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Texto - Responsabilidade Civil

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APONTAMENTOS DE RESPONSABILIDADE CIVIL 
 
I CONSIDERAÇÕES INICIAIS 
 
1.1 Conceito de responsabilidade civil; 1.2 Decomposição do vínculo jurídico: 
distinção entre dever jurídico originário e sucessivo; 1.3 Figura criada por 
Marton; 1.4 Proteção integral da pessoa humana; 1.5 Evolução da 
responsabilidade civil: 1.5.1 Reparação do mal pelo mal; 1.5.2 Reparação 
patrimonial; 1.5.3 Estado mutualista; 1.6 A responsabilidade civil na 
Constituição Federal; 1.7 Responsabilidade moral, penal e civil; 1.8 Espécies 
e pressupostos. 
 
 
1.1 Conceito de responsabilidade civil 
 
O Direito conjuga o humano e o social, porquanto ele existe em razão das pessoas que se interagem na 
convivência em sociedade (ubi homo, ibi societas). Sociedade e Direito são realidades conatas e se pressupõem: 
onde está a sociedade, está o Direito (ubi societas, ibi ius), sendo a recíproca verdadeira, onde está o Direito, está a 
sociedade (ubi ius, ibi societas), logo onde o homem está, está o Direito (ubi homo, ibi ius). Consequentemente, toda 
regra jurídica tem por referência a convivência das pessoas na sociedade. 
O homem solitário, a visada de Robson Crusoé na obra de Alexandre Drufs, é uma ficção ou, pelo menos, 
uma exceção raríssima de se encontrar. A pessoa humana é, por natureza, destinada à vida social, até pela sua 
evidente incapacidade de atender as suas necessidades essenciais, isoladamente. 
 
Magistral a ensinança de Ihering: 
 
Vida humana e vida social significam o mesmo. Isto já os velhos filósofos gregos 
reconheciam perfeitamente: não há aforismo que exprima de modo mais conciso e cabal a 
vocação do homem do que a denominação dele como zoon põlitikòn, ser social.1 
 
O Direito tem o propósito de viabilizar a coexistência na liberdade de cada um e de todos no interesse do 
bem comum, motivado pelos valores da ordem e da justiça, que devem ser estabelecidos na solidariedade, de modo 
que, no auxílio mútuo, sejam superadas as desigualdades discriminatórias, consoante os objetivos fundamentais 
estampados no art. 3º, da Constituição Federal. 
É a busca virtuosa do consenso sobre o que pode e o que não pode, do justo e do injusto, do lícito e do 
ilícito, garantindo a segurança nas relações entre os homens e, ao mesmo tempo, permite a cada pessoa encontrar-
se e definir-se dentro do seu contexto existencial. Nessa busca incessante cabe à Moral fecundar o Direito, para que 
ele encontre maior grau de adesão e obediência cívica. 
Pertinente cotejar a lição de San Tiago Dantas, segundo a qual a ordem jurídica apresenta duplo sentido: 
“proteger o lícito e reprimir o ilícito. Quer dizer, proteger a atividade do homem que se explica de acordo com o 
direito; reprimir a atividade do homem que se explica contrariamente ao direito.”2 
 Sendo assim, a noção de Direito vincula-se à noção de composição dos conflitos de interesses, tendo por 
escopo, repita-se, o atendimento dos valores da ordem e da justiça, com igualdade e liberdade, essenciais à 
dignidade humana (CF, art. 1º, III). A regra jurídica, por conseguinte, além de operar como regra de conduta, também 
opera como dissipadora de conflitos, valendo como paradigma para o comportamento futuro. 
Bem por isso, o Direito não é apenas uma técnica, mas uma ciência e uma arte, operando em dois polos, um 
coletivo e outro individual. No primeiro é a ordem que rege o conjunto das relações humanas na vida em sociedade. 
No segundo é o reconhecimento de possibilidades determinadas a cada pessoa, isto é, define e assegura os direitos 
individuais dos membros dessa mesma sociedade. 
Particularmente, o Direito Civil objetiva as relações jurídicas em que pode envolver-se todo cidadão, por 
referir-se a todos indistintamente na regulação das atividades intersubjetivas em geral, tanto das pessoas naturais 
como das pessoas jurídicas. Mota Pinto assegura que é o ramo do Direito dirigido à tutela da personalidade humana, 
visando “facilitar ou melhorar a convivência com outras pessoas humanas – é essa a zona central da vida em 
sociedade e é ela o campo próprio da incidência do Direito Civil.”3 Miguel Reale pondera que, em um País, a 
Constituição e o Código Civil são as duas leis fundamentais. A Constituição “estabelece a estrutura e as atribuições 
do Estado em função do ser humano e da sociedade civil”, enquanto o Código Civil refere-se “à pessoa humana e à 
sociedade como tais, abrangendo suas atividades essenciais.”4 
 
1 IHERING, Rudolf von. A finalidade do direito. Tradução de José Antônio Correa. Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1979, vol. I, p. 48. 
2 DANTAS, San Tiago. Programa de direito civil. Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1979, vol. I, Parte Geral, p. 341. 
3 PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria geral do Direito Civil. Coimbra: Coimbra Editora Ltda., 1976, p. 10. 
4 REALE, Miguel. O projeto do Código Civil: situação após a aprovação pelo Senado Federal, 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 
2 e 3 . 
 2 
O Direito Civil é, pois, o direito comum, incidente nas relações humanas partilhadas na vida diária, 
disciplinando os direitos da personalidade, os interesses familiares e os patrimoniais pertinentes à propriedade dos 
bens, às obrigações e à responsabilidade civil. 
 Desponta daí, que o modo de composição patrimonial dos conflitos de maneira a reparar o dano (an 
debeatur) a favor de quem o sofre, pela representação pecuniária equivalente (quantum debeatur), ilustra ao longo do 
tempo a trajetória da responsabilidade civil, pois ela se assenta no elementar princípio ético de que o dano causado 
pelo descumprimento de um dever jurídico contratual ou extracontratual deve ser reparado. 
 A regra é primum non nocet (em primeiro lugar não fazer o dano); feito o dano, porque ofende o dever 
jurídico sintetizado no adágio alterum non laedere (não lesar a outrem), cumpre a obrigação de indenizar. Essa é 
uma das facetas mais almejadas da concreção do Direito: o perene e renovado anseio de alcançar o justo e o 
equânime. Ou por outra, a tendência humana, cara ao jusnaturalismo, sintetizada na arcaica e simplificada regra 
sustentáculo da vida honesta, desde a Jura Praecepta do Direito Romano: honeste vivere, neminem laedere, suum 
cuinque tribuere (viver honestamente, não lesar a ninguém, dar a cada um o que é seu). 
 Nesse contexto, mostra-se atual o sinótico conceito de René Savatier: “Responsabilidade civil é a obrigação 
que incumbe uma pessoa de reparar o prejuízo causado a outra, pelo fato próprio, ou pelo fato de pessoa e coisas 
que dela dependam.”5 
 Detalhando Savatier: 
a) Dever jurídico que obriga uma pessoa, devedor, a reparar o dano causado à outra pessoa, credor; 
b) Em razão de ato próprio: confundam-se na mesma pessoa quem causa o dano e quem terá a obrigação de repará-
lo; 
c) Pode o dano ter sido causado por uma pessoa e a obrigação de indenizar recair sobre outra pessoa, no caso o seu 
responsável; 
d) Pode ainda o dano ter sido causado por animais ou coisas inanimadas e a indenização ficar por conta de quem 
tem a sua propriedade ou guarda. 
 Consiste, destarte, na obrigação de o agente causador de um ato lesivo indenizar a vítima, ajustando-se 
perfeitamente ao conceito genérico de obrigação, que é o direito do credor de exigir certa prestação do devedor. Por 
conseguinte, o instituto da responsabilidade civil é parte integrante do Direito das Obrigações, aplicando-se a ele o 
princípio obrigacional de quem deve atender a indenização é o devedor e o seu patrimônio responde pelo débito, 
como providencia o Código Civil no artigo 391 (Título IV, do Inadimplemento das Obrigações, Capítulo I, das 
Disposições Gerais) e o artigo 942 (Título IX, Da Responsabilidade Civil, Capitulo I, Da Obrigação de Indenizar). 
 Senão nota-se: 
a) É fonte de obrigação: do dano nasce a obrigação de indenizá-lo. 
b) É uma obrigação de dar pecuniária: essa indenização é o equivalente do danorepresentado em moeda corrente. 
c) É a tutela genérica das obrigações de dar, fazer ou não fazer: se impossível restabelecer o stato quo ante pela 
tutela específica, resolve-se pela tutela genérica das perdas e danos. 
 Assim, a responsabilidade civil é o instituto jurídico de fundamental importância para a resolução dos conflitos 
de interesses com tríplice função: a de garantia, a de sanção civil e a de prevenção. 
 A função-garantia outorga à vítima do dano o direito de se ver ressarcida. A função-sanção imputa ao agente 
causador do dano o dever de compor esse ressarcimento. A função-preventiva atua em duas facetas distintas. A 
uma, opera como coação psicológica, prevenindo a coletividade de novas violações que poderiam eventualmente ser 
realizadas, pelo próprio causador do ilícito, ou por qualquer outra pessoa. A duas, o desafio de aperfeiçoar o sistema 
para evitar situações de perigo, o quanto possível, pois afastá-las de todo é impossível. Nota-se, essa terceira função 
é decorrência natural das duas funções precedentes. 
Há de se entender, na vida social a pessoa humana tem liberdade para o exercício de seu direito, como tem 
responsabilidade no exercitá-lo. 
Jean Paul Satre pontifica que o ser humano ontologicamente não possui liberdade, ele é liberdade em sua 
essência; “assim, minha liberdade está perpetuamente em questão em meu ser; não se trata de uma 
qualidade sobreposta ou uma propriedade de minha natureza; é precipuamente a textura de meu ser.”6 
 Essa liberdade como atributo caracterizador do ser do homem não pode, por parte da lei, sofrer restrições, 
mas o seu exercício impõe limites, pois sempre coexistem boas e más intenções, sendo fortes e fracos bondosos e 
maldosos, por isso que a nobreza do exercício da liberdade é medida pelo fim a que se destina. 
Nada mais lúcido que ao lado da liberdade, como parelha inseparável, está a responsabilidade. José de 
Aguiar Dias inaugura sua clássica obra, com esta frase: “Toda manifestação da atividade humana traz em si o 
problema da responsabilidade”, para depois em referência a Marton, completar: “A responsabilidade não é fenômeno 
exclusivo da vida jurídica, antes se liga a todos os domínios da vida social.”7 
Daí a oportuna pergunta de Viktor Emil Frankl: “Quando se resolverão a levantar na costa ocidental [de Nova 
Iorque] uma estátua da Responsabilidade, a fazer pendant com a estátua da Liberdade, da costa oriental?”8 
 
5 SAVATIER, René. Traité de la responsabilité civile, tome I : Le sources e la responsabilité civile . Paris : Libraire Génerale de 
Droit et de Jurisprudence, 1939, Introduction, p. 1 : “La reponsabilité civile est l’obligation qui peut incomber à une personne de 
réparer le dommage causé à autri par son fait, ou par le fait des personnes ou des choses dépendante d’elle. » 
6 SARTRE, Jean Paul. O ser e o nada. 
7 DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil, 10 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 1-2. 
8 FRANKL, Viktor Emil. Psicoterapia e sentido de vida. Fundamentos da logoterapia e análise existencial. Tradução de Alípio 
Maia de Castro. São Paulo: Quadrante [s.d.], p. 106. 
 3 
 
1.2 Decompondo o vínculo jurídico: distinção entre dever jurídico originário e sucessivo 
 A estrutura da obrigação apresenta três elementos: o subjetivo, o objetivo e o espiritual ou vínculo jurídico. 
 O subjetivo é o pessoal, reúne no polo passivo o devedor, aquele que é obrigado a cumprir a prestação, e no 
polo ativo o credor, aquele que tem o direito de receber a prestação. 
 O objetivo é o componente material, cujo objeto imediato é uma prestação de dar, fazer ou não fazer, e o 
objeto mediato ou objeto da prestação é desvendado na resposta à seguinte pergunta: dar, fazer ou não fazer o quê? 
A resposta é o bem da vida perseguido pelo credor, ao qual se obriga o devedor. 
 O espiritual é o vínculo jurídico, o liame que liga os polos passivo e ativo de uma obrigação, possibilitando a 
este exigir daquele o adimplemento da prestação. Revela a jurisdicidade da relação obrigacional. Desdobra-se em 
dois momentos, o dever jurídico originário e o dever jurídico sucessivo. 
 Não a gosto dos unitaristas que resumem os dois momentos em um único, o Código Civil no art. 389 
distingue obrigação e responsabilidade: não cumprida a obrigação, dever jurídico originário, o devedor responde por 
perdas e danos, dever jurídico sucessivo. Como clarifica a seguinte passagem: “A”, advogado, contrata com “B”, seu 
cliente, defendê-lo em determinada ação. Reside aqui o débito: “A”, devedor, cumpre a prestação de serviços 
profissionais na defesa dos direitos de “B”, credor. Essa obrigação de fazer é dever jurídico originário, primário. “A”, 
entretanto, não cumpre a sua obrigação, transgride o dever jurídico que voluntariamente assumiu. Surge, então, outro 
dever jurídico, portanto sucessivo, secundário, qual seja, compor o prejuízo experimentado por “B”. Reside aqui a 
responsabilidade. O dever jurídico sucessivo (responsabilidade) toma o lugar do dever jurídico originário (débito não 
adimplido). 
O dever jurídico originário nasce pela vontade das partes, enquanto o dever jurídico sucessivo de 
ressarcimento do prejuízo, ao contrário, independe da vontade das partes, é a resposta do ordenamento jurídico ante 
o inadimplemento de um negócio jurídico bilateral ou unilateral. 
 Essa distinção deve-se ao Direito alemão, por intermédio de Alois Brinz, o primeiro a separar esses dois 
momentos da relação obrigacional. Para ele o débito, que o chama de schuld, é o pagamento espontâneo pela 
realização da prestação, que depende com exclusividade de uma ação ou omissão do devedor. Já a 
responsabilidade, que a chama de haftung, é o direito do credor de investir contra o patrimônio do devedor, e obter a 
devida indenização pelos prejuízos ante o inadimplemento voluntário da obrigação. É o pagamento forçado com o 
socorro do Poder Judiciário. 
 Demais disso, os autores alemães demonstram a existência de débito sem responsabilidade. É o caso das 
dívidas de jogo proibido, obrigações prescritas etc. A obrigação é imperfeita ou natural, isto é, desprovida do 
momento sucessivo da responsabilidade, assim inexigível. Há devedor e credor, prestação e vínculo jurídico, este, no 
entanto, apenas no seu primeiro momento: o débito que é o pagamento espontâneo; se pagar é pagamento com 
direito de retenção (soluti retentio). Falece do momento sucessivo da responsabilidade, ou seja, o credor não pode, 
via Poder Judiciário, forçar o pagamento, a fim de receber seu crédito com o constrangimento do patrimônio do 
devedor. 
 Não apenas. No caso da fiança, há a responsabilidade, mas não o débito. O fiador não é devedor, é o 
garante do devedor. Se este não paga a prestação, só então surge a responsabilidade daquele. Logo, o fiador tem 
apenas a responsabilidade e não o débito. 
 Destarte, a relação obrigacional apresenta dois momentos bem distintos: se o devedor não pagar a prestação 
espontaneamente, surge, em razão desse inadimplemento, a responsabilidade, quando o credor promove ação sobre 
os bens do devedor. Aqui se encontra a responsabilidade civil contratual. 
O mesmo acontece na prática do ato ilícito, na responsabilidade civil extracontratual, quando não há um 
contrato celebrado entre devedor e credor. Se alguém pratica um ato ilícito, descumprindo uma obrigação legal, 
abrolha a responsabilidade, que é o dever de indenizar o dano causado. 
 
1.3 Figura criada por Marton 
 Antes de se obter o momento da responsabilidade decorre o momento da infração de um dever jurídico 
próprio de uma obrigação preexistente, tanto contratual como extracontratual. Para se saber quem é responsável, 
indaga-se quem é obrigado. É o mecanismo da responsabilidade elaborado na figura criada por Marton, na qual o 
órgão mantenedor da norma interroga do violador: “por que faltaste a teu dever, praticando (ou omitindo)tal ato? Se 
a pergunta for satisfatoriamente respondida, o interrogado estará desobrigado, se insatisfatória será ele condenado.9 
 
1.4 Proteção integral da pessoa humana 
 Pelo exposto, a responsabilidade civil açambarca a proteção integral da pessoa humana, a qual deve ser 
entendida na sua mais ampla concepção, como uma unitas multiplex, para usar a expressão tão comum em Santo 
Tomás de Aquino. 
 Cai a fiveleta o conceito de Victor Emil Frankl, que apresenta um projeto no qual considera salvaguardada a 
unidade antropológica sem minimizar as diferenças ontológicas – corpo, psique e noéses – que se revelam 
inevitavelmente na análise fenomenológica do ser humano. 
 As dimensões somática e psíquica correspondem à esfera da facticidade: impulsos, necessidades biológicas, 
instintos; enquanto que a dimensão noética corresponde à esfera da existência: liberdade e responsabilidade. 
 
9 MARTON, G. Les fundaments de la responsabilitè civile: révision de la doctrine essai d’un système unitaire. Paris: Sirey, 1938, 
p. 263 e 264 : « porquais as-tu manqué à ton devoir en faisant (ou omittant) tel ou tel acte. » 
 4 
 A pessoa humana aparece centrada em um núcleo noético, fonte de todas as atividades efetivamente 
humanas. A esse núcleo pessoal noético pertencem os fenômenos que lhes são mais exclusivos, como a capacidade 
de amar, decidir, descobrir e realizar valores, portanto compreende a faculdade de reagrupar os elementos que 
compõem a facticidade. 
Nessa dimensão a pessoa humana não é um ser guiado, impulsionado, mas é um ser livre e responsável, 
com capacidade e possibilidade de resistir e superar os impulsos tendentes a determinar e condicionar o seu 
comportamento, a sua conduta no meio social. 
 Educar a pessoa humana, abrir-lhe um horizonte de valores e de sentido, significa, sobretudo, apelar para 
esse núcleo noético, que aponta para a realização de si através da transcendência. 
 Essa é a teleologia própria do ser humano, adormecida algumas vezes por limitações de ordem pessoal e, 
muitas outras, reprimida pela violência branca que a sociedade liberal manobra explicita ou implicitamente. 
 Pois bem, essa pessoa humana, considerada na sua inteireza, vê-se sob a iminência de risco a todo 
momento, apenas por viver em uma sociedade de massa. Necessário, então, que a responsabilidade civil proteja, 
indiscriminadamente, os seus interesses e direitos patrimoniais e da personalidade em todas as suas dimensões, 
aqui compreendido o anseio transcendental, pois a sociedade atual, embora laica, reconhece, constitucionalmente, o 
direito à liberdade de professar credo religioso. 
 Nesse desiderato, a Constituição Federal, tida por diligente porque vocacionada a bafejar todos os ramos do 
Direito com a eficácia de seus valores e princípios, ganha novo vigor com a sua carga axiológica na defesa da 
dignidade humana e dos direitos da personalidade, sem desprezar os direitos patrimoniais, pois a pessoa, por 
tendência natural, é vocacionada a ser proprietário. Ademais, o patrimônio mínimo é da essência na precaução de 
uma vida digna. 
 
1.5 Evolução da responsabilidade civil 
 A evolução da responsabilidade civil realça ainda mais a proteção integral da pessoa humana. Cuida-se, 
assim, em breves pinceladas enfocar o seu escorço histórico que, em verdade, acompanha o homem desde os mais 
priscos tempos. Presta-se também para a boa compreensão do fundamento, evolução, estágio atual e perspectivas 
futuras desse instituto. 
 
1.5.1 Reparação do mal pelo mal 
Nos primórdios da civilização predominava a vindicta, a vingança coletiva, o grupo reagia contra o agressor 
pela ofensa de um de seus membros. 
 Essa vingança coletiva foi sucedida pela reação privada. É a vingança individual, selvagem talvez porque se 
fazia justiça pelas próprias mãos. Estava-se sob a égide da Lei de Talião (talio) sistematizada na fórmula: olho por 
olho, dente por dente, feitio de reação espontânea e natural ou a vingança pura e simples. Ao poder público somente 
cabia intervir para coibir os abusos, declarando quando e como a vítima poderia ser recompensada pelo seu direito 
retaliado, infringindo no ofensor dano idêntico ao sofrido, sem arredar a possibilidade de as partes transacionarem. 
Na Lei das XII Tábuas, 450 a.C., encontram-se vestígios da vingança privada, é o critério inserido na tábua VIII, lei 
2ª: si membrum rupsit, ni cume eo pacit, talio esto (se alguém fere outrem, que sofra a pena de talião, salvo se existir 
acordo). 
Era a fase da reparação do mal pelo mal, a responsabilidade era objetiva, não se cogitava a culpa como seu 
fundamento. Responsabilidade penal e civil não se distinguiam.10 
1.5.2 Reparação patrimonial 
 O período dessa equivalência da punição do mal pelo mal, esboçando a perspectiva de uma composição 
entre a vítima e o agente causador do dano inserida na solução transacional, é sucedido na contenção da 
responsabilidade civil à responsabilidade patrimonial. 
 Grande a contribuição, nesse entretanto, do Direito Romano. O Senado teria se sensibilizado com os ritos 
corporais macabros, banindo-os. Deu-se, então, a separação da responsabilidade civil e penal pela Lex Poetela 
Papiria, editada 326 a.C. A concepção de pena foi substituída pela ideia de reparação do dano sofrido. 
 À Lex Aquilia de Damno, proposta pelo tribuno romano Aquilio em 286 a.C., coube desvendar novos 
horizontes. Ela esboçou a ideia de culpa como fundamento da responsabilidade civil, dessa sorte o causador do dano 
que tivesse laborado sem culpa seria isento de qualquer responsabilidade. Essa lei introduziu, ademais, o damnum 
iniuria datum: o dano causado à bem alheio, empobrecendo a vítima sem enriquecer o ofensor. Tão grande é a 
evolução trazida pela Lex Aquilia, que a ela se prende a denominação de aquiliana para a responsabilidade 
extracontratual em oposição à contratual. 
 Na Idade Média, plantando suas raízes no Direito Romano, seguiu-se a estruturação da ideia de dolo e culpa 
como a mais importante contribuição. Os canonistas elaboraram, à luz da moral cristã, o princípio clássico segundo o 
qual cada um deveria responder pelos seus atos culposos, que produzissem dano injusto a outrem. A culpa ganhou 
fortes contornos éticos e morais, ligados à ideia do livre-arbítrio e de sua indevida utilização pelos fieis. É a noção de 
pecado como consciente violação a dever de ordem divina. 
 Foi por meio da teoria subjetiva, que a responsabilidade civil ingressou no Direito moderno, tendo como 
principais elaboradores dois exponenciais civilistas franceses Domat e Pothier e como tenazes defensores André 
Tunc e os irmãos Mazeaud. O seu fundamento é a culpa efetiva e provada.11 
 
10 LIMA, Alvino. Culpa e risco, 2 ed. Revista e atualizada por Ovídio Rocha Barros Sandoval. São Paulo: RT, 1998, p. 27. No 
mesmo sentido: PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 6. 
 5 
 Com a Revolução Industrial a sociedade transformou-se rapidamente. O sossego e a tranqüilidade 
transmudaram-se em excitação, a segurança no seu antônimo a insegurança, tanto que Josserand forjou a frase: 
“vivemos mais intensamente (Roosevelt) e mais perigosamente (Nietzsche)”. A teoria da culpa tornou-se insuficiente 
para atender os mais variados casos de danos produzidos pelas novas atividades perigosas, embora socialmente 
úteis. Passou-se a pensar, terminando por introduzir na legislação, a máxima: ubi emolumentum, ibi onus (onde está 
o ganho, ai está o encargo), que traz em seu âmago a teoria do risco proveito. Mais uma vez, o berço foi a França 
com Saleilles e Josserand. O primeiro, com sua visão profética, desenvolveu a teoria sobre o acidente do trabalho em 
que o empregador, independentemente de culpa, responde pelos danos sofridos pelo empregado em consequência e 
por ocasião da jornadade trabalho. Do segundo extrai-se a ideia de revolução a permear a história da 
responsabilidade civil, reforçando as ideias objetivas. 
 
Uma verdadeira revolução, dissociando completamente a responsabilidade da culpa, 
erigindo o patrão, a comuna ou o explorador da aeronave em seu próprio segurador por 
motivo dos riscos que criou; a idéia de mérito ou de demérito nada tem a ver no caso; a lei 
impõe o princípio justo e salutar “a cada um segundo seus atos e segundo suas iniciativas”, 
princípio valioso para uma sociedade laboriosa; princípio protetor dos fracos: a força, a 
iniciativa, a ação devem ser por si mesmas geradoras de responsabilidades.”12 
 
 É a responsabilidade civil objetiva que, ainda mais desenvolvida, elegeu o risco criado nas atividades 
perigosas como motivação determinante do ressarcimento ante o prejuízo de vítimas inocentes, dispensando 
qualquer consideração a respeito da culpa. 
 Nos dias atuais, em sua tese de livre docente, apresentada na Faculdade de Direito da USP, Giselda Maria 
Fernandes Novaes Hironaka sugere o que chama responsabilidade pressuposta, uma nova evolução da 
responsabilidade subjetiva para a responsabilidade objetiva. E Lembra logo no pórtico de seu trabalho: 
 
Há um novo sistema a ser construído, ou, pelo menos, há um sistema já existente que 
reclama transformação, pois as soluções teóricas e jurisprudências até aqui desenvolvidas, 
e ao longo de toda a história da humanidade, encontram-se em crise, exigindo a revisão em 
prol da mantença do justo.13 
 
 A ensinança dessa mestra coloca no cerne das preocupações contemporâneas a pessoa humana, que clama 
pela reparação dos danos sofridos, para que não fique irressarcível. Clama mais, que se adote uma política 
preventiva ao dano dentro da teoria da responsabilidade civil. 
 
1.5.3 Estado mutualista 
 
 Não raramente, a vítima não consegue a devida reparação, porquanto o agente do dano ou não tem 
patrimônio, ou é ele insuficiente para responder por todo prejuízo. 
 A Nova Zelândia acena com a sua experiência, o estado mutualista. Em 1974, naquele país foi criado a 
Accident Compensation Commission, trata-se de uma agência estatal que responde por todos os eventos lesivos, 
dessa forma alforriando o agente causador do dano e garantindo à vítima o ressarcimento. 
 O sistema é atraente, tem agradado a Nova Zelândia, contudo demanda a criação de uma contribuição para 
os seus fins, o que dificulta a sua implantação, especialmente nos países de pesada carga tributária. Por isso, talvez, 
não tenha sido ainda imitado por nenhum outro país.14 
 Ao Brasil o sistema não é todo estranho, pois vige o seguro obrigatório de veículos, como também o seguro 
da seguridade social, que imputa a responsabilidade ao Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) por simples 
política de proteção ao trabalhador. Muito tendo a crescer nesse campo dos seguros gerais. 
 Do exposto, presente a predição de Josserand, mesmo já afastada no tempo ainda proveitosa: “nessa 
matéria [responsabilidade civil] a verdade de ontem não é mais a de hoje, que deverá, por sua vez, ceder lugar à de 
amanhã”.15 
 
1.6 A responsabilidade civil na Constituição Federal 
 Com a promulgação Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988, foram introduzidas em seu texto 
importantes temas de responsabilidade civil, ainda mais ressaltando a integral proteção à pessoa humana, a saber: 
a) A reparação do dano material ou moral, por publicação ofensiva a terceiro ou à imagem (art. 5º, inc. V); 
b) A previsão de indenização por dano material ou moral pela violação à intimidade, à vida privada, à honra e à 
imagem das pessoas (art. 5º, inc. X); 
 
11 O pensamento de Domat, à luz do jusnaturalismo, inspirou o art. 1.382, do CC francês: “Tout fait quelconque de l’homme qui 
cause à autrui un domange, oblige celui par la faute duquel Il est arrivé, à la réparer » (Qualquer fato humano que cause a outrem 
um dano, obriga o culpado a repará-lo). 
12 JOSSERAND, Louis. Revista Forense vol. 86, p. 548. 
13 HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Responsabilidade pressuposta. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p. 3. 
14 COELHO. Fábio Ulhoa. Curso de direito civil, vol. 2, 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 278 a 181. 
15 JOSSERAND, Louis, ibide, p. 548. 
 6 
c) Responsabilidade do Estado pela indenização ao condenado por erro judicial e por ficar preso além do tempo 
fixado na sentença (art. 5º, inc. LXXV); 
d) A transmissibilidade aos herdeiros de reparação do dano, até o limite da força da herança recebida (art. 5º, inc. 
LX); 
e) Cúmulo das indenizações por acidente do trabalho e de direito comum, mediante conduta culposa ou dolosa do 
empregador (art. 7º, XXVIII); 
f) A responsabilidade civil da empresa nos casos de atos praticados contra a ordem econômica e financeira e contra 
a economia popular, sem prejuízo da responsabilidade individual de seus dirigentes (art. 173, § 5º); 
g) Responsabilidade civil das pessoas naturais e jurídicas, pela reparação de danos causados ao meio ambiente (art. 
225, § 3º). 
 A leitura da responsabilidade civil à luz da Constituição Federal não se resume apenas por essas previsões 
legais. Vai-se além. 
 É a mudança do ponto de vista sistemático, de sorte as normas constitucionais estão na cumeada do 
ordenamento jurídico, logo os seus princípios e valores – repita-se – tornam-se normas diretivas, ou normas-guia, 
que devem informar todo o sistema, informando, logicamente, o Direito Privado. Assim é, porque esses princípios e 
valores são retirados, no lúcido dizer de Maria Celina Bodin de Moraes, “da consciência social, do ideal ético, da 
noção de justiça presentes na sociedade, são, portanto, os valores através dos quais aquela comunidade se 
organizou e se organiza.”16 
 
1.7 Responsabilidade moral, penal e civil 
 A responsabilidade moral é uma natura debere, a que se constitui em mero dever de honra e consciência. 
São relações fundadas na pietas, no officium, na fides, no íntimo da pessoa humana para quem nenhuma crença lhe 
ilumine a alma, ou no seu relacionamento com Deus para quem professa credo religioso. Seu cumprimento é questão 
de princípios, por se tratar de genuína liberalidade, a exemplo de cumprir ato de última vontade não expresso em 
testamento. 
 Sob a ótica do direito, na consideração do vínculo jurídico que dá juridicidade à obrigação, essa espécie não 
tem nem débito nem responsabilidade. Porém, não permanece alheia de efeitos jurídicos quando do seu espontâneo 
cumprimento. O ordenamento jurídico confere-lhe a soluti retentio (direito de retenção), de sorte quem deposita um 
óbolo na mão tremula que se lhe estende, não tem direito a repetição do indébito (repetitio indebiti). Vige o apotegma: 
cuius per errorem dati retitio est, eius consulto dati danatio, isto é, a prestação intencional de um indevido absoluto 
não pode ser repetida, constituindo uma liberalidade. 
 Quanto à responsabilidade penal e a civil separam-nas nítidas dessemelhanças. 
 Se uma conduta, comissiva ou omissiva, ferir norma jurídica de Direito Penal, que é de Direito Público, tipifica 
um delito: crime ou contravenção, ensejando a responsabilidade penal, sempre considerando o apotegma do Direito 
Penal Liberal: “não há crime, nem pena sem prévia previsão legal” (nullum crimen, nulla poena sine praevia lege). 
Ao infringir norma de Direito Público, o delinqüente com a sua conduta perturba a ordem social, provocando, 
ato contínuo, uma reação do ordenamento jurídico que não se compadece com esse comportamento, a reação é 
representada pela pena. Pouco importa se a vítima do delito experimentou ou não algum prejuízo, o dano é de 
natureza social, o agente da conduta típica tem que responder por ela, pois o seu ato provoca quebra da paze da 
ordem social de maneira indiscriminada, não individualizada. 
 Concluindo, o Direito Penal: a) focaliza a pessoa do delinqüente; b) objetiva o resguardo do interesse social; 
c) movimenta a máquina judiciária, no mais das vezes, independentemente da vontade da vítima. 
 Enquanto no Direito Civil, a norma violada é de Direito Privado, e essa violação cria um desequilíbrio no 
patrimônio ou em outro interesse da vítima juridicamente protegido, tendo como causa a conduta também comissiva 
ou omissiva do agente. Seu objetivo é o restabelecimento do patrimônio ofendido no status quo ante (dano 
patrimonial), ou recompensar a vítima pelo interesse extrapatrimonial transgredido (dano moral). 
 Em suma, o Direito Civil: a) focaliza o dano causado; b) visa à necessidade de ressarcimento do patrimônio 
depreciado ou do interesse não patrimonial ofendido; c) é matéria apenas do interesse do prejudicado, que pode ou 
não movimentar a máquina judiciária, no primeiro caso exigindo a respectiva reparação, na outra hipótese 
resignando-se com o prejuízo sofrido. 
 Vale pela clareza e objetividade, repetir Clóvis Beviláqua: 
 
O direito penal vê, no crime, um elemento perturbador do equilíbrio social, e contra ele 
reage no intuito de restabelecer esse equilíbrio necessário à vida do organismo social; o 
direito civil vê, no ato ilícito, não mais um ataque à organização da vida em sociedade, mas 
uma ofensa ao direito privado, que é um interesse do indivíduo assegurado pela lei, e, não 
podendo restaurá-lo, procura compensá-lo, satisfazendo o dano causado. O direito penal 
vê, por trás do crime, o criminoso, e o considera um ente anti-social, que é preciso adaptar-
se às condições de vida coletiva ou pô-lo em condições de não mais desenvolver a sua 
energia perversa em detrimento dos fins humanos, que a sociedade se propõe realizar; o 
direito civil vê, por trás do ato ilícito, não simplesmente o agente, mas, principalmente, a 
vítima, e vem em socorro dela, a fim de, tanto quanto lhe for permitido, restaurar o seu 
 
16 MORAES, Maria Celina Bodin de. O princípio da dignidade humana, in Princípios do direito civil contemporâneo. Rio de 
Janeiro: Renovar, 2006, p. 3. 
 7 
direito violado, conseguindo, assim, o que poderíamos chamar a eurritmia social refletida no 
equilíbrio dos patrimônios e das relações pessoais, que se formam no círculo do direito 
privado.17 
 
 Na eleição do pensamento de Peirano Facio, Serpa Lopes discorre que é de natureza política e não técnica, 
a causa determinante da ilicitude incidir na responsabilidade civil ou penal, pois o ilícito, tanto em um como no outro 
âmbito, é ontologicamente o mesmo. São razões de ordem político-legislativa que conduzem o legislador, em dado 
momento, a incriminar algumas condutas impondo pena ao delinqüente, em outras no regime da simples reparação 
de dano, e ainda a dispor para umas terceiras a acumulação dos dois efeitos jurídicos.18 
 No caso de lesões corporais ou outra ofensa à saúde, o ofensor estará sujeito à pena expendida no art. 129, 
do Código Penal, e no campo civil poderá ser condenado nas despesas de tratamento e dos lucros cessantes até o 
fim da convalescença da vítima, além de pagar a importância da multa no grau médio da pena criminal 
correspondente, como providencia o art. 949, do Código Civil. 
 Importante notar, nesta oportunidade, a regra do art. 935: “A responsabilidade civil é independente da 
criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas 
questões se acharem decididas no juízo criminal.” É a letra do Enunciado 45, aprovado na I Jornada de Direito Civil 
promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal: “No caso do art. 935, não mais se 
poderá questionar sobre a existência do fato ou sobre quem seja o seu autor se estas questões se acharem 
categoricamente decididas no juízo criminal”. (Matéria a ser desenvolvida com mais detalhes nas causas de 
irresponsabilidade) 
 
1.8 Espécies e pressupostos da responsabilidade civil 
 A responsabilidade civil é o dever jurídico derivado diretamente da lei (extracontratual) ou da inexecução de 
uma obrigação adrede celebrada (contratual), que obriga uma pessoa (devedor), a reparar o dano patrimonial, moral 
ou estético causado a outra (credor), em razão de ato próprio (direta), de ato de pessoa por quem responde, pelo fato 
animal ou de coisa inanimada de sua propriedade ou sob a sua guarda (indireta), seja por culpa (subjetiva), seja por 
simples imposição legal, ou pela exploração de atividade de risco (objetiva). 
 Assim considerando, apropositada a classificação de Maria Helena Diniz, conforme segue abaixo. 
a) Quanto ao fato gerador: 
Responsabilidade civil contratual deriva do inadimplemento de um negócio jurídico bilateral ou unilateral. 
Responsabilidade civil extracontratual decorre da violação de um dever jurídico geral exposto na lei. 
b) Quanto ao fundamento: 
Responsabilidade civil subjetiva implica na conduta lesiva dolosa ou culposa. 
Responsabilidade civil objetiva a conduta lesiva prescinde de culpa ou dolo, ou porque prevista em lei ou na 
justificativa da teoria do risco. 
c) Quanto ao agente: 
Responsabilidade civil direta oriunda de ato próprio, a pessoa que produz o dano é a responsável pela indenização. 
Responsabilidade civil indireta se o causador do dano é um terceiro vinculado ao responsável pela indenização, ou o 
dano é causado por animal ou coisa inanimada de sua propriedade ou sob sua guarda. 
 Por outro lado, a responsabilidade civil apresenta os seus pressupostos: 
a) A conduta que é sempre uma ação ou omissão humana. 
b) O dano a interesses ou direitos alheios, patrimonial, moral ou estético. 
c) O nexo de causa e efeito que é a relação entre a conduta como causa e o dano como efeito. 
 
II: DAS ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL 
 
2.1 Responsabilidade civil contratual; 2.2 Jurisprudência; 2.3 
Responsabilidade civil extracontratual; 2.4 Jurisprudência. 2. 5 Natureza do 
dever jurídico violado; 2.6 Uma distinção nem sempre fácil; 2.7 Tutela 
externa do crédito; 2.8 Responsabilidade civil subjetiva; 2.9 Jurisprudência; 
2.10 Responsabilidade civil objetiva; 2.11 Teorias sobre as atividades de 
risco; 2.12 Fontes objetivas; 2.13 Confronto de situações de risco; 2.14 Um 
sentido de complementaridade; 2.15 Jurisprudência; 2.16 
Responsabilidade civil direta; 2.17 Responsabilidade civil indireta; 2.18 
Jurisprudência. 
 
2.1 Responsabilidade civil contratual 
 O art. 389, do Código Civil, preceitua: “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos 
[...]” Há o inadimplemento absoluto da obrigação, a prestação não é mais possível ou útil ao credor. O dever jurídico 
originário convencionado pela vontade das partes, porque inadimplido pelo devedor, convola-se na indenização das 
perdas e danos sofridos pelo credor, dever jurídico sucessivo imposto pela lei. 
 
17 BEVILAQUA, Clóvis, ob. cit., p.p. 272-273. 
18 SERPA LOPES, Miguel Maria. Curso de direito civil. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 4ª ed. revista atualizada pelo prof. José 
Serpa Santa Maria, vol. V, p. 161-162. 
 8 
 Não difere quando o inadimplemento é relativo, no caso de mora, dado que o art. 395 dispõe: “Reponde o 
devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa [...].” A prestação ainda é possível e útil ao credor, por isso 
perseguida pela tutela específica tal qual convencionada, acrescida das perdas e danos e dos consectários da mora 
e da sucumbência: juros, atualização monetária e honorários de advogado. 
 Via de consequência, a responsabilidade civil contratual, fundada na autonomia privada, promana da 
transgressão de uma obrigação adrede celebrada pelas partes. Há o inadimplemento absoluto ou relativo, uma vez 
que a obrigação deve ser cumpridano tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer, conforme 
providencia a última parte do art. 394, do Código Civil. 
 Para que ocorra essa espécie de responsabilidade civil é indispensável que preexista um contrato válido 
entre devedor e credor. Válido porque o contrato não produzirá efeitos jurídicos se eivado de nulidade 
contemporânea à sua formação. Pelo princípio da obrigatoriedade, as partes vinculam-se ao contexto do contrato de 
forma irresistível. A vontade é livre até que se obriga, uma vez obrigada gera efeitos jurídicos: a conduta passa a ser 
pautada pela obrigação contratada, por isso se diz que o contrato é lei entre as partes. 
 
Compromisso de compra e venda – Impossibilidade de transcrição do título no registro 
imobiliário – Cessão do mesmo lote a outra pessoa – Direito a indenização por perdas e 
danos – Valor da indenização. Se o contrato tornou-se inexeqüível por culpa da promitente 
vendedora, tem esta de responder pela reparação dos prejuízos do promissário comprador, 
cujo montante será o valor atual do imóvel negociado, a ser apurado em liquidação, mais os 
consectários comuns da sucumbência e da mora (TJMJ, ap. 62.028, da Comarca de Belo 
Horizonte, j. 04.08.83, rel. Des. Humberto Theodoro, in Humberto Theodoro Junior, 
Responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência, 3 ed. Rio de Janeiro: Aide Ed., 1993, p. 
337). 
 
Pode ainda a responsabilidade civil contratual resultar do descumprimento de obrigação gerada por um 
negócio jurídico unilateral, aquele em que há manifestação de vontade de uma só parte em uma única direção, 
colimando um determinado objetivo. Verbia gratia, a promessa de recompensa, a gestão de negócios, o pagamento 
indevido, o enriquecimento sem causa (CC, artigos 854 a 860), podendo acrescentar entre outros o testamento, a 
renúncia, o cheque ao portador. 
Curioso painel fixado em pontos estratégicos da cidade trazia este anúncio: “volta Peteleco”, e oferecia 
recompensa para quem encontrasse o cão errante. A declaração de vontade obriga o declarante desde o momento 
em que se torna pública, visto que ela se destina à pessoa indeterminada. A determinação dá-se no momento em 
que se preencherem as condições de exigibilidade da prestação, no caso o encontro e a restituição do animal. 
Alguém que encontrasse o cão, restituindo-o, tornar-se-ia credor da recompensa. Se não paga, nasce o direito de 
reclamá-la perante o Poder Judiciário. 
Não diferente a promessa de recompensa mediante sorteio, como bastas vezes anuncia o comércio varejista 
em suas propagandas ou publicidades de vendas promocionais. 
 
Indenização. Responsabilidade civil. Inadimplemento de premiação obtida em sorteio. 
Hipótese de promessa de recompensa, vinculado o promitente. Verba devida. Recurso 
provido. A oferta de prêmios mediante sorteio configura promessa de recompensa, a qual, 
efetuada publicamente, vincula o promitente (TJSP – 2ª Câm. de Férias – rel. Des. Walter 
Moraes, j. 20.08.93, in JTJ Lex 150/83). 
 
Considerando que essa espécie de responsabilidade diz respeito ao contrato e ao negócio jurídico unilateral, 
Fernando Noronha e José Jairo Gomes preferem chamá-la responsabilidade civil negocial. A tradição, todavia, 
consagrou a denominação responsabilidade civil contratual, passando a espécie a nomear o gênero.19 
 São seus pressupostos: 
a) a conduta que descumpre um negócio jurídico bilateral ou unilateral (ato ilícito contratual); 
b) o dano daí decorrente; 
c) o nexo de causa e efeito entre um e outro. 
 
2.2 Jurisprudência 
Tratando-se de contrato de locação de cofre, o banco depositário é responsável pelos 
danos materiais decorrentes de assalto, devendo as coisas ser restituídas ao stato quo 
ante, sendo considerada nula a cláusula de não indenizar, em obediência às regras do 
Código de Defesa do Consumidor – Súm. 297 do STJ – Dano moral não demonstrado – 
Juros moratórios da citação, por tratar-se de obrigação contratual – Art. 1.536, § 2º, do 
 
19 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações: fundamentos do direito das obrigações: introdução à responsabilidade civil. São 
Paulo: Saraiva, 2003, p. 432. GOMES, José Jairo. Direito civil: introdução e parte geral. Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 496. 
 9 
CC/1916 [atual art. 405] – Sucumbência recíproca mantida – Recursos improvidos (1º 
TACivSP, 12ª Câm., j. 1º.06.2004, rel. Juiz Paulo Eduardo Razuk, RT 832/239).20 
 
O credor que, no abuso de seu direito, protesta duplicata já paga, responde civilmente pelos 
danos morais e materiais decorrentes de sua atitude. O dano moral é presumido, razão pela 
qual a ocorrência do fato, sem que tenha havido culpa concorrente da vítima, faz surgir o 
dever de indenizar que, todavia, deve ser arbitrado de forma moderada, segundo o princípio 
do sistema aberto e de acordo com o prudente arbítrio do juiz (1º TACivSP, 7ª Câm., j. 
29.10.2002, rel. Juiz Ariovaldo Santini Teodoro, RT 813/268). 
 
O advogado somente será civilmente responsável pelos danos causados a seus clientes ou 
a terceiros, se decorrentes de erro grave, inescusável, ou de ato ou omissão com culpa, em 
sentido largo (STF, Tribunal Pleno, j. 06.11.2002, RDA 234/360).21 
 
A incorreção de tratamento odontológico, realizada por profissional imperito, enseja a 
indenização por dano material. Dessa forma, os valores despendidos no serviço 
inadequado devem ser reembolsados, bem como o novo tratamento protético que foi 
realizado por outro dentista especializado (TJSP, 5ª Câm. Dir. Privado, j. 05.06.2003, rel. 
Des. Rodrigues de Carvalho, RT 818/199).22 
 
 
2.3 Responsabilidade civil extracontratual 
 Determinado estabelecimento comercial passa a promover música eletrônica e o som estridente escapa do 
local, perturbando os moradores vicinais com decibéis acima da regulamentação permitida. Comete ato ilícito, por 
abuso de direito, como previsto no art. 187, do Código Civil. Tocar música em estabelecimento comercial é exercício 
de direito, porém o som excessivo, que perturba os vizinhos, é abuso desse mesmo direito; ato ilícito, pois. 
 É a providência do art. 1.277, do mesmo diploma: “O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito 
de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela 
utilização de propriedade vizinha.” Há o inadimplemento de um dever jurídico legal, derivado da vontade do Estado, 
porquanto estampado na lei. Da inobservância do dever legal, abrolha a obrigação indenizatória. 
 
Direito de vizinhança – Poluição sonora – Dano moral – Indenização – Verba devida em 
razão do desassossego e desconforto causados pelas turbações acústicas. Emenda Oficial: 
o desassossego e o desconforto causados pelas turbações acústicas são capazes de gerar 
prejuízos ensejadores de danos morais (2º TACivSP, 11ª Câm., Ap. 836061-0/7, rel. Juiz 
Egidio Giacoia, j. em 23.08.2004, RT 830/259). 
 
Conclui-se, que a responsabilidade civil extracontratual procede da ofensa à norma jurídica reguladora da 
vida das pessoas em sociedade. É também chamada de aquiliana, uma vez que remonta a Lex Aquilia de Damno. 
 São seus pressupostos: 
a) a conduta que descumpre um dever legal (ato ilícito extracontratual); 
b) o dano daí decorrente; 
c) o nexo de causa e efeito entre uma e outra. 
 
2.4 Jurisprudência 
 
Ação ordinária indenizatória. Estacionamento rotativo de carro em logradouro público. 
Subtração de veículos. Hipótese contrária a Súm. 130 do STJ. No caso do sistema de vaga 
certa, o pagamento só confere ao usuário a utilização do local da via pública, de uso 
comum do povo, destacado com o fim de ordenar o espaço público, garantindo a 
necessária rotatividade nos grandes centros urbanos. Na espécie, não há contrato de 
depósito, de guarda do bem sob prometida vigilância e proteção. A regulamentação do 
poder de polícia nos logradouros públicos,em estacionamento aberto, não pode acarretar 
ao ente público a ampliação de sua responsabilidade para responder pela guarda e 
 
20 “Súm. 297, STJ: O CDC é aplicável às instituições financeiras.” – A cláusula de não indenizar será oportunamente dissertada. 
Por enquanto ficam as observações: não é admitida no CDC, arts. 24, 25 e 51,I, e nos contratos de depósito contraria a essência do 
contrato (ver RT 670/73, 616/31). Só tem cabimento quando estabelecida com caráter de transação (RT 563/146). 
21 Sobre responsabilidade civil do advogado consultar: RT 787/143, 772/362, 749/267, Repertório IOB de Jurisprudência 
3/12.892, Boletim da AASP 613, 14 a 20.10.2002, RJTJSP 68/45, 125/176, JTJ-Lex 172/9. 
22 Nos serviços prestados por profissionais liberais firma-se um contrato, ainda que seja verbal (contrato de prestação de serviço, 
art. 593 e segtes, do CC). Se com advogado é o contrato de mandato (CC, arts. 653 e segtes., do CC). 
 10 
depósito do bem (TJRJ, 12ª Câm. j. 14.06.2005, rel. Des. Gamaliel Quinto de Souza, RT 
841/333).23 
 
É personalíssimo o direito à imagem e à intimidade. Se, com intuito de angariar maior 
audiência, conhecido programa dominical de televisão utiliza a imagem de consagrado galã 
de novelas, contratado de emissora concorrente, fazendo alarde de um leilão de roupa 
íntima que teria sido usada pelo ator em tradicional peça teatral “Paixão de Cristo”, 
realizada no estado da Paraíba durante a “Semana Santa”, sem obter previamente a 
indispensável autorização para essa exposição pública, respondem concorrentemente o 
apresentador do programa e a emissora pelo efeito lesivo daí decorrente. O fato de ser dito 
que o produto obtido seria destinado a instituição de caridade, não descaracteriza a ofensa 
ao direito do autor. Sendo um profissional de atividade artística, consagrado na mídia, sua 
imagem não pode ser utilizada, sem a sua anuência, como atração para aumentar a 
perfomance de empresa com a qual não mantém vínculo contratual (TJRJ, 9ª Câm., j. 
04.05.2004, rel. Des. Laerson Mauro, RT 836/301).24 
 
Dano Moral – Indenização – Morte de detento que se encontrava sob a guarda da 
Administração Pública – Negligência do Estado em zelar pela integridade do presidiário 
caracterizada – Hipótese em que a verba indenizatória deve ser fixada em termos 
razoáveis, sendo descabido seu pagamento via precatório em virtude da pequena monta. 
Ementa Oficial: Havendo morte de presidiário que se encontra sob a guarda da 
Administração Pública, a responsabilidade em indenizar a família da vítima é do Estado, 
sendo essa objetiva. A indenização a título de dano moral deve ser fixada em termos 
razoáveis, sendo impossível que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento 
indevido, nem em valor ínfimo. Incabível o pagamento da obrigação por precatório quando 
o seu valor for de pequena monta. (TJRO, Câm. Especial, j. 18.02.2004, rel. Des. Rowilson 
Teixeira, RT 832/351). 
 
Responsabilidade civil. Danos morais e materiais. Inundação em subsolo de hotel. Bueiros 
e galerias pluviais entupidos. Responsabilidade civil subjetiva. Demonstração do dano e do 
nexo causal. Omissão das autoridades do Município. Inexistência de excludentes de 
responsabilidade. Recurso necessário conhecido e desprovido (TJRN, 3ª Câm. Civ., j. 
12.06.2006, rel. Des. João Rebouças, RT 852/350).25 
 
O veículo automotor, cada vez mais sofisticado e veloz, quando entregue nas mãos de 
motoristas menos preparados, em face da embriaguez, passa a constituir uma arma 
perigosa, impondo grande risco às pessoas que se encontram nas vias públicas. Ora, se 
não querem o resultado lesivo, assumem pelo menos o risco de produzi-lo (TJSP, 5ª Câm. 
 
23 A hipótese aparta-se dos estacionamentos ofertados por casas comerciais, supermercados, shopping center, que por usufruírem 
benefícios, têm responsabilidade civil pelo furto ou avaria nos veículos. “Os shopping centers que oferecem estacionamentos 
gratuitos a seus clientes não se isentam de responsabilidade por furto de veículos colocados sob sua guarda, pois é certo que a 
retribuição pelos serviços está devidamente incluída no preço do custo das mercadorias. O relacionamento existente entre o cliente 
usuários do estacionamento e a administração do shopping não se caracteriza como contrato de depósito típico, mas como 
prestação de serviço que podem ser definidos como de segurança” (TJSP, 7ª Câm., j. 02.11.88, rel. Des. Sousa Lima, RT 639/60). 
De igual teor: RJTJSP 137/388, 135/150. Furto de veículo em estacionamento de supermercado, obrigação deste de indenizar: RT 
832/228. 
24 O direito à imagem, como exceção aos direitos da personalidade, pode ser cedido para exploração econômica, mas sempre com 
o consentimento da pessoa. A CF, no art. 5º, X, garante a inviolabilidade do direito à imagem. Poética, nem por isso menos 
jurídica, a passagem de Álvaro Antônio: “Minha imagem pertence a todo mundo, tanto ao sol quanto ao regato, mas eu não quero 
que a profanem, porque ela representa um homem e é presente de Deus”, in BIANCO, João Carlos. A obra fotográfica, o direito à 
imagem, à vida privada e à intimidade, Revista Justitia, órgão do Ministério Público do Estado de São Paulo, vol. 189-192, p. 
206. 
25 Diferentemente quando fortes chuvas, imprevisíveis e inevitáveis, atingem a cidade: “Evidenciada a força maior em razão de 
situação excepcional de fortes chuvas que assolaram a cidade, afasta-se a responsabilidade civil do Município em reparar os danos 
causados a munícipe por enchentes se inexistem provas de que a Administração municipal tenha agido com culpa, tanto no que ser 
refere a eventuais entulhos que dificultaram a vazão de águas do rio ou entupiam bocas de lobo, quanto à aprovação do loteamento 
em que foi construída a casa atingida pela inundação” (RT 843/240). Atenção: a responsabilidade civil do Estado – União, 
Estados Membros, Municípios e suas autarquias etc. – é objetiva, CF, art. 37, § 6º, CC, art. 43. As exceções são quando da 
prestação de serviços, como neste caso. Ver na doutrina: CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil, 7 ed. 
São Paulo: Atlas, 2007, p. 218 e seguintes. 
 11 
Criminal, j. 15.12.94, rel. Des. Silva Pinto, in Rui Stoco. Tratado de responsabilidade civil: 
doutrina e jurisprudência, 7 ed. São Paulo: RT, 2007, p. 1.420).26 
 
 
2.5 Natureza do dever jurídico violado 
 Decorrente do exposto, quanto ao fato gerador a responsabilidade civil ora nasce do contrato, ora do delito 
(vel ex contractu nascitur vel ex delicto), tomando a roupagem contratual ou extracontratual. Em ambas sempre 
existe um dever jurídico preexistente, o que as distingue é a natureza do dever jurídico transgredido. 
Na contratual o dever jurídico dimana da vontade das partes – negocio jurídico bilateral ou unilateral – a 
declaração de vontade é fonte de direito. O dever jurídico é positivo, cumprir a palavra empenhada, o seu 
inadimplemento impõe a responsabilidade. 
Na extracontratual o dever jurídico decorre da vontade do Estado – a lei – imperativo geral e abstrato relativo 
à conduta humana dirigido a todos indistintamente. O dever jurídico é negativo o de não prejudicar (neminem 
laedere); provada a ofensa à norma e o dano evidencia-se a responsabilidade. 
Na lição de José de Aguiar Dias, em uma ou em outra, a conduta qualifica-se pelo descumprimento de um 
dever jurídico precedente, pois a declaração da vontade e a lei vinculam à observância. No mesmo sentido apregoa 
Sergio Cavalieri Filho dentre outros.27 
 Trata-se da teoria dualista eleita pelo Código Civil, embasada na dicotomia que separa as duas espécies de 
responsabilidade civil. Os adeptos da teoria monista ou unitária não aceitam a distinção. Para eles as duas espécies 
conduzem para os mesmos efeitos jurídicos e requerem os mesmospressupostos a começar pela conduta lesiva 
timbrada pelo ato ilícito: contratual ou extracontratual. 
De efeito, a responsabilidade civil contratual e a extracontratual confundem-se ontologicamente e nos efeitos, 
todavia forçoso reconhecer que se distinguem especialmente quanto às exigências probatórias. E aqui sobeja 
importância. 
 Na responsabilidade civil contratual, a culpa da parte contratante que não cumpre o negócio jurídico 
celebrado é presumida, está in re ipsa, dimana do próprio inadimplemento. Enquanto que na responsabilidade civil 
extracontratual, a culpa deve ser provada por aquele que assimilou o dano, a vítima; o que não deixa de ser, por 
vezes, um crucial procedimento. É a regra geral, que admite exceção, conforme será visto no item relativo à 
presunção de culpa. 
 Outra distinção é quanto à mora. Nas obrigações provenientes do ato ilícito, relata o art. 398, do Código Civil, 
considera-se o devedor em mora, desde que o praticou; é a denominada mora ex re. Nas obrigações contratuais nem 
sempre há termo para o adimplemento, mormente nos deveres acessórios de conduta, ou seja, aqueles deveres 
secundários à prestação, e a mora somente decorre após interpelação extrajudicial ou judicial; é a chamada mora ex 
persona, consoante disposição expressa do parágrafo único do art. 397. A principal consequência dessa distinção, 
portanto, dá-se no momento em que se inicia a fluência dos juros moratórios. 
 Outras diferenças contingenciais podem ser articuladas, como no caso de prefixação das perdas e danos, 
que pode ocorrer apenas na responsabilidade civil contratual (cláusula penal compensatória), assim ainda a eleição 
do foro para a ação de reparação de dano. 
 
2.6 Uma distinção nem sempre fácil 
 Não há como negar, por vez ou outra, a dessemelhança entre ambas situa-se em uma zona cinzenta de 
difícil equação. Toma-se como exemplo o motorista de ônibus que ocasiona acidente por transpor sinal vermelho, 
causando lesões nos passageiros. A sua conduta descumpre o dever de parada obrigatória, exposto na lei de 
trânsito. Nessa hipótese há concurso entre as duas espécies de responsabilidade, a lei foi transgredida 
(extracontratual), e o contrato não foi cumprido (contratual). Outro exemplo, a do médico contratado para certa 
cirurgia, que age negligentemente, porquanto deixa de proceder conforme as normas de assepsia; daí o paciente 
adquire uma infecção. Entende-se inadimplido o contrato, pois violada a cláusula tácita de proceder no sentido de 
tomar os cuidados profissionais devidos no desempenho de uma obrigação de fazer, própria do contrato de 
prestação de serviço, embora a transgressão à lei pela conduta negligente. 
Em tais situações, na doutrina e na jurisprudência, prevalece o entendimento de que a responsabilidade civil 
é contratual. 
 
 
26 Nélson Hungria assinala, ainda antes da metade do século passado, que o automóvel se transformara “num verdadeiro flagelo, a 
matar mais que a própria peste branca ou a peste céltica”, e Castro Veiga faz a seguinte imagem: “surgiu um tipo novo de doença 
a que se deu o nome de cronopatia, tão maléfica e nociva quanto a peste que se convencionou chamar de “AIDS”. 
27 DIAS, José Aguiar. Cláusula de não-indenizar: chamada cláusula de irresponsabilidade, 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1980, 
p. 34: “O fato de não existir contrato entre a vítima e o responsável não estabelece, como aquele ponto de vista faz crer, que a 
responsabilidade extracontratual se configure na ausência de obrigação anterior, porque, além da obrigação contratual, existe, 
quando não se queira descer a especificações, a obrigação de não violar a norma jurídica e, afinal, a obrigação ampla de não lesar, 
neminem laedere.” CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil, 8 ed. São Paulo: Atlas, p. 275: “Na 
responsabilidade civil contratual [...] o dever jurídico violado pelo devedor tem por fonte a própria vontade dos indivíduos. São 
eles que criam, para si, voluntariamente, certos deveres jurídicos. A responsabilidade extracontratual, por sua vez, importa 
violação de um dever estabelecido pela lei, ou na ordem jurídica, como, por exemplo, o dever geral de não causar dano a 
ninguém.” 
 12 
2.7 Tutela externa do crédito 
Na tutela externa do crédito, expressão forjada por Orlando Gomes, cuida-se atentar também para a 
distinção entre as duas espécies de responsabilidade civil. 
Pelo princípio da relatividade dos efeitos jurídicos (res inter alios acta), o contrato somente produz efeitos 
jurídicos entre as partes, isto é, aqueles que nele manifestam a sua vontade, vinculando-se ao seu conteúdo, de 
modo que não aproveita e nem prejudica terceiros, aqueles que dele não participam. 
 Por lógico raciocínio, se o contrato decorre do acordo de vontade das partes, não pode ter eficácia em 
relação a terceiros e seu patrimônio. Logo, ninguém se submete a uma relação contratual a não ser que a lei o 
obrigue ou se a própria pessoa o queira. 
 O atual Código Civil, forçoso convir, deixou de considerar o contrato apenas como instrumento de satisfação 
de interesses pessoais das partes contratantes, considerando-o também como de interesse da coletividade, pela 
introdução de outro princípio: o da função social do contrato (CC, art. 421). 
 Mais do que antes, o contrato passou a ter a prerrogativa de oponibilidade contra terceiros, dada a 
importância que ele desempenha para a coletividade, e os terceiros não podem comportar-se como se ele não 
existisse. Hão de respeitar o contrato firmado pelas partes, não interferindo de maneira a prejudicá-lo, quer incitando 
uma das partes a descumpri-lo, quer impedindo-a de cumpri-lo, honrando o que ela prometera. 
 No primeiro caso, o inadimplemento dá-se em razão da cumplicidade de terceiro. Para aquele que é parte a 
responsabilidade é contratual, quanto ao terceiro a responsabilidade é extracontratual. Em um mesmo fato convivem 
as duas espécies, incidindo a solidariedade, quando as duas condutas contribuem para o prejuízo da outra parte 
inocente (CC, art. 942, 2ª parte). Eis decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: “[...] A responsabilidade 
civil extracontratual (delitual ou quase delitual) pode coexistir com a responsabilidade civil contratual, como no caso 
de cumplicidade na violação do contrato [...]” (TJSC, 2ª Câm., j. 10.9.1991, rel. Des. Eduardo Luz, RT 680/167). 
No segundo caso, tem-se a responsabilidade civil extracontratual, porquanto o contrato não foi executado por 
fato exclusivo de terceiro, portanto por alguém estranho à convenção. 
 
Para reflexão 
 Em cada jurisprudência transcrita, qual a espécie da obrigação inadimplida? E qual conduta do agente 
causador do dano que implica na sua responsabilidade? 
 Quais os casos de negócio jurídico bilateral e unilateral? 
 Quais são os denominados “consectários comuns da sucumbência e da mora”? 
 A partir de quando os juros da mora são contados na obrigação contratual e no ato ilícito? Em que artigos 
estão previstos? 
 O que é abuso de direito? Há previsão legal no Código Civil? Se positiva a resposta, em que artigo? 
 O que significa a expressão: “faz surgir o dever de indenizar que, todavia, deve ser arbitrado de forma 
moderada, segundo o princípio do sistema aberto e de acordo com o prudente arbítrio do juiz”? 
 Advogado e dentista que prestam serviços a seus pacientes celebram contrato? Se positiva a resposta, qual 
a modalidade de obrigação que anima esse contrato? Quais os artigos do CC que prevêem a responsabilidade de 
cada um? 
É justo que se recrimine o vizinho por ouvir música em som estridente, considerando os usos e costumes 
atuais, especialmente após o avanço da tecnologia nos aparelhos de reprodução de sons? Qual o conceito jurídico 
de vizinhança? Pesquise. 
 Será que essa conduta não está dentro da interferência tolerável? 
Se cada um tem o direito deouvir música, como é direito de cada um fazer cessar as interferências 
prejudiciais ao sossego, não se está, portanto, diante da aplicação do princípio da coexistência dos direitos? O que é 
esse princípio? Como resolver a questão? 
 É personalíssimo o direito à imagem e à intimidade. Qual o conceito de um e de outro? Direito personalíssimo 
é sinonímia de direito da personalidade de que tratam os artigos 11 a 21, do Código Civil? 
 Por que o Estado responde pela morte de detento? 
 Por que o Município responde por enchentes, cujo motivo é o entupimento de bueiros e galerias pluviais? 
Nas duas jurisprudências acima transcritas, sobre a morte de detento e a inundação em razão da chuva, os 
acórdãos referem-se às mesmas espécies de responsabilidade do Estado e do Município? As decisões são 
consentâneas ou contraditórias? 
 Distinga a responsabilidade civil contratual da extracontratual. 
 Por que na responsabilidade contratual é mais fácil a prova da responsabilidade do agente causador do 
dano? 
 Formule, valendo-se da sua capacidade inventiva, uma responsabilidade civil contratual e outra 
extracontratual, tomando por exemplos fatos de sua vida. 
 Além do contrato escrito, podem existir contratos verbal e tácito? Pesquise. 
 
2.8 Responsabilidade civil subjetiva 
Um motorista transita pela via tributária, não respeita o sinal de transito de parada obrigatória, invade a pista 
preferencial e ocasiona acidente com dano a outrem. 
 13 
 Trata-se de responsabilidade civil subjetiva, que conforta a sua justificativa na conduta culposa. É também 
denominada teoria clássica ou teoria tradicional da culpa.28 
 No exemplo, o motorista labora com culpa ao contravir o sinal regulamentar de trânsito, embora o seu 
entendimento ético-jurídico fosse no sentido de portar-se com cuidado objetivo, parando o veículo ante a advertência 
de normatização do tráfego e neste sentido devesse ser a sua determinação volitiva, pois assim a circunstância o 
exigia. Entretanto, age com imprudência e o efeito jurídico é contrário à sua vontade, deve ressarcir as perdas e 
danos decorrentes. 
 
Responsabilidade civil – Acidente de trânsito – Inobservância da placa de “Pare”, 
avançando por cruzamento de via preferencial – Indenizatória procedente, quer também 
quanto à desvalorização do veículo, admitida a incidência da correção monetária (1º 
TACivSP, 8ª Câm., j. 21.10.1980, rel. Juiz Negreiros Penteado, JTACSP 70/75).29 
 
 Reforçando, essa espécie de responsabilidade civil inspira-se no ato ilícito, o qual implica na ideia de conduta 
culposa. A culpa, por sua vez, pode ser considerada em sentido restrito, quando se manifesta pela negligência, 
imprudência ou imperícia, que se opõe ao dolo, ou em sentido amplo que açambarca o dolo, a vontade dirigida para 
o evento. Na culpa, o agente causador do dano quer a conduta, mas não quer o dano; no dolo, quer tanto a conduta 
quanto o dano. 
 Estudo mais pormenorizado de culpa será abordado no pressuposto da conduta, isto porque a culpa 
considerada isoladamente tem relevância apenas conceitual, para adquirir relevância jurídica deve integrar a 
conduta.30 
 Na Parte Geral do Código Civil, a responsabilidade civil subjetiva esteia-se no art. 186: “Aquele que, por ação 
ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente 
moral, comete ato ilícito.” 
 O ato ilícito de que trata este artigo é todo ato contrário às normas de Direito Público ou de Direito Privado, 
sendo os seus elementos estruturais a antijuridicidade, a culpabilidade, o dano e a imputabilidade. 
 A antijuridicidade é toda ação ou omissão humana adversa ao ordenamento jurídico, que ofende direitos 
alheios. Ordenamento jurídico que é constituído por comandos dirigidos às pessoas para que ajam de determinados 
modos, ou se abstenham de certas ações. Há uma contrariedade entre a conduta humana e a norma jurídica, 
independentemente de qualquer juízo de censura. Compõe o aspecto objetivo da ilicitude. 
 Já a culpabilidade é o estado do culpável, do que pode ser imputado ao agente causador do dano a título de 
dolo ou culpa. A pessoa é culpada quando poderia e deveria ter agido em consonância com a prescrição da lei, mas 
não o faz. Só pode ser atribuída à pessoa capaz por ter discernimento e vontade, isto é, o agente há de ter liberdade 
para determinar-se. Compõe o aspecto subjetivo da ilicitude. 
O dano, como já assinalado, é todo prejuízo sofrido por uma pessoa, em qualquer bem ou interesse 
juridicamente tutelado, patrimonial, moral ou estético. É o elemento unificador da responsabilidade civil, a partir dele é 
que se justifica a atuação normativa. Sem dano não há responsabilidade. 
 A imputabilidade é a atribuição da conduta danosa a determinada pessoa capaz, pois o incapaz é 
inimputável. Responde à indagação sobre a razão pela qual é atribuído a alguém o dever indenizatório. 
 A importância do ato ilícito reside, pois, no fato de ser fonte das obrigações, dando ao advento uma relação 
jurídica cujo objetivo é o ressarcimento do dano. 
Na Parte Especial do Código Civil, a responsabilidade civil subjetiva está prevista no artigo 927: “Aquele que, 
por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” 
 São seus pressupostos: 
a) uma conduta culposa ou dolosa (culpa lato senso); 
b) o dano daí decorrente; 
c) o nexo de causa e efeito entre um e outro. 
 No sistema anterior, quando em curso o Código Civil de Bevilaqua, o centro da responsabilidade civil era a 
culpa, com raras exceções à teoria objetiva, quando diretamente prevista em lei, assim entendendo, por exemplo, os 
direitos de vizinhança (CC 16, art. 554), o fato da coisa animada ou inanimada (CC 16, art. 1.527 a 1.529), o contrato 
de transporte (Lei 2.681, de 7.12.1912), entre outros poucos. 
 
2.9 Jurisprudência 
 
28 Ensina Washington de Barros Monteiro: “Teoria da responsabilidade civil subjetiva – Esta é a teoria clássica e tradicional da 
culpa, também chamada de teoria da responsabilidade civil subjetiva, que pressupõe sempre a existência de culpa (lato sensu), 
abrangendo o dolo (pleno conhecimento do mal e direta intenção de o praticar) e a culpa (strito sensu), violação de um dever que 
o agente podia conhecer e acatar, mas que descumpre por negligência, imprudência ou imperícia.” (Curso de direito civil: direito 
das obrigações, volume 5º: 2ª parte, 34 ed. ver. e atual. por Carlos Alberto Dabus Maluf e Regina Beatriz Tavares da Silva, São 
Paulo: Saraiva, 2003, p. 449). 
29 Atualmente com o avanço da mecânica que proporciona a substituição de peças, sem deixar vestígio da colisão, não mais se 
admite a desvalorização do veículo. Exceto nos casos em que a evidência da colisão fica marcante no veículo, pela 
impossibilidade de sua recuperação total. 
30 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil, 7 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 23. 
 14 
Indenização – Dano moral – Envio de mensagem eletrônica – Calúnia. A violação da honra, 
em virtude de envio de mensagem eletrônica, imputando falsamente a prática de fato 
definido como crime, enseja dano moral (TAMG, 2ª Câm. Civ., rel. Juiz Roberto Borges de 
Oliveira, publ. DJMG 03.03.2004, in RJ 317/139). 
 
Indenização – Dano moral – Cheque pós-datado – Apresentação antecipada – Devolução – 
Inscrição de nome – Cadastro de emitentes de cheques sem fundos (...). Sendo o cheque 
emitido para pagamento em data posterior, sua apresentação antecipada, dando ensejo a 
sua devolução por insuficiência de fundos e inscrição do emitente no cadastro de emitentes 
de cheques sem fundos, implica o dever de reparação por danos morais [...] (TAMG, 2ª 
Câm. Civ. Rel. Juiz Alberto Aluízio Pacheco de Andrade, publ. DAMG 04.03.2004, in RJ 
317/139). 
 
A responsabilidade civil no transporte puramente gratuito é aquiliana e nãocontratual, 
respondendo o transportador pelos danos que causar ao carona em razão de culpa grave 
na condução do veículo. Inteligência dos arts. 186 e 927 do CC. (TJMA, 3ª Câm. Civ., j. 
20.10.2005, rel. Desa. Cleonice Silva Freire, RT 845/327).31 
 
Responsabilidade civil – danos a prédio vizinho – Indenização pleiteada pelo locatário – 
Possibilidade – Titular de fundo de comércio. Tem legitimidade para cobrar o reembolso do 
que gastou na reforma do imóvel danificado por culpa do vizinho o locatário que, havendo 
ali instalado seu estabelecimento comercial, o incorporou a essa universidade de bens que 
é seu fundo de comércio (1º TACivSP, 2ª Câm., j. 24.03.83, rel. Juiz Rangel Dinamarco, RT 
580/162). 
 
Civil e processual civil. Acidente rodoviário. Veículo de transporte pesado que invade pista 
em sentido contrário vindo a causar sinistro. Dano moral e material. Cabimento. Boletim de 
ocorrência. Presunção juris tantum. Ausência. I – Demonstrada a culpa do motorista que, 
ao invadir a pista de rolamento em sentido contrário, causou grave acidente de trânsito, 
impõe-se o dever de indenizar. II – O boletim de ocorrência não goza de presunção juris 
tantum dos fatos articulados, vez que o policial registra o fato de acordo com o que lhe é 
narrado, não fazendo por isso prova absoluta. III – Recurso não provido (TJMA, 2ª Câm. 
Civ., j. 17.10.2006, rel. Des. Antônio Guerreiro Júnior, RT 858/328). 
 
2.10 Responsabilidade civil objetiva 
Outro caso de responsabilidade civil quanto ao fundamento pode ser reproduzido no contrato de transporte. 
Alguém adquire passagem de uma cidade para outra com determinada empresa. Celebra uma obrigação de fazer, se 
inadimplida, a empresa transportadora responde pelo prejuízo causado ao passageiro sem indagação do 
pressuposto subjetivo da culpa. Nessa espécie de contrato vige a denominada cláusula de incolumidade, por conter 
uma obrigação de resultado, na qual o devedor somente cumpre a prestação se alcançar o fim colimado pelo credor. 
Por isso, é também chamada de obrigação de fim. 
Trata-se da responsabilidade civil objetiva, que não cogita da conduta culposa ou dolosa do agente causador 
do dano, basta a relação de causa e efeito entre o dano experimentado pela vítima e a ação ou omissão do agente. 
Estabelecida esta causalidade abrolha, de pronto, a obrigação de indenizar. Por isso, é também denominada 
responsabilidade civil sem culpa. 
 
Responsabilidade civil – Indenização – Transporte rodoviário de passageiros – Extravio de 
bagagem – Passageira que não indicou o que levava em sua mala – Irrelevância – 
Transportador que assume responsabilidade de resultado atinente à chegada ao destino 
contratado não só do passageiro, mas também de seus pertences – Verba devida. Ementa 
da Redação: Tratando-se de extravio de bagagem em transporte ferroviário, é devida 
indenização à passageira, ainda que não indicado o que levava em sua mala, uma vez que 
em contrato de transporte, assume o transportador a responsabilidade de resultado atinente 
à chegada não só do passageiro, mas também dos seus pertences ao destino contratado 
(1º TACivSP, 2ª Câm., j. 10.11.2004, rel. Juiz Borelli Thomaz, RT 835/250). 
 
 
31 A responsabilidade civil nos transportes onerosos de pessoas e mercadorias é contratual e objetiva, como se verá logo em 
seguida. Além do transporte gratuito ou de cortesia e o oneroso, existente uma terceira categoria, o transporte aparentemente 
gratuito ou interessado, ad exemplum, o que o patrão oferece ao empregado na ida e volta do trabalho, do corretor que leva cliente 
ao imóvel que está a venda etc. Como regra geral, no acidente de transito a responsabilidade é extracontratual e subjetiva. A 
exceção é o contrato de transporte (CC, art. 734). 
 15 
 A responsabilidade civil objetiva, no caso em testilha, é prevista na lei. Estampa o art. 734, do Código Civil: 
“O transportador responde pelos danos causados às pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força 
maior (externa), sendo nula qualquer cláusula excludente de responsabilidade.”32 
 É o que dispõe a primeira parte do art. 927, parágrafo único: “Haverá obrigação de reparar o dano, 
independentemente de culpa, nos casos previstos em lei [...]”. A exclusão da culpa traz maior abrangência à 
responsabilidade civil, protegendo de forma mais ampla a vítima inocente de dano. 
 Não se investiga nem sequer a antijuridicidade – muito menos a culpabilidade – do fato danoso; considera-
se, sim, se ocorreu o evento e se dele emanou o dano. Equivale afirmar, também o ato lícito pode ensejar a 
responsabilização do agente que ao praticá-lo ocasione dano. 
Outra faceta dessa espécie de responsabilidade civil está prevista na parte final do citado parágrafo único do 
art. 927: “[...] ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco 
para os direitos de outrem.” 
É a grande novidade do Código Civil de Reale, elegendo uma previsão genérica em cláusula geral33. Desde 
há tempos, Caio Mário da Silva Pereira pontificava que o Direito moderno já não visava o autor do ato, porém a 
vítima, acrescendo que juristas e tribunais, manifestando franca tendência pela doutrina objetiva, reclamavam contra 
a ausência de disposição genérica a permitir a sua afirmação no Direito pátrio.34 E modernamente, Carlos Alberto 
Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho prestam merecida homenagem: “de uma coisa não se tem dúvida: aqui foi 
adotada a teoria do risco criado cujo maior defensor é o mestre Caio Mário”.35 
Duas questões são apresentadas, definir atividade normalmente desenvolvida e risco. 
A primeira é toda atividade organizada, não eventual ou casual, difere do ato avulso, não praticado com 
assiduidade. Não precisa ser uma atividade empresarial, mas que seja habitualmente exercida, assim por meio de 
uma profissão ou mesmo de uma associação que, como se sabe, não tem finalidade lucrativa. Qualquer atividade 
isolada, sem o caráter da habitualidade, permanece sob o manto da incidência da culpa.36 
A segunda é o risco. Na parafernália do mundo moderno, cabe indagar: o que não causa risco? Em Grande 
Sertão Veredas, registra Guimarães Rosa, viver, por si só, já é um risco. Pode-se dizer, contudo, que risco é perigo. 
Traduz-se na circunstância concreta que prenuncia a ocorrência de dano. Pioneiramente, o art. 2.050, do Código Civil 
italiano37, que contém norma análoga, adota o termo perigo, que significa a potencialidade da atividade normalmente 
desenvolvida produzir dano a outrem, mesmo sendo essa atividade lícita e de utilidade social. A doutrina italiana 
elege dois critérios para definir atividade perigosa: a) a quantidade de danos habitualmente causados pela atividade 
em questão; b) a gravidade de tais danos. 
De destacado valor é o primeiro critério, pois considera o ponto de vista estatístico. É o fator quantitativo, que 
sempre se revela provável, in concreto, ou seja, são atividades que a experiência tem demonstrado proporcionar 
elevado número de acidente. Para exemplificar toma-se o digitador, apesar de a atividade, aparentemente, não 
apresentar risco, é grande a ocorrência de dano físico, a chamada LER/DORT, inerente aos movimentos repetitivos 
(LER: lesão por esforços repetitivos; DORT: Distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho). Recorrente 
também a disacusia nos ambientes de trabalho que produzam muito barulho. É uma lesão no epitélio neurosensorial, 
das células ciliadas do órgão Corti, muito comum no operário que se submete à constante e pernicioso ruído, 
levando-o à surdez progressiva e permanente. 
O que não se mostra razoável é deixar o conceito de risco ao arbítrio do senso comum, pois não se chegará 
a critério aceitável. No senso comum notam-se dissonâncias cognitivas que geram impropriedades. Proveitoso para 
assim demonstrar é o transporte. As pessoas

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