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15 Os Cromossomos Humanos

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3a. prova - Schor - Paginador: Fernando
203
OS CROMOSSOMOS HUMANOS
Cap. 15
A informaçªo genØtica contida no nœcleo das
cØlulas Ø constituída pelo DNA o qual, na espØ-
cie humana, encontra-se distribuído em 46 cro-
mossomos. Esse DNA estÆ associado a proteínas
em diferentes graus de compactaçªo conforme
a fase do ciclo celular em que a cØlula se encon-
tra de forma que os cromossomos se apresenta-
rªo com diferentes morfologias. Durante a
interfase, fase do ciclo celular entre duas divi-
sıes mitóticas, os cromossomos se encontram
desespiralizados formando uma massa homogŒ-
nea denominada cromatina nªo sendo possível,
portanto, distingui-los como estruturas indivi-
dualizadas.
Antes de a cØlula iniciar o processo de divi-
sªo, ocorre a duplicaçªo do DNA cromossômi-
co resultando em duas duplas hØlices de DNA
idŒnticas. À medida que a cØlula começa a se
dividir, ocorre uma gradual condensaçªo dos
cromossomos sendo que estes se tornam mais
visíveis como estruturas distintas durante a me-
tÆfase da mitose. Nessa fase, os cromossomos
estªo duplicados e sªo visualizados sendo com-
postos, cada um, por duas cromÆtides idŒnticas
ligadas pelo centrômero (Fig. 15.1).
Apesar de os cromossomos terem sido des-
critos e assim denominados no final do sØculo
XIX jÆ tendo sido relacionados à hereditarieda-
de, foi somente em 1956 que se determinou
como sendo 46 o nœmero de cromossomos na
Os Cromossomos Humanos
espØcie humana. Isso só foi possível graças à in-
troduçªo de tØcnicas de cultura de cØlulas e de
preparaçªo cromossômica as quais sªo basica-
mente as mesmas ainda hoje utilizadas.
ESTUDO DOS CROMOSSOMOS
O estudo dos cromossomos pode ser reali-
zado a partir de qualquer tecido com cØlulas
nucleadas com capacidade de divisªo, tais como
os linfócitos do sangue perifØrico, fibroblastos
da pele, cØlulas da medula óssea, das vilosidades
coriônicas, do líquido amniótico ou ainda de te-
cidos sólidos como as gônadas e tumores. A cul-
tura de linfócitos do sangue perifØrico Ø a tØcnica
mais utilizada para o estudo cromossômico de-
vido à facilidade de obtençªo e de cultivo do
material (Fig. 15.2).
 Para a realizaçªo do cariótipo, linfócitos re-
tirados do sangue perifØrico sªo colocados em
meio de cultura enriquecido com soros adequa-
dos e fito-hemaglutinina a qual estimula a divi-
sªo dos linfócitos T. As cØlulas sªo cultivadas em
condiçıes estØreis a 37oC por cerca de 72 horas.
Na œltima hora de cultura Ø adicionada colchici-
na, substância que impede a formaçªo das fi-
bras do fuso mitótico bloqueando as cØlulas em
metÆfase, fase de maior condensaçªo cromos-
sômica e, portanto de mais fÆcil visualizaçªo. O
preparo dos cromossomos Ø efetuado com a adi-
Maria Isabel Melaragno
Bianca Borsatto
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VOL. 1 — BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA
Cap. 15
Fig. 15.2 — Esquema das etapas para a realizaçªo de uma cultura de linfócitos do sangue perifØrico para obtençªo do
cariótipo.
Fig. 15.1 — Esquema do ciclo mitótico mostrando a morfologia dos cromossomos.
çªo de uma soluçªo salina hipotônica, para ha-
ver um melhor espalhamento dos cromossomos,
seguido da adiçªo de uma soluçªo fixadora. O
material Ø gotejado em lâminas de microscópio.
As lâminas sªo entªo coradas e as cØlulas em
metÆfase, analisadas em microscópio óptico.
Existem diferentes mØtodos de coloraçªo cro-
mossômica para a anÆlise dos cromossomos, sen-
do a coloraçªo sólida e o bandamento G os mais
utilizados na rotina de citogenØtica. A coloraçªo
Cromossomos
descondensados
(cromatina)
Cromossomos
como única
cromátide
(não visualizável)
INTERFASE METÁFASE
Cromossomos
com duas
cromátides
Separação das
cromátides irmãs
ANÁFASE e TELÓFASE
2 células filhas
resultantes
da mitose
INTERFASE
5ml de sangue venoso
Sangue
meio de cultura
soro fetal bovino
fito-hemaglutinina
Incubação
72 horas a 37oC
Colchicina
1 hora a 37oC
Separação
dos linfócitos
por centrifugação
Tratamento
hipotônico
Fixação
das células
Células
gotejadas
em lâminas
Coloração
das lâminas
Análise
FotografiaCARIÓTIPO
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OS CROMOSSOMOS HUMANOS
Cap. 15
sólida, obtida atravØs do uso do corante Giemsa
resulta na coloraçªo homogŒnea dos cromosso-
mos permitindo a anÆlise de seu nœmero e mor-
fologia. A tØcnica de coloraçªo de bandamento
G resulta em faixas transversais, denominadas
bandas, características para cada cromossomo,
permitindo a identificaçªo e classificaçªo de cada
um dos 23 pares cromossômicos.
Na metÆfase, os cromossomos sªo constituí-
dos por duas cromÆtides unidas pelo centrôme-
ro, o qual delimita longitudinalmente dois braços
cromossômicos: o menor referido como braço
curto (representado pela letra p, de petit) e o maior
como braço longo (representado pela letra q). De
acordo com a posiçªo do centrômero, os cromos-
somos humanos podem ser classificados em me-
tacŒntricos (braços de tamanhos semelhantes),
submetacŒntricos (braço curto menor do que o
longo) e acrocŒntricos (braço curto muito menor
do que o longo). Segundo normas internacionais
de padronizaçªo de nomenclatura cromossômica
(ISCN, 1995), as bandas cromossômicas delimi-
tam diferentes regiıes de seus braços. Dentro de
cada regiªo, as bandas (bandas claras e escuras)
sªo numeradas a partir do centrômero (Fig. 15.3).
Os cromossomos, após anÆlise em micros-
cópio óptico, sªo fotografados e organizados de
acordo com o tamanho, posiçªo do centrômero e
padrªo de bandamento. A essa classificaçªo e or-
ganizaçªo dos cromossomos Ø dado o nome de
cariótipo (Fig. 15.4).
Verifica-se na espØcie humana, 23 pares de
cromossomos sendo 22 pares de autossomos
(pares encontrados igualmente em ambos os
sexos) e um par de cromossomos sexuais (XX
na mulher e XY no homem). Os cariótipos nor-
mais masculinos e femininos sªo designados
46,XY e 46,XX, respectivamente.
O estudo dos cromossomos e da divisªo ce-
lular Ø referido como citogenØtica. Atualmente
existem analisadores de imagem computadori-
zados os quais sªo utilizados em citogenØtica
para fazer a classificaçªo dos cromossomos e a
realizaçªo da cariotipagem automaticamente.
CITOGENÉTICA-MOLECULAR
A limitaçªo da citogenØtica clÆssica Ø de-
corrente da necessidade de cØlulas em divisªo
Fig. 15.3 — Padrªo de bandamento G de um cromossomo metacŒntrico (1), um submetacŒntrico (X) e um acrocŒntrico
(21). O centrômero delimita o braço curto (p) e o braço longo (q) onde sªo evidenciadas as diferentes regiıes e bandas
desses cromossomos.
Região banda
Região banda
Região banda
33
2
1
1
1
2
2
1
1
65
43
2
1
3
2 2
1
11
1
2
3
4
5
1
22
1
21
7
1
43
214
3
2
1
1
2
12
3
4
5
2
1
3
1
2 2
1
1
2
3
4
5
6
3
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VOL. 1 — BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA
Cap. 15
para a obtençªo de cromossomos metafÆsicos e
tambØm pelo nível limitado de resoluçªo quanto
à visualizaçªo de possíveis alteraçıes cromossô-
micas.
Uma banda cromossômica nas melhores
condiçıes de bandamento contØm 3.106 pares
de bases (pb), de forma que somente poderªo
ser detectadas, pelo exame do cariótipo, dele-
çıes ou alteraçıes cromossômicas maiores do
que as de cerca de 100 genes. Outra dificuldade
da citogenØtica clÆssica Ø a necessidade de cro-
mossomos metafÆsicos de boa qualidade, o que
muitas vezes nªo Ø possível, como por exemplo,
em alguns tipos de tumores sólidos.
Em cØlulas interfÆsicas, a informaçªo genØ-
tica que nos era dada anteriormente pelo estudo
dos cromossomos era restrita à cromatina X, ou
corpœsculo de Barr, descrito em 1949 em cØlu-
las femininas. Essa cromatina X representa um
dos cromossomos X da mulher que permanece
condensado e inativado durante a interfase. Em
casos de aneuploidias, qualquernœmero de cro-
mossomos X a mais do que um, resulta em cro-
matina X positiva. Atualmente, com as tØcnicas
de citogenØtica-molecular, todos os cromosso-
mos jÆ podem ser estudados, mesmo durante a
interfase.
Com a introduçªo de tØcnicas moleculares,
houve nos œltimos anos um avanço da citoge-
nØtica. A chamada citogenØtica-molecular Ø ba-
seada na capacidade de as fitas da dupla hØlice
de DNA se separarem (pelo rompimento das
pontes de hidrogŒnio que unem os nucleotídeos
das duas fitas) atravØs de diferentes processos
de desnaturaçªo, e de se renaturarem. Desta
forma, Ø possível obter molØculas híbridas atra-
vØs do emparelhamento de molØculas comple-
mentares do DNA alvo com uma determinada
sonda de DNA.
Existem diferentes tipos de sonda as quais sªo
utilizadas de acordo com o interesse da investiga-
çªo: sondas complementares às regiıes centro-
mØricas de todos os cromossomos, sondas de
seqüŒncias œnicas (incluindo as gŒnicas) e son-
das de um cromossomo inteiro as quais repre-
sentam um conjunto de sondas que se hibridam
com vÆrias regiıes de um cromossomo resultan-
do em uma “pintura cromossômica” (Fig. 15.5).
A tØcnica mais utilizada Ø a tØcnica de hibri-
daçªo in situ por fluorescŒncia (FISH). Para a
realizaçªo da FISH, as lâminas sªo preparadas
a partir de cØlulas crescidas em suspensªo, de
preparaçªo direta ou a partir de tecidos sólidos,
sendo o material fixado em lâminas de micros-
cópio. As sondas utilizadas sªo marcadas de for-
ma que poderªo ser detectadas por fluorocromos
com microscópio de fluorescŒncia.
Entre as vantagens da tØcnica de FISH, des-
tacam-se a possibilidade de anÆlise de cØlulas em
interfase, eliminando a necessidade de culturas
celulares e o estudo de metÆfases de prepara-
çıes cromossômicas pobres ou com anormali-
Fig. 15.4 — Cariótipo de um homem normal (46,XY) com bandamento G. (a) Cromossomos metafÆsicos como sªo
visualizados ao microscópio (b) Cromossomos após terem sido fotografados, cortados e organizados aos pares.
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OS CROMOSSOMOS HUMANOS
Cap. 15
dades cromossômicas muito complexas ou pe-
quenas, que nªo seriam detectadas atravØs de
tØcnicas clÆssicas de bandamento.
ALTERA˙ÕES CROMOSSÔMICAS
A primeira doença reconhecida como tendo
etiologia cromossômica foi a síndrome de Down,
quando Lejeune e col., em 1959, relataram a
presença de um cromossomo extra em indiví-
duos com a síndrome. Em seguida, outras sín-
dromes decorrentes de alteraçıes cromossômicas
numØricas foram descritas e tambØm, alteraçıes
cromossômicas estruturais.
A Tabela 15.1 apresenta as alteraçıes cromos-
sômicas mais freqüentes na espØcie humana.
Durante a divisªo celular, os cromossomos sªo
distribuídos eqüitativamente às cØlulas-filhas. Uma
distribuiçªo anormal dos cromossomos pode re-
sultar em alteraçıes cromossômicas numØricas. Por
outro lado, quebras durante a divisªo celular po-
dem resultar em alteraçıes cromossômicas estru-
turais.
Na maioria das vezes, o erro ocorre durante
a meiose, resultando em gametas e, portanto,
em zigotos, com desequilíbrio cromossômico
acarretando anormalidades em todas as cØlulas,
ou seja, uma anormalidade constitucional. Em
alguns casos, o erro pode ocorrer após a forma-
çªo do zigoto, em divisıes mitóticas, podendo
ocasionar mosaicismo, isto Ø, a presença num
indivíduo ou tecido de duas ou mais linhagens
celulares geneticamente distintas, porØm, origi-
nadas de um mesmo zigoto. O mosaicismo Ø
mais freqüentemente observado em alteraçıes
envolvendo os cromossomos sexuais. Nestes
casos, o fenótipo tende a ser mais leve depen-
dendo do grau de mosaico.
Alteraçıes cromossômicas dos autossomos
ou dos cromossomos sexuais (tanto numØri-
cas como estruturais) podem ser verificadas
em síndromes malformativas, retardo mental,
hipogonadismo e em erros da determinaçªo
sexual. Na genØtica da reproduçªo, o estudo
citogenØtico estÆ recomendado para casos inex-
plicados de infertilidade, abortamentos espon-
tâneos, em casos de diagnóstico prØ-natal e,
atualmente, em diagnóstico prØ-implantacional.
Alteraçıes cromossômicas tambØm tŒm sido re-
lacionadas a cØlulas tumorais e a síndromes de
instabilidade cromossômica.
A maioria das alteraçıes cromossômicas
nªo Ø viÆvel sendo responsÆveis por mais de 50%
dos abortos espontâneos. Estima-se que a inci-
dŒncia de alteraçıes cromossômicas em recØm-
nascidos seja em torno de 0,7%.
Para se descrever cariótipos alterados, indi-
ca-se nœmero total de cromossomos, seguido pe-
los cromossomos sexuais e pela anormalidade, seja
ela um cromossomo adicional ou em falta, ou um
cromossomo estruturalmente alterado. Como
exemplos de cariótipos alterados temos os carió-
Fig. 15.5 — Hibridaçªo in situ por fluorescŒncia em: (a) uma cØlula interfÆsica hibridada com sonda centromØrica do
cromossomo 18, revelando trissomia desse cromossomo; (b) cromossomos metafÆsicos hibridados com sonda de pintura
cromossômica do cromossomo X de uma mulher normal; (c) cromossomos metafÆsicos de um indivíduo normal hibrida-
dos com a sonda controle RARA em 17q21 e com a sonda da regiªo 17p13.3, regiªo cuja deleçªo acarreta a síndrome
de Miller-Dieker (cortesia Dr. Marcial Francis Galera).
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VOL. 1 — BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA
Cap. 15
Tabela 15.1
Alteraçıes Cromossômicas Freqüentes nos Seres Humanos
Distœrbio Anormalidade Cariótipos Mais Freqüentes IncidŒncia
Cromossômica
Síndrome de Down Trissomia 21 47,XX(ou XY),+21 1:600
47,XX,+21/46,XX
6,XX,der(21;14)(q10;q10),+21
Síndrome de Edwards Trissomia 18 47,XX(ou XY),+18 1:8.000
Síndrome de Patau Trissomia 13 47,XX(ou XY),+13 1:25.000
Síndrome de Turner Monossomia X 45,X 1:5.000
45,X/46,XX
46,X,i(Xq)
45,X/46,Xi(Xq)
46,X,del(Xp)
Síndrome de Klinefelter Cromossomos
sexuais XXY 47,XXY 1:800
Síndrome do triplo X Trissomia X 47,XXX 1:700
Síndrome do duplo Y Cromossomos
sexuais XYY 47,XYY 1:2.000
Triploidia 3n 69,XXX raro
Tetraploidia 4n 92,XXXX raro
Rearranjos nªo deleçıes, ex: 1:17.000
equilibrados duplicaçıes etc. 46,XX,del(5p)
46,XY,der(2)t(2;5)(q21;q31)
Rearranjos equilibrados translocaçıes ex: 1:1.000
robertsonianas 45,XX,der(14;21)(q10;q10)
translocaçıes ex: 1:11.000
recíprocas 46,XY,t(2;5)(q21;q31)
tipos 47,XY,+21 (trissomia do cromossomo 21),
45,X (monossomia X), 45,X/46,XX (monosso-
mia X em mosaico), 46,XX,del(5)(p)(15) (dele-
çªo do braço curto do cromossomo 5 com ponto
de quebra na banda p15), 46,XX,t(2;7)(q13;q22)
(translocaçªo recíproca equilibrada entre os
braços longos dos cromossomos 2 e 7), 46,XY,
inv(1)(p21q31) (inversªo pericŒntrica do cromos-
somo 1) e 46,Xi(Xq) (isocromossomo de braço
longo do X).
Alteraçıes Cromossômicas NumØricas
As alteraçıes cromossômicas numØricas po-
dem ser classificadas em aneuploidias e poli-
ploidias, dependendo da quantidade de cromos-
somos envolvidos no desequilíbrio.
Aneuploidia
A aneuploidia Ø o tipo mais comum de dis-
tœrbio cromossômico, ocorrendo em aproxima-
damente 4% das gestaçıes.
As aneuploidias constituem um tipo de alte-
raçªo numØrica na qual as cØlulas nªo contŒm
um mœltiplo de 23 cromossomos, apresentando
cromossomos a mais ou a menos. Podem
ocorrer monossomias (presença de apenas um
representante de um dado cromossomo), tris-
3a. prova - Schor - Paginador: Fernando
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OS CROMOSSOMOS HUMANOS
Cap. 15
somias (presença de trŒs cromossomos em vez
do par normal) e, mais raramente, tetrassomias
e pentassomias.
Aneuploidias sªo letais para a maioria dos
cromossomos. A monossomia estÆ praticamen-
te restrita à monossomia do cromossomo X, a
qual resulta na síndrome de Turner. As monos-
somias autossômicas sªo, em geral, incompatí-
veis com a sobrevivŒncia a termo, enquanto que
trissomias de alguns cromossomos sªo vistas com
certa freqüŒncia entre nativivos.
As trissomias completas de autossomosmais
freqüentes sªo as dos cromossomos 21, 13 e 18
as quais resultam nas síndromes de Down (Fig.
15.6), Patau e Edwards, respectivamente. As tris-
somias envolvendo os cromossomos sexuais po-
dem resultar nos cariótipos 47,XXY, 47,XXX,
47,XYY e nas síndromes de Klinefelter, triplo X
e duplo Y, respectivamente. Os raros casos de
tetrassomia e pentassomia estªo restritos aos cro-
mossomos sexuais.
As aneuploidias envolvendo os cromossomos
sexuais, em geral, resultam em alteraçıes feno-
típicas mais brandas do que aquelas envolvendo
os autossomos, em virtude da inativaçªo de um
dos cromossomos X que excederem a um, no
início da vida embrionÆria e da pouca quantida-
de de genes presentes no cromossomo Y.
Poliploidia
Qualquer cØlula que contenha um mœltiplo
exato de 23 cromossomos Ø designada euplói-
de. Assim, cØlulas normais como os gametas
haplóides (n=23) e as cØlulas somÆticas diplói-
des (2n= 46) sªo euplóides. Acima do nível di-
plóide, a euploidia Ø denominada poliploidia.
Nos seres humanos, a poliploidia Ø pouco fre-
qüente tendo sido relatadas triploidia (3n) e
tetraploidia (4n) em abortos e em nativivos com
sobrevida curta, estes em geral apresentando mo-
saicismo.
Uma das possíveis causas da triploidia Ø a
dispermia, i.e., a fertilizaçªo de um ovócito por
dois espermatozóides. A tetraploidia, menos fre-
qüente que a triploidia, pode se originar pela
fusªo de dois zigotos diplóides, ou pela falha
mitótica no início do desenvolvimento embrio-
nÆrio, com a migraçªo dos cromossomos dupli-
cados para uma œnica das duas cØlulas-filhas.
Alteraçıes Cromossômicas Estruturais
As alteraçıes cromossômicas estruturais sªo
menos freqüentes do que as alteraçıes cromos-
sômicas numØricas, podendo envolver um ou mais
autossomos, cromossomos sexuais ou ambos.
Essas alteraçıes resultam de quebras nos
cromossomos e subseqüente reuniªo das extre-
midades quebradas em uma configuraçªo anor-
mal (Fig. 15.7). As quebras cromossômicas
podem ser espontâneas ou causadas por agen-
tes clastogŒnicos, como a radiaçªo ionizante e
algumas substâncias químicas.
Os rearranjos cromossômicos resultantes
podem ser equilibrados ou nªo-equilibrados
com relaçªo à quantidade de material genØtico
por cØlula.
Nos rearranjos equilibrados, nªo hÆ perda
nem ganho de material genØtico. Desta forma,
as alteraçıes equilibradas nªo acarretam, como
regra geral, efeitos no fenótipo do indivíduo,
apesar destes estarem sujeitos a riscos elevados
de produzir prole com desequilíbrios cromossô-
micos. No grupo de rearranjos equilibrados, es-
tªo incluídas as translocaçıes equilibradas e as
inversıes.
Os rearranjos cromossômicos nªo-equilibra-
dos sªo aqueles que resultam em material cro-
mossômico em falta (deleçªo) ou em excesso
(duplicaçªo), resultando em monossomias ou
trissomias parciais, respectivamente. Em contras-
Fig. 15.6 — Cariótipo 47,XX,+21 (trissomia do cromosso-
mo 21) de um paciente com a síndrome de Down.
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VOL. 1 — BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA
Cap. 15
te com as alteraçıes numØricas, cujas aneuploi-
dias estªo restritas a poucos autossomos, a va-
riedade de alteraçıes estruturais Ø enorme, pois,
as quebras cromossômicas podem ocorrer em
diferentes pontos e envolver diferentes cromos-
somos ou combinaçıes cromossômicas.
Deleçªo (representada pela
abreviatura “del”)
As deleçıes se referem à perda de parte do
cromossomo resultando em monossomia parcial
do segmento perdido. Em geral, as deleçıes sªo
menos viÆveis do que as duplicaçıes correspon-
dentes, sendo letais quando resultam em perda
de mais de 2% do genoma total haplóide. Entre
as deleçıes, mais freqüentes encontram-se a de-
leçªo do braço curto do cromossomo 5 (com
diferentes pontos de quebra em 5p) resultando
na monossomia parcial 5p, originariamente de-
Fig. 15.7 — Esquema de exemplos de alteraçıes cromossômicas estruturais: (a) deleçªo no braço curto do cromossomo
X; (b) isocromossomo do braço longo do cromossomo X; (c) inversªo pericŒntrica do cromossomo 1; (d) translocaçªo
recíproca entre os braços longos dos cromossomos 4 e 10 e (e) translocaçªo robertsoniana entre os cromossomos 14 e 21.
nominada síndrome, e as deleçıes dos braços
curtos dos cromossomos 4, 11 e 18.
As deleçıes podem ocorrer de novo, i.e., ori-
ginando-se casualmente na meiose de um dos
pais ou, ser o resultado da segregaçªo de um
rearranjo equilibrado presente em um dos pais
(e.g. translocaçªo equilibrada). Pode ocorrer
deleçªo das extremidades de um cromossomo
com a posterior uniªo dos braços curtos e longos
havendo a formaçªo de um cromossomo em anel
(r, de ring). Algumas deleçıes podem ser muito
pequenas de forma que sªo difíceis ou impossí-
veis de serem reveladas no estudo do cariótipo.
Essas deleçıes submicroscópicas, ditas micro-
deleçıes, podem ser entªo mais facilmente
identificadas atravØs da tØcnica de FISH, como
exemplificado na Fig. 15.5. As microdeleçıes
podem envolver genes contíguos e resultar em
fenótipo com características de vÆrias doenças
monogŒnicas.
q13
q28
Xp Xq
XqXq
p22
q25
180o
14 14 21 21 14 t(14;21) 21
der(10)
10
4
der(4)Translocação(4;10)(q34;q21)
q21
q34
4 4
10 10
del(X) (q12q28)
Deleção
Translocação recíproca equilibrada
Fragmento
sem
centrômero
Isocromossomo
Inversão
inv(1)(p22q25)
Translocação Robertsoniana
equilibrada
x i (Xq)
A
B
C
D
E
3a. prova - Schor - Paginador: Fernando
211
OS CROMOSSOMOS HUMANOS
Cap. 15
Dentre alguns exemplos de síndromes de mi-
crodeleçıes, podemos ressaltar as síndromes de
Prader-Willi e de Angelman, responsÆveis por
alteraçıes fenotípicas distintas. Cerca de 70%
dos casos de ambas afecçıes sªo decorrentes de
uma deleçªo em 15q11-q13, entretanto, depen-
dendo da origem parental da deleçªo, ou seja,
se esta ocorreu no cromossomo 15 paterno ou
materno, os fenótipos apresentados serªo carac-
terísticos das síndromes de Prader-Willi e de
Angelman, respectivamente.
Duplicaçªo (“dup”)
As duplicaçıes se referem ao ganho de um
segmento cromossômico que poderÆ resultar em
trissomias parciais. Essas podem surgir por cros-
sing over desigual durante a meiose ou a partir
de um gameta com desequilíbrio cromossômico
herdado de um progenitor com uma alteraçªo
equilibrada.
Isocromossomo (“i”)
Os isocromossomos sªo cromossomos nos
quais um dos braços estÆ ausente e o outro du-
plicado. Um indivíduo com um isocromossomo
apresenta monossomia de um braço cromossô-
mico e trissomia do outro.
Os possíveis mecanismos para se formar um
isocromossomo sªo a divisªo errônea do cen-
trômero e quebras em Xp próximas ao centrô-
mero com a reuniªo das extremidades quebradas.
Entre os isocromossomos observados em nati-
vivos estÆ o do braço longo do cromossomo X,
sendo que o cariótipo pode ser representado
como 46,X,i(Xq).
Inversªo (“inv”)
As inversıes ocorrem quando um œnico cro-
mossomo sofre duas quebras e o segmento entre
essas Ø reconstituído de forma invertida. Um por-
tador dessa alteraçªo cromossômica equilibrada
poderÆ produzir gametas anormais, acarretando
um maior risco de abortamento e prole com tris-
somias e/ou monossomias parciais. As inversıes
podem ocorrer envolvendo o centrômero (inver-
sıes pericŒntricas) ou, apenas um dos braços
cromossômicos (inversıes paracŒntricas).
Translocaçªo (“t”)
As translocaçıes se referem à troca de seg-
mentos entre cromossomos nªo-homólogos. As
translocaçıes recíprocas resultam da quebra
de cromossomos, com a troca recíproca dos
segmentos quebrados. Em geral, apenas dois
cromossomos estªo envolvidos e o nœmero
total de cromossomos Ø inalterado, sendo a
alteraçªo cromossomicamente equilibrada. Na
maioria das vezes, as translocaçıes recíprocas
nªo acarretam alteraçıes fenotípicas, estando
associadas a um alto risco de formaçªo de ga-
metas nªo equilibrados resultandoem aborta-
mento e/ou progŒnie anormal. As translocaçıes
robertsonianas, por outro lado, ocorrem pela
fusªo dos braços longos de dois cromossomos
acrocŒntricos próxima à regiªo centromØrica,
com a perda dos braços curtos. O cariótipo re-
sultante, com apenas 45 cromossomos, in-
cluindo o cromossomo com a translocaçªo, Ø
considerado equilibrado, uma vez que a perda dos
braços curtos de acrocŒntricos, os quais sªo cons-
tituídos por rDNA, nªo tem implicaçıes fenotípi-
cas. Um portador de translocaçªo robertsoniana
apresenta, no entanto, risco elevado para a prole
com desequilíbrio cromossômico. Um exemplo de
translocaçªo robertsoniana freqüente Ø a dos bra-
ços longos dos cromossomos 21 e 14 (Fig. 15.8).
Assim, uma mulher portadora do cromossomo de-
rivado dessa translocaçªo apresenta cariótipo
45,XX,der(14;21)(q10;q10) e poderÆ dar ori-
gem a indivíduos com a síndrome de Down e
trissomia 21 por translocaçªo com o cariótipo
46,XY,der(14;21)(q10;q10),+21.
Quanto às características clínicas das sín-
dromes, as trissomias dos autossomos afetam
mais o fenótipo do que as trissomias dos cro-
mossomos sexuais. Nas alteraçıes dos cromos-
somos autossomos, observam-se, em geral,
retardo de crescimento intra-uterino e pós-na-
tal, comprometimento do desenvolvimento men-
tal, padrªo de sinais dismórficos e malformaçıes.
Por outro lado, malformaçıes maiores e retardo
mental nªo sªo comuns nas aneuploidias dos cro-
mossomos sexuais, sendo a característica mais
marcante, o comprometimento da fertilidade.
A determinaçªo do sexo masculino Ø dada
pela presença do gene SRY (Sex determining re-
gion Y chromosome), presente no braço curto
do cromossomo Y, gene esse responsÆvel pela
formaçªo do testículo a partir da gônada indife-
212
VOL. 1 — BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA
Cap. 15
renciada. Subseqüentemente, a diferenciaçªo
sexual masculina dos ductos genitais internos e
da genitÆlia externa Ø determinada pelos hormô-
nios produzidos pelos testículos. Desta forma,
os cariótipos que apresentam o cromossomo Y
(mais especificamente, o braço curto onde se
localiza o gene SRY), resultam em indivíduos
com fenótipo masculino.
Síndromes de Instabilidade Cromossômica
Existem síndromes que apresentam instabili-
dade cromossômica, as quais demonstram uma
freqüŒncia mais elevada de quebras e rearranjos
cromossômicos variados. Defeito nos mecanis-
mos de reparo de DNA resultam nessa predis-
posiçªo a quebras e hipersensibilidade a agentes
mutagŒnicos. As síndromes clÆssicas de instabi-
lidade cromossômica sªo a anemia de Fanconi,
ataxia-telangiectasia e síndrome de Bloom as
quais apresentam herança mendeliana autossô-
mica recessiva.
Sítio FrÆgil do X
A síndrome do sítio frÆgil do X recebeu esse
nome devido à presença de um cromossomo X
que demonstra uma regiªo com uma falha nªo
corada próxima à porçªo distal do braço longo
em Xq27.3, em geral envolvendo ambas as
cromÆtides, sendo essa regiªo susceptível a que-
bras. O cromossomo X frÆgil Ø observado em
culturas de linfócitos utilizando condiçıes de
cultura com depleçªo de Æcido fólico ou de timi-
dina, sendo detectado em atØ 50% das metÆfa-
ses de homens portadores da síndrome e, menos
freqüentemente, em mulheres heterozigotas para
o gene. A mutaçªo do frÆgil X apresenta um com-
portamento instÆvel, podendo haver um aumento
do nœmero de repetiçıes do trinucleotídeo CGG
na regiªo 5’ nªo traduzida do gene, aumento esse
verificado quando o gene Ø transmitido pela
mulher, constituindo uma doença com padrªo
de herança pouco usual.
Dissomia Uniparental
A dissomia uniparental, conceito relativa-
mente novo em humanos, Ø observada quando
um genitor contribui com duas cópias de um
cromossomo e o outro com nenhuma. Como
mencionado anteriormente, as síndromes de Pra-
der-Willi e de Angelman, em 70% dos casos, sªo
causadas por microdeleçıes do cromossomo 15,
em 15q11-q13. Os 30% restantes sªo decorren-
tes de dissomia uniparental do cromossomo 15.
Esse fenômeno pode surgir de diferentes ma-
neiras, dentre elas, da formaçªo de um zigoto
trissômico com perda subseqüente de um dos
cromossomos 15, restando os dois de mesma
origem parental. A dissomia uniparental resulta
em efeito fenotípico por haver imprinting genô-
mico, ou seja, a expressªo diferencial dos alelos
de origem materna e paterna. Algumas partes
de alguns cromossomos (entre essas, a regiªo
q11-13 do cromossomo 15) estªo sujeitas a esse
fenômeno do imprinting genômico sendo que a
maioria do genoma autossômico parece ser fun-
cionalmente dissômica.
RESUMO
Os cromossomos humanos podem ser estu-
dados atravØs do cariótipo, obtido a partir do
estudo de cØlulas metafÆsicas, ou atravØs de tØc-
nicas de citogenØtica-molecular, com o uso de
sondas de DNA específicas para certos cromos-
somos ou regiıes cromossômicas. AtravØs des-
sas metodologias, alteraçıes cromossômicas
numØricas e estruturais podem ser identificadas.
Fig. 15.8 — Cariótipo 46,XX,der(14;21)(q10;q10),+21 de
uma paciente com síndrome de Down e trissomia 21 por
translocaçªo.
3a. prova - Schor - Paginador: Fernando
213
OS CROMOSSOMOS HUMANOS
Cap. 15
Essas anormalidades sªo verificadas em maior
freqüŒncia em casais com infertilidade (muitas
vezes devido a uma alteraçªo estrutural equili-
brada), em abortos, em síndromes malformati-
vas, em casos de retardo mental, hipogonadismo,
entre outros.
BIBLIOGRAFIA
1. Jorde LB, Carey JC, Bamshad MJ, White RL. GenØtica
MØdica. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 1999.
2. Gersen SL, Keagle MB. The Principles of Clinical
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3. Miller OJ, Therman E. Human Chromosomes. Springer-
Verlag New York, Inc., New York, 2001.

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