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Textos não verbais, humorísticos e irônicos Verônica Daniel Kobs* Textos não verbais Já há algum tempo, considera-se texto tudo o que pode ser interpretado. Em nosso dia a dia, não percebemos, mas até inconscientemente somos to- cados pelo efeito de um outdoor, de uma música, ou de uma paisagem. Ora, se o significado de texto foi ampliado, é natural que o significado de leitura tenha sofrido uma alteração semelhante. De fato, ler não implica mais apenas a decodificação de signos escritos (letras ou palavras): ler é perceber as coisas e emitir julgamentos sobre elas. Trata-se de dois níveis diferentes de interação. A simples percepção acontece quando olhamos algo muito rapidamente e, talvez por pressa ou pelo fato de o que observamos não ser importante no momento, não damos muita importância. Isso não quer dizer, porém, que aquilo que foi visto não tenha sido apre- endido ou não tenha provocado nenhum efeito. Toda informação que nos chega é arquivada em nosso cérebro e, algum tempo depois, ela pode ser recuperada, por algum estímulo externo nos avisando que aquela música, aquela foto ou aquela placa já foi visualizada, faz parte de uma memória e, portanto, é parte da bagagem cultural do sujeito. A partir do momento em que uma informação é retomada, aquilo que antes estava inerte no arquivo mental torna-se disponível para o uso em análises, comparações etc. A partir dessas informações sobre o que pode ser considerado texto e sobre o conceito mais amplo de leitura, chegamos facilmente a textos feitos apenas a partir de imagens ou feitos predominantemente pela imagem. Tais textos podem ser chamados de não verbais e há muitos exemplos deles em nosso cotidiano. Mapas, gráficos, quadros e placas são apenas alguns desses exemplos. * Doutora em Estudos Li- terários pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Literatura Bra- sileira pela UFPR. Licencia- da em Letras Português- -Latim pela UFPR. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 2 Textos não verbais, humorísticos e irônicos Por condensarem a informação, muitos desses textos não verbais têm um valor simbólico. As placas e os outdoors são um bom exemplo disso, pois são textos que exigem comunicação imediata: a mensagem tem de ser passada rapidamente, para ser apreendida também em poucos segundos. Sempre que se fala de textos não verbais, vem à tona um debate infin- dável e já velho conhecido nosso: o que vale mais – uma imagem ou mil palavras? Se fosse fácil de responder a essa pergunta, ela não despertaria tantas opiniões, nem seria tema de debate ainda hoje. A única coisa que se pode afirmar sobre o assunto é que, assim como os textos escritos, algumas imagens se prestam a uma interpretação fácil, enquanto outras requerem mais análise, permitindo uma multiplicidade de pontos de vista. Logo, a uni- lateralidade ou a multiplicidade estão intrinsecamente ligadas à intenção do texto verbal ou não verbal, o que, por sua vez, está diretamente ligado com a finalidade e com o público a que se destina. Placas As placas de sinalização têm uma intenção puramente informativa e, por- tanto, não admitem interpretações variadas: elas precisam ser entendidas do mesmo modo por todos. A rapidez é outro quesito importante nesse tipo de texto não verbal, razão pela qual um desenho, ou seja, um signo não verbal, pode corresponder a uma mensagem que, na escrita, seria passada por um conjunto de signos escritos (palavras). Por exemplo, a placa indicando que é proibido fumar em determinado local aglutina e resume várias palavras ao optar pela representação visual da mensagem. Abaixo, vejamos algumas placas bem conhecidas, entre elas a de “Proibi- do fumar”. IE SD E Br as il S. A . IE SD E Br as il S. A . IE SD E Br as il S. A . Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Textos não verbais, humorísticos e irônicos 3 Outra característica importante das placas de sinalização é que o uso da imagem torna-as universais. Se, em diferentes partes do mundo, fosse usada a escrita para indicar a proibição do fumo, ou o banheiro feminino, ou o masculino, seria preciso escrever na língua oficial de cada lugar. Com o uso da imagem nas placas de sinalização, isso não se faz necessário, já que, por exemplo, o bonequinho com características femininas vai ser compreendido da mesma forma por pessoas de diferentes nacionalidades – alemães, brasi- leiros, cubanos, dinamarqueses, ingleses etc. Gráficos Os gráficos compreendem outro tipo de texto não verbal e podem ser de diversos modelos. O fundamental, em um gráfico, é a apresentação de dados, de modo a facilitar a apreensão, por parte de quem o visualiza. Com certeza em um texto há alguns dados que poderiam se perder em meio a tantas informações, ainda mais se esse texto for relativamente ex- tenso. Utilizando-se o gráfico, que geralmente associa cores e números, a apreensão dos dados é facilitada, sem mencionar que, em caso de dúvida, basta ao leitor recorrer ao gráfico novamente, sem necessidade de procurar, em meio às palavras do texto, aquela informação de que precisa. Vamos ver um exemplo de gráfico de formato circular, popularmente cha- mado de gráfico pizza. Infoescravo Blog 20 65 15 Escravos da tecnologia Blogueiros Técnicos em TI D is po ní ve l e m : < w w w .te te ra co n- su lto ria .c om .b r> . A da pt ad o. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 4 Textos não verbais, humorísticos e irônicos Esse gráfico traz informações que poderiam ser apresentadas em forma de texto. Há um título – “Infoescravo Blog” – e, na legenda, três categorias rela- cionadas ao título. Cada categoria corresponde a uma cor marcada no gráfico circular. Correspondendo a uma parte do todo, os três tipos de “infoescravos” também ganham um número, que indica a porcentagem alcançada pela ca- tegoria em relação à totalidade do círculo. A partir daí, é fácil a síntese, bastan- do associar os números e as cores às categorias informadas na legenda: escravos da tecnologia = 65% � blogueiros = 15% � técnicos em TI = 20% � E podemos fazer ainda outras duas observações importantes a respeito do gráfico. A primeira: é evidente a predominância da imagem (não verbal) em relação às palavras (verbal), que aparecem só na legenda e no título. Além disso, repare que a concretização dos dados apresentados na forma de um círculo dividido em cores, possibilita uma clara percepção do que representa os 65% atribuídos aos “escravos da tecnologia” perto das outras porcentagens, muito menores. Obviamente, chegaríamos a essa mesma conclusão apenas pela comparação dos números, mas o desenho mostra essa diferença. Mapas Assim como os gráficos, os mapas também trabalham com o predomínio das imagens, sendo exemplos de textos não verbais. No entanto, existe uma diferença básica: o gráfico tem de ser construído, enquanto o mapa já está feito, bastando usar as delimitações entre estados e cidades, por exemplo, indicando os agrupamentos importantes para a informação a ser dada, com o uso de cores ou hachuras. Vamos a um exemplo. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Textos não verbais, humorísticos e irônicos 5 NÚMERO DE LIVROS LIDOS POR ANO Livros lidos por ano por região 3,7 na escola e 0,2 fora dela 3,9 4,2 4,5 4,9 5,5 3,4 na escola e 1,1 fora dela 3,7 na escola e 1,8 fora dela 3,0 na escola e 1,9 fora dela 3,6 naescola e 0,6 fora dela D is po ní ve l e m : < ht tp :// bp 1. bl og ge r. co m /_ W KO FK 4Y 6r N w /S Ec EW km qz G I/A A A A - A A A A A iI/ qa qH V4 _L U N k/ s1 60 0- h/ br as il_ le i- tu ra 20 07 .p ng >. A da pt ad o. Nesse mapa, as cores formam conjuntos que relegam a divisão original para um segundo plano, pois não importa mais a divisão em estados, mas que conjunto de estados corresponde ao mesmo dado sobre a leitura. Como o subtítulo anuncia, o mapa tem a intenção de informar as quantidades de “Livros lidos por ano por região”. Dessa forma, cada região, formada por vários estados, recebe uma cor e, depois, um número é colocado em desta- que em cada uma delas. Por fim, para detalhar a informação, uma linha liga esse número a um quadro, que especifica qual é a quantidade de livros lidos na escola e fora dela. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 6 Textos não verbais, humorísticos e irônicos Poemas visuais Há dois tipos de poemas visuais: aqueles feitos de palavras e de imagens e aqueles feitos apenas de imagens. Mas essa duplicidade também pode aparecer nas placas, nos gráficos e nos mapas. Sendo assim, o diferencial dos poemas visuais em relação aos demais textos não verbais já apresentados refere-se à intenção artística – que, por sua vez, vai restringir o alcance do texto, porque textos literários como os poemas visuais têm um público mais restrito que os textos informativos. Em geral, os poemas visuais que conjugam imagem e palavra tendem a reforçar, pelo desenho ou pela forma, o significado de uma palavra básica usada na sua construção. Vejamos um exemplo do compositor, poeta e cantor Arnaldo Antunes. (A N TU N ES , 1 99 7, p . 4 5) Esse texto transforma o seu título (“Rio: o ir”) em um elemento concreto ao formar três círculos com as letras da palavra rio, que se multiplicam, for- mando uma figura geométrica. Além disso, também fica clara a ideia de que todo rio desemboca no mar, razão pela qual o o funciona como um ralo por onde escoam as águas que chegam até ele. Mais um detalhe importante é que a escolha do título não foi aleatória, o que é provado não apenas pelo fato de os rios correrem para o mar: o ir é Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Textos não verbais, humorísticos e irônicos 7 a palavra rio ao contrário, comprovando que a forma obtida pelo artista foi descoberta a partir de uma análise bastante atenta da palavra rio. Sendo assim, o poema que analisamos não é feito apenas de imagens, mas sobrepõe a forma à escrita a partir do momento em que rompe com a apresentação da palavra na página. Se, antes, ela era apenas impressa sobre a folha em branco, no poema visual a palavra aparece com uma forma deter- minada, a qual ajuda a compor o sentido do texto. Textos humorísticos Voltando agora aos textos verbais, vamos falar de um estilo específico de escrita: a humorística. Claro que o humor também pode aparecer em textos não verbais. Independentemente do texto em que esse recurso apareça, o re- sultado vai ser o mesmo: o riso. Todo jornal tem uma seção de piadas – um tipo de texto que, tanto na fala quanto na escrita, é o mais associado ao humor. No teatro, no cinema e na televisão, há diversos exemplos de comédia. Mas os exemplos também aparecem na literatura. Nessa área, podemos citar os nomes dos cronistas Roberto Gomes e José Simão, de Luis Fernando Ve- rissimo e Jô Soares, entre outros. Fiquemos com a leitura de dois haicais escritos por Dalton Trevisan, que também se dedica a esse tipo de texto, embora eles sejam minoria em sua produção literária. Já reparei (TREVISAN, 1994, p. 89-90) – Já reparei, garçom: a segunda empadinha nunca é tão boa como a primeira. – … – Hoje você me traga a segunda antes da primeira. É bom ser churrasqueiro – É bom ser churrasqueiro: fico olhando o fogo, até esqueço da carne. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 8 Textos não verbais, humorísticos e irônicos Mas antes de passarmos à análise dos textos vamos saber um pouco mais sobre os haicais. De origem japonesa, esse tipo de texto privilegia a síntese. Os haicais mais tradicionais são escritos em três versos de cinco, sete e cinco sílabas poéticas, respectivamente. Em geral, essas produções se detêm sobre a descrição de uma paisagem ou a lembrança de um fato. Dalton Trevisan, porém, ao usar esse tipo de texto, faz algumas adapta- ções. A primeira diz respeito à forma: o autor escreve os textos em prosa, e não em verso. A segunda mudança refere-se ao tema, porque esses haicais que acabamos de ler são voltados ao humor, característica inexistente nos haicais tradicionais. Os dois haicais de Dalton Trevisan pertencem ao mesmo livro – Dinorá – e a sua leveza não se deve apenas ao tom humorístico mas também à sua bre- vidade e à simplicidade dos temas. Perceba ainda que o final é importante. No primeiro texto, a graça reside no fato de a conclusão do cliente ser tão apressada que nem atenta para o detalhe de que, se a ordem das empadas for invertida, o problema não deixará de existir, já que a segunda empadinha passará a ser a primeira. E no segundo exemplo, apesar de no início haver referência ao churras- queiro, o texto termina afirmando que o fogo faz o churrasqueiro se esque- cer da carne, o que deixa implícita a questão que provoca o riso: mas, afinal, que tipo de churrasqueiro é esse? Há autores que trabalham com o humor de uma maneira diferente e mais peculiar. Os mestres do chamado humor negro costumam associar situações engraçadas a momentos tristes, às vezes trágicos. O fato é que, no humor negro, o riso é provocado em um contexto sério, que não se relaciona à ale- gria. Essa inadequação é a principal característica desse tipo de humor que era característica marcante de vários textos do escritor Machado de Assis. Abaixo, foi transcrita uma passagem de Memórias Póstumas de Brás Cubas, em um bom exemplo do humor negro na literatura. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Textos não verbais, humorísticos e irônicos 9 O sujeito magro (ASSIS, 1970, p. 271) O sujeito magro […] tornou a tratar da casa, alteando a proposta. – Trinta e oito contos, disse ele. – Ahn?… gemeu o enfermo. O sujeito magro aproximou-se da cama, pegou-lhe na mão, e sentiu-a fria. […] – Não… não… quar… quaren… quar… quar… Teve um acesso de tosse, e foi o último; daí a pouco expirava ele, com grande consternação do sujeito magro, que me confessou depois a disposi- ção em que estava de oferecer os quarenta contos; mas era tarde. Pela leitura do fragmento acima, a situação já parece estranha desde o começo, quando um homem à morte, querendo vender uma propriedade, negocia com o interessado na compra sem conseguir chegar a um acordo. Desde o início ele deixa claro que só venderá a casa por 40 contos de réis (a moeda da época), mas o outro tenta negociar um preço mais baixo. O resul- tado da cena, bastante inusitado, é trágico: o doente tem uma crise de tosse da qual não consegue se recuperar e acaba morrendo. Em meio a um certo lamento, vem o riso um pouco tímido – dada a morte do personagem –, mas inevitável diante da descoberta de que a pessoa interessada na compra tinha ideia de pagar os 40 contos pedidos e, se fosse assim, talvez não hou- vesse o acesso de tosse e o enfermo ainda estivesse vivo. Textos irônicos Os textos irônicos são aquelesque fazem uso da ironia, uma figura de linguagem que trabalha com a duplicidade de sentidos, obrigando o leitor a interagir com um discurso construído em dois níveis – um visível e o outro, invisível. Ser irônico é escrever ou falar justamente o oposto do que se pre- tende expressar. Sendo assim, a fala ou a escrita constitui a parte visível do Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 10 Textos não verbais, humorísticos e irônicos texto. No entanto, a correta interpretação de um texto ou de uma fala com ironia exige que o receptor vá além das palavras, chegando à parte invisível, mas subentendida pelo conjunto lido ou ouvido, o que o ajudará a descobrir por exemplo que, embora tenha sido usada uma palavra positiva para quali- ficar uma pessoa, na verdade o autor sente um profundo desprezo por essa pessoa. Esse jogo duplo proposto pela ironia requer habilidade do leitor ou do ouvinte – afinal, não chegar ao real significado de um texto irônico dará uma ideia completamente contrária daquela que fazia parte da real intenção do autor do texto. É como não entender o final de uma piada. Para exemplificar a linguagem irônica, fiquemos com outra passagem de Machado de Assis, também retirada do romance Memórias Póstumas de Brás Cubas. Notas (ASSIS, 1970, p. 154) Soluços, lágrimas, casa armada, veludo preto nos portais, um homem que veio vestir o cadáver, outro que tomou a medida do caixão, caixão, essa, to- cheiros, convites, convidados que entravam, lentamente, a passo surdo […] Isto que parece um simples inventário eram notas que eu havia tomado para um capítulo triste e vulgar que não escrevo. Na sua forma original, o capítulo de que foi retirado esse trecho tem pouco mais de meia página e é todo feito de enumerações, assim como as que podem ser lidas nas três primeiras linhas transcritas. A ironia está no final da citação. Já sabemos que o trecho faz parte de um capítulo, denominado “Notas” e, mesmo assim, o narrador nega isso, dizendo justamente o contrário quando afirma que “Isto que parece um simples inventário eram notas que eu havia tomado para um capítulo triste e vulgar que não escrevo.” Como não escreve se o leitor acabou de ler o capítulo? É nessa contradição que está a ironia: o narrador afirma que não escreve, mas o fato é que acabou escrevendo. É comum a associação entre ironia e humor, o que pode ser comprova- do pelo trecho que estamos analisando. A princípio, a contradição gera um estranhamento, mas quando se percebe a ironia também se percebe o bom humor do narrador ao fazer a brincadeira, e o riso é quase inevitável. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Textos não verbais, humorísticos e irônicos 11 Texto complementar A crônica abaixo é um bom exemplo de texto humorístico. Boa leitura e divirta-se! Diga não às drogas (VERISSIMO, 2010) Tudo começou quando eu tinha uns 14 anos e um amigo chegou com aquele papo de “experimenta, depois, quando você quiser, é só parar...” e eu fui na dele. Primeiro ele me ofereceu coisa leve, disse que era de “raiz”, “natu- ral”, “da terra”, que não fazia mal, e me deu um inofensivo disco do Chitãozi- nho e Xororó e em seguida um do Leandro e Leonardo. Achei legal, coisa bem brasileira; mas a parada foi ficando mais pesada, o consumo cada vez mais frequente, comecei a chamar todo mundo de “Amigo” e acabei comprando pela primeira vez. Lembro que cheguei na loja e pedi: – Me dá um CD do Zezé di Camargo e Luciano. Era o princípio de tudo! Logo resolvi experimentar algo diferente e ele me ofereceu um CD de Axé. Ele dizia que era para relaxar; sabe, coisa leve... Banda Eva, Cheiro de Amor, Netinho etc. Com o tempo, meu amigo foi oferecendo coisas piores: É o Tchan, Companhia do Pagode, Asa de Águia e muito mais. Após o uso contínuo eu já não queria mais saber de coisas leves, eu queria algo mais pesado, mais desafiador, que me fizesse mexer a bunda como eu nunca havia mexido antes, então, meu “amigo” me deu o que eu queria, um CD do Harmonia do Samba. […] Mas, depois de muito tempo de consumo, a droga perde efeito, e você começa a querer cada vez mais, mais, mais... Comecei a frequentar o submundo e correr atrás das paradas. Foi a partir daí que começou a minha decadência. Fui ao show de encontro dos grupos Karametade e Só pra Contrariar, e até comprei a Caras que tinha o Rodriguinho na capa. Quando dei por mim, já estava com o cabelo pintado de loiro, minha mão tinha crescido muito em função do pandeiro, meus polegares já não se mexiam por eu passar o tempo todo fazendo sinais de positivo. Não deu outra: entrei para um grupo de pagode. Enquanto vários outros viciados can- tavam uma “música” que não dizia nada, eu e mais 12 infelizes dançávamos alguns passinhos ensaiados, sorriamos, fazíamos sinais combinados. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 12 Textos não verbais, humorísticos e irônicos Lembro-me de um dia quando entrei nas lojas Americanas e pedi a coletâ- nea As Melhores do Molejão. Foi terrível!! Eu já não pensava mais!! Meu senso crítico havia sido dissolvido pelas rimas “miseráveis” e letras pouco arrojadas. Meu cérebro estava travado, não pensava em mais nada. Mas a fase negra ainda estava por vir. Cheguei ao fundo do poço, no limiar da condição humana, quando comecei a escutar “Popozudas”, “Bondes”, “Tigrões”, “Motinhas” e “Tapi- nhas”. Comecei a ter delírios, a dizer coisas sem sentido. Quando saia à noite para as festas, pedia tapas na cara e fazia gestos obscenos. Fui cercado por outros drogados, usuários das drogas mais estranhas; uns nobres queriam me mostrar o “caminho das pedras”, outros extremistas preferiam o “caminho dos templos”. Minha fraqueza era tanta que estive próximo de sucumbir aos radi- cais e ser dominado pela droga mais poderosa do mercado: a droga limpa. Hoje estou internado em uma clínica. Meus verdadeiros amigos fizeram a única coisa que poderiam ter feito por mim. Meu tratamento está sendo muito duro: doses cavalares de rock, mpb, progressivo e blues. Mas o meu médico falou que é possível que tenham que recorrer ao jazz e até mesmo a Mozart e Bach. Queria aproveitar a oportunidade e aconselhar as pessoas a não se entregarem a esse tipo de droga. Os traficantes só pensam no dinhei- ro. Eles não se preocupam com a sua saúde, por isso tapam sua visão para as coisas boas e te oferecem drogas. Se você não reagir, vai acabar drogado: alienado, inculto, manobrá- vel, consumível, descartável e distante; vai perder as referências e definhar mentalmente. Em vez de encher a cabeça com porcaria, pratique esportes e, na dúvida, se não puder distinguir o que é droga ou não, faça o seguinte: Não ligue a tevê no domingo à tarde; Não escute nada que venha de Goiânia ou do interior de São Paulo; Não entre em carros com adesivos “Fui...”. Se te oferecerem um CD, procure saber se o suspeito foi ao programa da Hebe ou se apareceu no Sabadão do Gugu; Mulheres gritando histericamen- te é outro indício; Não compre nenhum CD que tenha mais de seis pessoas na capa; Não vá a shows em que os suspeitos façam gestos ensaiados; Não compre nenhum CD que a capa tenha nuvens ao fundo; Não compre qual- quer CD que tenha vendido mais de um milhão de cópias no Brasil; e Não escute nada que o autor não consiga uma concordância verbal mínima. Mas, principalmente, duvide de tudo e de todos. A vida é bela! Eu sei que você consegue! Diga não às drogas. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Textos não verbais, humorísticos e irônicos 13 Atividades 1. Faça uma pequenalista de textos não verbais, além daqueles apresen- tados neste capítulo. Não se esqueça de justificar a inclusão dos textos listados na categoria de textos estudada. 2. Escreva um breve parágrafo interpretativo para o quadro reproduzido abaixo, Summer (1573), de Giuseppe Arcimboldo. D om ín io p úb lic o. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 14 Textos não verbais, humorísticos e irônicos 3. Identifique e comente o uso da ironia nos períodos abaixo. a) Sua nota, na prova de matemática, foi excelente: três e meio! b) Na quinta-feira, meu carro foi parar na oficina. O conserto custou a bagatela de 1.500 reais. 4. Marque a alternativa que cita três exemplos de textos não verbais. a) Romance, notícia e fotografia. b) Poema, bilhete e outdoor. c) História em quadrinhos, gráfico e romance. d) Fotografia, gráfico e placa de trânsito. 5. IE SD E Br as il S. A . A placa acima I. é exemplo de texto verbal porque pode ser associada às palavras “pessoas com necessidades especiais”. II. é um texto não verbal porque usa uma imagem em vez de palavras. III. tem a universalidade como sua principal característica, porque pode ser entendida por pessoas de diversas nacionalidades. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Textos não verbais, humorísticos e irônicos 15 Entre as afirmações acima, a) apenas a I é correta. b) apenas II e III são corretas. c) apenas a III é correta. d) apenas I e III são corretas. 6. Os melhores do ano A rentabilidade das aplicações de janeiro a maio (em %) Ouro Dólar comercial Poupança CDI Carteira livro (ações) Fundo de ações Bolsa do Rio Bolsa de São Paulo Inflação (IGPM) -4,18 3,11 5,94 8,55 31,51 43,99 52,69 61,14 4,30 (F RI ED LA N D ER ; G RI N BA U M , 2 01 0. A da pt ad o. ) Segundo o gráfico acima, a) o dólar comercial foi o investimento com menor rentabilidade. b) o ouro foi o investimento com menor rentabilidade. c) o fundo de ações só perdeu para a Bolsa do Rio. d) o texto não precisa da palavra para ser compreendido. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 16 Textos não verbais, humorísticos e irônicos 7. O humor a) não se realiza em textos não verbais. b) perde seu efeito quando associado a situações de tristeza ou tra- gédia. c) confere leveza ao texto e na maioria das vezes depende do final da história. d) é exclusividade do discurso literário. 8. Analise o período abaixo e depois assinale a alternativa com conside- rações corretas. Praia e chuva: não poderia existir melhor combinação. a) O trecho apresenta a leveza própria do humor. b) O texto é verbal e exemplifica o humor negro. c) O texto é irônico, característica percebida na associação “praia e chuva”. d) O texto usa ironia, que se evidencia no uso da palavra melhor. 9. Analise o fragmento abaixo: Tudo começou quando eu tinha uns 14 anos e um amigo chegou com aquele papo de “experimenta, depois, quando você quiser, é só parar...” e eu fui na dele. Primeiro ele me ofereceu coisa leve, disse que era de “raiz”, “natu- ral”, “da terra”, que não fazia mal, e me deu um inofensivo disco do Chitãozi- nho e Xororó e em seguida um do Leandro e Leonardo. Achei legal, coisa bem brasileira; mas a parada foi ficando mais pesada, o consumo cada vez mais frequente, comecei a chamar todo mundo de “Amigo” e acabei comprando pela primeira vez. Agora, avalie as afirmações. I. O texto usa comparações para obter o tom humorístico. II. O texto é verbal e se caracteriza pela leveza, traço marcante nos textos de humor. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Textos não verbais, humorísticos e irônicos 17 III. O texto é exemplo de humor negro, porque relaciona a música ao consumo de drogas. Entre essas afirmações, a) apenas I e II são corretas. b) apenas II e III são corretas. c) apenas a III é correta. d) apenas I e III são corretas. O mapa abaixo servirá para as questões 10 e 11. (D iv ul ga çã o IB G E. A da pt ad o. ) 0 53Km Escala gráfica aproximada 10. Segundo os dados apresentados no mapa, a) a divisão proposta corresponde à divisão original do mapa do Brasil. b) na região Sul predomina o clima “sempre úmido” com “verão morno”. c) a região Centro-Oeste é o único exemplo de clima seco. d) as gradações de cor correspondem à divisão apresentada na le- genda. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 18 Textos não verbais, humorísticos e irônicos 11. Analise algumas afirmações sobre o mapa apresentado. I. As cores se responsabilizam por propor uma divisão que apresente a diferença climática. II. As palavras (elementos verbais) dividem espaço com o mapa (ele- mento não verbal). III. A diferença climática é o fator predeterminante para a divisão ado- tada no mapa, que se apresenta em cores e tons variados. Entre tais afirmações, a) apenas I e II são corretas. b) I, II e III são corretas. c) II e III são corretas. d) I e III são corretas. Dica de estudo Para ir se acostumando com os recursos do humor e da ironia e, principal- mente, para aprimorar a interpretação de textos irônicos, leia diariamente, no caderno cultural dos jornais, algumas tiras e histórias em quadrinhos: esses tipos de texto são campeões no uso das linguagens humorística e irônica. Referências ANTUNES, Arnaldo. 2 ou + Corpos no Mesmo Espaço. São Paulo: Perspectiva, 1997, p. 45. ARCIMBOLDO, Giuseppe. Summer. Disponível em: <http://www.theartbook. com/summer_arcimboldo>. Acesso em: 25 fev. 2005. ASSIS, Machado de. Memórias Póstumas de Brás Cubas. São Paulo: W. M. Jack- son, 1970. FRIEDLANDER, Davi; GRINBAUM, Ricardo. A festa do investidor. Veja, Seção Eco- nomia e Negócios. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/180697/p_132.html>. Acesso em: 2 abr. 2010. MAPA DO CLIMA no Brasil. Disponível em: <http://campeche.inf.furb.br/sisga/ educacao/ensino/mapaClima.php>. Acesso em: 2 abr. 2010. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br Textos não verbais, humorísticos e irônicos 19 NÚMERO DE LIVROS lidos por ano. Disponível em: <http://bp1.blogger.com/_ WKOFK4Y6rNw/SEcEWkmqzGI/AAAAAAAAAiI/qaqHV4_LUNk/s1600-h/brasil_lei- tura2007.png>. Acesso em: 2 abr. 2010. PLACAS de sinalização. Disponível em: <http://www.abafire.com.br/sinalizacao_ placas.php?gclid=CKyuioKR6aACFUwf7godDyeAFg>. Acesso em: 2 abr. 2010. TETERA, Eduardo. Infoescravo Blog. Disponível em: www.teteraconsultoria.com. br. Acesso em: 2 abr. 2010. TREVISAN, Dalton. Dinorá. Rio de Janeiro: Record, 1994. VERISSIMO, Luis Fernando. Diga Não às Drogas. Disponível em: <http://www. correaneto.com.br/ curiosidades/naoasdrogas.htm>. Acesso em: 2 abr. 2010. Gabarito 1. Outros exemplos de textos não verbais são escultura, fotografia, lo- gomarca, outdoor etc., e podem ser assim classificados porque usam a imagem como principal meio de comunicação, permitindo variadas interpretações, já que a falta do signo escrito não inviabiliza a compre- ensão do texto. 2. Respostas possíveis: Modo literal de representar o ditado popular “Você é o que você come.” Os alimentos são essenciais ao ser humano. Relação entre o colorido dos legumes e das frutas próprios do verão (Summer) e o humor das pessoas,pelo que a estação representa. 3. a) A ironia está na palavra excelente, usada para se referir a uma nota baixa. b) É irônico o trecho “custou a bagatela de 1.500 reais”, pois 1.500 re- ais não é uma bagatela (como 3,5 não é uma boa nota) e, sendo assim, comprova-se a ironia, que usa um termo para se referir à ideia contrária àquilo que ele representa. Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br 20 Textos não verbais, humorísticos e irônicos 4. D 5. B 6. B 7. C 8. D 9. A 10. D 11. B Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br
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