Buscar

Desenvolvimento como liberdade

Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original

Desenvolvimento como Liberdade
Amartya Sen
(Capítulos 01-03)
Introdução
Quais são os limites do foco excessivo no crescimento do produto? Até que ponto observar o acumulo de riqueza permite verificar se a vida das pessoas é realmente melhor? 
Mudança de foco: não nos interessa mais somente expandir as riquezas, mas expandir as liberdades.
Introdução
De acordo com Amartya Sen, é necessário analisar de maneira integrada as atividades econômicas, sociais e políticas. 
Notem que agora o PIB já não é mais o foco central. O IDH pode nos dizer mais, mas ainda assim é incompleto. 
A expansão das liberdades mais básicas de um indivíduo passa a ser vista como o objetivo final do processo de desenvolvimento, ao mesmo tempo em que o autor também reconhece o papel instrumental das liberdades.
Introdução
Sob essa nova visão, podemos notar que um crescimento econômico substancial não necessariamente irá implicar em desenvolvimento econômico. Exemplo disso é o progresso econômico em uma ditadura, ou então crescimento com acentuado aumento da desigualdade social (até que ponto a desigualdade de renda é inerente ao processo de acumulação de capital).
Introdução
É um foco novo e mais abrangente que “dirige a atenção para os fins que tornam o desenvolvimento importante, em vez de restringi-lo a alguns meios específicos”, por mais importantes que sejam esses meios. 
Ou seja, a acumulação de riqueza é de fato um fator central no desenvolvimento, mas não pode ser vista como o objetivo final. 
Introdução
Isso exige que o conceito de liberdade seja bem trabalhado, esforço que será empreendido ao longo do livro. Passa a haver a necessidade de algumas perguntas adicionais, como:
O que é a liberdade? 
Como defender a liberdade sem cair no anarquismo?
Quando uma determinada ordem social defende de fato as liberdades essenciais, e quando ela faz uso dessas liberdades apenas como discurso ideológico? 
Quais são os inimigos dessa liberdade? O livre mercado é a solução para isso? 
Ao trabalhar esse conceito de liberdade, iremos ver que ela é resultado de uma ordem social difícil de se obter na maior parte das sociedades. 
Introdução
A liberdade é central para o processo de desenvolvimento por duas razões:
1) A razão avaliatória: a avaliação do progresso tem de ser feita verificando-se primordialmente se houve aumento das liberdades das pessoas;
2) A razão da eficácia: a realização do desenvolvimento depende inteiramente da livre condição de agente das pessoas. 
Introdução
Liberdades substantivas: é o objetivo final do processo de desenvolvimento, tendo relação com o direito de participação política, o acesso à educação e a condições básicas de saúde. É aquilo que permite os indivíduos de uma sociedade se um agente ativo. Enfim, tudo aquilo que permite o ser humano se desenvolver e participar de uma sociedade
Liberdades instrumentais: liberdades que empiricamente se mostram associadas às liberdades substantivas (oportunidades econômicas, liberdades políticas, facilidades sociais, garantias de transparência e segurança protetora). 
Pergunta: esses dois conceitos de liberdade são totalmente discerníveis na prática?
Introdução
Devemos defender a liberdade econômica porque ela gera mais riquezas ou porque ela é um fim em si mesmo?
Muitas vezes, a defesa do sistema capitalista apela para a sua maior eficiência na alocação dos recursos. Mas, supondo um planejamento central perfeitamente eficiente, ainda assim não seria mais desejável viver em uma sociedade com maior liberdade econômica?
Introdução
“As liberdades substantivas estão entre os componentes constitutivos do desenvolvimento. Sua relevância para o desenvolvimento não tem de ser estabelecida a posteriori, com base em sua contribuição indireta para o crescimento do PNB ou para a promoção da industrialização”.
Essas liberdades e direitos também contribuem para o progresso econômico, mas não é por isso que elas devem ser defendidas. 
Introdução
No exemplo citado na página 19, Amartya Sen diz que um negro americano tem expectativa de vida menor que um cidadão médio de países mais pobres. Para o propósito do capítulo, que é mostrar a necessidade de se transcender a mera análise do nível de riqueza, é válido. Mas, para ser coerente com o resto da análise, não é superficial tratar “viver mais” como o objetivo final? Até que ponte esses indivíduos nessas sociedades desfrutam efetivamente maiores liberdades? 
Em outras palavras, ele expande a análise, mas nesse trecho, comprime em viver mais, o que é uma limitação maior ainda do que observar o crescimento do produto tão somente. 
Introdução
Nos modelos vistos até o momento, há diferença entre o trabalhador que gera 10 unidades de produto sob um regime de servidão ou sobre um sistema de livre contrato? É possível que, mesmo sendo menos produtivo, ele esteja em uma sociedade mais desenvolvida?
Na prática, há associação entre liberdade e maior produtividade. Porém, novamente, isso não deve fazer com que a liberdade seja defendida por ser mais produtiva, mas sim por ser desejável em si mesma e por ser um aspecto constitutivo do desenvolvimento.
Introdução
Nessa nova visão, a liberdade econômica não é menosprezada. Muito pelo contrário, está entre as liberdades substanciais e é também uma liberdade instrumental relevante. Sen destaca, porém, que ela é uma das liberdades essenciais no processo de desenvolvimento. 
Considerando essa nova ótica, qual é o papel do desenvolvimento moral e cultural de uma sociedade? Pode-se dizer que o Brasil é um país moralmente e culturalmente desenvolvido?
Introdução
“Os valores prevalecentes e os costumes sociais também respondem pela presença ou ausência de corrupção e pelo papel da confiança nas relações econômicas, sociais ou políticas”.
Baseado nesse trecho, pode-se dizer que atual crise política do Brasil possui um impacto negativo sobre a sociedade que transcende os prejuízos econômicos?
Introdução
Resumidamente:
Apresenta liberdade como objetivo final do desenvolvimento econômico (liberdades substantivas). Na prática, isso implica tornar os indivíduos capacitados a serem agentes ativos em uma sociedade.
Para isso, há um conjunto de liberdades instrumentais que possuem relação empiricamente atestadas com essas liberdades substantivas.
Pergunta-se:
Sendo o objetivo tornar as pessoas aptas a atuarem na sociedade, pode-se dizer que a educação possui um papel central no desenvolvimento econômico? O que é a educação? 
Digressão sobre a educação
1) muitas vezes, os números podem mentir sobre a educação
No Uzbequistão, crianças são colocadas para colher algodão no momento em que “oficialmente” estão estudando. 
Digressão sobre educação
2) estar em sala de aula não significa estar estudando (com qualidade)
Digressão sobre educação
2) Alguns números sobre o Brasil:
Último ranking divulgado pelo PISA (http://www.oecd.org/pisa), conquistou as seguintes colocações entre 70 países:
63º lugar em ciências
59º lugar em leitura
66º lugar em matemática
Outros resultados que ajudam a compor o quadro do desempenho da educação brasileira:
Ranking Pearson – 38º lugar entre 40 países
Ranking Fórum Econômico Mundial/Capital Humano – 83º lugar entre 130 países
Ranking EF/Proficiência em Inglês – 40º lugar entre 72 países
Ranking IMD/Geração e Retenção de Talentos – 57º lugar entre 61 países
Ranking S&P/Educação Financeira – 74º lugar entre 144 países
Digressão sobre educação
3) quando se reconhece importância da educação, geralmente se diz na sequência “temos que investir mais”. Será este mesmo o problema?
Em termos de investimento por aluno, porém, investimentos não são tão altos assim. No entanto, no meu ponto de vista, investir mais não gerará necessariamente melhores resultados (ex: Place du Maître Albert, Sócrates...)
Se não é só investimento, qual é o problema?
Questões
Quais são as principais diferenças entre esta abordagem apresentada por Amartya Sen e a abordagem neoclássica, tal qual a vista no modelo
de Solow? 
Nesta nova abordagem, o acúmulo de riqueza é o objetivo final ou é um dos meios, ainda que um dos mais importantes, no processo de desenvolvimento?
Qual é o papel da educação em cada uma das abordagens? Sob qual ponto de vista a educação serve somente como mero instrumento para o ganho produtivo? Qual é a diferença para a educação como um instrumento de promoção da liberdade?
1. A perspectiva da liberdade
A perspectiva da liberdade
Este capítulo apresenta as noções básicas que fundamentam a análise empreendida pelo autor (segue apresentação dos prolegômenos). Por isso, de certa maneira, repete um pouco do que já foi discutido na introdução.
Considerando a distinção entre liberdade substantiva e liberdade instrumental, a ênfase aqui é dada à liberdade substantiva. 
A perspectiva da liberdade
“A riqueza evidentemente não é o bem que estamos buscando, sendo ela meramente útil e em proveito de alguma coisa” (Aristóteles)
“De que me serve isso [a riqueza], se não me torna imortal” (Maitreyee)
Embora haja uma relação entre opulência e realizações, ela pode ser ou não muito acentuada, e pode muito bem depender demais de outras circunstâncias. 
A perspectiva da liberdade
A riqueza não é desejável em si mesma, mas sim porque ela é um meio para termos mais liberdade para levar o tipo de vida que temos razão para valorizar.
Essa relação [entre riqueza e liberdade] não é exclusiva, nem uniforme.
Não é exclusiva porque existem outras influências significativas em nossas vidas além da riqueza;
Não é uniforme porque o impacto da riqueza em nossas vidas varia de acordo com essas outras influências [e até mesmo de acordo com o nível de riqueza do qual já desfrutamos].
A perspectiva da liberdade
Devemos então mudar nosso foco de atenção das riquezas para as liberdades, ou, ainda mais especificamente, para as privações das liberdades. 
As privações das liberdades representam a falta de acesso por parte dos indivíduos às condições necessárias para que ele se desenvolva como um agente livre de uma sociedade. 
Formas de privação da liberdade
Fomes coletivas ou subnutrição;
Falta de acesso a serviços de saúde, saneamento básico ou água tratada;
Negação de direitos políticos e civis básicos. Este último exemplo parece menos relevante que os anteriores, mas Amartya Sen atenta para o fato de que nunca houve nenhuma fome coletiva em regimes efetivamente democráticos.
Dois papéis da liberdade
Avaliação e eficácia: A liberdade é importante por si mesma para a liberdade global da pessoa (avaliação), e também porque favorece a oportunidade de a pessoa ter resultados valiosos (eficácia). 
Dois papéis da liberdade
As liberdades dos indivíduos são consideradas os elementos constitutivos básicos, ou seja, expandem as “capacidades” das pessoas de levar a vida que valorizam. 
“Essas capacidades podem ser aumentadas pela política pública, mas também, por outro lado, a direção da política pública pode ser influenciada pelo uso efetivo das capacidades participativas do povo. Essa relação de mão dupla é central na análise aqui apresentada.” 
Sistemas avaliatórios: rendas e capacidades
No aspecto avaliatório, a abordagem concentra-se em uma base factual, que a diferencia da seguintes abordagens:
Econômica: riqueza e renda;
Utilitarista: satisfação mental;
Libertária: procedimentos para a liberdade (desconsiderando as consequências acarretadas por estes procedimentos).
Tais aspectos devem ser integrados a um quadro mais amplo e completo de êxito e privação.
A questão do desemprego
Um exemplo de como a visão mais ampla pode afetar nossa avaliação sobre o desenvolvimento de uma sociedade é a questão do desemprego. 
Nos estados de bem-estar social, o problema do desemprego é atenuado pela seguridade social. Assim, indivíduo recebe uma renda que o auxilia até que encontre um novo emprego. 
Porém, os efeitos do desemprego vão além da renda, pois ele contribui para a “exclusão social” de alguns grupos e acarreta perda de autonomia, de autoconfiança e de saúde física e psicológica. 
Relação desta abordagem com a tradição econômica
Essa abordagem difere da economia contemporânea que tende a concentrar sua análise na renda. 
Porém, ao vermos a tradição de estudos econômicos do passado, notamos que a origem da economia foi significantemente motivada pela necessidade de estudar a avaliação das oportunidades que as pessoas têm para levar uma vida boa e as influências causais sobre essas oportunidades. 
William Petty, por exemplo, pai das contas nacionais, tinha como objetivo avaliar a condição de vida das pessoas. 
Mercados e liberdades
Há dois motivos para defendermos a economia de mercado:
(1) A negação de oportunidades de transação, por meio de controles arbitrários, pode ser, em si, uma fonte de privação de liberdade.
(2) Os mercados expandam a renda, a riqueza e a oportunidade das pessoas. 
Sempre que há uma restrição a alguma transação, há alguma perda social. Há casos, porém, em que esta perda é justificada pelo prejuízo que as transações podem acarretar a terceiros. 
Mercados e liberdades
A disciplina da economia tendeu a afastar-se do enfoque sobre o valor das liberdades em favor dos valores das utilidades, das rendas e das riquezas.
Conforme vimos anteriormente, caso de uma economia planejada centralmente pudesse gerar as mesmas riquezas que uma economia de livre mercado, ainda assim haveria prejuízos no que se refere a ação livre de cada indivíduo. Por que isto é relevante?
Resultados de culminância: foco apenas nos resultados finais
Resultados abrangentes: considera também o processo. 
“O mérito do sistema de mercado não reside apenas em sua capacidade de gerar resultados de culminância mais eficientes”.
Questão
A presença simultânea de mão de obra adscritícia e endividamento acarreta uma forma de privação de liberdade em muitas agriculturas pré-capitalista. Trata-se de um sistema que feria gravemente a liberdade dos indivíduos e que, além disso, apresentava baixa produtividade. Para sistemas avaliatórios abrangentes, é correto defender o fim deste sistema de trabalho tão somente porque ele apresenta uma produtividade inferior? Como este exemplo diferencia sistemas avaliatórios de resultados abrangentes de sistemas avaliatórios de resultados de culminância?
Mercados e liberdades
Robert Fogel e Stanley Engerman, em Time on the cross: the economics of American Negro slavery apresenta dados que revelam que as cestas de mercadorias consumidas pelos escravos eram comparativamente superiores às rendas dos trabalhadores agrícolas livres. 
Para os sistemas avaliatórios concentrados apenas nos resultados de culminância (ou seja, do ponto de vista estritamente focado na riqueza), havia motivos para os escravos tentarem fugir das propriedades em que viviam?
Mercados e liberdades
“Os princípios liberais, ou de não interferência, dos economistas clássicos (smithianos ou ricardianos) não eram, em primeiro lugar, princípios econômicos; eram uma aplicação à economia de princípios considerados aplicáveis a um campo bem mais amplo. A afirmação de que a liberdade econômica conduz à eficiência econômica não passava de um esteio secundário. [...] O que realmente questiono é se temos justificativa para esquecer, tão completamente como a maioria de nós esqueceu, o outro lado do argumento.”
J. R. Hicks, Wealth and Wellfare, 1981. 
Mercados e liberdades
Essa transferência do argumento para o aspecto meramente econômico revela uma tendência de nos concentrarmos sempre em fatores de ordem econômico-social para defender as ideias publicamente, deixando a moral de lado. É correto hierarquizarmos as discussões dessa forma? É possível constatar em nossa sociedade a prevalência do enfoque econômico nas discussões? 
Tradição, cultura e democracia
Um tópico importante do desenvolvimento econômico é a sua relação com as tradições e heranças culturas de determinados povos. Existe um inescapável problema valorativo na decisão do que se deva escolher se e quando acontecer
de algumas partes da traição não puderem ser mantidas juntamente com mudanças econômicas e sociais que possam ser necessária por outras razões.
A resposta não é “devemos desenvolver economicamente o país e deixar isso de lado”, como defendem os apologistas do desenvolvimento, nem deve ser alçada da elite dos “guardiães” da tradição.
Tradição, cultura e democracia
Havendo indícios de conflito real entre a preservação da tradição e as vantagens da modernidade, é necessário uma resposta participativa. 
Como a participação requer conhecimentos e um grau de instrução básico, negar a oportunidade da educação escolar a qualquer grupo – por exemplo, às meninas – é contrário às condições fundamentais da liberdade participativa. 
Ao saber que há limitações deste tipo em determinadas regiões, é correto intervir? E no caso de abuso de força das autoridades públicas, com o uso de armas químicas, por exemplo? O que difere isso da imposição cultural de um povo em relação a outro?
Observações finais
Ponto positivo da avaliação tradicional (de resultados de culminância) é que ela facilita a comparação dos países.
Porém, isto não é necessariamente algo negativo para uma abordagem avaliatória mais abrangente. Primeiro porque ordenar os países não é o objetivo dessa abordagem; segundo, porque o próprio questionamento dos critérios podem conduzir a importantes discussões públicas. 
2. Os fins e os meios do desenvolvimento
Os papéis constitutivo e instrumental da liberdade
A expansão da liberdade é considerada (1) o fim primordial e (2) o principal meio do desenvolvimento. Respectivamente, papel constitutivo e papel instrumental. 
O papel constitutivo foi mais discutido no primeiro capítulo. Agora, no segundo, será tratado o papel instrumental.
O papel instrumental da liberdade
O papel instrumental da liberdade concerne ao modo como diferentes tipos de direitos, oportunidades e “intitulamentos”* contribuem para a expansão da liberdade humana em geral e, assim, para a promoção do desenvolvimento. 
*O “Intitulamento” de uma pessoa é representado pelo conjunto de pacotes alternativos de bens que podem ser adquiridos mediante o uso dos vários canais legais de aquisição facultados a essa pessoa. Uma pessoa que passa fome, por exemplo, não possui nenhum acesso a nenhum pacote de bens que contenha uma quantidade adequada de alimentos. 
O papel instrumental da liberdade
A eficácia da liberdade como instrumento reside no fato de que diferentes tipos de liberdade apresentam inter-relação entre si. As liberdades estão ligadas por relações empíricas. 
São diversas, mas podem ser resumidas em cinco:
Liberdade política;
Facilidades econômicas;
Oportunidades sociais;
Garantias de transparência;
Segurança protetora.
O papel instrumental da liberdade
Liberdade política
Refere-se às oportunidades que as pessoas têm para determinar quem deve governar e com base em que princípios, além de incluir a possibilidade de fiscalizar e criticar as autoridades, de ter liberdade de expressão política e uma imprensa sem censura, de ter a liberdade de escolher entre diferentes partidos políticos...
O papel instrumental da liberdade
Facilidades econômicas
São as oportunidades que os indivíduos têm para utilizar recursos econômicos com propósitos de consumo, produção ou troca. São os “intitulamentos” econômicos. 
Está diretamente associada com a riqueza, mas, em adição às considerações agregativas, deve-se levar em conta as considerações distributivas. 
Não se trata somente da riqueza materialmente produzida, mas do amplo acesso a ela. A disponibilidade de financiamento, por exemplo, possui um papel importante aqui. Daqui a importância do microcrédito, por exemplo, conceito criado e amplamente difundido pelo economista Muhammad Yunus.
O papel instrumental da liberdade
Oportunidades sociais
São as disposições que a sociedade estabelece nas áreas de educação, saúde etc., as quais influenciam a liberdade substantiva de o indivíduo viver melhor. 
São importantes não só para a condução da vida privada, mas também para uma participação mais efetiva em atividades econômicas e políticas. 
Amartya Sem cita como o analfabetismo pode ser prejudicial socialmente. Exemplo disso é o alto grau de analfabetismo no Brasil no final do século XIX. Fim da escravidão deixou diversas pessoas a mercê da própria sorte sem condições de participação efetiva na sociedade. Com proclamação da república, muitos dos ideias de participação popular foram incorporados, mas pouco foi feito para modificar esse cenário. E atualmente, o analfabetismo foi resolvido? E o que dizer sobre o analfabetismo funcional?
O papel instrumental da liberdade
Garantias de transparência
Referem-se às necessidades de sinceridade que as pessoas podem esperar: a liberdade de ligar uns com os outros sob a garantia de dessegredo e clareza. Essas garantias têm um claro papel instrumental como inibidores da corrupção, da irresponsabilidade financeira e de transações ilícitas. 
O papel instrumental da liberdade
Segurança protetora
É necessária para proporcionar uma rede de segurança social, impedindo que a população afetada seja reduzida à miséria abjeta e, em alguns casos, até mesmo à fome e à morte. 
Pode ser feita por meio de suplementos de renda regulares, por exemplo. Exemplo disso é o programa bolsa família e o projeto de renda mínima. 
Inter-relações e complementaridade
Essas liberdades instrumentais aumentam diretamente as capacidades das pessoas, mas também suplementam-se mutuamente e podem, além disso, reforçar umas às outras. 
O crescimento econômico, por exemplo, pode ajudar não só elevando rendas privadas, mas também possibilitando ao Estado financiar a seguridade social (relação entre “facilidades econômicas” e “segurança protetora”). 
Inter-relações e complementaridade
Outro exemplo é a relação entre crescimento econômico e educação básica (“facilidades econômicas” e “oportunidades sociais”). 
O que é causa de quê? Caso as facilidades econômicas proporcionem oportunidades sociais, sem que o inverso também ocorra de maneira relevante, talvez poderíamos voltar a defender uma abordagem centrada no acumulo de riquezas. Porém, a experiência mostra um importante papel das oportunidades sociais no desenvolvimento econômico. 
Inter-relações e complementaridade
No êxito econômico alcançado pelas economias do Leste Asiático, com destaque para o Japão, foi precedido por expansão em massa da educação e, mais tarde, também dos serviços da saúde. Amartya Sen destaca que isso foi feito muito antes de que fossem rompidos os grilhões da pobreza generalizada nesses países (no caso do Japão, na era Meiji, entre 1868 e 1911).
Inter-relações e complementaridade
Outro exemplo é o contraste entre Índia e China. A comparação entre os países mostra como um nível mais elevado de oportunidades sociais pode fazer com que os efeitos positivos de uma economia de mercado sejam muito maiores:
Quando a China adotou a orientação para o mercado em 1979, ela já contava com um povo altamente alfabetizado;
Em contraste, a Índia possuía uma população adulta semianalfabeta quando adotou a orientação para o mercado em 1991, tendo um desempenho econômico muito aquém do obtido pela China. 
Inter-relações e complementaridade
Além disso, as condições de saúde na China também eram muito melhores do que as encontradas na Índia devido ao compromisso social do regime pré-reforma. 
Isso nos indica que o mercado não faz todo o trabalho sozinho.
Inter-relações e complementaridade
Podemos relacionar esse aspecto observado por Amartya Sen com o que já vimos sobre os modelos neoclássicos de crescimento:
No modelo de Solow, como se dá o crescimento?
Por acumulação de capital.
E o que representa o acumulo de capital?
Ele representa a produção por meio de uma nova tecnologia mais produtiva.
E como isso se relaciona com melhores oportunidades sociais?
Quanto mais educada e saudável for uma população, melhor uso ela vai conseguir fazer da tecnologia incorporada. Ou seja,
o capital acumulado vai ser mais bem utilizado. Naturalmente não podemos ver essa relação algebricamente no modelo trabalhado, mas podemos considerar estes fatores como complementares à análise feita por Solow. Dito de outro modo: pessoas mais educadas e saudáveis poderão fazer melhor uso dos benefícios do mercado. 
Disposições sociais mediadas pelo crescimento
Estatísticas apontam para uma associação direta entre renda per capita e longevidade. 
No entanto, resta investigar como se dá essa relação. Um estudo feito por Sudhir Anand e Martin Ravallion mostra que o impacto da renda per capita na longevidade se dá por dois meios: 
1- a renda dos mais pobres;
2- gastos públicos com serviços de saúde. 
Quando se incorpora essas duas variáveis, o efeito explicativo da renda per capita deixa de ser significativo. 
Disposições sociais mediadas pelo crescimento
Ou seja, o impacto do crescimento econômico depende de como os seus frutos são aproveitados. Isso fica claro na comparação entre o crescimento observado no Leste Asiático e o crescimento observado em países como o Brasil, Paquistão e Índia
No Leste asiático, o crescimento econômico foi acompanhado por aumento de longevidade, com redução da mortalidade e aumento da expectativa de vida mais preponderantes do que no caso dos demais países citados. 
Disposições sociais mediadas pelo crescimento
Podemos resumir a relação entre crescimento econômico e qualidade de vida da seguinte maneira:
Em economias de crescimento econômico elevado, há contraste entre:
Casos com grande êxito no aumento da duração e qualidade de vida (como Coreia do Sul e Taiwan), e
Casos sem êxito comparável nesses outros campos (como o Brasil).
Em economias com grande êxito no aumento da qualidade de vida, há contraste entre:
Casos com grande êxito em termos de elevado crescimento econômico (como Coreia do Sul e Taiwan), e
Casos sem êxito na obtenção de elevado crescimento econômico (como Sri Lanka, China pré-reforma, o Estado indiano de Kerala). 
Disposições sociais mediadas pelo crescimento
O fato de haver crescimento econômico sem melhorias na qualidade de vida das pessoas pode ser facilmente compreendido. Mas como se dá a melhoria na qualidade de vida das pessoas com pouca disponibilidade de recursos?
Custeio público: ocorre por meio de um programa de hábil manutenção social dos serviços de saúde, educação e outras disposições sociais relevantes. Naturalmente, esse tipo de serviço é mais sustentado na medida em que há também crescimento econômico. Mas o que Amartya Sen procura destacar aqui é que não há uma dependência do crescimento econômico. 
Provisão pública, rendas baixas e custos relativos
Como é possível oferecer serviços públicas de saúde e educação básica com baixa renda?
Tais serviços são altamente trabalho-intensivos e, portanto, relativamente baratos nas economias pobres, onde os salários são baixos. 
Muitos serviços de saúde são muito onerosos, mas o mais básicos não, e estes podem apresentar um grande efeito sobre a mortalidade. 
Por isso, é possível haver melhorias na qualidade de vida da população por meio do custeio público, como os exemplos citados anteriormente atestam. Não é preciso esperar um país prosperar para investir em educação básica e saúde (e, além disso, quando o crescimento ocorrer, com bons níveis de educação básica e de saúde ele apresentará maior magnitude). 
Redução da mortalidade na Grã-Bretanha no século XX
Amartya Sen mostra ainda que essa certa dissociação entre crescimento econômico e melhoria na qualidade de vida também pode ser observada em países ricos. 
No caso da Grã-Bretanha, as décadas de rápida expansão da expectativa de vida foram períodos de crescimento lento do PIB per capita.
Observações finais
O processo de desenvolvimento é crucialmente influenciado pelas inter-relações entre as liberdades instrumentais. Por isso, há a necessidade de desenvolver e sustentar uma pluralidade de instituições, como sistemas democráticos, mecanismos legais, estruturas de mercado, provisão de serviços de educação e saúde, facilidades para a mídia e outros tipos de comunicação, etc. 
Observações finais
A respeito dos meios de comunicação, qual é o papel da internet no exercício dos direitos civis?
Tocqueville, pensador político do século XIX, ao analisar a democracia norte-americana, destacou a necessidade de uma mediação entre indivíduo e poder central. Isso se dá de duas formas:
Liberdade de imprensa;
Associações politicamente influentes.
Ou seja, para o funcionamento de uma democracia, indivíduo deve receber informações corretas e ter a capacidade de agir efetivamente. Na medida em que auxilia a difusão de informações, pode-se dizer que a internet possui papel positivo sobre o processo de desenvolvimento econômico. 
3. Liberdade e os fundamentos da justiça
Introdução
O objetivo desse capítulo é apresentar as principais maneiras de se fazer juízos avaliatórios de uma sociedade em termos de desenvolvimento. 
Para isso, enfatiza as bases informacionais consideradas por cada uma delas. 
O que é base informacional?
Introdução
Uma parábola: Annapurna quer que alguém arrume o jardim de sua casa. Ela possui três opções para realizar o serviço, as quais apresentam o mesmo preço e a mesma qualidade de serviço. 
Dinu: embora os três sejam pobres, Dinu é o mais pobre; logo, escolhendo-o ela estaria auxiliando o mais necessitado;
Bishanno: empobreceu faz menos tempo e, por isso, está psicologicamente mais abalado; por isso, ao escolhe-lo estaria proporcionando maior grau de felicidade e satisfação possível;
Rogini: possui uma doença crônica e poderia usar o dinheiro para se livrar de sua moléstia; assim, escolhendo-o estaria proporcionando o máximo de qualidade de vida possível e aumentando a longevidade. 
Introdução
Uma parábola: Caso Annapurna não soubesse sobre a infelicidade de Bishano e da doença de Rogini, ela escolheria Dinu. Caso ela levasse em conta tão somente a depressão de Rogini, ela o escolheria. Caso desconsiderasse os demais fatores e pensasse somente no problema de saúde enfrentado por Rogini, ela o escolheria. 
Esta parábola nos mostra a importância da base informacional considerava para avaliar a questão. Annapurna está ciente de todas as informações e, por isso, deve refletir sobre qual base informacional utilizar. 
Introdução
Essa parábola nos ilustra que as diferenças nos princípios envolvidos na avaliação se relacionam às informações específicas que são consideradas decisivas. 
Por isso, para refletir sobre os juízos avaliatórios sobre o desenvolvimento das sociedades, Amartya Sen irá enfatizar neste capítulo a discussão sobre a base informacional que deve ser considerada. 
Introdução
Na parábola, ela deve considerar:
Renda e pobreza?
Prazer e Felicidade?
Qualidade de vida?
Os dois primeiros itens são os mais comumente considerados nas teorias de ética e de justiça social tradicionais. O terceiro é menos, e incluí-lo no debate dos juízos avaliatórios é a proposta que Amartya Sen apresenta neste capítulo.
Informações incluídas e excluídas
Podemos inferir da parábola que base informacional é o conjunto de informações necessárias para formas juízos.
Para Amartya Sen, os méritos e as limitações de cada abordagem podem em muito ser compreendidos examinando-se o alcance e os limites de sua base informacional. 
Informações incluídas e excluídas
Serão examinados:
O utilitarismo;
A teoria de John Rawls; 
O libertarismo.
A partir dos méritos e deméritos apresentados em cada uma das correntes, Amartya Sen irá apresentar sua contribuição, que ele chama de “abordagem da capacidade”. 
A utilidade como base informacional 
A base informacional do utilitarismo tradicional é o somatório das utilidades dos estados de coisas. 
Trata-se de focar no bem-estar de uma pessoa, sendo o bem-estar uma característica essencialmente mental, ou seja, o prazer ou felicidade gerada.
A utilidade como base informacional 
Naturalmente, comparações interpessoais de felicidade
não podem ser feitas com muita precisão. Ainda assim, tem sido a teoria ética dominante. 
Seu fundador, Jeremy Bentham, foi sucedido por importantes economistas, como:
John Stuart Mill;
William Stanley Jevons; 
Francis Edgeworth; 
Alfred Marshall; e 
A. C. Pigou.
A utilidade como base informacional 
Os requisitos para a avaliação utilitarista podem ser divididos em três componentes:
Consequencialismo: todas as escolhas (de ações, regras, instituições, etc.) devem ser julgadas por suas consequências;
“Welfarismo”: deve-se considerar a utilidade de um estado específico;
“Ranking pela soma”: as utilidades de diferentes pessoas devem ser somadas conjuntamente para se obter seu mérito agregado. 
Os três componentes juntos fornecem a fórmula utilitarista clássica de julgar cada escolha a partir da soma total de utilidades geradas por meio dessa escolha.
A utilidade como base informacional 
Assim sendo, injustiça, sob essa ótica, seria uma perda agregada de utilidade em comparação com o que poderia ter sido obtido. 
Como felicidade ou desejo não são fáceis de medir, frequentemente se define utilidade na análise econômica moderna como alguma representação numérica das escolhas observáveis de uma pessoa. 
A utilidade como base informacional 
Pode parecer muito abstrato, mas não é. Há uma série de modelos econométricos que buscam avaliar políticas públicas, por exemplo, em termos de bem-estar social máximo alcançado por meio da decisão. 
O que se faz, em geral, é considerar algo como a utilidade implícita nas escolhas feitas pelos indivíduos:
“Se uma pessoa escolhe uma alternativa x de preferência a uma outra, y, então, e só então, essa pessoa obtém mais utilidade de x do que de y. A ‘graduação em escala’ das utilidades tem de obedecer a essa regra, entre outras, e, nessa estrutura, afirmar que uma pessoa obtém mais utilidade de x do que de y não é substantivamente diferente de dizer que ela escolheria x dada a escolha entre os dois.”
A utilidade como base informacional 
Méritos da abordagem utilitarista
Importância de levar em consideração os resultados das disposições sociais ao julgá-las. A mudança de foco das características específicas dos objetos de análise para suas consequências pode facilitar a avaliação (ex: direito de propriedade). 
Necessidade de atentar para o bem-estar das pessoas envolvidas ao julgar as disposições sociais e seus resultados. Ainda que haja controvérsias sobre maneira de medir o bem-estar, atentar-se para ele é de fato relevante.
A utilidade como base informacional 
Limitações da perspectiva utilitarista:
Indiferença distributiva: usualmente, o interesse está centrado na agregação das medidas de utilidade, mas não na sua distribuição;
Descaso com os direitos, liberdades e outras considerações desvinculadas da utilidade: tais aspectos são considerados somente de maneira indireta, isto é, na medida em que afetam a utilidade. Isto é uma limitação porque tais fatores podem ser importantes em si mesmos, ainda que não afetem a utilidade;
Adaptação e condicionamento mental: isto e uma limitação em especial para a comparação interpessoal. Os destituídos tendem a conformar-se com sua privação pela pura necessidade de sobrevivência e podem, em consequência, não ter coragem de exigir mudança. Ou seja, a medida mental do prazer ou do desejo é maleável demais para constituir-se em um guia confiável para a privação e a desvantagem. 
John Rawls e a prioridade da liberdade formal
Determinadas classes de direitos têm precedência política sobre a promoção de objetivos sociais, independentemente das consequências que delas possam advir. 
Nesse ponto, assemelha-se ao libertarismo (ou seja, no dever de haver precedência que determinados direitos). Difere, porém, pelo fato de os direitos que recebem precedência para John Rawls ser muito menos amplo, e constituirem essencialmente em várias liberdades formais pessoais, como alguns direitos políticos e civis básicos. 
John Rawls e a prioridade da liberdade formal
Faz bastante sentido, porém, por que o peso das necessidades econômicas intensas, que podem ser questões de vida ou morte, deveria ser inferior ao das liberdades formais pessoais?
Essa ressalva não equivale a dizer que a liberdade formal não deva ter prioridade, mas sim que a forma dessa exigência não deve ter o efeito de fazer com que as necessidades econômicas sejam facilmente desconsideradas. 
John Rawls reconheceu a força desse argumento e sugeriu modos de inseri-lo na estrutura de sua teoria da justiça. 
O libertarismo
Trata-se de uma visão semelhante a de John Rawls, porém ‘mais exigente’. Seu principal representante é Robert Nozick, e defende de maneira mais veemente um conjunto maior de liberdades formais invioláveis, não importando-se (ou importando-se menos) com as consequências que estas liberdades possam vir a ter.
A prioridade inflexível dos direitos libertários pode ser particularmente problemática. A importância de liberdades substantivas não pode ser descartada como justificativa da “prioridade da liberdade formal”. Até mesmo gigantescas fomes coletivas podem ocorrer sem que os direitos libertários de pessoa alguma sejam violados (Amartya Sen, Poverty and famines). 
Analogamente, privações de outros tipos (por exemplo, ausência de tratamento médico para doenças curáveis) podem coexistir com todos os direitos libertários (incluindo direitos de propriedade) sendo inteiramente respeitados.
O libertarismo
Ou seja, a proposta de uma teoria da prioridade política indecentemente das suas consequências é prejudicada por implicar uma considerável indiferença às liberdades substantivas que as pessoas acabam tendo ou não. 
Portanto, no que concerne à sua base informacional, o liberalismo como abordagem é demasiado limitado. Mesmo se for atribuído um peso especial à liberdade formal, é muito implausível afirmar que ela teria uma prioridade absoluta e inflexível como a que teorias libertárias insistem em lhe dar. Precisamos de uma base informacional mais ampla para a justiça. 
Utilidade, renda real e comparações interpessoais
Vimos que uma das principais limitações do utilitarismo é o subjetivismo. É possível superar essa limitação?
O mais comum, nos dias de hoje, é inferir sobre a utilidade, com aquilo que se chama Utilidade Revelada (pelas escolhas). 
Essa saída tomada para justificar as mensurações da utilidade, porém, não é suficiente para resolver o problema: 
Suponha duas pessoas com mesmos gostos e mesmas decisões, mas uma, por exemplo, obtém apenas um terço das satisfações que a outra pessoa obtém. Não é possível, assim, identificar a utilidade de ambas da mesma maneira, ainda que suas escolhas sejam iguais. 
Um exemplo: um indivíduo pobre com uma doença parasítica no estômago pode preferir dois quilos de arroz a um quilo, exatamente como outro indivíduo – igualmente pobre, mas não doente – poderia preferir, mas seria difícil demonstrar que ambos obteriam o mesmo benefício de, digamos, um quilo de arroz. 
Utilidade, renda real e comparações interpessoais
É possível tentar superar esta dificuldade por meio da análise da renda real, mas o mesmo problema permanece, pois a diversidade das preferências permanece oculta. 
Amartya Sen destaca cinco fatores que promovem variações entre rendas reais e vantagens obtidas:
Heterogeneidades pessoais (ex: pessoas doentes);
Diversidades ambientais (ex: necessidade de aquecimento);
Variações no clima social (ex: prevalência de crimes);
Diferenças de perspectivas relativas (ex: diferentes padrões de comportamento de diferentes grupos sociais);
Distribuição na família (ex: diferentes regras distribuidoras em diferentes famílias)..
Renda, recursos, liberdades
Ainda assim, a renda real pode nos dizer informações relevantes sobre o nível de desenvolvimento de um país, principalmente considerando-se o caso dos mais pobres. O que Amartya Sen destaca aqui, porém, é que este é um fato relevante para começar a análise, mas que a análise não deve terminar nesta etapa. 
Um
primeiro candidato para suplementar esta análise são os “bens primários” de John Ralws. Bens primários são meios de uso geral que ajudam qualquer pessoa a promover seus fins, como “direitos, liberdades e oportunidades, rendas e riqueza e as bases sociais do respeito próprio”.
Renda, recursos, liberdades
A mudança do enfoque das rendas para os bens primários é uma ampliação da base informacional, mas ela não é adequada para lidar com todas as variações relevantes da relação entre renda e recursos, de um lado, e bem-estar e liberdade, de outro. 
Notem que Amartya Sen está tentando criar uma ligação entre as medidas tradicionalmente utilizadas e aquelas que ele propõem. A questão principal aqui é como inferir das rendas (e de considerações suplementares) a capacidade real de um indivíduo obter aquilo que julga valioso. Naturalmente, isto não é nada fácil. 
Renda, recursos, liberdades
Uma alternativa ao enfoque sobre os meios para o bem viver é a concentração sobre como as pessoas conseguem viver de fato.
 Economistas ‘clássicos’, como William Petty, Gregory King, François Quesnay, entre outros, já tinham essa preocupação, de tal forma que isso não é uma novidade. A novidade aqui é tentar criar indicadores mais efetivos nesse sentido, com o enfoque sobre as liberdades geradas pelos bens, e não sobre os bens em si mesmos. 
Bem-estar, liberdade e capacidade
Dessa forma, a base informacional deve estar centrada nas liberdades substantivas, e não nas utilidades ou nos bens primários.
Para isso, é feita a distinção entre funcionamentos e capacidades. 
Funcionamentos: reflete as várias coisas que uma pessoa pode considerar valioso fazer ou ter.
Capacidade: combinações alternativas de funcionamentos cuja realização é factível para a pessoa (ou, menos formalmente, a liberdade de ter estilos de vida diversos). 
Bem-estar, liberdade e capacidade
Podemos então considerar um vetor de funcionamento, que é a representação numérica do grau de funcionamento usufruído por uma pessoa e também um “conjunto capacitário” que consiste nos vetores de funcionamento alternativos dentre os quais a pessoa pode escolher
Enquanto a combinação dos funcionamentos reflete as realizações efetivas, o conjunto capacitário representa a liberdade para realizar combinações alternativas de funcionamentos. 
Bem-estar, liberdade e capacidade
O enfoque da “abordagem da capacidade”, que é a proposta de Amartya Sen neste capítulo, pode ser dado aos funcionamento realizados ou ao conjunto capacitário. Ambas abordagens são possíveis e podem ser usadas conjuntamente. 
Qual a limitação de um enfoque total sobre o funcionamento realizado? Ou, de outra maneira, qual a contribuição do enfoque capacitário?
Escolher x quando não há alternativas é substancialmente diferente de escolher x quando há alternativas (diferença entre jejuar e passar fome).
Pesos, Valoração e Escolha Social
A vantagem de se considerar funcionamentos (ou capacidades) como alternativa à utilidade é que essa abordagem facilita a comparação interpessoal. 
Porém, há algumas dificuldades:
Quais funcionamentos devem ser considerados?
Qual a relação entre a liberdade substantiva (conjunto capacitário) e a realização real (vetor de funcionamento escolhido)?
Quais ponderações devem ser atribuídas às capacidades?
Pesos, Valoração e Escolha Social
John Rawls lida com isso por meio de um “índice” global de posse de bens primários. Porém, mais importante do que uma definição técnica, seria uma discussão acerca dos itens considerados fundamentais em uma sociedade, sendo essa a diferença entre a abordagem ‘tecnocrática’ e abordagem ‘democrática’ na definição dos índices.
Notem que a tentativa de partir da renda e considerar o uso efetivo que as pessoas podem fazer dela por meio da renda real utiliza os preços de mercado como fatores ponderadores. Porém, isso pode não refletir necessariamente a valoração dada pelas pessoas. Trata-se de uma confusão entre renda-real e bem-estar efetivamente experimentado pela pessoa. 
Pequeno resumo da parte negativa do capítulo
Até o momento, foram destacadas as limitações de se considerar:
A utilidade;
Liberdades formais; e
Renda real,
tendo sido destacado, essencialmente, que esses fatores não representam as liberdades substantivas efetivamente disponíveis para os indivíduos. 
Informações sobre capacidades: usos alternativos
Ficou claro a importância de se considerar as capacidades no juízo avaliatório, mas como fazê-lo?
As diversas dificuldades apresentadas por Amartya Sen podem fazer parecer que é algo muito difícil de ser implementado, mas ele propõe algumas alternativas factíveis.
Informações sobre capacidades: usos alternativos
1) Abordagem direta: consiste em examinar diretamente o que se pode dizer sobre as vantagens mediante o estudo e a comparação de vetores de funcionamentos e capacidades;
2) Abordagem suplementar: parte da comparação interpessoais no espaço da renda, mas suplementa com considerações sobre capacidades. 
3) Abordagem indireta: informações determinantes de capacidade, exceto a renda, podem ser usadas para calcular “rendas ajustadas”.
Exemplo: considerando o analfabetismo como uma limitação relevante na capacidade das pessoas, a primeira abordagem consistiria em avaliar o nível de analfabetismo das pessoas ou de uma região, a segunda abordagem iria avaliar a renda, mas ofereceria separadamente a informação sobre o analfabetismo e, por fim, a terceira abordagem consistiria na ponderação da renda por um indicativo do analfabetismo. 
Informações sobre capacidades: usos alternativos
A vantagem da abordagem indireta reside no fato de que a renda é um conceito familiar e frequentemente permite uma mensuração mais rigorosa. 
Porém, é preciso considerar como se dá a relação entre a limitação das capacidades e as rendas. Por exemplo, como uma transferência de renda poderia efetivamente modificar a desigualdade observada na renda ajustada?
Observações finais
Não há um “caminho das pedras” para resolver esses problemas dos juízos avaliatórios. O capítulo mostrou pontos positivos e negativos das principais teorias éticas e de justiça social, partindo deles para propor a inclusão de conceitos oriundos da “avaliação das capacidades”. 
Apesar das dificuldades em se fazer esta inclusão, este é um caminho que mostra-se muito frutífero e que contribui para o entendimento das limitações efetivamente vivenciadas pelos indivíduos.

Teste o Premium para desbloquear

Aproveite todos os benefícios por 3 dias sem pagar! 😉
Já tem cadastro?

Continue navegando