cenário. Os turnos de fala, geralmente, são controlados por um 
líder, e apresentam outros tipos de restrição, especialmente no que se refere à estrutura 
de participação dos falantes.
275
Estrutura de Participação
Modelo de participação de falantes e ouvintes em 
uma atividade de fala. Veja a próxima seção para 
exemplos.
 
Os cenários prescritivos são característicos dos eventos religiosos, rituais 
sagrados e jurídicos, a exemplo dos membros de uma igreja recitando palavras de um 
livro de oração, de noivos fazendo seus votos na cerimônia de casamento, entre outras. 
Há um alto grau de dependência em arranjos feitos anteriormente, normalmente fixados 
em cenários escritos, ou em ritos transmitidos verbalmente de geração a geração. 
Ilustrativo dos cenários ficcionais, quetambém têm alta dependência de 
cenários escritos, elaborados por outras pessoas de antemão, é o uso da linguagem 
por um ator num ato teatral, representando Hamlet. A ficção representa um nível de 
atividade que se sobrepõe ao uso pessoal da linguagem no dia-a-dia das conversações. 
No entanto, não é raro, ver que a ficção se beneficia da realidade quando, por exemplo, 
os atores improvisam em sua atuação ou interagem com o público, etc. O que dizer, por 
exemplo, do cenário de linguagem utilizado pelos participantes de um reality show? O 
cenário ficcional parece configurar-se mais um suporte para o uso da linguagem, que 
ocorre sempre de forma pessoal, seja institucional, seja prescritiva, seja mediado pela 
escrita, como é o caso de um executivo que dita uma carta a sua secretária endereçada 
a um parceiro de negócios e faz uso característico do cenário mediado. Cenários 
ficcionais são, portanto, um caso em que a audiência se configura como espectadora 
sem interferência na atividade desenvolvida e o uso de linguagem concerne tão somente 
aos participantes envolvidos no suporte ficcional. 
Já em cenários privados, segundo Clark, as pessoas falam consigo mesmas sem 
a intenção de que os outros reconheçam o enunciado como um turno de fala. Um dos 
exemplos apresentados é quando se xinga um outro motorista por ter ultrapassado 
pela direita, mesmo sabendo que ele não pode ouvir. Mesmo nos cenários privados, 
o falar consigo mesmo, não deixa de ser dialógico. Quando digo um impropério 
contra alguém que não pode me ouvir, ainda assim me dirijo a esta exata pessoa, 
ou ao conjunto de todas as pessoas, que naqueles termos, possam representar o meu 
interlocutor ‘surdo’. 
Todos os demais cenários são, em nossa opinião, subtipos dos cenários pessoais 
mais básicos, já que envolvem, em maior ou menor grau, uma atividade verbal de 
interação face a face. Os cenários não-pessoais, por exemplo, não podem prescindir 
uma audiência interlocutora, ainda que relativamente se realizem sem a interação 
verbal freqüente entre falantes e ouvintes.
3. Métodos de Investigação em Lingüística Interacional
Princípios de Análise Etnometodológica da conversação • 
A Análise da Conversação preocupa-se particularmente com os recursos 
lingüísticos. Isto não significa fazer uma descrição geral de uma gramática, mas dos 
processos usados pelos falantes para construir o sentido, assegurar a compreensão 
mútua e tornar possíveis as atividades de linguagem ordinárias.
A organização da conversação pode ser descrita como uma realização coletiva, 
interna e metódica dos participantes. A organização dos recursos lingüísticos é 
coordenada com a própria organização da conversação, que se estrutura a partir de 
276
elementos como os turnos de fala, os tópicos discursivos, o sistema de participação 
dos falantes, e regras de simetria e assimetria, os papéis sociais de falantes e ouvintes, 
dentre outros.
Segundo Marcuschi (1986, p.), a Análise da Conversação teve seu início na 
década de 60 a partir da Etnometodologia e Antropologia Cognitiva e seu estudo 
era eminentemente organizacional, pois se ocupava da descrição das estruturas da 
conversação e seus mecanismos organizadores. A partir de J.J. Gumperz (1982) e da 
Sociolingüística Interacional, tendeu à observação de aspectos como a “especificação 
dos conhecimentos lingüísticos, paralingüísticos e socioculturais que devem ser 
partilhados para que a interação seja bem sucedida. Esta perspectiva ultrapassa a 
análise de meras estruturas e atinge os processos cooperativos presentes na atividade 
conversacional: o problema passa da organização para a interpretação” (grifo do 
autor).
A conversa, sob esta perspectiva, é organizada de modo que haja negociação entre 
os participantes, ou seja, para que realmente ocorra interação. Os diversos assuntos 
abordados pelos falantes são denominados, segundo a análise etnometodológica, 
‘tópicos’. Numa situação de interação os tópicos podem continuar, mudar ou 
simplesmente chegar ao fim, pela negociação dos falantes. Para falar sobre os 
‘tópicos’, os participantes organizam a conversação em ‘turnos’ que constituem a 
oportunidade que cada um tem de dar sua contribuição para a conversação, é ‘a vez’ 
que cada falante tem de se expressar sobre dado ‘tópico’. Os turnos geralmente não são 
distribuídos automaticamente aos falantes. Um interlocutor pode, em dado momento, 
querer tomar a palavra de quem está falando e, para isso, sobrepõe sua voz até que 
o outro ceda. Este procedimento é denominado ‘assalto ao turno’. Em ‘interações 
simétricas’, todos os participantes têm direitos iguais ao uso dos turnos; isto se verifica 
em conversações informais entre amigos ou familiares. Já em interações consideradas 
‘assimétricas’, como entrevistas de emprego, consultas médicas, e até em sala de aula, 
um dos integrantes da conversação possui os domínio sobre os turnos e os distribui a 
seu critério. Para Drew e Heritage (1992) as interações assimétricas são típicas dos 
ambientes institucionais e as relações entre profissionais e leigos se dão em termos 
de ‘pares adjacentes’, ou seja, os profissionais determinam os tópicos e controlam os 
turnos através de perguntas, as quais os leigos somente respondem, mas não opinam 
sobre tópico, nem fazem ‘assalto aos turnos’. Desse modo, a conversa é iniciada, 
mantida e concluída pela vontade de apenas um dos interlocutores.
organização seqüencial da falaa) 
Galembeck (2003) 1 aponta como principal característica da conversação “o 
fato de que os interlocutores alternam-se nos papéis de falante e ouvinte”. O turno 
conversacional seria então “a participação de cada um dos interlocutores”, ou seja, é o 
exercício da fala, que ocorre quando um interlocutor passa de ouvinte a falante.
O turno de fala constitui a organização de base da conversação e da interação 
em geral. Ele permite saber como os participantes realizam de forma local e conjunta 
a coordenação de suas condutas conversacionais. Essa coordenação é a condição 
fundamental das atividades socialmente organizadas (Cf. CLARK, 1992, 1996). 
A fim de procederem à tomada, transição e manutenção da fala, os 
interlocutores investigam o desenvolvimento do turno para identificar ou produzir, de 
1 GALEMBECK, P. T (2003). O Turno Conversacional. In: Preti, D. (Orgs). 
Análise de Textos Orais. São Paulo: Humanitas, FFLCH/USP, pp 65 – 92.
277
modo reconhecível, os pontos em que um turno termina e o outro começa. A tarefa de 
reconhecimento da finalização de um turno revela uma multiplicidade de dimensões 
sintáticas, pragmáticas, prosódicas, mas também gestuais, visuais e motrizes. 
Os turnos têm função essencialmente interacional. Os interlocutores 
acompanham o desenvolvimento do tópico conversacional através da inserção de 
elementos fáticos (mostrando o funcionamento do canal comunicativo), como os 
marcadores conversacionais: uhn, uhn, né? certo?; ou das tentativas de transição e 
tomada da fala. Nesses momentos, os falantes identificam momentos no turno do outro 
em que a colaboração do interlocutor é solicitada e assumem a vez na conversação. 
Muito freqüentes também são os assaltos ao turno – um falante invade a fala do seu 
interlocutor e toma a posse do turno.
As regras que regulam a organização dos turnos de fala são geralmente utilizadas, 
sem que os falantes necessariamente as mencionem: elas remetem a um saber tácito, que 
se espera que o falante adquira na prática de interação. O caráter ordenado da conversa 
se torna observável por sua manifesta obediência aos princípios organizacionais, mas 
também quando as expectativas normativas são violadas e pelas técnicas disponíveis 
para reparar as violações e restabelecer a ordem.
Um falante pode entender como inacabados os enunciados do outro falante e 
ler as hesitações que marcam o final do segmento do interlocutor como manifestando 
uma busca de palavras ou

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