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TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Registro: 2016.0000336148 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 1007880-14.2015.8.26.0127, da Comarca de Carapicuíba, em que é apelante ANDERSON MARCELO ROSA (JUSTIÇA GRATUITA), é apelado IGREJA EVANGÉLICA ASSEMBLÉIA DE DEUS NO IPIRANGA. ACORDAM, em 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento em parte ao recurso, para afastar a prescrição e decadência e julgar improcedente o pedido. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ALEXANDRE LAZZARINI (Presidente sem voto), ANGELA LOPES E PIVA RODRIGUES. São Paulo, 17 de maio de 2016 JOSÉ APARÍCIO COELHO PRADO NETO RELATOR Assinatura Eletrônica TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 1007880-14.2015.8.26.0127 - Carapicuíba - D 2 APELAÇÃO Nº 1007880-14.2015.8.26.0127 APELANTE: ANDERSON MARCELO ROSA APELADA: IGREJA EVANGÉLICA ASSEMBLEIA DE DEUS NO IPIRANGA JUÍZA: ROSSANA LUIZA MAZZONI DE FARIA VOTO Nº 9.269 APELAÇÃO Ação Declaratória de Nulidade de Doação c.c Indenizatória por Danos Morais Alegação de doação de direitos possessórios, sem reserva de parte ou renda suficiente para subsistência - Sentença reconhecendo prescrição e decadência com relação ao pedido de anulação e de improcedência do pedido de danos morais Inconformismo do autor, alegando que a demanda não é anulatória, mas declaratória de nulidade, fundada no artigo 548 do Código Civil, pelo que não decorreu o prazo prescricional previsto no artigo 205 do Código Civil, que o instrumento de doação não atende a forma prescrita em lei e que é devida a indenização por danos morais, ante os fatos desabonadores que lhe foram imputados em contra notificação Pedido de declaração de nulidade, incidência do artigo 205 do Código Civil, inocorrência da prescrição Não configurada a hipótese do artigo 548 do CC Termos da contra notificação dirigida ao autor incapazes de causar danos morais Recurso parcialmente provido para, afastado o reconhecimento da decadência e da prescrição, julgar a ação integralmente improcedente. Vistos. TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 1007880-14.2015.8.26.0127 - Carapicuíba - D 3 Trata-se de Apelação interposta contra sentença proferida pela MM. Juíza da 4ª Vara Cível da Comarca de Carapicuíba, em Ação Declaratória de Nulidade de Doação cumulada com Indenizatória por Danos Morais proposta por ANDERSON MARCELO ROSA contra IGREJA EVANGÉLICA ASSEMBLEIA DE DEUS NO IPIRANGA, que reconheceu a prescrição e a decadência do pedido de anulação do negócio jurídico, e julgou improcedente o pedido de indenização por dano moral, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em R$ 1.000,00 (hum mil reais), observado o artigo 12 da Lei nº 1.060/50. Apela o autor, pugnando pela reforma da sentença, para que a ação seja julgada procedente, alegando, basicamente, que a presente demanda não é anulatória, mas declaratória de nulidade, fundada no artigo 548 do Código Civil, pelo que não decorreu o prazo prescricional, que é aquele previsto no artigo 205 do Código Civil, que o instrumento de doação não atende a forma prescrita em lei e que é devida a indenização por danos morais, ante os fatos desabonadores que lhe foram imputados na contra notificação a ele dirigida pela ré. Recurso tempestivo, isento de preparo e contrarrazoado. É o breve relatório do necessário. O recurso comporta parcial provimento. Respeitado o entendimento da MM. Juíza “a quo”, não se vislumbra no caso em tela a decadência, tampouco a prescrição por ela reconhecidas na r. sentença apelada. TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 1007880-14.2015.8.26.0127 - Carapicuíba - D 4 Da leitura da petição inicial, vê-se que tendo o autor firmado “Instrumento Particular de Cessão de Direitos de Doação de Posse”, de dois imóveis em favor da ré, aos 30 de setembro de 2011, busca pela presente ação a declaração de nulidade de dita doação, com fulcro no artigo 548 do Código Civil, norma do seguinte teor: “Art. 548. É nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador.” Ora, se assim é, inaplicável ao caso “sub judice” a decadência prevista no artigo 178, inciso II, do Código Civil, pois a pretensão judicialmente deduzida não foi baseada em erro ou dolo na realização do negócio jurídico, enfim, em mero vício de consentimento, mas sim no direito indisponível de viver com um mínimo de dignidade, a impor a incidência do prazo prescricional de 10 (dez) anos, assinado no artigo 205 do mesmo “Codex”. Nesse sentido, como se verá a seguir, é o escólio de ULDERICO PIRES DOS SANTOS, que ao comentar o artigo 1.175 do Código Civil de 1916, inteiramente repetido no artigo 548 do Código Civil de 2002, conclui pela aplicação do prazo vintenário então previsto para as ações pessoais no artigo 177, diminuído para 10 (dez) anos no artigo 205 do atual Estatuto Substantivo: “Doação que extrapola as regras dos arts. 1.175 e 1.176 do Código Civil A doação de todos os bens, sem o doador reservar parte deles para a sua subsistência, ou provar que possui renda suficiente para viver, é nula de pleno direito. E também é se ele doar mais do que podia dispor em testamento na ocasião da liberalidade TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 1007880-14.2015.8.26.0127 - Carapicuíba - D 5 (arts. 1.175 e 1.176 do Código Civil). As doações feitas ao arrepio destes textos são nulas, porque ofendem ditas normas legais. O prazo para anulá-las é o de 20 anos contados do dia imediato àquele em que foram feitas.” (Obra do autor citado, “PRESCRIÇÃO DOUTRINA, JURISPRUDÊNCIA E PRÁTICA”, Editora Forense, 2ª edição, página 247, grifei). Importante frisar, que quando do comentário acima transcrito, o teor do artigo 178, parágrafo 9º, alínea “b”, foi substancialmente repetido no artigo 178, inciso II, do atual Código Civil. Portanto, levando-se em conta que a presente ação foi distribuída aos 9 de outubro de 2015, e que o “Instrumento Particular de Cessão de Direitos de Doação de Posse”, cuja declaração de nulidade é perseguida foi firmado pelas partes em 30 de setembro de 2011, não há que se falar em decadência ou prescrição. Pois bem, presente a hipótese prevista no parágrafo 4º do artigo 1.013 do Novo Código de Processo Civil, passo à analise do mérito propriamente dito. E, nesse passo, forçoso concluir que o autor não tem razão em seus pleitos. Com efeito, não se observa a alegada nulidade da doação efetuada pelo autor à ré, pois em momento algum do processado restou comprovado que ele, quando da doação, não auferisse renda suficiente para a sua subsistência. Pelo contrário, tendo-se em mente que epigrafada doação foi levada a efeito no ano de 2011, e que o autor buscou sua declaração de nulidade TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 1007880-14.2015.8.26.0127 - Carapicuíba - D 6 apenas no ano de 2015, ou seja, quatro anos após o ato de disposição de vontade, há que se inferir, sem margem a dúvidas, que ele possuía condições de prover o seu próprio sustento, independentemente da perda dos direitos possessórios doados, o que, inclusive, encontra apoio nos documentos por ele mesmo apresentados as fls. 52/59. Trata-se, na verdade, de arrependimento tardio por parte do autor da doação efetuada, irrelevante, por si só, para determinar a aplicação do artigo 548 do Código Civil.Por fim, com relação ao pedido indenizatório por danos morais, correta a r. sentença, pois os termos da contra notificação enviada ao autor, ora apelante, por ele destacados na petição inicial, não constituem, evidentemente, como bem observou a MM. Juíza, “ato ilícito, uma perturbação nas relações psíquicas, na tranquilidade, passível assim de indenização” (verbis, cfr. fls. 263). Neste sentido, vale mencionar o ensino de SERGIO CAVALIERI FILHO: “Dissemos linhas atrás que dano moral, à luz da Constituição vigente, nada mais é do que agressão à dignidade humana. Que consequências podem ser extraídas daí? A primeira diz respeito à própria configuração do dano moral. Se dano moral é agressão à dignidade humana, não basta para configurá-lo qualquer contrariedade. Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação nº 1007880-14.2015.8.26.0127 - Carapicuíba - D 7 desequílibrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos.” (“Programa de Responsabilidade Civil”, Sérgio Cavalieri Filho, 5ª. Edição, Malheiros Editores, p. 93). Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso, para afastadas a decadência e prescrição reconhecidas na sentença, julgar a ação integralmente improcedente, mantidos os ônus da sucumbência aplicados. JOSÉ APARÍCIO COELHO PRADO NETO Relator
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