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Prolapso uretral em um cão: Relato de caso Urethral prolapse in a dog - Case report Fabiane Azeredo Atallah – Doutoranda em Ciência Animal pela Universidade Estadual do Norte Fluminense - RJ. Paulo Daniel Sant`Anna Leal – Pós-Graduando em Ciências Veterinárias pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro- UFRRJ. Tainara Ribeiro – Graduando(a) em Medicina Veteriária pela Universidade Estadual do Norte Fluminense - RJ. Oscar Fernando Tirado Estupiñan – Mestrando em Ciência Animal pela Universidade Estadual do Norte Fluminense - RJ. Saulo José Quina Silva – Graduando(a) em Medicina Veteriária pela Universidade Estadual do Norte Fluminense - RJ. André Lacerda De Abreu Oliveira – Professor Doutor Associado de Técnicas Cirúrgicas da Universidade Estadual do Norte Fluminense - RJ. Atallah FA, Leal PDS, Ribeiro T, Estupiñan OFT, Silva SJQ, Oliveira ALA. JBCV - Jornal Brasileiro de Cirurgia Veterinária; 2013; 2(4); 1-637. Resumo O prolapso uretral é caracterizado pela protusão da mucosa uretral distal, formando uma massa pequena de aspecto avermelhado se estendendo além do orifício peniano. O presente relato descreve o caso de um cão, Bulldogue Inglês, 9 anos de idade, castrado, atendido no Centro de Terapia Intensiva e Emergência Veterinária-Clínica 24 horas que se apresentou com sangramento intermitente na extremidade peniana, aumento de volume da mesma, lambedura da região, além de desconforto e inquietação. Frente ao qua- dro clínico e físico do animal, foi concluído o diagnóstico. Adotou-se o procedimento terapêutico cirúr- gico de ressecção e anastomose da porção uretral prolapsada. O tratamento cicrúrgico se mostrou eficaz, tendo o animal apresentado, após o decorrer de dez dias, ótima recuperação com completa cicatrização uretral. Palavras-chave: Prolapso uretral, cão, pênis, mucosa. Abstract The urethral prolapse is characterized by protrusion of the distal urethral mucosa, forming a small mass of reddish appearance extending beyond the orifice of the penis. This report describes the case of a dog, English Bulldog, 9 years old, neutered, treated at the Intensive Care Unit of small animals from Rio de Janeiro (RJ-CTI) who presented with intermittent bleeding at the end penile increase the same volume, licking the region, besides discomfort and restlessness. Faced with clinical and physi- cal animal, the diagnosis was completed. We adopted the procedure of therapeutic surgical resection and anastomosis portion of urethral prolapse. Cirúrgico the treatment was effective, and the animal presented after the course of ten days, great recovery with complete urethral healing. Keywords: Urethral prolapsed, dog, penis, mucosa. RELATO DE CASO 1 JBCV - Jornal Brasileiro de Cirurgia Veterinária 2013;2(4); 1-637. 2JBCV - Jornal Brasileiro de Cirurgia Veterinária (2013);2(4); 1-637. Prolapso uretral em um cão: Relato de caso Introdução Prolapso uretral é uma afecção incomum em cães, não possui existência de relatos em cadelas e caracteriza-se pela protusão da mucosa da uretra distal, com a formação de uma pequena massa de aspecto roxo-avermelhado que se estende além do orifício peniano (1). O conteúdo prolapsado pode apresentar ou não sangramento intermitente, co- mumente durante a excitação. A fisiopatologia dessa enfermidade em cães não está completa- mente elucidada, tem sido relacionada a infecções genito-urinárias, excitação excessiva e outros fato- res como predisposição genética, traumatismo ou presença de cálculos. Masturbação excessiva pode acontecer em machos não castrados independen- te da raça, predispondo a enfermidade em ques- tão (2). Em raças braquioceálicas se acredita que a manifestação do prolapso se deve a predisposição genética devido ao aumento da pressão intra-ab- dominal, secundária a obstrução crônica das vias aéreas superiores (3,4). Os sinais clínicos exibidos decorrem da lesão que distingue o prolapso, podendo a protrusão se apresentar edemaciada e/ou congesta, e/ou necrosada (2). Este quadro é comumente acompa- nhado por sangramento prepucial, desconforto, estrangúria, hematúria e lambedura excessiva da ponta do pênis, embora nem todos os sinais ocor- ram simultaneamente. O sangramento pode ser in- termitente e intensificado quando o animal se ex- cita, urina ou lambe a extremidade peniana (2,3,5). O diagnóstico do prolapso uretral canino pode- rá ser dado, além da observação dos sinais clínicos, a partir do exame físico durante o qual pode-se visualizar protrusão da mucosa por meio da ex- teriorização peniana do prepúcio, observando as- sim, uma massa arredondada vermelho brilhante a roxo escuro (4,5,6). Em exames laboratoriais po- dem ser encontrados presença de anemia do tipo regenerativa, comumente detectada em cães com sangramento crônico ou intermitente. A realização da urinálise também pode ser efetuada como meio de exclusão de possível infecção do trato urinário, sendo útil no estabelecimento do diagnóstico (5). Medidas paliativas podem diminuir o quadro clínico, como o uso de tranquilizantes e antibióti- cos, isolamento de fêmeas no estro e prevenção da exposição do animal a outros fatores que provo- cam excitação (7). Quando a mucosa uretral se mostra viável, a redução pode ser possível, sendo fundamentada na manipulação cautelosa da porção prolapsada, utilizando-se um cateter uretral lubrificado dire- tamente introduzido na luz do orifício uretral ex- terno, com o propósito de diminuir a protrusão. Com o cateter introduzido, procede-se a realização de sutura em bolsa de tabaco ao redor da protru- são, de forma que a luz uretral não seja obstruída e a micção possa ocorrer normalmente. Os fios de suturas são retirados após dez dias, e o paciente monitorado quanto a recidivas. Em caso de reci- diva, o tratamento cirúrgico quanto a técnica de ressecção e anastomose uretral apresenta-se como opção aconselhável (1,5). Em situações onde a re- gião protusa viável se apresente sob dimensões que impossibilitem a redução por manipulação da técnica sugerida anteriormente, pode-se eleger a técnica preconizada por Kirsch, Hauptman e Wal- shaw (3) que sugere a redução do prolapso através da uretropexia. Em casos de cães cujo o prolapso está associado à excitação sexual, é indicado a or- quiectomia bilateral do animal (1,8). Complicações pós-operatórias podem ocorrer em animais submetidos ao tratamento cirúrgico, sendo observados: edema na região manipulada; hemorragias associada com excitação ou micção, que podem persistir de três a quinze dias após o ato cirúrgico; auto-mutilação e possíveis recidivas com novas indicações cirúrgicas (9). Os procedimentos pós-cirúrgicos requerem terapia com antibióticos, analgésicos, anti-infla- matórios, tranquilizantes para a redução da exci- tação, gelo para evitar edema e hemorragia, colar elizabetano para previnir multilação e lambedura da ferida cirúrgica (10). O objetivo do trabalho foi relatar o caso de pro- lapso uretral em um cão macho, descrevendo uma técnica para tratamento cirúrgico eficaz, não asso- ciado a complicações significativas ou recorrência. Relato de Caso Foi atendido no Centro de Terapia Intensiva e Emergência Veterinária-Clínica 24 horas um cão ma- cho da raça Bulldog Inglês, de 9 anos de idade, cas- trado, diagnosticado com prolapso uretral, após a realização de exame clínico e físico, associado junto a 3 JBCV - Jornal Brasileiro de Cirurgia Veterinária (2013);2(4); 1-637. Prolapso uretral em um cão: Relato de caso exposição peniana. O paciente apresentava como queixa principal sangramento intermitente na extremidade peniana, lambedura da região, desconforto e inquietação. Ao exame clínico, evidenciou presença de aumento de volume na extremidade peniana, de contorno regular, em forma de uma pequena cereja de coloração aver- melhada (Figura 1). Tratava-sede volume não redu- tível à manipulação. Hemorragia local intermitente foi observada durante a realização do exame clínico e manipulação do animal. De acordo com a proprietá- ria, o animal manifestava comportamento sexual exa- cerbado, apesar de ser orquiectomizado. Foi realizado hemograma, urinálise com cultura e antibiograma, perfis renal e hepático as quais estavam dentro dos va- lores de normalidade, o resultado da análise urinária sugeria infecção das vias urinárias (cistite), foi coleta- do urina por cistocentese com auxílio do ultrassom e enviado para cultura e antibiograma, tendo sido ob- servado o crescimento de Staphylococcus epidermidis, sensível a cevovecina. co ampola contendo 20 mL-Vetnil Ind. e Com. de Pro- dutos Veterinários Ltda-Louveira - São Paulo - Brasil) por via intramuscular, indução anestésica com propo- fol (Fresofol 1%, ampola de 20 mL-10mg/mL - Frese- nius Kabi Brasil Ltda, Campinas - SP) a 4mg/kg por via intravenosa, para permitir a intubação orotraque- al realizada com sonda endotraqueal com balonete, sendo imediatamente acoplada ao aparelho de aneste- sia inalatória (Sistema de Anestesia 1000-Oxigel-Vila Mascote-São Paulo – SP). Manutenção da anestesia espontânea com isoflurano (Isothane - Baxter Labora- tório do Brasil Ltda-São Paulo-Brasil) na concentração de 1,6%, o que corresponde aproximadamente a 1,0 de concentração alveolar mínima (CAM) em fluxo de oxigênio a 100%. Após o posicionamento do animal em decúbito dorsal, o pênis foi exposto e realizou-se a antissepsia cirúrgica com clorexidine dergemante a 2%. Para me- lhor visualização, inseriu-se na luz da uretra um ca- teter estéril número oito, adequadamente lubrificado a base de água ( K-Y® Gel). Seguiu-se incisando em 180º pela circunferência uretral, mais próximo possí- vel da extremidade do pênis, na base da mucosa pro- tusa e confeccionou-se um ponto simples separado da uretra à túnica do pênis com fio não absorvível mono- filamentar nylon 4 – 0 (Figura 2). Por fim, completou- -se a incisão em 360º, removeu-se a porção restante do tecido protuso e a síntese anastomótica foi completa- da a partir do emprego de suturas em padrão simples interrompido, mantendo um intervalo de um a dois milímetros entre os pontos. Ao final do procedimento o pênis foi reposicionado no prepúcio. Figura 1 - Mucosa uretral prolapsada Frente ao quadro clínico apresentado pelo animal e informações pregressas conferida no histórico clíni- co do mesmo, adotou-se o procedimento terapêutico cirúrgico de ressecção e anastomose da porção uretral prolapsada. Como medidas pré-cirúrgicas o pacien- te foi medicado com cevovecina/convenia® na dose de 0,1mg/kg por via subcutânea e como medicação pré-anestésica, sulfato de morfina 0,5 mg/kg (Dimorf 10mg/mL ampola 1mL–Cristália-Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda - Itapira-São Paulo-Brasil) asso- ciado a acepromazina 0,01mg/kg (acepran 0,2%-Fras- Figura 2 - Suturas em padrão simples interrompido da mucosa uretral. 4JBCV - Jornal Brasileiro de Cirurgia Veterinária (2013);2(4); 1-637. Prolapso uretral em um cão: Relato de caso O animal permaneceu internado durante as pri- meiras 48 horas, período o qual apresentou sangra- mento associado com a micção. Foi administrado, por via oral, ácido tranexâmico 250mg na dose de 25mg/ kg em 12-12h, total de três aplicações. No pós-operatório foi prescrito rifamicina sódica tópica (Rifocina Spray - Sanofi-Aventis Farmacêutica Ltda) no local da ferida cirúrgica. O proprietário foi orientado a deixar o animal em repouso, aplicação de calor frio (gelo) na ferida cirúrgica nas primeiras 48 horas. Os pontos foram retirados 10 dias após o pro- cedimento e, até o momento, o animal não apresentou recidiva. Discussão Comumente é diagnosticado prolapso uretral em cães da raça Bulldogue Inglês, pelo fato des- sas raças braquicefálicas possuírem as vias aéreas superiores parcialmente obstruídas. Causam du- rante respiração forçada um aumento da pressão intrabdominal o que prejudica o retorno venoso através das veias penianas, proporcionando a uretra de prolapsar (3,4). O que não foi observado neste estudo mesmo o animal sendo um Bulldog inglês. Relatou-se a masturbação excessiva como queixa principal e que junto ao exame clínico re- alizado, levou a causa principal da doença (2). A masturbação excessiva pode acometer machos não castrados independente da raça, predispon- do a ocorrência do prolapso (2); indo de encon- tro com o trabalho apresentado, em que o animal atendido na clínica era um macho, de 9 anos e que havia sido submetido a castração com um ano de idade. Apesar de outros comportamentos normal- mente não serem afetados, ao se realizar a remo- ção dos testículos, acompanhada pela retirada dos epidídimos e parte dos cordões espermáticos, ou seja, a orquiectomia propriamente dita, haverá subsequente redução na produção de testosterona circulante, correlacionada com a diminuição da libido e de comportamentos sexuais masculinos (11). Neste trabalho, observou-se que o animal cuja castração já havia sido realizada há quatro anos, não manifestou a diminuição nem mesmo a eliminação da libido. Corroborando com Liziane (1), como não foi observado nenhuma anormalidade genito-uriná- ria intermitente a predisposição genética associa- da à excitação sexual e masturbação excessiva do animal, interviram como fatores desencadeantes do prolapso. A técnica realizada foi a mesma proposta pela literatura, técnica de ressecção e anastomose ure- tral. Apesar do tratamento clínico ser possível, a remoção da mucosa prolapsada apresenta menor chance de recidiva e por isso foi escolhida como melhor opção para ser aplicada no presente estu- do (1). Conclusão A técnica cirúrgica descrita e aplicada nesse estudo mostrou-se eficaz, e o animal não apresen- tou recidiva até o presente momento. Referências 1. LIZIANE F. H. C., MARQUES J. M.V., CONTESINI, E. A., F.M. P., SIMONE S. & M. MUCILLO. Prolapso uretral em um bulldogue Inglês. Acta Scientiae Veterinariae, 2007; 35(1):109-113. 2. BIRCHARD, S.J. Surgical treatment of urethral prolapse in male dogs. 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