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HOMOSSEXUALIDADE MOLECULAR


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CENTRO UNIVERSITÁRIO METODISTA IPA
CURSO DE PSICOLOGIA
Leila Lemos da Silva
Margarete Guarnieri Ramos
Patrícia Lopes
Suelen Schmitt
DELEUZE E A “HOMOSSEXUALIDADE MOLECULAR” -
(Paul Beatriz Preciado)
Porto Alegre
2018
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho pretende trazer à reflexão alguns mecanismos que operam no processo de normalização ou de regulação da subjetividade com relação à sexualidade, e as formas produzidas de resistências a essa normalização através das posições dos sujeitos-corpo, em aproximação à noção de “homossexualidade molecular”, um dos conceitos esquizoanalíticos de Deleuze mais importantes no estudo de gênero e sexualidade.
Utilizamos como referência o livro de Paul Beatriz Preciado, importante filósofo espanhol no cenário de debates sobre a teoria queer e estudos de gênero, “Manifesto Contrassexual - Práticas Subversivas de Identidade Sexual” publicado na França em 2000, com enfoque no capítulo “Exercício de leitura contrassexual - Da filosofia como modo superior de dar o cu”.
A partir da modernidade, e hoje com mais força no mundo contemporâneo, o imaginário heteronormativo trata de organizar nossa sociedade através de um conjunto de rituais que vão passar necessariamente por uma lógica marcada pela ideia binária entre homem e mulher, masculino e feminino. Muitas ciências, a exemplo do Direito e da maioria das teorias existentes no campo da Psicologia, afirmam o modelo heteronormativo como pressuposto em uma concepção de gênero que é focada no sexo biológico. Isso mostra o quanto se produz de um conhecimento voltado para esse imaginário heterossexual que produz intensa heteronormação da vida, produzindo o conceito de heteronormatividade.
Segundo Paula Nogueira Pires Batista (2016) - mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Goiás (PPGAS/UFG), Preciado, em “Manifesto Contrassexual”, descreve o pênis como origem da diferença sexual, sendo este levado à morte e consigo o sistema tradicional de representação sexo/gênero. Observa ainda que o filósofo espanhol fala sobre o dildo, um objeto de plástico, marginal, que supostamente poderia substituír o pênis, fazendo referência a esse que é colocado central e imprescindível para o sexo. Avança comentando que os trabalhadores do ânus seriam os proletários de uma possível revolução contrassexual, como forma de desprivatizá-lo.
No contexto da política da diversidade, a resistência é uma produção que sai na perpendicular de um movimento identitário. E como forma de discutir sobre o tema no contemporâneo, apresenta-se o depoimento de Triz, rapper paulista transgênero não binário, e sua arte como expressão e movimento de resistência.
2. O CONCEITO DE “HOMOSSEXUALIDADE MOLECULAR”
A “homossexualidade molecular” de Deleuze, segundo Paul Beatriz Preciado (2014, p. 173), é um conceito que se insere de forma tática em O Anti-Édipo (2010, p. 97) e utilizados por Deleuze e Guattari ao se afirmarem homossexuais moleculares. Na transcrição de um trecho do citado livro, é possível observar a analogia feita pelos autores entre sexualidades e os conceitos de molar e molecular: molar é relacionado a heterossexualidade, na forma como é estatisticamente verificada; está naquilo que limita os objetos e os sujeitos como representação, através de seus sistemas de referência. A “homossexualidade molecular”, por sua vez, é colocada como correspondente ao devir, ao possível dos fluxos, das transições de fases, das intensidades e da segmentaridade flexível, as quais tornam possível o caminho da transversalidade – travessia molecular dos estratos e dos níveis, operada pelas diferentes espécies de agenciamentos.
Para melhor exemplificar o conceito de molar: refere-se à segmentaridade dura e remete ao que está cristalizado e estático na forma de uma representação que atende a determinadas demandas de localização do sujeit. Está presente em determinadas instituições, como a família, bem como nas categorizações identitárias, profissão, sexo, partido ou classe.
Já o conceito de molecular, ao contrário, associa-se à noção de uma segmentaridade flexível, de fluxos e devires e aponta para a abertura, para novas formas de visibilidades, não se deixando reduzir à identidade.
Sobre a homossexualidade molecular, Preciado quer entender que tipo de operações físicas a “homossexualidade molecular” produz enquanto conceito e lança a questão que não é respondida: Qual é a relação entre “homossexualidade molecular”, enquanto conceito, e o mantra repetido “devir mulher”? Que tipo de operações físicas a “homossexualidade molecular” produz enquanto conceito?
Segundo Liblik (2016), o citado filósofo espanhol busca compreender a relação entre “homossexualidade molecular” e o devir mulher através dos contornos que Deleuze dá a esses conceitos, na ideia de que a “homossexualidade molecular” não se restringe a relacionamentos entre homens com homens e de mulheres com mulheres, pois há homens que procuram o que há de masculino na mulher, e a mulher, por sua vez, procura o que há de feminino no homem. É o que representa para Deleuze a transversalidade.
3. OS DEVIRES
Para melhor compreender a ideia central do que se discute neste trabalho, é necessário identificar o significado do conceito de “devir”.
Para Gilles Deleuze e Félix Guattari, há vários devires, como por exemplo, o devir animal, devir mulher, devir invisível, devir molécula, devir criança, etc. São linhas de fuga que vão de encontro às essências e às significações. É onde se movimentam os afetos (Deleuze; Guattari, l977, p. 20). É sempre um processo, sem começo e nem fim; um espaço intermediário de ruptura a todas as identidades e oposições binaristas. O devir não define nem separa o que é homem do que é mulher, o que é criança ou adulto, humano ou inumano, orgânico ou inorgânico. Ao contrário, o devir se dá pela união, pela ideia de multiplicidade infinita do corpo e por novas estéticas de existência. A realidade molecular do desejo é transsexual pois desafia as constituições binárias do sexo (DELEUZE; GUATTARI, 1976).
3.1 O DEVIR MULHER
“Todos os devires começam e passam pelo devir mulher. É a chave dos outros devires” (D&G, Mil Platôs 4 citado por TRINDADE,2016).
Ao articular a noção de “homossexualidade molecular” e “devir mulher”, de Deleuze e Guattari, Preciado aponta para a possibilidade de que se possa pensar ou escrever transversalmente sobre fenômenos sem necessariamente ter vivido aquela experiência. Definindo-se como” homossexual molecular”, Deleuze aciona o conceito de transversalidade, que permite se pensar ou escrever sobre determinados fenômenos sem tê-los vivido, tratando-se de possibilidades de experiência de devir” (BATISTA, 2015). 
 A transversalidade, enquanto prática política e teoria, transforma-se em uma possibilidade para experiências de “devir”. A homossexualidade, o alcoolismo e a drogadição estão na ordem do “devir” e, para Deleuze, são grupos ou guetos dos quais ele não tinha necessidade de frequentar, já que obtinha efeitos análogos aos deles em si mesmo, mas por outros meios. Ele criticava a natureza desses grupos, dizendo que o problema estava nas relações transversais em que os efeitos produzidos pelo homossexualismo ou pela droga sempre poderiam ser produzidos por outros meios. Assim, ele dissocia a relação transversal como algo da comunidade ou do grupo. Para ele, estes lugares produzidos em torno da identidade não servem como uma verdade da enunciação. A comunidade homossexual, portanto não é capaz de enunciar a verdade sobre a enunciação de um “nós” assim como a identidade homossexual também não pode servir como enunciação da verdade do “eu”.
O devir mulher, apesar de apresentar-se composto na forma feminina, não é exclusivo da mulher. Ele é também um devir através do qual o homem, ou quem quer que esteja aberto a novos fluxos de experimentação, é capaz de transformar abrindo-se para a variação. 
Abaixo, transcrevemos a percepção do psicólogoe filósofo Rafael Trindade quanto ao conceito do devir mulher, considerando sua potência política:
[...] força de um devir está no que passa entre, no que escorre destas determinações de poder. “O devir mulher contamina a forma homem e também a forma mulher. Aceleração, velocidade, fluxos, o devir não se faz diante de nossos olhos, mas em nossos corpos (TRINDADE, 2016).
 Na sequência, o filósofo resssalta a forma molar do modelo dominante do homem ocidental e a sua desterritorialização pela mulher:
[...] O homem procura subordinar a forma mulher, já a mulher, faz variar a forma homem. O devir mulher abala as estruturas do ser homem, por isso a linha molar traça um plano definido de modelos dominantes: homem, branco, adulto, racional, heterossexual, trabalhador, ocidental. Cada vez mais fixo, cada vez mais poder, cada vez menos espaço para o fora, o indefinido, a vida. Deleuze e Guattari definem o devir mulher como a chave para todos os outros devires, ela é a porta de entrada para qualquer devir minoritário, a mulher é a primeira a desterritorializar o homem e fazer fugir suas formas binárias e hierárquicas (TRINDADE, 2016).
 
3.2 O DEVIR BICHA
Não há nada de natural na nossa concepção de gênero, é uma produção intensa social que vai construindo e ligando ponto por ponto o nosso desejo por um sexo, sejas ele o sexo oposto, seja ele o mesmo sexo. O problema da heteronormatividade é que a possibilidade do gênero como variação, como variabilidade, é retirada de cena porque se o gênero pode variar, é somente dentro do mecanismo heteronormativo.
Gênero é algo inacabado e que se expressa de diferentes formas, é um estilo de existência, não está dentro de um padrão, não segue uma norma, não obedece uma categoria por isso é difícil categorizar as expressões de gênero que existem no cotidiano.
Ao se operar na dimensão da categorização, “sou gay”, “sou lésbica”, sou “bi” se está operando na lógica de que precisamos o tempo inteiro produzir o armário. O processo de heteronormalização colabora para instituir ou para localizar o indivíduo no contexto atual. E o indivíduo localizado (Foucault) marcado, tipificado, é presa fácil para o controle contemporâneo. Aquilo que escapa ao controle, que é próprio da variação do gênero, funciona como mecanismo de resistência, como prática política de produção de novas formas de relação de si consigo.
O devir gay, ou devir bicha, na linha do Guattari e de Deleuze, é uma ideia de potência que constitui um corpo sem órgãos, sem rosto. Ela rompe com uma forma de governo da existência e que é por excelência heterossexista; então o devir gay não necessariamente é um devir dos gays porque muito gay, lésbica, travesti, homossexual não consegue se encaixar no devir gay, assim como muitos heterossexuais encontram em si mesmo neste devir gay. Há uma vulnerabilidade geral que opera sobre os afetos. Há uma pornografia que ensina a transar, que faz com que a nossa vida erótica sexual seja mecânica, que seja papai mamãe, que faz com que não se encontre prazer, embora se imagine a sexualidade com o corpo.
No registro do heterossexismo e na ideia da heterossexualidade compulsória, a mulher é desvalorizada frente a figura do homem e tomada como objeto. Então, as mulheres se engajaram no devir bicha porque estes lugares sociais foram historicamente cristalizados em uma experiência do ser mulher na sociedade. Quando se coloca em questão um campo problemático, o que se abre é o devir, pelo instalar de um campo onde estão naturalizados o machismo, a servidão das mulheres, a ideia de que pobre é sujo, e onde há uma pornografia sexual que mecaniza nossa relação com o sexo.
4. CONTRASSEXUALIDADE
 A contrassexualidade é um movimento em direção àquilo que não é identitário. A partir da escrita de O Anti-Édipo, de Deleuze e Guattari, é possível notar um conceito importante para a Esquizoanálise que é a ideia do corpo sem órgãos; permite entender o que seja contrassexualidade, conceito que advém da noção Foucaultiana como um mecanismo de resistência. É, portanto, o corpo construído socialmente, é o corpo cujos órgãos desempenham uma função, uma missão. Por exemplo: é missão do pênis a reprodução; é missão do coração o amor; do pulmão a respiração. O corpo com órgãos é definido, caracterizado, prescrito, é um corpo cujos órgãos detêm uma função específica. A ideia de um corpo sem órgãos significa desertar desse corpo com órgãos, que funciona como um mecanismo. O desertar do corpo com órgãos é um mecanismo de resistência. E desertar da sexualidade significa compor um corpo sem órgãos. A contrassexualidade é a composição daquilo que não é, que está em “devir”, que pode vir a ser. A sexualidade foi historicamente construída e ela constitui um corpo sem órgãos. É uma prática definida de modos de ser, de exercício da sexualidade, do sexo, a qual tem a reprodução por finalidade. Desde o final do século XVIII e ao longo do século XIX, a prática ou a ciência sexual vai se ocupar de construir órgãos para serem experimentados, o que torna a experimentação da vida muito limitada. O processo de subjetivação advindo dos discursos das ciências sexuais traz a consequência de que os sujeitos se pensem a partir de uma sexualidade heteronormativa, uma heterossexualidade compulsória que vai delimitar as experiências com relação ao sexo. A intensa produção de modos de se relacionar com o sexo, que inclusive diz respeito aos nossos afetos, é o que nos faz sentir que a forma correta que é dada desde sempre para nossa sexualidade heterossexual.
A contrassexualidade, por sua vez, é uma afirmação de diferentes performances de gênero, afirmação de "n" possibilidades para composição do gênero, tratando de desligar a ideia de que gênero é igual a sexo biológico. Ela opera uma ideia de que os corpos, por serem sexuados ou generizados, são compostos de subjetividade que permitem o desempenho de uma experiência de sexo muito mais normativa do que qualquer tipo de experiência. A desnaturalização dessa forma de relação com o sexo é o que constitui a resistência da contrassexualidade.
A ideia do privilégio do pênis, do falo, mostra toda uma construção falocêntrica e heterocentrada sobre nossa sexualidade. A contrassexualidade vai colocar uma questão e problematizar a ideia falocêntrica, supondo eleger o ânus como um órgão importantíssimo para fazer esta resistência. Primeiro: porque o ânus foi o primeiro órgão a ser privatizado. É um órgão privado, escondido por entre as pernas, é o órgão do controle, de passagem de capital das relações econômicas, é o órgão que constitui muitas características de personalidade que são importantes para o contexto atual, para sustentar a máquina capitalística. Nesse sentido, desprivatizar o ânus acaba sendo um mecanismo de resistência. Por isso, a contrassexualidade elege humanos como práticas de resistência. Importante também é a ideia de que o ânus não tem sexo, é aquilo que nos torna comum, um órgão comum de todos, eleger o ânus como elemento de contrassexualidade acaba sendo importante nesse cenário.
5. EXEMPLO DE PERFORMANCE EM RESISTÊNCIA
Poderíamos citar Liniker, Jaloo, Johnny Hooker, Linn da Quebrada, entre outros que representam artistas que desconstroem as regras estabelecidas na música e na sociedade. Mas, resolvemos citar como exemplo para o trabalho - Triz, 18 anos, cantor de gênero neutro que explodiu na web com rimas que falam sobre amor, preconceito e descoberta. Triz prefere ser chamado na linguagem neutra que utiliza a terminação com a letra “e” substituindo os artigos femininos e masculinos.
Triz é um transexual do gênero não binário, ou seja, ele (como prefere ser chamado) não se identifica nem como homem nem como mulher. Existem transbinários (que se identificam com homem ou mulher) e trans não binários (que não se identificam com nenhum dos dois gêneros). “Ser homem ou mulher não está na carcaça, ou seja, no corpo humano, mas na nossa cabeça, isso você pode mudar no bisturi, minha mente não é a de uma mulher e também não é a de um cara.Embora tenha vagina, nunca me considerei menina, eu não me reconheço como mulher e muito menos como homem”, declara. 
Tentar achar um gênero que defina a musicalidade de Triz é algo complexo. Ele trabalha com arte e todas as suas variações, não quer que sua imagem esteja vinculada apenas às causas LGBT. Refere que se está fazendo rap naquele momento, as pessoas já a classificam como rapper. “Calma, eu sou uma pessoa, tenho outras músicas para fazer, não gosto que ela seja associada a uma única coisa, ela pode e deve ser ouvida por todos os públicos”, afirma.
Triz é exemplo de modos de se pensar sexualidades móveis que não se fecham em uma identidade, mas que geram potência. Ele é molecular, vive muitas possibilidades de experiências de devires, modifica sua relação com o próprio corpo, cria uma nova percepção das coisas, uma nova sensibilidade e uma nova afetividade. As formações de poder dominantes e repressivas operam nas denominações de papéis, hierarquização da sociedade e codificação dos destinos, é a partir do corpo que ele desnaturaliza esta cultura para criar linhas de fuga.
O movimento para fora das estruturas sociais de dominação começa pela sexualidade, pela saída do enquadramento dos gêneros e da organização binária dos sexos enquanto motivação ético-política contra a dominação. Ou seja, a questão que se coloca é micropolítica. A saída dos dualismos e das segmentaridades (quaisquer que sejam eles) passa por uma ruptura da sexualização para então alcançar outras rupturas.
6. CONCLUSÕES
Os movimentos identitários têm capacidade de transversalizar as lutas. As mulheres, os gays, os heteros, os negros, travestis, trans, todos têm os mesmos problemas. A luta de um só é uma forma de governo. Guardadas as diferenças, somos mais fortes juntos. No entanto, estamos apáticos, anestesiados por formas de governo reacionárias que nos sucumbe, mas temos os mesmos problemas. Estamos nos acostumando e ficando calados perante a submissão imposta pela necessidade da sobrevivência, pelo comando do capitalismo, sem potência de resistência. Não há mais espaço para lutas solitárias e, insatisfeitos em nossas vidas íntimas, tratamos o outro como objeto.
O que Deleuze e Guattari nos mostram é que a diferença é necessariamente produção de um coletivo, já que ela é o fruto de composições das forças que constituem um determinado contexto sociocultural. Eles nos mostram ainda que abrir-se para a diferença implica em se deixar afetar pelas forças de seu tempo. Uma política que não consiste simplesmente em reconhecer o outro, respeitá-lo, preocupar-se com as consequências que nossa conduta possa ter sobre ele, trata-se de assumir as consequências de sermos permanentemente atravessados pelo outro. 
A discussão sobre identidade é necessária e serve de alerta para que as relações entre os sujeitos sejam mais solidárias, para que sejam possíveis novas formas de existência – mais éticas, estéticas e políticas.
As formas de resistências aqui destacadas são movimentos que vão na contramão da regulação da subjetividade com relação à sexualidade. Ainda hoje, de forma geral, pairam muitas dúvidas sobre sexo e gênero. É desconcertante olhar para o outro e não conseguir “decifrá-lo”. Isso porque nos acostumamos à materialidade das certezas (que acreditamos necessárias e reais), nos espelhos do mundo-homem. E aquilo que não está, mas que se espreita na imaterialidade, no devir, no fluxo do desejo, não é algo em que se possa colocar em caixas, porões ou celas. O desconhecido gera dúvidas, possivelmente porque estas surgem do modo de pensar instituído, de uma vida ditada e de rebanho. As resistências são múltiplas, em vozes que ecoam em gritos de multidões, mas também em silêncios, em imobilidades, em lentidão e prudência, porque além da criação, há força na conservação do que nos permitimos estar ou ser. 
Somos corpo e desejo em uma sociedade que é do homem e para o homem, porque é na sua forma – devir homem – que se encontra o molar; inflexível, estático, dominador, representativo dos jogos essencialistas de poder, nos moldes que subjetivam o lugar supremo do homem.
 A forma feminina é forma de resistência e de vazão de micropartículas que, desacomodadas, procuram reintegrar-se como um organismo em metamorfose. É a procura de novos lugares, longe de formas morais, em direção da ética do devir. É a possibilidade molecular de expansão, de desfazer codificações, de evanescer e ressurgir sem as amarras de uma identidade ou de uma essência que imobiliza e assujeita.
A mulher, o homem, o gay, o não binário, o jovem, todos nós, independente de categorizações que envolvam o sexo, gênero, raça, nível social, profissão, ou qualquer outro demarcador de identidades, devemos, solidária e coletivamente, buscar a força da afirmação, a potência do devir mulher que há em cada um de nós.
REFERÊNCIAS
BATISTA, Paula Nogueira Pires. Resenha: PRECIADO, Paul Beatriz. Manifesto Contrassexual. Universidade Federal de Goiás, Goiânia, Brasil, N-1 Edições, 2014, 224 p.
CARVALHO, Diego. O que é resistência na sociedade de controle? Fronteiras-estudos midiáticos, v. 16, n. 3, p. 257-260, 2014. Disponível em: < http://revistas.unisinos.br/index.php/fronteiras/article/viewFile/fem.2014.163.10/4449>. Acesso em: 15/11/2018
ESTADÃO. Entrevista com Triz. Disponível em: <https://cultura.estadao.com.br/noticias/musica,ser-homem-ou-mulher-nao-esta-na-carcaca-ou-seja-no-corpo-humano-mas-na-nossa-cabeca-diz-triz,70001942295> Acesso em: 17/11/2018
LIBLIK, Carmem Silvia da Fonseca Kummer. A contrassexualidade como superação das dicotomias de gênero e sexo. Rev. Estudos Fem. vol.24, Florianópolis: Mai/Ago 2016 <http://dx.doi.org/10.1590/1805-9584-2016v24n2p653> acesso em 16/11/18
PRECIADO, Beatrix Paul. Manifesto contrassexual - Práticas subversivas de identidade sexual. São Paulo: n-1 edições, 2014, p. 173-193
PUCSP. Ninguém é deleuziano. Disponível em: <https://www.pucsp.br/nucleodesubjetividade/Textos/SUELY/ninguem.pdf > Acesso em: 17/11/2018 
SANTINI, Rose Marie; CAMELIER, Joana. Devir mulher, sexualidade e subjetividade: aproximações entre Deleuze & Guattari e Pierre Bourdieu sobre a construção social dos corpos. Revista Ártemis, v. 19, 2015. Disponível em: <http://www.periodicos.ufpb.br/index.php/artemis/article/viewFile/26204/14098>. Acesso em: 16/11/2018
TRINDADE, Rafael. Devir-mulher. Site Razão Inadequada, 2016 <https://razaoinadequada.com/2016/03/08/devir-mulher/> acesso em 16/11/2018
UFRGS. Molar e Molecular. Disponível em: < http://www.ufrgs.br/e-psico/subjetivacao/espaco/molar-molecular.pdf> Acesso em: 17/11/2018