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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ – REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO PÓS-GRADUAÇÃO PROJETO “A VEZ DO MESTRE” CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR ANÁLISE VOCACIONAL, BASEADA NA MODALIDADE CLÍNICA, ATUANDO COMO FACILITADORA NA ESCOLHA PROFISSIONAL DO ADOLESCENTE. LÚCIA MARA DE MELLO SERRA SANTOS Rio de Janeiro, janeiro de 2002. UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ – REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO PÓS-GRADUAÇÃO PROJETO “A VEZ DO MESTRE” CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR ANÁLISE VOCACIONAL, BASEADA NA MODALIDADE CLÍNICA, ATUANDO COMO FACILITADORA NA ESCOLHA PROFISSIONAL DO ADOLESCENTE. LÚCIA MARA DE MELLO SERRA SANTOS Monografia apresentada à Universidade Candido Mendes como requisito parcial da realização do curso lato sensu em docência do ensino superior, sob a orientação da professora Maria Esther de Araújo Oliveira. Rio de Janeiro, janeiro de 2002 Dedico com muito carinho ao meu irmão, LUIZ FERNANDO, que me motivou a buscar novos caminhos. “quando eu tiver setenta anos então vai acabar esta adolescência vou largar da vida louca e terminar minha livre docência vou fazer o que meu pai quer começar a vida com passo perfeito vou fazer o que minha mãe deseja aproveitar as oportunidades de virar um pilar da sociedade e terminar meu curso de direito então ver tudo em sã consciência quando acabar esta adolescência” Paulo Leminsky AGRADEÇO ADEUS, À orientadora e a todos os instrutores do curso de Pós-graduação de Docência do Ensino Superior, que ajudaram na minha especialização profissional, promovendo através de suas experiências, o alicerce que necessitava para alcançar o meu crescimento profissional. RESUMO A dificuldade do jovem em escolher uma profissão, ocupa um lugar de destaque nos conflitos vividos pelos adolescentes. É um momento crucial, em que o jovem tem que definir uma profissão, ao mesmo tempo em que está definindo sua identidade. O ato de escolher, às vezes, é tão complexo, que o jovem sente-se desorientado e com dificuldade de fazer uma escolha que lhe dê uma satisfação pessoal. Diante dessa complexidade vocacional, o presente trabalho pretende comprovar, através de pesquisas bibliográficas, que a análise Vocacional é uma atividade que visa facilitar esse processo de escolha, baseada em técnicas e aliada a um conjunto de informações sobre o mundo do trabalho, promove a elaboração de conflitos, possibilitando o jovem de encontrar sua identidade ocupacional. Para tanto, salienta conceitos e esclarecimentos sobre o que é Análise Vocacional e as diferentes modalidades de atuação, bem como sua importância como atividade individual ou em grupo no processo de escolha profissional do adolescente. Compreendendo ainda, que a identidade ocupacional é um aspecto da identidade do sujeito, apresenta uma abordagem sobre adolescência, suas crises e seus conflitos, associados a um estudo sobre vocação, reparação e luto a fim de esclarecer melhor a dinâmica da personalidade do adolescente. Ressalta também as influências do grupo familiar, do grupo de pares e as influências do sistema produtivo, já que conforme o processo de identificações, o adolescente fará seu engajamento profissional. Devido a importância desse engajamento profissional esclarece de forma mais detalhada o que a literatura apresenta sobre a identidade ocupacional e a identidade vocacional. Desses estudos considera fundamental o adolescente perceber a necessidade de ser sujeito ativo de sua escolha profissional e que lhe proporcionará uma satisfação pessoal a medida que ele conseguir relacionar seus gostos e interesses com o mundo externo. Como conclusão, fica evidenciado que a Análise Vocacional facilita o autoconhecimento do jovem, ajuda-o a perceber o que está impedindo-o de escolher e assim, sem impor solução, auxilia o adolescente a viabilizar uma escolha profissional com liberdade de mudá-la. Visto dessa forma, a vocação não é inata e pode sofrer alterações ao decorrer do tempo, logo a Análise Vocacional deve estar baseada na modalidade clínica, no sentido de promover atividades que ajudem o jovem a aprender a escolher. O adolescente que consegue perceber o seu mundo interno e suas relações com o mundo externo e elaborar de forma positiva os seus conflitos, é um adolescente que adquiriu uma identidade pessoal e, por conseguinte, terá possibilidades de fazer uma escolha profissional de forma madura e ajustada. SUMÁRIO RESUMO INTRODUÇÃO......................................................................................................07 1 – ANÁLISE VOCACIONAL – UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA............09 1.1 – Diferenciação entre Modalidade Clínica e Modalidade Estatística.....11 1.2 – Atendimento individual ou em grupo.....................................................12 2 – ADOLESCÊNCIA............................................................................................14 2.1 – Identidade e Crise....................................................................................15 2.2 – Vocação – Reparação – Luto..................................................................18 3 – INFLUÊNCIAS NO PROCESSO DE ESCOLHA........................................22 3.1 - Influência do Sistema Produtivo.............................................................22 3.2 - Influência do Grupo Familiar e do Grupo de Pares.............................24 4 – IDENTIDADE OCUPACIONAL E IDENTIDADE VOCACIONAL........26 CONCLUSÃO........................................................................................................27 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................29 7 INTRODUÇÃO A velocidade dos acontecimentos e das mudanças atuais, associadas a um contexto socioeconômico de instabilidade, desemprego e alta competitividade, exigem pessoas mais preparadas, tendo um compromisso consigo mesma e com a profissão que venha a escolher. A contemporaneidade do mercado de trabalho leva o indivíduo a ganhar ou a perder prestígio e condiciona a inserção dele na sociedade. O jovem diante dessa realidade vive um verdadeiro dilema, tendo que construir seu projeto de vida, atendendo à subsistência e ao mesmo tempo à realização e satisfação pessoal. Esse momento torna-se ainda mais difícil por coincidir com a fase de definição de si mesmo, em que o jovem está se descobrindo. É o momento em que ele está definindo a sua identidade. Definir uma profissão que preencha o adolescente em sua totalidade é extremamente complexo. A problemática vocacional envolve fatores que por vezes geram conflitosfrente à situação de escolha. Esses fatores se referem ao próprio processo de desenvolvimento do adolescente, numa confluência de vivências pessoais e socioculturais. O jovem, naturalmente em crise, devido a mudanças corporais, sociais e cognitivas, depara-se com as exigências do mundo adulto que lhe cobra uma realização profissional e se vê diante de um leque de profissões que muitas vezes desconhece o campo de atuação. Sendo assim, diante da complexidade que uma escolha exige associada a instabilidade entre o que se é e o que quer ser, o adolescente sente-se desorientado, interessando-se por várias profissões ou sem ligar-se a nenhuma delas, apresentando dificuldades de discriminação tanto de objetos externos como internos, com dificuldades no processo decisório de elaborar uma escolha autônoma em relação a seu futuro profissional. Às vezes, a escolha se torna tão conflitiva para o jovem, que se faz necessário a intervenção de um profissional especializado para ajudá-lo no processo de escolha. O ato de escolher torna-se menos sofrido, quando o jovem, consegue elaborar seus conflitos e 8 assim chegar a uma escolha mais autêntica e acertada, buscando uma profissão que terá o seu perfil, trazendo uma maior satisfação pessoal. Acreditando que a escolha profissional, não é somente decidir o que fazer, mas, principalmente quem ser, e reconhecendo que o período de crise e de conflito emocionais próprios da fase da adolescência dificulta o processo de escolha, o presente trabalho pretende abordar a importância da Análise Vocacional como facilitadora do processo decisório. A Análise vocacional é uma atividade desenvolvida para ajudar o jovem nesse processo, através de técnicas e aliada a um conjunto de informações sobre o mundo do trabalho, aborda a problemática da questão da vocação e do processo decisório e sem impor soluções auxilia o jovem no processo de escolha, despertando a vontade de realizar, de fazer uma escolha consciente sobre si mesmo e sua vida. A proposta é desenvolver uma abordagem através da modalidade clínica, com enfoque psicodinâmico da personalidade do adolescente, levando em conta os aspectos cognitivos, afetivos e socioculturais, buscando desenvolver atividade que ajudem o adolescente aprender a escolher, a descobrir suas potencialidades, de forma a interagir seu mundo interno com o mundo externo, superando obstáculos com maturidade, elaborando seus conflitos e ansiedades em relação ao futuro. E assim, comprovar que a Análise vocacional, baseada na modalidade clínica, atua como facilitadora diante do processo de escolha, auxiliando o adolescente a buscar o autoconhecimento, como também a autonomia e a responsabilidade de uma escolha profissional que poderá realizá-lo como indivíduo. Para tanto, a Análise Vocacional deve ser vista como uma etapa natural incorporada ao processo de ensino-aprendizagem-formação do indivíduo. 9 1 -ANÁLISE VOCACIONAL – UMA VISÃO CONTEMPORÂNEA O mundo contemporâneo dominado pela tecnologia e globalização, busca uma nova visão onde tudo interage e nada fica estagnado. Diante da atual conjuntura, onde a palavra chave é empreendimento e criatividade, conforme relato de consultores atuais, não se concebe mais um ser passivo, recebendo pronto o caminho que deverá percorrer. Assim também, a abordagem no campo vocacional, com o decorrer da história sofre avanços e transformações. A Orientação Vocacional, a partir de teste de aptidão e interesse que se propõe a dar uma resposta pronta, definitiva para o indivíduo, vai cedendo lugar a uma abordagem mais dinâmica, com conceitos psicanalíticos e uma postura existencialista, reconhecendo o jovem como um ser ativo em processo, capaz de decidir seus caminhos. Essas mudanças ocorreram inicialmente na Argentina, por psicólogos como Bohoslavsky, Marina Müller, entre outros. A nova proposta tem seu embasamento na modalidade clínica e acredita que o jovem pode chegar a uma decisão profissional pela elaboração de sua identidade vocacional-ocupacional e ser capaz de uma decisão autônoma. A Análise Vocacional (muitas vezes usada com outras nomenclaturas) é um dos campos de atuação do psicólogo em que o cliente busca uma resposta para suas dúvidas pertinentes a uma escolha profissional, normalmente jovens que enfrentam a passagem de um ciclo educativo a outro. Segundo Bohoslavsky (1977, p.32), usando a terminologia Orientação Vocacional, define como: “Colaboração não diretiva com o cliente, no sentido de restituir-lhe uma identidade e/ou promover o estabelecimento de uma imagem não conflitiva de sua identidade profissional”. Assim, definido, quem se dedica deve ser um psicólogo devidamente treinado no emprego da Estratégia Clinica. O psicólogo, fazendo uso da estratégia clínica, busca desenvolver atividades que ajudam o jovem a aprender a escolher, a descobrir suas potencialidades, considerando os aspectos cognitivos, afetivos e culturais, de forma que ele possa elaborar seus conflitos, interagindo seu mundo interno com seu mundo externo, superando dificuldades e fazendo 10 uma escolha profissional com autonomia, responsabilidade e maturidade. Aplicar a Estratégia Clínica é compreender o outro, é perceber e fazer o outro se perceber. Aborda como objeto de estudo o Comportamento Humano no sentido de promover benefícios a ele, favorecendo mudanças, prevenindo dificuldades. Essa abordagem contribui para que o indivíduo possa refletir sobre a responsabilidade de traçar o seu caminho, tornando-se sujeito ativo da sua escolha profissional. Como sujeito da escolha, o adolescente aprende a escolher uma profissão de forma mais consciente que possa realizá-lo como pessoa, rompendo com o determinismo que impõe um futuro pré -definido. Para tanto, é necessário, eliminar a idéia que a vocação é inata, que o jovem será dotado de determinadas aptidões para o resto da vida. É perfeitamente natural, o adolescente, ao longo do tempo identificar-se com outras profissões, ter novos interesses. Diante dessa abordagem contemporânea, o psicólogo que atuar no campo de Análise Vocacional, enquanto prática psicológica, não deve ter uma postura diretiva, e sim analítica, daí o termo Análise Vocacional ter sido empregado ao invés de Orientação Vocacional. O psicólogo com uma postura analítica passa de orientador a facilitador do processo de escolha profissional. Facilita na busca de informação sobre profissões e mercado de trabalho, como principalmente auxilia o jovem no processo de autoconhecimento, promovendo o desenvolvimento da autonomia e da responsabilidade de uma profissão. Há de ressaltar, que alguns profissionais utilizam-se da terminologia “Orientação Vocacional” ou “Orientação profissional”, mas não aborda a modalidade tradicional que orienta o jovem, informando de forma diretiva o caminho que deverá seguir. Lucchiari (1993) aborda, de forma bastante esclarecedora, essa quebra do aspecto diretivo ou quase impositivo, transformando essa atividade em mecanismo auxiliador do jovem. Diante do vocacional, a postura de quem faz uso da modalidade clínica é atuar como facilitadora, ajudando o adolescente a conhecer e a conhecer-se, para uma escolha profissional consciente e acertada. É na integração do mundo interno com o mundo externo e na elaboração de seus conflitos que o adolescente conseguirá alcançar sua identidade. 1.1 – Diferenciação entre Modalidade Clínica e Modalidade Estatística 11 Para melhor entender o procedimento da Análise Vocacional numa visão mais atual, faz-se necessário uma melhorcompreensão da abordagem da modalidade clínica e da modalidade estatística conforme relato de Bohoslavsky (1977). A importância dessa diferenciação reside no fato de que a aplicação, dessa ou daquela modalidade, corresponderá numa postura diferente de atuação profissional. Há de se ressaltar, contudo, que a tendência atual, segundo pesquisas, é a modalidade clínica. A Modalidade Estatística é uma prática tradicional em Orientação Vocacional. Utiliza-se de testes como instrumentos fundamentais para conhecer as aptidões, os interesses do sujeito, acrescido de informações profissionais e entrevistas psicológicas. Como resultado faz-se um prognóstico conclusivo que orienta a profissão ou campo de atuação mais compatível com o perfil do sujeito. Nessa prática tradicional, acredita-se que há um homem certo para o lugar certo. Considera que cada carreira ou profissão requer aptidão específica que pode ser definida a priori e medida, se o sujeito se ajusta, fará uma carreira bem sucedida. O psicólogo deve desempenhar um papel ativo, aconselhando o jovem na sua decisão, pois estes não são capazes de fazer suas próprias escolhas. Sendo assim, essa modalidade concebe o indivíduo como ser passivo e que deverá receber pronto o caminho a percorrer para ser bem sucedido profissionalmente. Não leva em conta as transformações socioculturais e parte da idéia que as profissões não mudam. Conhecendo a situação atual pode-se predizer o desempenho futuro. A Modalidade Clínica, diferente da modalidade Estatística, vê o homem como um ser ativo em processo, capaz de decidir seus caminhos. Enfatiza a dinâmica da personalidade e acredita que as carreiras e profissões requerem potencialidades e que estas não são específicas, logo não podem ser definidas a priore e nem mensuráveis. Essas potencialidades modificam-se, assim como a realidade sóciocultural. Acredita no surgimento de carreiras novas e de especialidades que estão sempre mudando. Embora alguns profissionais possam utilizar-se da aplicação de teste, não é utilizado como instrumento fundamental. Seu principal instrumento é a entrevista e técnicas psicológicas que possam auxiliar o jovem a compreender os aspectos internos e externos, contribuindo para uma decisão madura e consciente. 12 Na modalidade clínica, a comunicação é fundamental, na medida que promove um maior conhecimento do sujeito, permitindo alterações que sejam favoráveis ao processo decisório. A preocupação não é com o que se escolhe, e sim, como se escolhe. A tarefa do psicólogo é esclarecer e informar, sem impor soluções, participando como facilitador do processo criativo. A idéia principal é que a identidade ocupacional se desenvolve como um aspecto da identidade pessoal e sendo assim, não deve ser considerada como algo definido, mas como um processo submetido às mesmas leis e dificuldades que ocorrem na busca da identidade pessoal. Para o adolescente definir o futuro, não é somente definir o que fazer, mas fundamentalmente, definir quem ser, ao mesmo tempo quem não ser. Para reforçar a importância dessa modalidade, Bohoslavsky (1977) aborda a importância da questão ética no processo de escolha. A ética surge do fato de que o homem é sujeito da escolha e nenhum profissional por mais capacitado tem o direito de expropriar. O profissional diante da modalidade clínica não deve fazer uso de uma postura diretiva. Os conflitos vocacionais deverão ser compreendidos como processo normal da adolescência e, que apesar da crise, o jovem poderá ser sujeito ativo de sua escolha profissional. Do resultado da elaboração da crise em o jovem que vive, associada aos mecanismos empregados para superá-la ocorrerá o desenvolvimento de novas formas de relação com o seu mundo interior e seu mundo exterior, o que possibilitará a formação de uma identidade ocupacional. 1.2 – Atendimento Individual ou em Grupo O processo de escolha profissional pode ser individual ou em grupo. Contudo autores contemporâneos preferem trabalhar a questão da vocação em grupo. Lucchiari (1993) relata que o trabalho em grupo alcança maiores resultados porque é próprio do adolescente o convívio em grupo e turmas. No momento em que ele busca sua identidade é importante sentir-se igual aos outros, de forma a possibilitar uma troca, em que cada participante torne-se um facilitador do outro, auxiliando no conhecimento que 13 cada membro busca de si mesmo ao compartilhar sentimentos de dúvidas e inseguranças em relação à escolha profissional. Rappaport (1998) argumenta que, apesar do estudo das vocações realizadas individualmente possibilitar um maior aprofundamento das questões da vida do jovem, a abordagem grupal possibilita o atendimento de um número maior de jovens e propicia um maior entrosamento. Acrescenta que a diversidade de visões dos participantes enriquecem cada indivíduo, que em geral, apresentam para o grupo aspectos da realidade que costumam influenciar na escolha profissional. Cabe ressaltar que a Análise Vocacional empregada em grupo ou individual, não contempla uma proposta diretiva. O jovem é responsável por sua escolha e mesmo que não chegue a fazer uma escolha no final do processo, algo terá mudado dentro dele. O processo decisório continua, não termina quando acaba a análise, pois ele terá aprendido a refletir sobre a questão da vocação e mais tarde quando ele conseguir elaborar seus conflitos, a escolha acontecerá. De todo modo, a Análise vocacional pretende levar o adolescente a conhecer-se, através de processos dinâmicos, refletindo sobre as expectativas e conflitos que envolvem a personalidade de cada um, ligando o crescimento pessoal com o crescimento vocacional, fortalecendo-o e dando-lhes condições de fazer sua escolha profissional de forma mais consciente. 14 2 – ADOLESCÊNCIA É no período da adolescência que ocorre a maior dificuldade em relação a uma escolha profissional por coincidir com o momento em que o jovem está buscando a sua identidade pessoal. Faz-se necessário então, um estudo sobre a adolescência, seu significado e sua implicação perante um engajamento profissional. A tendência atual é assinalar a adolescência como um processo evolutivo que compreende os aspectos biológicos, psicológicos, sociais ou culturais que são peculiares ao jovem, e não apenas como um momento de transição entre a infância e a idade adulta, como se pensava até a algum tempo atrás. É na adolescência que ocorre o ápice da maturação biopsicossocial do indivíduo. Segundo Osor (1989, p.21), a adolescência deve ser entendida: “Como um conjunto de transformações psicológicas que acompanham o fenômeno biológico da puberdade – é a resultante de um paralelogramo de forças, onde os fatores intrapsíqiuicos e socioculturais constituem os vetores que a compõem”. Ainda conforme Osor, embora alguns autores caracterizem a puberdade como uma fase inicial da adolescência, predomina a concepção universal que ela pode precedê-la ou sucedê-la. O que caracteriza a puberdade são modificações biológicas dessa faixa etária, enquanto que a adolescência caracteriza-se por transformações psicossociais. Knobel (1981) adverte que as mudanças físicas da puberdade influenciam no processo da adolescência, a medida que essas modificações biológicas, própria da puberdade, provocam no jovem uma série de situações psicológicas que culminam com a sua identidade sexual. Vale dizer que o fenômeno puberdade é universal e seu início é cronológico se considerarmos a normalidade física, coincide com todos os povos,com raríssimas exceções como o caso dos Pigmeus, púberes aos oito anos de idade, de acordo com relato de Osor. A adolescência, ao contrário, tem características peculiares que se desenvolvem segundo o ambiente sociocultural em que vive, considerando ainda aspectos biológicos e 15 psicológicos do indivíduo, não é um período estagnado e sim um processo, marcado na maioria das vezes por desequilíbrios e instabilidades. 2.1–Identidade e Crise A adolescência é um período em que o jovem busca uma individualidade, procurando torná-se um ser único. Essa busca de identidade do jovem é acompanhada por transformações no crescimento físico, no amadurecimento sexual e na consciência social. Generalizando, identidade é o conceito que uma pessoa faz de si mesmo como indivíduo inserido em seu meio, percebendo-se como uma unidade separada e distinta dos outros indivíduos. Erikson (1968) aborda o processo de formação de identidade do adolescente como uma configuração em evolução, composta por sínteses e resssinteses do ego vividos no período infantil. Essa configuração corresponde a uma interação gradativa aos dados constitucionais, à maturação sexual, à identificações significativas, à defesas efetivas, à sublimações bem sucedidas e à papéis coerentes. Para ele, a identidade contém uma soma de identificações sucessivas vividas na infância, quando a criança queria ser como as pessoas de quem dependiam e as crises vividas vão sendo resolvidas em novas identificações com companheiros da mesma idade e com figuras líderes fora do ciclo familiar. Seus valores sociais e éticos estão relacionados com a influência dos pais e dos pares e é nesse período também que ocorrem transformações na capacidade intelectual, gerando uma certo absolutismo de suas idéias, para adquirir poderes na maneira de lidar com o mundo adulto e assim, questionar o meio com a intenção de modificá-lo. Essa intelectualização é uma defesa para se afastar dos conflitos e envolver-se em questões filosóficas como forma de negar o reconhecimento de não poder mudar a sua realidade. Como resultante de experiências e críticas vivenciadas pelo jovem durante o período da infância acompanhada por transformações corporais e pela aquisição de novas capacidades cognitivas, o adolescente vive uma vulnerabilidade, tendo que atender ainda as expectativas e exigências da família, dos amigos e da sociedade, gerando conflitos e crises existências que culminam com a formação de sua identidade. 16 As transformações em seu corpo, bem como a exigências do mundo adulto criam conflitos no jovem, fazendo com que ele crie defesas, por se sentir a princípio invadido. Contudo, ao mesmo tempo em que procura refugiar-se em suas conquistas infantis, onde se sente protegido, também deseja participar do que o mundo adulto pode lhe proporcionar, só que na maioria das vezes sente-se despreparado. É o momento da internalização, em que o adolescente mesmo em crise, tem que harmonizar-se com aspectos da sua personalidade, no sentido de preparar-se para as tarefas que o mundo adulto lhe impõe. Compete ao ego integrar os aspectos psicossociais e psicossexuais e ao mesmo tempo integrar os novos elementos de identificações com os que já existiam, procurando superar as descontinuidades que por ventura ocorram. O jovem para atravessar a crise, deve resolver as questões referentes aos requisitos do crescimento fisiológico, desenvolver um amadurecimento mental com responsabilidade social. Para Osor (1989), o conceito operacional de identidade ocorre a partir dos vínculos de integração espacial, temporal e social introduzidos na literatura por Grinberg: O vínculo de integração espacial se faz através da imagem que se tem do próprio corpo, tornando-o único como indivíduo. O vínculo de integração temporal está ligado ao fato do indivíduo ser capaz de recordar-se do passado, projetar o futuro, como sendo capaz de ser o mesmo durante sua vida, apesar das mudanças internas e externas que venham a ocorrer. O vinculo de integração social está associado ás inter-relações pessoais, a princípio com as figuras parentais e depois com todas as figuras envolvidas afetivamente com o indivíduo ao longo da vida. Acrescenta ainda, que o sentimento de identidade é função de um equilíbrio dinâmico entre os três vértices de um triângulo, conforme figura abaixo. O que penso que sou O que eu penso que os outros pensam que sou O que os outros pensam que sou SENTIMENTO DE IDENTIDADE Figura 1 17 A tarefa básica da adolescência, sob a ótica psicológica, é a aquisição desses sentimentos de identidade. O jovem passa por desequilíbrio para alcançar a vida adulta e é na elaboração desses desequilibro que o jovem estabelece sua identidade. O jovem busca uma identidade para definir e redefinir a si próprio e uns aos outros, entre o que ele percebe de si mesmo e o que ele acha que os outros percebem e esperam dele. Diante do crescimento acelerado do biológico, a perda da conduta infantil, que antes lhe proporcionava segurança, o adolescente se vê diante de um novo papel imposto pela sociedade e da incerteza dos papéis adulto que o mundo social lhe cobra, mostram-se preocupados com o que possam parecer aos olhos dos outros, comparando com o que eles se julgam ser aos protótipos papéis ideais. Os valores pré-estabelecidos e essa revolução fisiológica acarretam nos adolescentes sentimentos ambivalentes, na medida que ele deseja o mundo adulto ao mesmo tempo em que o teme. Cabe ressaltar em relação à identidade e crise da adolescência, o que Erikson (1968) chamou de moratória psicossocial. Para ele, moratória social é um momento de espera nos compromissos adulto, mas não uma espera passiva. Seria uma tolerância da sociedade e um aprendizado do jovem que se harmoniza com os valores da sociedade. O que o adolescente internaliza e o “rótulo” que ele adquire é de suma importância para o processo de formação da identidade. J. E. Márcia, uma professora adjunta na Universidade da Colúmbia Britânica (Canadá), segundo relato de Gail Sheehy (1989), fez uma contribuição à obra de Erikson, ao fazer distinção entre quatro posições “normais” na formação da identidade do indivíduo: x� O grupo da moratória – é o grupo que ainda não fez comprometimentos, contudo enquanto retarda esses comprometimentos, os jovens estão lutando ativamente para sua realização; x� O grupo de identidade predeterminada – parece seguro do que pretende ser, mas fez comprometimento sem crise, aceitando passivamente a identidade dada pelos pais, sem uma busca ativa; x� o grupo de identidade difusa – esquivou-se de definir o que deseja, os jovens não questionam os pais, sentindo-se sempre desajustados; x� O grupo de identidade realizada – passou pela crise e superou-a, e em geral os adolescentes tornam-se adultos bem ajustados. 18 Conforme essa concepção e de outros tantos autores, parece ser necessária a crise pela qual o adolescente passa para que a sua identidade possa ser plenamente realizada. Esses longos processos na busca de identidade vão sendo construídos na medida em que o adolescente vivencia as mudanças de seu corpo e é capaz de aceitar seus aspectos de criança e adulto para sua inserção no mundo adulto, acompanhado de mudanças internas que vão definindo a sua personalidade, sua ideologia e conseqüentemente sua identidade. 2.2 – Vocação – Reparação – Luto As teorias para definir o que é vocação são diversas e contraditórias. Alguns autores acreditam que a vocação nasce com o indivíduo, como uma resposta aum chamado interior pré -determinado. Outros acreditam que é a soma de experiência vivida pelo indivíduo de forma consciente ou inconsciente e não determinado pelo destino. A tendência atual é empregar o termo como uma resultante de processos que estão vinculados tanto a fatores internos como a fatores externos. Mesmo quando se refere a um chamamento interior, se faz num sentido mutável, podendo ser transformado conforme a dinâmica da personalidade. Wender e outros, de acordo com relatos de Bohoslavsky (1977), mencionam a hipótese de que vocação estaria relacionada aos chamados interiores danificados que devem ser reparados pelo ego. Para Bohoslavsky (1977, p.74), reparação em seu aspecto descritivo, refere-se ao que Segal, H. descreveu como “comportamentos que expressa o desejo e a capacidade do sujeito em recriar um objeto bom, exterior e interior destruído”. O termo desejo pode ser entendido por impulso, instinto ou tendência. Acredita-se dentro dessa concepção que a reparação, provavelmente seja a manifestação do instinto de vida que põe fim a destruição que é o instinto de morte. Desta forma traduz-se uma dialética observada na polaridade destruição e reparação. Quando se fala em objeto bom destruído, é porque ocorre uma ambivalência, o objeto além de ser amado é odiado e essa destruição se produz no campo da fantasia. Um ego forte compreende a realidade, tolera ambivalência e busca uma reparação. Entretanto, quando o ego não é forte o indivíduo não aceita a perda, devido a própria agressão do objeto bom, criando comportamentos defensivos de dissociação em que o 19 sujeito separa o ego do objeto, como forma de anular a dependência e de negação, que são denominados pseudo-reparação. Bohoslavsky relata que as pseudo-reparações determinam comportamentos: x� Maníacos – que são comportamentos: de desprezo, em que se nega aspecto bom do objeto; de controle, em que se nega a autonomia do objeto; de triunfo, em que se nega a perda do objeto. x� Compulsivos – que são comportamentos vinculados a uma culpa persecutória e impõe ao ego atividades exigentes, de forma que o ego funciona de modo rígido, danificando cada vez mais o objeto e restringindo a autonomia do indivíduo. x� Melancólico – que são comportamentos de autodestruição, como única forma de reparar o objeto fosse destruindo a si próprio. Assim sendo, para compreender a identidade profissional do jovem, deve-se perceber se a reparação é autentica ou pseudo-reparações. Uma autêntica reparação leva o indivíduo a reconhecer a culpa e é necessário, que a reparação se dê para atender o “self”, ou seja, a si próprio. Quando a reparação é realizada sobre o objeto externo, por exemplo, para atender os pais, ocorre que desatende ao “self” e com isso o objeto interno continua reclamando. Para tanto, é fundamental perceber o que o “self” está pedindo para ser reparado, só assim haverá uma autentica reparação dos objetos. Bohoslavsky comenta ainda que os diferentes modos de reparação determinará o tipo de vínculos com as profissões. Para tanto, é importante, estabelecer “com que” instrumento se repara, em relação a “qual” objeto externo está ocorrendo a reparação e “à maneira de quem” ocorrerá a reparação, são dados que informarão as razões da escolha de uma profissão. O indivíduo ao inserir-se no mundo adulto está escolhendo “com que” quer trabalhar, “por que” quer fazer, “como fazer”, “quando”. e “onde” trabalhar. Através dessa dinâmica interna e externa vivenciada pelo jovem, cabe ressaltar também, os movimentos de avanços e recuos que Osor (1989) considera como processo de substituição da dependência infantil para a autonomia adulta. Esses movimentos são: x� Redefinição da imagem corporal devido a perda do corpo infantil e transformação do corpo adulto; 20 x� Elaboração da perda de uma relação simbiótica de dependência com os pais da infância através de um processo de separação/individuação. x� Elaboração do luto mediante à perda da condição infantil. x� Surgimento de uma escala de valores ou códigos de ética própria. x� Busca de identificação no grupo de iguais. x� Procedimento de luta/fuga com a geração precedente. x� Aceitação dos ritos de iniciação para alcançar o mundo adulto. x� Aquisição de sua identidade sexual que nem sempre corresponde aquela ao qual pertence (homossexuais). Assim, o adolescente marcado por um complexo psicodinâmico, para conseguir sua inserção na sociedade tem que elaborar perdas. Basicamente ao escolher um papel adulto, o adolescente está escolhendo quem ser e quem não ser. Ao decidir uma profissão deixa de ser outro profissional, abandona outros objetos e formas de ser. São verdadeiros lutos vivenciados pelo jovem e da elaboração desses lutos e da forma como ele interage com o mundo, que o adolescente conquistará uma identidade. A. Aberastury (1981) descreve três lutos fundamentais na adolescência. x� Luto pelo corpo infantil – as transformações biológicas próprias da adolescência, despertam no jovem um sentimento de impotência diante da realidade que ele não consegue mudar. Por conseguinte caracteriza uma tendência ao uso onipotente das idéias, o que conduz a ele deslocar sua rebeldia em direção ao intelecto. x� Luto pela identidade e pelo papel infantil. – o indivíduo, na adolescência, vive um o dilema de não poder manter a dependência infantil, mas ao mesmo tempo não pode usufruir à independência adulta, causando uma confusão de papéis, vivendo o “fracasso de personalização”. Com isso, o adolescente passa a atribuir para o grupo seus atributos e joga a maioria das suas responsabilidade para os pais. x� Luto pelos pais da infância – a relação de dependência dos pais começa aos poucos a ser abandonada. Ocorre uma contradição diante das relações objetais parentais internalizadas e os pais reais externos, então o jovem elabora o luto, substituindo as figuras idealizadas dos pais que lhe permite projetar em professores, ídolos etc. 21 Une-se a esses lutos, o luto pela bissexualidade infantil, também perdida. Esses lutos trazem consigo também a confusão sexual e uma dificuldade temporal que caracteriza o pensamento nessa faixa etária. É possível falar que o adolescente vive uma deslocalização do tempo. O que pode ser observado no imediatismo do jovem ou na relegação do tempo. Conforme as urgências do jovem o tempo “encolhe”ou “estica” Bohoslavsky (1977) entende que um luto bem elaborado tolera os sentimentos de culpa diante do objeto e de si mesmo vividos pela separação. A culpa ocorre por que quem abandona alguma coisa sente perda de seu próprio ego, devido as identificações projetivas. O que se pretende dizer é que quando se deixa algo é como se estivesse também abandonando partes de si mesmo que se identificaram projetivamente no que se perde e também culpa pela perda do objeto, na medida que se fantasia que o abandono do objeto implica em atitudes retaliativas por parte do objeto, fala-se então, de culpa persecutória. Como componente manifesto ocorrem a crítica e a autocrítica. Esse tipo de fantasia pode ser percebida no jovem que teme escolher uma profissão que gosta, com medo de desagradar seus pais e simbolicamente um ataque aos pais terá como conseqüência ser atacado por eles. Ainda conforme Bohoslavsky, uma outra forma de culpa é a culpa depressiva em que o medo à retaliação é substituía por comportamentos reparatórios. A reparação quando a culpa é depressiva pode ocorrer sobre o “self” ou sobre o objeto. Quando os sentimentos de culpa são aceitos pelo indivíduo, bem como a elaboração do luto, os aspectos do “self” que estão vinculados aos objetos e situaçõesperdidas poderão ser discriminados, ou seja, o jovem será capaz de separar as partes de si mesmo que foi depositado no objeto que deixou. O adolescente que é capaz de desestruturar-se e reestruturar-se, tanto em seu mundo interno como em suas relações com o mundo exterior é um adolescente que adquiriu uma identidade pessoal e, por conseguinte, uma identidade ocupacional, com condições de fazer uma escolha madura. 22 3 – INFLUÊNCIAS NO PROCESSO DE ESCOLHA A escolha profissional é considerada uma das escolhas mais difíceis exigidas pela sociedade, tem implicação direta na satisfação de vida e bem estar do indivíduo, conduzindo seu estilo de vida e sua inserção no mercado de trabalho. O jovem se vê diante de uma encruzilhada tendo que atender as suas necessidades básicas e a sua realização pessoa. Almeja um lugar na sociedade ao mesmo tempo em que busca alcançar sua identidade, inicia-se então, a tão falada crise da adolescência. Como todo indivíduo é um ser peculiar, diferente um dos outros, para melhor compreende-los é importante analisar como ele se percebe e percebe o meio em que vive. Faz-se necessário, então, uma compreensão dos fatores que contribuem para a dinâmica da sua personalidade e que influenciam o processo de escolha. Diante do processo de escolha, interessa de maneira mais direta a influência do sistema produtivo, da relação do indivíduo com o grupo familiar e com o grupo de pares. Um dos grandes desafios do jovem será processar as diversas influências recebidas, tendo que integrá-las e diferenciar-se delas, projetando-se para o futuro. Partindo do pressuposto que a identidade ocupacional é um aspecto da identidade do sujeito, os problemas vocacionais terão de ser entendidos como problemas da personalidade que estão impedindo o jovem de alcançar uma escolha profissional. Em síntese, todo processo de escolha depende da elaboração da dinâmica em que o jovem vive. Uma escolha madura e ajustada é quando o jovem consegue identificar-se com seus próprios gostos e identificar o mundo exterior, incluindo as profissões. 3.1–Influência do Sistema Produtivo O mundo contemporâneo vive momentos de grandes transformações engrenadas a um ritmo tecnológico acelerado que domina a economia mundial, provocando mudanças e descontinuidades sucessivas no mercado de trabalho. O desenvolvimento do processo de 23 informação, das industrias eletrônicas, a robótica são fatos dessa realidade em ritmo acelerado. Mais do que nunca em toda a História, é preciso estar atento ao novo. Novos paradigmas vêm sem se anunciar e se instalam cada vez mais rápido e muitas vezes sem ser percebidos. Uma nova concepção na relação capital / trabalho estabelece outras formas de atuação. O emprego de qualificação fixa, com ocupações bem definidas sofre um processo de corrosão, enquanto o emprego de qualificação variada vai se reestruturando. Há uma ampliação tanto horizontal anexando novas atividades, como vertical incorporando numa mesma profissão tarefas que antes era de outras. Esses processos de corrosão, desestruturação e reestruturação das ocupações refletem diretamente na economia mundial que sofre alterações. Observa-se a recodificação de espaços ocupacionais, onde algumas profissões acabam sendo extintas enquanto outras são criadas e outras tantas modificadas. No epicentro dessas transformações está o ser humano com seus medos, desejos e conflitos, buscando uma realização profissional que possa encontrar “eco” nas mudanças aceleradas do sistema produtivo, que como uma verdadeira revolução, transforma o mercado de trabalho e o estilo de vida das pessoas. O indivíduo ganha ou perde prestígio nessa dinâmica de mercado de trabalho e o fato da formação do indivíduo se distanciar da realidade deve ser considerada. Sendo assim, a educação continuada passa a ser vista como necessidade no projeto de profissionalização do indivíduo para ascensão social, já que a recodificação dos espaços ocupacionais exige constante atualização. Inicia-se então, um novo ciclo, o do capital intelectual. Na sociedade atual, cada vez mais o prestígio sobre as profissões está ligado ao trabalho intelectual. Do ponto de vista estritamente social, todas as profissões são importantes por contribuir para a manutenção da sociedade, no entanto na prática percebe- se que a própria sociedade discrimina algumas profissões, dando prestígio a outras. O meio sóciocultural tem grande influência na questão vocacional. Quando uma pessoa obtém êxito na sua profissão e consegue aprovação social, sente-se mais integrado na sociedade. Em conseqüência disso, é natural o indivíduo querer trabalhar em alguma profissão que tenha importância social e que seja bem remunerada. Entretanto a realização total do 24 indivíduo só será completa se ele elaborar suas necessidades pessoais, incluindo aqui aspectos psicológicos, com as possibilidades sociais. O psicólogo ao atua no campo vocacional não deve perder de vista que a identidade ocupacional se desenvolve a partir da identidade pessoal. Só assim, terá verdadeiramente auxiliado o jovem a elaborar seus conflitos para fazer uma escolha profissional satisfatória. Nessa dinâmica do setor produtivo faz-se necessário que o indivíduo aprenda a escolher para que ao longo da vida possa sempre elaborar seu projeto de vida acompanhando as mudanças que já estão acontecendo, bem como as transformações que poderão vir a surgir no futuro, viabilizando escolhas com liberdade de mudá-las. 3.2 – Influência da Família e do Grupo de Pares. Baseado na concepção que a vocação não é inata e sim resultante de fatores individuais e ambientais adquiridos quer de forma consciente ou inconsciente, todas as experiências vividas desde a infância influenciam o processo de escolha. O primeiro vínculo que a criança estabelece é com a família, e a medida que ela cresce esses vínculos aumentam e novos contatos surgem. A criança então, começa a se relacionar com outras pessoas fora do ambiente familiar, passa a entrar em contato com grupos, amigos, escolas e vai se socializando. Assim ao se tornar adolescente, já possui uma soma de experiências adquiridas que associada às transformações físicas vão definir quem realmente o adolescente é e quem ele quer ser. No período da adolescência começam a surgir confrontos com os pais, que criam desejos e expectativas em relação a seus filhos. O jovem, nessa fase, fica confuso sem conseguir discriminá-los dos seus próprios desejos. Observa-se que pais mais seguros proporcionam gradativamente a afirmação e identidade de seus filhos, além de desenvolver a auto-estima. O mesmo não acontece com pais autoritários ou laissez-faire que segundo pesquisas, desencadeiam nos adolescentes problemas de ajustamento. É comum o jovem querer seguir o mesmo caminho profissional de seus pais ou ao contrário, procurar caminhos opostos dos familiares. Mesmo quando os pais pensam que não estão influenciando os seus filhos, ainda assim, seus sonhos e desejos são captados pelos jovens. 25 Além dos desejos e de outros aspectos subjetivos, as situações reais vividos dentro do grupo familiar, influenciam de forma substancial o desenvolvimento do jovem, como também situações vividas pelo grupo de pares e pela sociedade. Os grupos que os adolescentes fazem parte estabelecem um padrão normativo e constituem as bases na maneira do jovem se conduzir As relações que os adolescentes estabelecem desde o nascimento estão presentes no momento da opção vocacional e compreender essas relações contribuipara perceber melhor o conflito que impede o jovem escolher uma profissão. Contudo não basta só conhecer a que grupos pertencem, mas como interioriza, percebe e expressa essa participação. Esses processos de relação e interiorização dos grupos são mecanismo de identificação. Identificações são movimentos realizados pelo jovem em relação às influências adquiridas pela família, grupos de pares, pela sociedade. Muitas vezes essas identificações podem não está claramente explicita, sendo necessário um aprofundamento maior da reflexão desses vínculos com o outro. Essa compreensão do que está encoberto por identificações inconscientes, torna-se fundamental para o processo vocacional, assim como perceber se há contradições entre os valores do grupo familiar e os valores do grupo de pares. De acordo com Bohoslavsky (1977), havendo uma contradição, haverá uma dissociação da própria identidade, devido às identificações com os dois grupos que ele não poderá integrar. Conforme o sucesso e o fracasso das ações vinculadas ao sistema de gratificação ou frustração no processo de identificação, o adolescente fará o seu engajamento profissional. 26 4– IDENTIDADE OCUPACIONAL E IDENTIDADE VOCACIONAL Bohoslavsky (1977) considera que a identidade ocupacional é a autopercepção em termos de papéis ocupacionais no decorrer do tempo e o que conduz o jovem a determinar a identidade ocupacional é a identidade vocacional. A identidade vocacional, de acordo com essa teoria, determina a escolha do indivíduo e tem haver com o processo de elaboração de identificação, luto e reparação do jovem. De suas raízes genética associada as influências do meio ambiente em vivencia suas experiência, será formada a identidade ocupacional. Sendo assim, a identidade ocupacional-vocacional é parte do processo da identidade pessoal e desde o nascimento sofre como estas influências do meio ambiente. Portanto, não pode ser algo pré-determinado, mas um processo que interage o mundo interno com o mundo externo do indivíduo. A identidade Ocupacional compreende o que o jovem quer ser, abrangendo um “onde”, “como” e “quando”; enquanto as respostas ao “para que” e “por que” que conduz ao indivíduo a assumir determinado papel é sua identidade vocacional. É importante considerar, contudo, que nem sempre os “chamamentos” da identidade vocacional são claros e precisos, muitas vezes torna-se confuso para o jovem saber que papel pretende assumir na sociedade. Diante do desconhecido, ele vive momentos de ansiedade, que são as crises da normalidade dos adolescentes. É um período bastante difícil para o jovem por coincidir com o momento da formação da sua identidade pessoal. Sendo assim, a Análise Vocacional só será válida se compreender o processo como um todo. Deve facilitar o jovem a interagir o mundo interno com o mundo em que vive, aprofundar seu auto-conhecimento, dar informações e interpretar de forma mais realista o sistema socioeconômico e cultural em que vive, corrigindo fantasias e distorções das imagens profissionais. Contribuindo para o crescimento pessoal do adolescente terá conseqüentemente contribuído para o ajustamento na aquisição de papéis sociais adulto, ajudando-o a alcançar sua identidade ocupacional. 27 CONCLUSÃO Pela observação dos aspectos apresentados, percebe-se que o adolescente vive um período crucial, tendo que definir seu projeto de vida no momento que está definindo sua identidade. Sem dúvida, é uma etapa em que o jovem precisa de ajuda, não só de profissionais voltados para a questão da vocação, como de seus familiares, de seus amigos e da sociedade. O difícil, parece ser ajudar o jovem sem tirar dele o direito de ser autor de sua vida. Esses são os erros mais comuns dos pais, que na busca de amenizar os conflitos que o adolescente está vivendo, ou por se projetar nos filhos, querem decidir por eles. Toda crise é um momento difícil, mas é também através dela que o indivíduo “arruma” o que está “desarrumado” dentro dele. O importante é o jovem perceber que nenhuma escolha é definitiva, principalmente na questão da vocação. É natural, ao longo do tempo, surgir outros interesses. O que normalmente acontece, é que o adolescente além de não possuir um autoconhecimento, sente-se confuso diante da diversidade de profissões com dificuldades de conciliar seus gostos e interesses com o mundo exterior, ou seja, com o mundo do trabalho, dificultando-o de fazer uma escolha que lhe traga satisfação pessoal. Explorando o entendimento, suas causa e seus efeitos, a Análise Vocacional baseada na modalidade clínica, não só promove no adolescente uma busca de si mesmo, possibilitando uma reflexão sobre o seu mundo intermo, como contribui com informações sobre o mundo do trabalho, auxiliando-o a perceber e conhecer as soluções para o problema vocacional. Seguindo essa concepção, é imprescindível ao profissional atuante no campo vocacional trabalhar com a integração do tempo, auxiliando o jovem a perceber quem foi, quem é, que será, superando assim, a descontinuidade que por ventura ocorram. Quando o jovem consegue associar o que ele foi, no período da infância, com o que é no presente e o que se tornará no futuro estabelecido, alcançará sua continuidade interna, 28 reconciliando o conceito de si mesmo com os valores que a sociedade tem dele e com isso terá se encontrado como pessoa e encontrado um lugar no mundo em que vive. É fundamental ainda, considerar as influências do grupo familiar e do grupo de pares; esclarecer sobre o sistema produtivo, ajudar o jovem a elaborar seus lutos; bem como aprofundar com ele questão da vocação, da reparação, percebendo se está havendo uma autêntica reparação ou uma pseudo-reparação. Uma escolha ajustada depende de uma integração do mundo interno com o mundo externo na busca de uma identidade. Definir o que fazer é antes de tudo definir quem ser e se o adolescente continuar com dúvidas após o processo de Análise Vocacional, é por que ainda não conseguiu essa integração. Contudo, a Análise Vocacional terá contribuído para o jovem aprender a escolher e a medida que o jovem vai vivenciando as influências adquiridas pelo mundo externo e integrando com seu mundo interno fará uma escolha acertada. A idéia básica é que o jovem aprenda a elaborar seus conflitos e não negá-los. Do resultado da elaboração da crise, associada a forma de superá-la é que o indivíduo formará sua identidade pessoal e por conseguinte terá possibilidades de alcançar sua identidade ocupacional. Em conseqüência de tudo que foi analisado, é inquestionável a importância da Análise Vocacional como facilitadora do processo de escolha profissional vivenciada principalmente pelos adolescentes na busca de sua inserção social. 29 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BOHOSLAVSKY, R. – Orientação Vocacional: A Estratégia Clínica. São. Paulo: Ed. Martins Fontes, 1977. LUCCHIARI, D. H. – Pensando e Vivendo a Orientação Profissional. Rio de Janeiro: Ed. Summus, 1993. ZASLAVSKY, I. ou col. – Orientação Vocacional: Uma Experiência em Processo. Rio de Janeiro: Ed. Eldorado, 1979. RAPPAPORT, C. R. – Escolhendo a Profissão. São Paulo: Ed. Ática, 1998. RODRIGUES, E. A. - Escolher a Profissão. São Paulo: Ed. Scipione, 1990. BOCK, A. M. B. ou col. – Psicologias: Uma Introdução ao Estudo de Psicologia. São Paulo: Ed. Saraiva, 1989. ZAGURY, T. – O Adolescente por Ele Mesmo. Rio de Janeiro: Ed. Record,1999. ERIKSON, E. – Identidade Juventude e Crise. Rio de Janeiro: Ed. Zahar, 1976. OSOR, L. 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