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3a. prova - Schor - Paginador: Fernando 203 OS CROMOSSOMOS HUMANOS Cap. 15 A informaçªo genØtica contida no nœcleo das cØlulas Ø constituída pelo DNA o qual, na espØ- cie humana, encontra-se distribuído em 46 cro- mossomos. Esse DNA estÆ associado a proteínas em diferentes graus de compactaçªo conforme a fase do ciclo celular em que a cØlula se encon- tra de forma que os cromossomos se apresenta- rªo com diferentes morfologias. Durante a interfase, fase do ciclo celular entre duas divi- sıes mitóticas, os cromossomos se encontram desespiralizados formando uma massa homogŒ- nea denominada cromatina nªo sendo possível, portanto, distingui-los como estruturas indivi- dualizadas. Antes de a cØlula iniciar o processo de divi- sªo, ocorre a duplicaçªo do DNA cromossômi- co resultando em duas duplas hØlices de DNA idŒnticas. À medida que a cØlula começa a se dividir, ocorre uma gradual condensaçªo dos cromossomos sendo que estes se tornam mais visíveis como estruturas distintas durante a me- tÆfase da mitose. Nessa fase, os cromossomos estªo duplicados e sªo visualizados sendo com- postos, cada um, por duas cromÆtides idŒnticas ligadas pelo centrômero (Fig. 15.1). Apesar de os cromossomos terem sido des- critos e assim denominados no final do sØculo XIX jÆ tendo sido relacionados à hereditarieda- de, foi somente em 1956 que se determinou como sendo 46 o nœmero de cromossomos na Os Cromossomos Humanos espØcie humana. Isso só foi possível graças à in- troduçªo de tØcnicas de cultura de cØlulas e de preparaçªo cromossômica as quais sªo basica- mente as mesmas ainda hoje utilizadas. ESTUDO DOS CROMOSSOMOS O estudo dos cromossomos pode ser reali- zado a partir de qualquer tecido com cØlulas nucleadas com capacidade de divisªo, tais como os linfócitos do sangue perifØrico, fibroblastos da pele, cØlulas da medula óssea, das vilosidades coriônicas, do líquido amniótico ou ainda de te- cidos sólidos como as gônadas e tumores. A cul- tura de linfócitos do sangue perifØrico Ø a tØcnica mais utilizada para o estudo cromossômico de- vido à facilidade de obtençªo e de cultivo do material (Fig. 15.2). Para a realizaçªo do cariótipo, linfócitos re- tirados do sangue perifØrico sªo colocados em meio de cultura enriquecido com soros adequa- dos e fito-hemaglutinina a qual estimula a divi- sªo dos linfócitos T. As cØlulas sªo cultivadas em condiçıes estØreis a 37oC por cerca de 72 horas. Na œltima hora de cultura Ø adicionada colchici- na, substância que impede a formaçªo das fi- bras do fuso mitótico bloqueando as cØlulas em metÆfase, fase de maior condensaçªo cromos- sômica e, portanto de mais fÆcil visualizaçªo. O preparo dos cromossomos Ø efetuado com a adi- Maria Isabel Melaragno Bianca Borsatto 204 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 15 Fig. 15.2 Esquema das etapas para a realizaçªo de uma cultura de linfócitos do sangue perifØrico para obtençªo do cariótipo. Fig. 15.1 Esquema do ciclo mitótico mostrando a morfologia dos cromossomos. çªo de uma soluçªo salina hipotônica, para ha- ver um melhor espalhamento dos cromossomos, seguido da adiçªo de uma soluçªo fixadora. O material Ø gotejado em lâminas de microscópio. As lâminas sªo entªo coradas e as cØlulas em metÆfase, analisadas em microscópio óptico. Existem diferentes mØtodos de coloraçªo cro- mossômica para a anÆlise dos cromossomos, sen- do a coloraçªo sólida e o bandamento G os mais utilizados na rotina de citogenØtica. A coloraçªo Cromossomos descondensados (cromatina) Cromossomos como única cromátide (não visualizável) INTERFASE METÁFASE Cromossomos com duas cromátides Separação das cromátides irmãs ANÁFASE e TELÓFASE 2 células filhas resultantes da mitose INTERFASE 5ml de sangue venoso Sangue meio de cultura soro fetal bovino fito-hemaglutinina Incubação 72 horas a 37oC Colchicina 1 hora a 37oC Separação dos linfócitos por centrifugação Tratamento hipotônico Fixação das células Células gotejadas em lâminas Coloração das lâminas Análise FotografiaCARIÓTIPO 3a. prova - Schor - Paginador: Fernando 205 OS CROMOSSOMOS HUMANOS Cap. 15 sólida, obtida atravØs do uso do corante Giemsa resulta na coloraçªo homogŒnea dos cromosso- mos permitindo a anÆlise de seu nœmero e mor- fologia. A tØcnica de coloraçªo de bandamento G resulta em faixas transversais, denominadas bandas, características para cada cromossomo, permitindo a identificaçªo e classificaçªo de cada um dos 23 pares cromossômicos. Na metÆfase, os cromossomos sªo constituí- dos por duas cromÆtides unidas pelo centrôme- ro, o qual delimita longitudinalmente dois braços cromossômicos: o menor referido como braço curto (representado pela letra p, de petit) e o maior como braço longo (representado pela letra q). De acordo com a posiçªo do centrômero, os cromos- somos humanos podem ser classificados em me- tacŒntricos (braços de tamanhos semelhantes), submetacŒntricos (braço curto menor do que o longo) e acrocŒntricos (braço curto muito menor do que o longo). Segundo normas internacionais de padronizaçªo de nomenclatura cromossômica (ISCN, 1995), as bandas cromossômicas delimi- tam diferentes regiıes de seus braços. Dentro de cada regiªo, as bandas (bandas claras e escuras) sªo numeradas a partir do centrômero (Fig. 15.3). Os cromossomos, após anÆlise em micros- cópio óptico, sªo fotografados e organizados de acordo com o tamanho, posiçªo do centrômero e padrªo de bandamento. A essa classificaçªo e or- ganizaçªo dos cromossomos Ø dado o nome de cariótipo (Fig. 15.4). Verifica-se na espØcie humana, 23 pares de cromossomos sendo 22 pares de autossomos (pares encontrados igualmente em ambos os sexos) e um par de cromossomos sexuais (XX na mulher e XY no homem). Os cariótipos nor- mais masculinos e femininos sªo designados 46,XY e 46,XX, respectivamente. O estudo dos cromossomos e da divisªo ce- lular Ø referido como citogenØtica. Atualmente existem analisadores de imagem computadori- zados os quais sªo utilizados em citogenØtica para fazer a classificaçªo dos cromossomos e a realizaçªo da cariotipagem automaticamente. CITOGENÉTICA-MOLECULAR A limitaçªo da citogenØtica clÆssica Ø de- corrente da necessidade de cØlulas em divisªo Fig. 15.3 Padrªo de bandamento G de um cromossomo metacŒntrico (1), um submetacŒntrico (X) e um acrocŒntrico (21). O centrômero delimita o braço curto (p) e o braço longo (q) onde sªo evidenciadas as diferentes regiıes e bandas desses cromossomos. Região banda Região banda Região banda 33 2 1 1 1 2 2 1 1 65 43 2 1 3 2 2 1 11 1 2 3 4 5 1 22 1 21 7 1 43 214 3 2 1 1 2 12 3 4 5 2 1 3 1 2 2 1 1 2 3 4 5 6 3 206 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 15 para a obtençªo de cromossomos metafÆsicos e tambØm pelo nível limitado de resoluçªo quanto à visualizaçªo de possíveis alteraçıes cromossô- micas. Uma banda cromossômica nas melhores condiçıes de bandamento contØm 3.106 pares de bases (pb), de forma que somente poderªo ser detectadas, pelo exame do cariótipo, dele- çıes ou alteraçıes cromossômicas maiores do que as de cerca de 100 genes. Outra dificuldade da citogenØtica clÆssica Ø a necessidade de cro- mossomos metafÆsicos de boa qualidade, o que muitas vezes nªo Ø possível, como por exemplo, em alguns tipos de tumores sólidos. Em cØlulas interfÆsicas, a informaçªo genØ- tica que nos era dada anteriormente pelo estudo dos cromossomos era restrita à cromatina X, ou corpœsculo de Barr, descrito em 1949 em cØlu- las femininas. Essa cromatina X representa um dos cromossomos X da mulher que permanece condensado e inativado durante a interfase. Em casos de aneuploidias, qualquernœmero de cro- mossomos X a mais do que um, resulta em cro- matina X positiva. Atualmente, com as tØcnicas de citogenØtica-molecular, todos os cromosso- mos jÆ podem ser estudados, mesmo durante a interfase. Com a introduçªo de tØcnicas moleculares, houve nos œltimos anos um avanço da citoge- nØtica. A chamada citogenØtica-molecular Ø ba- seada na capacidade de as fitas da dupla hØlice de DNA se separarem (pelo rompimento das pontes de hidrogŒnio que unem os nucleotídeos das duas fitas) atravØs de diferentes processos de desnaturaçªo, e de se renaturarem. Desta forma, Ø possível obter molØculas híbridas atra- vØs do emparelhamento de molØculas comple- mentares do DNA alvo com uma determinada sonda de DNA. Existem diferentes tipos de sonda as quais sªo utilizadas de acordo com o interesse da investiga- çªo: sondas complementares às regiıes centro- mØricas de todos os cromossomos, sondas de seqüŒncias œnicas (incluindo as gŒnicas) e son- das de um cromossomo inteiro as quais repre- sentam um conjunto de sondas que se hibridam com vÆrias regiıes de um cromossomo resultan- do em uma pintura cromossômica (Fig. 15.5). A tØcnica mais utilizada Ø a tØcnica de hibri- daçªo in situ por fluorescŒncia (FISH). Para a realizaçªo da FISH, as lâminas sªo preparadas a partir de cØlulas crescidas em suspensªo, de preparaçªo direta ou a partir de tecidos sólidos, sendo o material fixado em lâminas de micros- cópio. As sondas utilizadas sªo marcadas de for- ma que poderªo ser detectadas por fluorocromos com microscópio de fluorescŒncia. Entre as vantagens da tØcnica de FISH, des- tacam-se a possibilidade de anÆlise de cØlulas em interfase, eliminando a necessidade de culturas celulares e o estudo de metÆfases de prepara- çıes cromossômicas pobres ou com anormali- Fig. 15.4 Cariótipo de um homem normal (46,XY) com bandamento G. (a) Cromossomos metafÆsicos como sªo visualizados ao microscópio (b) Cromossomos após terem sido fotografados, cortados e organizados aos pares. 3a. prova - Schor - Paginador: Fernando 207 OS CROMOSSOMOS HUMANOS Cap. 15 dades cromossômicas muito complexas ou pe- quenas, que nªo seriam detectadas atravØs de tØcnicas clÆssicas de bandamento. ALTERA˙ÕES CROMOSSÔMICAS A primeira doença reconhecida como tendo etiologia cromossômica foi a síndrome de Down, quando Lejeune e col., em 1959, relataram a presença de um cromossomo extra em indiví- duos com a síndrome. Em seguida, outras sín- dromes decorrentes de alteraçıes cromossômicas numØricas foram descritas e tambØm, alteraçıes cromossômicas estruturais. A Tabela 15.1 apresenta as alteraçıes cromos- sômicas mais freqüentes na espØcie humana. Durante a divisªo celular, os cromossomos sªo distribuídos eqüitativamente às cØlulas-filhas. Uma distribuiçªo anormal dos cromossomos pode re- sultar em alteraçıes cromossômicas numØricas. Por outro lado, quebras durante a divisªo celular po- dem resultar em alteraçıes cromossômicas estru- turais. Na maioria das vezes, o erro ocorre durante a meiose, resultando em gametas e, portanto, em zigotos, com desequilíbrio cromossômico acarretando anormalidades em todas as cØlulas, ou seja, uma anormalidade constitucional. Em alguns casos, o erro pode ocorrer após a forma- çªo do zigoto, em divisıes mitóticas, podendo ocasionar mosaicismo, isto Ø, a presença num indivíduo ou tecido de duas ou mais linhagens celulares geneticamente distintas, porØm, origi- nadas de um mesmo zigoto. O mosaicismo Ø mais freqüentemente observado em alteraçıes envolvendo os cromossomos sexuais. Nestes casos, o fenótipo tende a ser mais leve depen- dendo do grau de mosaico. Alteraçıes cromossômicas dos autossomos ou dos cromossomos sexuais (tanto numØri- cas como estruturais) podem ser verificadas em síndromes malformativas, retardo mental, hipogonadismo e em erros da determinaçªo sexual. Na genØtica da reproduçªo, o estudo citogenØtico estÆ recomendado para casos inex- plicados de infertilidade, abortamentos espon- tâneos, em casos de diagnóstico prØ-natal e, atualmente, em diagnóstico prØ-implantacional. Alteraçıes cromossômicas tambØm tŒm sido re- lacionadas a cØlulas tumorais e a síndromes de instabilidade cromossômica. A maioria das alteraçıes cromossômicas nªo Ø viÆvel sendo responsÆveis por mais de 50% dos abortos espontâneos. Estima-se que a inci- dŒncia de alteraçıes cromossômicas em recØm- nascidos seja em torno de 0,7%. Para se descrever cariótipos alterados, indi- ca-se nœmero total de cromossomos, seguido pe- los cromossomos sexuais e pela anormalidade, seja ela um cromossomo adicional ou em falta, ou um cromossomo estruturalmente alterado. Como exemplos de cariótipos alterados temos os carió- Fig. 15.5 Hibridaçªo in situ por fluorescŒncia em: (a) uma cØlula interfÆsica hibridada com sonda centromØrica do cromossomo 18, revelando trissomia desse cromossomo; (b) cromossomos metafÆsicos hibridados com sonda de pintura cromossômica do cromossomo X de uma mulher normal; (c) cromossomos metafÆsicos de um indivíduo normal hibrida- dos com a sonda controle RARA em 17q21 e com a sonda da regiªo 17p13.3, regiªo cuja deleçªo acarreta a síndrome de Miller-Dieker (cortesia Dr. Marcial Francis Galera). 208 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 15 Tabela 15.1 Alteraçıes Cromossômicas Freqüentes nos Seres Humanos Distœrbio Anormalidade Cariótipos Mais Freqüentes IncidŒncia Cromossômica Síndrome de Down Trissomia 21 47,XX(ou XY),+21 1:600 47,XX,+21/46,XX 6,XX,der(21;14)(q10;q10),+21 Síndrome de Edwards Trissomia 18 47,XX(ou XY),+18 1:8.000 Síndrome de Patau Trissomia 13 47,XX(ou XY),+13 1:25.000 Síndrome de Turner Monossomia X 45,X 1:5.000 45,X/46,XX 46,X,i(Xq) 45,X/46,Xi(Xq) 46,X,del(Xp) Síndrome de Klinefelter Cromossomos sexuais XXY 47,XXY 1:800 Síndrome do triplo X Trissomia X 47,XXX 1:700 Síndrome do duplo Y Cromossomos sexuais XYY 47,XYY 1:2.000 Triploidia 3n 69,XXX raro Tetraploidia 4n 92,XXXX raro Rearranjos nªo deleçıes, ex: 1:17.000 equilibrados duplicaçıes etc. 46,XX,del(5p) 46,XY,der(2)t(2;5)(q21;q31) Rearranjos equilibrados translocaçıes ex: 1:1.000 robertsonianas 45,XX,der(14;21)(q10;q10) translocaçıes ex: 1:11.000 recíprocas 46,XY,t(2;5)(q21;q31) tipos 47,XY,+21 (trissomia do cromossomo 21), 45,X (monossomia X), 45,X/46,XX (monosso- mia X em mosaico), 46,XX,del(5)(p)(15) (dele- çªo do braço curto do cromossomo 5 com ponto de quebra na banda p15), 46,XX,t(2;7)(q13;q22) (translocaçªo recíproca equilibrada entre os braços longos dos cromossomos 2 e 7), 46,XY, inv(1)(p21q31) (inversªo pericŒntrica do cromos- somo 1) e 46,Xi(Xq) (isocromossomo de braço longo do X). Alteraçıes Cromossômicas NumØricas As alteraçıes cromossômicas numØricas po- dem ser classificadas em aneuploidias e poli- ploidias, dependendo da quantidade de cromos- somos envolvidos no desequilíbrio. Aneuploidia A aneuploidia Ø o tipo mais comum de dis- tœrbio cromossômico, ocorrendo em aproxima- damente 4% das gestaçıes. As aneuploidias constituem um tipo de alte- raçªo numØrica na qual as cØlulas nªo contŒm um mœltiplo de 23 cromossomos, apresentando cromossomos a mais ou a menos. Podem ocorrer monossomias (presença de apenas um representante de um dado cromossomo), tris- 3a. prova - Schor - Paginador: Fernando 209 OS CROMOSSOMOS HUMANOS Cap. 15 somias (presença de trŒs cromossomos em vez do par normal) e, mais raramente, tetrassomias e pentassomias. Aneuploidias sªo letais para a maioria dos cromossomos. A monossomia estÆ praticamen- te restrita à monossomia do cromossomo X, a qual resulta na síndrome de Turner. As monos- somias autossômicas sªo, em geral, incompatí- veis com a sobrevivŒncia a termo, enquanto que trissomias de alguns cromossomos sªo vistas com certa freqüŒncia entre nativivos. As trissomias completas de autossomosmais freqüentes sªo as dos cromossomos 21, 13 e 18 as quais resultam nas síndromes de Down (Fig. 15.6), Patau e Edwards, respectivamente. As tris- somias envolvendo os cromossomos sexuais po- dem resultar nos cariótipos 47,XXY, 47,XXX, 47,XYY e nas síndromes de Klinefelter, triplo X e duplo Y, respectivamente. Os raros casos de tetrassomia e pentassomia estªo restritos aos cro- mossomos sexuais. As aneuploidias envolvendo os cromossomos sexuais, em geral, resultam em alteraçıes feno- típicas mais brandas do que aquelas envolvendo os autossomos, em virtude da inativaçªo de um dos cromossomos X que excederem a um, no início da vida embrionÆria e da pouca quantida- de de genes presentes no cromossomo Y. Poliploidia Qualquer cØlula que contenha um mœltiplo exato de 23 cromossomos Ø designada euplói- de. Assim, cØlulas normais como os gametas haplóides (n=23) e as cØlulas somÆticas diplói- des (2n= 46) sªo euplóides. Acima do nível di- plóide, a euploidia Ø denominada poliploidia. Nos seres humanos, a poliploidia Ø pouco fre- qüente tendo sido relatadas triploidia (3n) e tetraploidia (4n) em abortos e em nativivos com sobrevida curta, estes em geral apresentando mo- saicismo. Uma das possíveis causas da triploidia Ø a dispermia, i.e., a fertilizaçªo de um ovócito por dois espermatozóides. A tetraploidia, menos fre- qüente que a triploidia, pode se originar pela fusªo de dois zigotos diplóides, ou pela falha mitótica no início do desenvolvimento embrio- nÆrio, com a migraçªo dos cromossomos dupli- cados para uma œnica das duas cØlulas-filhas. Alteraçıes Cromossômicas Estruturais As alteraçıes cromossômicas estruturais sªo menos freqüentes do que as alteraçıes cromos- sômicas numØricas, podendo envolver um ou mais autossomos, cromossomos sexuais ou ambos. Essas alteraçıes resultam de quebras nos cromossomos e subseqüente reuniªo das extre- midades quebradas em uma configuraçªo anor- mal (Fig. 15.7). As quebras cromossômicas podem ser espontâneas ou causadas por agen- tes clastogŒnicos, como a radiaçªo ionizante e algumas substâncias químicas. Os rearranjos cromossômicos resultantes podem ser equilibrados ou nªo-equilibrados com relaçªo à quantidade de material genØtico por cØlula. Nos rearranjos equilibrados, nªo hÆ perda nem ganho de material genØtico. Desta forma, as alteraçıes equilibradas nªo acarretam, como regra geral, efeitos no fenótipo do indivíduo, apesar destes estarem sujeitos a riscos elevados de produzir prole com desequilíbrios cromossô- micos. No grupo de rearranjos equilibrados, es- tªo incluídas as translocaçıes equilibradas e as inversıes. Os rearranjos cromossômicos nªo-equilibra- dos sªo aqueles que resultam em material cro- mossômico em falta (deleçªo) ou em excesso (duplicaçªo), resultando em monossomias ou trissomias parciais, respectivamente. Em contras- Fig. 15.6 Cariótipo 47,XX,+21 (trissomia do cromosso- mo 21) de um paciente com a síndrome de Down. 210 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 15 te com as alteraçıes numØricas, cujas aneuploi- dias estªo restritas a poucos autossomos, a va- riedade de alteraçıes estruturais Ø enorme, pois, as quebras cromossômicas podem ocorrer em diferentes pontos e envolver diferentes cromos- somos ou combinaçıes cromossômicas. Deleçªo (representada pela abreviatura del) As deleçıes se referem à perda de parte do cromossomo resultando em monossomia parcial do segmento perdido. Em geral, as deleçıes sªo menos viÆveis do que as duplicaçıes correspon- dentes, sendo letais quando resultam em perda de mais de 2% do genoma total haplóide. Entre as deleçıes, mais freqüentes encontram-se a de- leçªo do braço curto do cromossomo 5 (com diferentes pontos de quebra em 5p) resultando na monossomia parcial 5p, originariamente de- Fig. 15.7 Esquema de exemplos de alteraçıes cromossômicas estruturais: (a) deleçªo no braço curto do cromossomo X; (b) isocromossomo do braço longo do cromossomo X; (c) inversªo pericŒntrica do cromossomo 1; (d) translocaçªo recíproca entre os braços longos dos cromossomos 4 e 10 e (e) translocaçªo robertsoniana entre os cromossomos 14 e 21. nominada síndrome, e as deleçıes dos braços curtos dos cromossomos 4, 11 e 18. As deleçıes podem ocorrer de novo, i.e., ori- ginando-se casualmente na meiose de um dos pais ou, ser o resultado da segregaçªo de um rearranjo equilibrado presente em um dos pais (e.g. translocaçªo equilibrada). Pode ocorrer deleçªo das extremidades de um cromossomo com a posterior uniªo dos braços curtos e longos havendo a formaçªo de um cromossomo em anel (r, de ring). Algumas deleçıes podem ser muito pequenas de forma que sªo difíceis ou impossí- veis de serem reveladas no estudo do cariótipo. Essas deleçıes submicroscópicas, ditas micro- deleçıes, podem ser entªo mais facilmente identificadas atravØs da tØcnica de FISH, como exemplificado na Fig. 15.5. As microdeleçıes podem envolver genes contíguos e resultar em fenótipo com características de vÆrias doenças monogŒnicas. q13 q28 Xp Xq XqXq p22 q25 180o 14 14 21 21 14 t(14;21) 21 der(10) 10 4 der(4)Translocação(4;10)(q34;q21) q21 q34 4 4 10 10 del(X) (q12q28) Deleção Translocação recíproca equilibrada Fragmento sem centrômero Isocromossomo Inversão inv(1)(p22q25) Translocação Robertsoniana equilibrada x i (Xq) A B C D E 3a. prova - Schor - Paginador: Fernando 211 OS CROMOSSOMOS HUMANOS Cap. 15 Dentre alguns exemplos de síndromes de mi- crodeleçıes, podemos ressaltar as síndromes de Prader-Willi e de Angelman, responsÆveis por alteraçıes fenotípicas distintas. Cerca de 70% dos casos de ambas afecçıes sªo decorrentes de uma deleçªo em 15q11-q13, entretanto, depen- dendo da origem parental da deleçªo, ou seja, se esta ocorreu no cromossomo 15 paterno ou materno, os fenótipos apresentados serªo carac- terísticos das síndromes de Prader-Willi e de Angelman, respectivamente. Duplicaçªo (dup) As duplicaçıes se referem ao ganho de um segmento cromossômico que poderÆ resultar em trissomias parciais. Essas podem surgir por cros- sing over desigual durante a meiose ou a partir de um gameta com desequilíbrio cromossômico herdado de um progenitor com uma alteraçªo equilibrada. Isocromossomo (i) Os isocromossomos sªo cromossomos nos quais um dos braços estÆ ausente e o outro du- plicado. Um indivíduo com um isocromossomo apresenta monossomia de um braço cromossô- mico e trissomia do outro. Os possíveis mecanismos para se formar um isocromossomo sªo a divisªo errônea do cen- trômero e quebras em Xp próximas ao centrô- mero com a reuniªo das extremidades quebradas. Entre os isocromossomos observados em nati- vivos estÆ o do braço longo do cromossomo X, sendo que o cariótipo pode ser representado como 46,X,i(Xq). Inversªo (inv) As inversıes ocorrem quando um œnico cro- mossomo sofre duas quebras e o segmento entre essas Ø reconstituído de forma invertida. Um por- tador dessa alteraçªo cromossômica equilibrada poderÆ produzir gametas anormais, acarretando um maior risco de abortamento e prole com tris- somias e/ou monossomias parciais. As inversıes podem ocorrer envolvendo o centrômero (inver- sıes pericŒntricas) ou, apenas um dos braços cromossômicos (inversıes paracŒntricas). Translocaçªo (t) As translocaçıes se referem à troca de seg- mentos entre cromossomos nªo-homólogos. As translocaçıes recíprocas resultam da quebra de cromossomos, com a troca recíproca dos segmentos quebrados. Em geral, apenas dois cromossomos estªo envolvidos e o nœmero total de cromossomos Ø inalterado, sendo a alteraçªo cromossomicamente equilibrada. Na maioria das vezes, as translocaçıes recíprocas nªo acarretam alteraçıes fenotípicas, estando associadas a um alto risco de formaçªo de ga- metas nªo equilibrados resultandoem aborta- mento e/ou progŒnie anormal. As translocaçıes robertsonianas, por outro lado, ocorrem pela fusªo dos braços longos de dois cromossomos acrocŒntricos próxima à regiªo centromØrica, com a perda dos braços curtos. O cariótipo re- sultante, com apenas 45 cromossomos, in- cluindo o cromossomo com a translocaçªo, Ø considerado equilibrado, uma vez que a perda dos braços curtos de acrocŒntricos, os quais sªo cons- tituídos por rDNA, nªo tem implicaçıes fenotípi- cas. Um portador de translocaçªo robertsoniana apresenta, no entanto, risco elevado para a prole com desequilíbrio cromossômico. Um exemplo de translocaçªo robertsoniana freqüente Ø a dos bra- ços longos dos cromossomos 21 e 14 (Fig. 15.8). Assim, uma mulher portadora do cromossomo de- rivado dessa translocaçªo apresenta cariótipo 45,XX,der(14;21)(q10;q10) e poderÆ dar ori- gem a indivíduos com a síndrome de Down e trissomia 21 por translocaçªo com o cariótipo 46,XY,der(14;21)(q10;q10),+21. Quanto às características clínicas das sín- dromes, as trissomias dos autossomos afetam mais o fenótipo do que as trissomias dos cro- mossomos sexuais. Nas alteraçıes dos cromos- somos autossomos, observam-se, em geral, retardo de crescimento intra-uterino e pós-na- tal, comprometimento do desenvolvimento men- tal, padrªo de sinais dismórficos e malformaçıes. Por outro lado, malformaçıes maiores e retardo mental nªo sªo comuns nas aneuploidias dos cro- mossomos sexuais, sendo a característica mais marcante, o comprometimento da fertilidade. A determinaçªo do sexo masculino Ø dada pela presença do gene SRY (Sex determining re- gion Y chromosome), presente no braço curto do cromossomo Y, gene esse responsÆvel pela formaçªo do testículo a partir da gônada indife- 212 VOL. 1 BASES MOLECULARES DA BIOLOGIA, DA GENÉTICA E DA FARMACOLOGIA Cap. 15 renciada. Subseqüentemente, a diferenciaçªo sexual masculina dos ductos genitais internos e da genitÆlia externa Ø determinada pelos hormô- nios produzidos pelos testículos. Desta forma, os cariótipos que apresentam o cromossomo Y (mais especificamente, o braço curto onde se localiza o gene SRY), resultam em indivíduos com fenótipo masculino. Síndromes de Instabilidade Cromossômica Existem síndromes que apresentam instabili- dade cromossômica, as quais demonstram uma freqüŒncia mais elevada de quebras e rearranjos cromossômicos variados. Defeito nos mecanis- mos de reparo de DNA resultam nessa predis- posiçªo a quebras e hipersensibilidade a agentes mutagŒnicos. As síndromes clÆssicas de instabi- lidade cromossômica sªo a anemia de Fanconi, ataxia-telangiectasia e síndrome de Bloom as quais apresentam herança mendeliana autossô- mica recessiva. Sítio FrÆgil do X A síndrome do sítio frÆgil do X recebeu esse nome devido à presença de um cromossomo X que demonstra uma regiªo com uma falha nªo corada próxima à porçªo distal do braço longo em Xq27.3, em geral envolvendo ambas as cromÆtides, sendo essa regiªo susceptível a que- bras. O cromossomo X frÆgil Ø observado em culturas de linfócitos utilizando condiçıes de cultura com depleçªo de Æcido fólico ou de timi- dina, sendo detectado em atØ 50% das metÆfa- ses de homens portadores da síndrome e, menos freqüentemente, em mulheres heterozigotas para o gene. A mutaçªo do frÆgil X apresenta um com- portamento instÆvel, podendo haver um aumento do nœmero de repetiçıes do trinucleotídeo CGG na regiªo 5 nªo traduzida do gene, aumento esse verificado quando o gene Ø transmitido pela mulher, constituindo uma doença com padrªo de herança pouco usual. Dissomia Uniparental A dissomia uniparental, conceito relativa- mente novo em humanos, Ø observada quando um genitor contribui com duas cópias de um cromossomo e o outro com nenhuma. Como mencionado anteriormente, as síndromes de Pra- der-Willi e de Angelman, em 70% dos casos, sªo causadas por microdeleçıes do cromossomo 15, em 15q11-q13. Os 30% restantes sªo decorren- tes de dissomia uniparental do cromossomo 15. Esse fenômeno pode surgir de diferentes ma- neiras, dentre elas, da formaçªo de um zigoto trissômico com perda subseqüente de um dos cromossomos 15, restando os dois de mesma origem parental. A dissomia uniparental resulta em efeito fenotípico por haver imprinting genô- mico, ou seja, a expressªo diferencial dos alelos de origem materna e paterna. Algumas partes de alguns cromossomos (entre essas, a regiªo q11-13 do cromossomo 15) estªo sujeitas a esse fenômeno do imprinting genômico sendo que a maioria do genoma autossômico parece ser fun- cionalmente dissômica. RESUMO Os cromossomos humanos podem ser estu- dados atravØs do cariótipo, obtido a partir do estudo de cØlulas metafÆsicas, ou atravØs de tØc- nicas de citogenØtica-molecular, com o uso de sondas de DNA específicas para certos cromos- somos ou regiıes cromossômicas. AtravØs des- sas metodologias, alteraçıes cromossômicas numØricas e estruturais podem ser identificadas. Fig. 15.8 Cariótipo 46,XX,der(14;21)(q10;q10),+21 de uma paciente com síndrome de Down e trissomia 21 por translocaçªo. 3a. prova - Schor - Paginador: Fernando 213 OS CROMOSSOMOS HUMANOS Cap. 15 Essas anormalidades sªo verificadas em maior freqüŒncia em casais com infertilidade (muitas vezes devido a uma alteraçªo estrutural equili- brada), em abortos, em síndromes malformati- vas, em casos de retardo mental, hipogonadismo, entre outros. BIBLIOGRAFIA 1. Jorde LB, Carey JC, Bamshad MJ, White RL. GenØtica MØdica. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 1999. 2. Gersen SL, Keagle MB. The Principles of Clinical Cytogenetics. Humana Press, Totowa, 1999. 3. Miller OJ, Therman E. Human Chromosomes. Springer- Verlag New York, Inc., New York, 2001.
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