Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
O POSITIVISMO DE COMTE Aula invertida TÓPICOS O surgimento do positivismo A definição e as linhas gerais do positivismo A concepção da ciência O Positivismo e o surgimento da psicologia. VÍDEOS O Positivismo de Auguste Comte https://www.youtube.com/watch?v=HfLpQ16WauM TEXTO Segue abaixo. Capit~lo dkcimo quint0 O socioIbgico e utilitarista 0 positivismo e o movimento de pensamento que dominou base parte da cultura europeia em suas expressbes nao s6 filosbficas, do positivismo mas tambem politicas, pedagogicas e literarias (e este o period0 hs os do verismo e do naturalismo) desde cerca de 1840 ate os inicios desenvolvimentos da primeira guerra mundial. 0 s traqos de fundo do ambiente da ci@ncia sociocultural que o positivismo interpreta, exalta e favorece silo: e a revolugSo uma substancial estabilidade politica, o process0 de industriali- industrial zaqilo e desenvolvimentos por vezes portentosos da ciCncia e da + 5 tecnologia. 0 marxismo interpretara de mod0 muito diferente a revoluqilo industrial e seus males (desequilibrios sociais, exploraqao do trabalho de menores etc.). 0 s positivistas nil0 ignorarilo estes males; tinham porem confianqa na forqa da ciCncia e do espirito cientifico, a seu ver mais que adequados a repor em seu lugar todo o corpo social. Eis os representantes mais influentes do positivismo: Au- guste Comte (1798-1857) na Franqa; John Stuart Mill (1806-1873) ~ P ~ ' ~ ~ ~ n t e s e Herbert Spencer (1820-1903) na lnglaterra; Jakob Moleschott do positivirmo (1822-1893) e Ernst Haeckel (1834-1919) na Alemanha; Roberto , Ardigo (1828-1920) na Italia. Embora se inserindo e se desenvolvendo em tradiqbes culturais e filosoficas diferentes (racionalismo cartesiano e lluminismo na Franqa; tradiqilo empirista, utilitarista e evolucionista na Inglaterra; naturalismo renascentista na Italia), o positivismo mostra, em suas manifestaqbes, traqos comuns que permitem fixar sua identidade como movimento cultural. 0s tracos a) 0 positivismo reivindica o primado da ciCncia: o unico teoricos conhecimento valido e o cientifico; o unico metodo para adqui- que conotam rir conhecimento e o das ciCncias naturais; este metodo consiste a "identidade" no encontro de leis causais e em seu controle sobre os fatos; tal do positivism0 metodo deve ser aplicado tambem ao estudo da sociedade, isto + 5 e, a sociologia. b) Passo a passo com o primado da ciCncia como instrumento cognoscitivo, temos a exaltaqilo da ciCncia como unico meio capaz de resolver, no curso do tempo, todos os problemas humanos e sociais anteriormente sofridos pela hu- manidade. 288 Sexta parte - 6 positivismo na cultura europCia da sociedade e progvessos da cizncia na kpoca do positivismo 0 positivismo representa um mo- vimento composite de pensamento que dominou grande parte da cultura europiia, em suas manifestaq6es filosoficas, politicas, pedagogicas, historiogrificas e literirias (a proposito de literatura, basta pensar no verismo e no naturalismo), de cerca de 1840 at6 quase 1914. Passado o furaciio de 1848, excetuan- do-se o conflito da Crimiia em 1854 e a guerra franco-prussiana de 1870, a era do positivismo foi ipoca de paz substancial na Europa e, ao mesmo tempo, ipoca da ypansiio colonial europiia na Africa e na Asia. Dentro desse quadro politico, a Europa consumou sua transformaqiio industrial, e os efeitos dessa revoluqiio sobre a vida social foram maciqos: o emprego das descobertas cientificas transformou todo o mod0 de pro- duqiio; as grandes cidades se multiplicaram; cresceu de forma impressionante a rede de intercimbios; rompeu-se o antigo equilibrio entre a cidade e o campo; aumentaram a produqiio e a riqueza; a medicina debelou as doenqas infecciosas, antigo e angustiante flagelo da humanidade. Em poucas palavras, a revoluqiio indus- trial mudou radicalmente o mod0 de vida. E os entusiasmos se cristalizaram em torno da idiia de progress0 humano e social irrefrei- vel, j i que, de agora em diante, possuiam-se os instrumentos para a soluqiio de todos os problemas. Para o pensamento da tpoca, esses instrumentos eram sobretudo a ciincia e suas aplicaq6es na industria, bem como no livre intercimbio e na educaqiio. Altm disso, no que se refere B ciincia, deve-se dizer que, no period0 que vai de 1830 a 1890, freqiientemente se entrela- qando com o desenvolvimento da industria (num entrelaqamento que niio foi unilateral), a ciincia registrou muitos passos adiante em seus setores mais importantes: na matemi- tica, entre outros, temos as contribuiq6es de Cauchy, Weierstrass, Dedekind e Can- tor; na geometria, as de Riemann, Bolyai, Lobacewskij e Klein; a fisica apresenta os resultados das pesquisas de Faraday sobre a eletricidade, e de Maxwell e Hertz sobre o eletromagnetismo; ainda na fisica, temos os trabalhos fundamentais de Mayer, Hel- mholtz, Joule, Clausius e Thomson sobre a termodinimica; o saber quimico 6 desen- volvido por Berzelius, Mendelejev e von Liebig, entre outros; Koch, Pasteur e seus discipulos desenvolvem a microbiologia, ob- tendo fxitos estrondosos; Bernard constr6i a fisiologia e a medicina experimental. Altm disso, i a ipoca da teoria evolucionista de Darwin. E os projetos tecnologicos encon- tram seu simbolo na Torre Eiffel de Paris e na abertura do canal de Suez. Substancial estabilidade politica, o process0 de industrializaqiio e o desenvolvi- mento da ciincia e da tecnologia constituem os pilares do meio sociocultural que o posi- t ivism~ interpreta, exalta e favorece. fi bem verdade que os grandes males da sociedade industrial niio tardariio a se fazer sentir (desequilibrios sociais, lutas pela conquista de mercados, condiqiio de misiria do proletariado, exploraqiio do trabalho do menor etc.). Esses males seriio diagnostica- dos pel0 marxismo em direqiio diferente da interpretaqiio do positivismo que, embora niio ignorando de mod0 nenhum tais males, pensava que eles logo desapareceriam, como fen6menos transitorios eliminiveis pel0 crescimento do saber, da educaqiio popular e da riqueza. 0 s pontos centvais da filosofia positivista 0 s representantes mais significativos do positivismo siio Auguste Comte (1798- 1857), na Franqa; John Stuart Mill (1806- 1873) e Herbert Spencer (1820-1903), na Inglaterra; Jakob Moleschott (1822-1893) e Ernst Haeckel(1834-1919), na Alemanha; Roberto Ardigb (1 828-1920), na Itilia. 0 positivismo, portanto, situa-se em tradiq6es culturais diferenres: na Franqa, inseriu-se no racionalismo, que vai de Descartes ao Iluminismo; na Inglaterra, ele se desenvolveu inserindo-se na tradiqiio empirista e utilitarista, entrelaqando-se, em seguida, com a teoria darwiniana da evolugiio; na Alemanha, assume a forma de cientificismo e de monismo materialista; na Itilia, com Ardigo, aprofunda suas raizes no naturalismo renascentista, embora d i seus frutos maiores, dada a situaqiio so- Capitulo de'cimo quinto - O positivismo soci016~ico e u t i l i t a ~ i ~ t a 289 cia1 da naqiio recim-unificada, no campo da pedagogia e tambim na antropologia criminal. Apesar de tais diversificaq6es, o positivismo apresenta traqos comuns que nos permitem sua identificaqiio como mo- vimento de pensamento. 1) Diversamente do idealismo, o posi- t ivism~ reivindica o primado da ci2ncia: nos conhecemos somente aquilo que as ciincias nos d io a conhecer, pois o unico me'todo de conhecimento e' o das ciBncias naturais. 2 ) 0 mitodo das ciincias naturais (identificaqiio das leis causais e seu domi- nio sobre os fatos) nio vale somente para o estudo da natureza, mas tambim para o estudo da sociedade. 3) Por isso, entendida como citncia dos "fatos naturais" que sPo as relaq6es huma- nas e sociais, a sociologia 6 frutoqualificado do programa filosofico positivista. 4) 0 positivismo niio apenas afirma a unidade do mitodo cientifico e o primado desse mitodo como instrumento cognosci- tivo, mas tambim exalta a ciincia como o unico meio em condiq6es de resolver, ao lon- go do tempo, todos os problemas humanos e sociais que at i entgo haviam atormentado a humanidade. 5 ) Conseqiientemente, a era do posi- t ivism~ i ipoca perpassada por otimismo geral, que brota da certeza de progress0 irre- freavel (por vezes concebido como fruto da engenhosidade e do trabalho humano e, por vezes, ao contririo, visto como necessiirio e automitico) rum0 a condiq6es de bem-estar generalizado em uma sociedade pacifica e penetrada pela solidariedade humana. 6) 0 fato de que a cisncia seja proposta pelos positivistas como o unico fundamen- to solido da vida dos individuos e da vida associada, de eia ser considerada como a garantia absoluta do destino progressista da humanidade, e de o positivismo se pro- nunciar pela "divindade" do fato, induziu alguns estudiosos a interpretarem o posi- t ivism~ como parte integrante da menta- lidade romBntica. Somente que, no caso do positivismo, seria exatamente a citncia a ser infinitizada. Assim, por exemplo, o positivismo de Comte, diz Kolakowski, "contim uma construqiio oniabrangente de filosofia da historia, que se consuma em visiio messiBnica" . 7) Essa interpretaqgo, porim, niio impediu que outros intirpretes (por exem- plo, Geymonat) vissem no positivismo temas fundamentais tornados da tradiqio iluminista, como a tendincia de consi- derar os fatos empiricos como a unica base do verdadeiro conhecimento, a f6 na racionalidade cientifica como solucio dos problemas da humanidade, ou aiida a concepqio leiga da cultura, entendida como construqiio puramente humana, sem dependtncias em relaqiio a pressupostos e teorias teologicas. 8) Sempre em linha geral, o positivis- mo (neste caso, John Stuart Mill i exceqgo) caracteriza-se pela confianqa acritica e, amiude, leviana e superficial, na estabilidade e no crescimento sem obstaculos da citncia. Essa confianqa acritica na cicncia chegou a se tornar fen6meno de costume. 9) A "positividade" da citncia leva a mentalidade positivista a combater as concepq6es idealistas e espiritualistas da realidade, concepq6es que os positivistas rotulavam como metafisicas, embora mais tarde tenham caido em metafisicas igual- mente dogmaticas. 10) A confian~a na citncia e na racio- nalidade humana, em suma, os traqos ilu- ministas do positivismo induziram alguns marxistas a considerarem insuficiente e at6 reducionista a usual interpretaqio marxis- ta, que s6 vti no positivismo a ideologia da burguesia da segunda metade do sku lo XIX. 290 Sexta parte - 0 positivisnzo m a cultura europCia 11. firrgrrste Colnte e o positivislno socioIbgico Animado desde a juventude com propositos de "regeneragao universal", sucessivamente pai oficial da sociologia, Auguste Comte (1798-1857) 6 o autor do Curso de filosofia positiva (1830-1842, em seis volumes). E e aqui que ele formula sua famosa lei dos tr& estagios, segundo a qua1 a humanidade, A humanidade assim como a psique dos individuos particulares, passa atraves de passa por trCs estbgios: tr& estdgios: a) estagio teologico; teologico, b) estdgio metafisico; meta fisico c) estag io positive. e positivo No estdgio teologico os fendmenos s%o interpretados como + § I "produtos da a@o direta e continua de agentes sobrenaturais, mais ou menos numerosos"; no estagio metafisico sao explicados com referCncia a essCncias, idCias, forgas abstratas como a "simpatia", a "alma vegetativa" etc.; no estagio positivo o homem procura descobrir, "com o uso bem combinado do raciocinio e da observagao", as leis efetivas "de sucessao e de se- melhanga" que presidem ao acontecimento dos fendmenos. * 0 objetivo da ciCncia - escreve Comte - e a pesquisa das leis, e isso por causa do fato de que "apenas o conhecimento das leis dos fendmenos [...I pode evidentemente levar-nos na vida ativa a modifica-10s para nossa "Ci@ncia, vantagem ". Ci&ncia, de onde previsao; previsao, de onde a@o. Na de ondepreviGo; esteira de Bacon e de Descartes, Comte afirma que sera a ciencia previskio, que fornecera ao homem o dominio sobre a natureza. Por con- de onde ac,+jon seguinte, d indispensavel conhecer a sociedade. Eis, entao, que + § 2 Comte propde a ciCncia da sociedade, a sociologia, como fisica social, que tem como tarefa a descoberta das leis que guiam os fendmenos sociais, assim como a fisica estabelece as leis dos fendmenos fisicos; e faz isso por meio de observagdes e compara$3es. A fisica social ou sociologia divide-se em estdtica social e dindmica social. A estatica social estuda as condigdes comuns que permitem a existencia das diversas sociedades no tempo: a sociabilidade fundamental do homem, a fami- lia, a divisao do trabalho e a coopera@o nos esfor~os etc. A lei Estatica social fundamental da estdtica social e a da liga@o entre os diversos e din6mica aspectos da vida social (politico, econdmico, cultural etc.). A di- social ndmica social compreende o estudo das leis de desenvolvimento + § 3 da sociedade. A lei fundamental da dini3mica social C a dos trbs est6gios. E eis um exemplo de aplicagao desta lei: o feudalism0 C estdgio teol6gico; a revolugao (que comega com a reforma protestante e termina com a revolu@o francesa) 6 estagio metafisico; a sociedade industrial 6 estagio positivo. Entre as ciCncias, a sociologia e a mais complexa, uma vez Classifica@o que - na hierarquia estabelecida por Comte e que quer ser uma e hjerarquia ordem Idgica, histdrica e pedagdgica - pressupde a biologia, a dasciencias qua1 pressupde a quimica, que, por sua vez, pressupde a fisica. + § 4 Nesta perspectiva, a filosofia deve "determinar exatamente o espirito de cada ciiincia, descobrir suas relagdes, reassumir, se pos- sivel, todos os seus principios proprios em numero minimo de principios comuns, conforme o metodo positivo". Capitulo decimo quinto - O positivismo socioIbgico e utilitarista 291 A regeneragao da sociedade - que, sobre a base do conhecimento das leis sociais, Comte propoe no Sistema de politica positiva (1851-1854) - assume as formas de uma religiZio, onde a Deus se substitui a humanidade, ao amor de Deus o da humanidade. Humanidade que e o conjunto de todos os homens vivos, dos mortos e dos que devem ainda nascer. 0 s individuos se regene- ram, dentro da humanidade, como as celulas de um organismo. Substituir 0 s individuos sZio o produto da humanidade: esta deve ser vene- rada como outrora o eram os deuses pagaos. E, fascinado pelo de oeu, universalismo do catolicismo, Comte propde sua religiao da hu- pel0 amor manidade como copia da ordem da lgreja catolica: com dogmas a humanidade (filosofia positiva, leis cientificas), batismo secular, crisma secular + § 5 etc.; com templos leigos (institutos cientificos) e um papa positivo que vigiara o desenvolvimento da indhtria e a utilizaqZio pratica das descobertas. Havera nomes novos para os meses e para os dias. A mulher e considerada o anjo da guarda positivo. , , , , ~ J\ lei dos tr&s estA9ios II A Augusto Comte foi o fundador do po- si t ivism~ francts. Nasceu no ano de 1798 em Montpellier de familia modesta, "emi- nentemente catolica e monirquica", foi discipulo e secretirio (e, depois, decidido antagonjsta) de Saint-Simon, aluno da famosa Ecole Polytechnique (e, aqui, niio devemos esquecer a funqiio de modelo da Ecole Polytechnique). Teve suficiente fami- liaridade corn a matemitica. Foi leitor dos empiristas ingleses, de Diderot, d'Alembert, Turgot e Condorcet (mais tarde, "por higiene mental", ler5 o menos possivel). Foi o pai oficial da sociologiae, em certos aspectos, o expoente mais representativo da orientaqgo do pensamento positivista em seu conjunto. Em seu itinerario intelectual e moral Comte escreve: "Ainda aos 14 anos eu j i sentia a necessidade fundamental de uma reestruturaqiio universal, politica e filosofica ao mesmo tempo, sob o impulso de salutar crise revolucionAria, cuja fase principal precedera meu nascimento. A influtncia luminosa de uma iniciaqiio matemitica rece- bida na familia, desenvolvida felizmente na ~ c o l e Polytechnique, fez-me instintivamente pressentir a unica via intelectual que podia realmente conduzir a essa grande renova- $50". E acrescenta que em 1822 ele via claro seu projeto filos6fico "sob a inspiraqiio constante de minha grande lei relativa ao conjunto da evoluqiio humana, individual e coletiva": a lei dos trts estigios. Trata-se da lei segundo a qua1 a huma- nidade, conforme a psique de cada homem, passa por trts estigios: a) o teologico; b) o metafisico; c) o positivo. Escreveu Comte no Curso de filosofia positivista (1 830-1 842): "Estudando o de- senvolvimento da inteligencia humana [.. .] desde sua primeira manifestaqiio at6 hoje, creio ter descoberto uma grande lei funda- mental [...I. Esta lei consiste no seguinte: cada uma de nossas concepq6es principais e cada ram0 de nossos conhecimentos passam necessariamente por trts estigios te6ricos diferentes: o estigio teol6gico ou ficticio, o estAgio metafisico ou abstrato e o estigio cientifico ou positivo [...I. Dai trts tipos de filosofia ou de sistemas conceituais gerais sobre o conjunto dos ferGmenos, que se excluem reciprocamente. 0 primeiro C um ponto de partida necessirio da inteligtncia humana; o terceiro C seu estado fix0 e de- finitivo; o segundo destina-se unicamente a servir como etapa de transiqiio". a) No estigio teologico, os fen6menos S ~ O vistos como "produtos da agio direta e continua de agentes sobrenaturais mais ou menos numerosos "; b) no estigio metafisico, S ~ O explicados em funqiio de esszncias, idCias ou forqas abstratas (0s corpos se uniriam graqas A 66 ' simpatia"; as plantas cresceriam em virtude da presenqa da "alma vegetativa"; o opio, como ironizava Moliih-e, adormece porque possui a "virtude soporifera"); c) mas C somente no "estigio positivo que o espirito humano, reconhecendo a E Lei dos trBs estagios. Comte de- nomina sua proposta da lei dos tr& estagios "minha grande lei", lei que se refere "ao conjunto da evolugao humana, individual e coletiva". A humanidade, como tambem a psique dos individuos particulares, passa atraves de trCs estdgios: a) o teolo- gico; b) o metafisico; c) o positivo ou cientifico. No Curso de filosofia positiva Comte afirma: "Estudando o desenvolvimen- t o da inteligencia humana [...I desde sua primeira manifestaqao ate hoje, creio ter descoberto uma grande lei fundamental [...I. Esta lei consiste no seguinte: cada uma de nossas concepgaes principais, cada ram0 de nossos conhecimentos passa neces- sariamente por trCs estagios teoricos diferentes: o estagio teologico ou fictlcio; o estagio metafisico ou abs- trato; o estagio cientifico ou positivo [...I. Dai trCs tipos de filosofia, ou de sistemas conceituais gerais, sobre o conjunto dos fendmenos, que se excluem reciprocamente. 0 primeiro 6 um ponto de partida necessario da inteligencia humana; o terceiro e seu estagio fixo definitivo; o segundo destina-se unicamente a servir como etapa de transigfio". No estcigio teofdgico os fen6menos sao explicados como produtos da ag8o direta de agentes sobrenaturais; no estcigio metafisico os agentes sobre- naturais silo substituidos por forgas abstratas, esshcias; 6 no estdgio po- sitivo "que o espirito humano, reco- nhecendo a impossibilidade de obter conhecimentos absolutos, renuncia a perguntar-se qua1 seja a origem e o destino do universo, quais sejam as causas intimas dos fendmenos, para procurar apenas descobrir, com o uso bem combinado do raciocinio e da observasao, suas leis efetivas, isto 6, suas relaqdes invariaveis de sucessao e de semelhansa". Esta 6, portanto, a lei dos trcis estagios, a pedra angular do edificio filosofico de Comte; lei que, a seu ver, valeria - como se repete - para o desenvol- vimento de toda a historia da huma- nidade, como tambem para o desen- volvimento da vida dos individuos particulares: todo homem e teologo em sua infbncia; e metafisico em sua juventude; e fijico em sua maturidade. impossibilidade de obter conhecimentos absolutos, renuncia a perguntar qual C sua origem, qual o destino do universo e quais as causas intimas dos fen6menos para procurar somente descobrir, com o uso bem combina- do do raciocinio e da observaqiio, suas leis efetivas, isto C, suas relaqBes invariiveis de suces+o e de semelhanqa". E essa, portanto, a lei dos trts estigios, o conceito-chave da filosofia de Comte. Lei que encontraria confirmaqio tanto no desenvolvimento da vida dos individuos (todo homem C te6logo na sua infincia, C metafisico em sua juventude e C fisico em sua maturidade), como na hist6ria humana. At6 sem conhecer Vico nem Hegel, Comte constr6i com sua lei dos trts estigios uma grandiosa filosofia da h id r i a , que se apre- senta como o es toda a evoluqiio da humanidade. Agora, portanto, estamos no estigio positivo. 0 s mitodos teologicos e metafisi- cos niio siio mais empregados por ninguCm, exceto no campo dos fen6menos sociais, observa amargamente Comte no Curso de filosofia positiva, "embora sua insuficihcia a esse respeito ja seja plenamente sentida por todos os espiritos um pouco evoluidos". Eis, portanto, salienta Comte, "a grande e unica lacuna que se trata de preencher para construir a filosofia positiva". A filosofia positiva, portanto, deve submeter a socie- dade a rigorosa pesquisa cientifica, ja que somente uma sociologia cientifica pode "ser considerada como a unica base solida para a reorganizagio social, que deve encerrar o estado de crise em que se encontram h i longo tempo as na@5es mais civilizadas". N5o se podem resolver crises sociais e politicas sen1 o devido conhecimento dos fatos sociais e politicos. E C por essa razio que Comte vE como tarefa extremamente ur- gente a do desenvolvimento da fisica social, vale dizer, da sociologia cientifica. Mas, antes de mais nada, em que consiste a ci@ncia para Comte? Na opiniio dele, o objetivo da cicncia esta na pesquisa das leis, j i que "s6 o conhecimento das leis dos fen6menos, cujo resultado constante C o de fazer com que possamos prevt-los, evidentemente, pode nos levar, na vida ativa, a modifici-10s em nosso beneficio". Capitulo de'cimo quinto - 6 positivisrno s o c i o k ~ i c o e utilitarista 293 Auguste Comte ( 1 798-1 8 57) for o pal ofictal da socrologza e o expoente mars representatzvo d o posztruzsmo. A lei C necessiria para prever, e a previsiio C necessiria para a aqio do homem sobre a natureza. Afirma Comte: "Em suma, ciincia, logo previsiio; previsiio, logo a@o: essa C a f6rmula simples que expressa de mod0 exato a relaqiio geral entre a ciincia e a arte, tomando esses dois termos em sua acepqiio total". Na trilha de Bacon e Descartes, Comte pensa que a ciincia C que deve fornecer ao homem o dominio sobre a natureza. E, no entanto, ele niio C em absoluto de opiniiio que a cicncia, essencialmente e por sua natureza, esteja voltada para os problemas prhticos. Comte C claro sobre a natureza teorica dos conhecimentos cientificos, que ele se apressa a distinguir claramente dos conhecimentos tCcnico-praticos. A esse respeito, chega a citar uma consideraqiio de Condorcet: "0 marinheiro, preservado do naufragio graqas a observaqiio exata da lon- gitude, devesua vida a uma teoria concebida dois mil anos antes por homens de ginio, que tinham em vista simples especulaq6es geomttricas". Mas Comte tambCm niio C empirista de tip0 antigo, que cuida somente dos dados de fato e exclui as teorias. Ainda no Curso de filosofia positiva, podemos ler: "Nos reconhecemos que a verdadeira ciincia [. . .] consiste essencialmente de leis e n io mais de fatos, embora estes sejam indispenshveis para o seu estabelecimento e sua sanqiio". A pura erudiqio consiste em fatos sem lei; a verdadeira ciincia consiste em leis controla- das com base nos fatos. E esse controle com base nos fatos exclui da ciincia toda busca de essincias e causas dtimas metafisicas. Essas idCias de Comte sobre a doutrina da ciincia influenciaram o pensamento pos- terior em virtude de sua clareza e validade. De qualquer modo, porCm, ja em alguns tre- chos do Curso de filosofia positiva e depois, sobretudo, no Sistema de politica positiva (1851-1854), Comte enrijece sua imagem de ciincia, quase a ponto de absolutiza-la: 294 Sexta parte - O positivismo na cultura europkia condena pesquisas especializadas, inclusive experimentais, o uso excessivo do cilculo e qualquer pesquisa cientifica cuja utilidade nHo seja evidente. Por isso, em sua opiniHo, deve-se confiar a citncia nHo aos cientistas, mas aos "verdadeiros fil6sofos", ou seja, a todos os que estio "dignamente dedicados ao sacerdocio da humanidade". 0 desenvolvimento posterior das citn- cias desmentiu essas idtias de Comte. Altm disso, urn conhecimento que hoje parece infitil pode se tornar necesshrio amanhi. Entretanto, no sistema de Comte, um saber estivel e bloqueado esta em funqiio de uma ordem social estivel. fi sociologia COMO fisica social Para passar de uma sociedade em crise para a "ordem social", h i necessidade de sa- ber. 0 conhecimento C feito de leis provadas com base nos fatos. Desse modo, C precis0 encontrar as leis da sociedade se quisermos resolver suas crises e prever o desenvolvi- mento futuro da convivhcia social Portanto, para a sociologia, atravCs do raciocinio e da observaqio, t possivel esta- belecer as leis dos fen6menos sociais, como a fisica pode estabelecer as leis que guiam os fen6menos fisicos. Comte divide a sociologia, ou fisica social, em: a) estatica social; b) dinhnica social. a) A estitica social estuda as condiqoes de existencia comuns a todas as sociedades em todos os tempos. Tais condi~oes siio a sociabilidade fundamental do homem, o nucleo familiar e a divisio do trabalho, que se concilia corn "a cooperaqHo dos esfor- qos". A lei fundamental da estitica social t a conex20 entre os diversos aspectos da vida social, de mod0 que, por exemplo, uma constituiqHo politica n io t independente de fatores como o econ6mico e o cultural. Rctrato de Conzte 2 mesa de tmbnlho.
Compartilhar