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AULA II CIENCIA POLITICA-TGE - DA LEGITIMIDADE DO SUJEITO POLITICO, DA RETORICA E DA PERSUASAO DO DISCURSO 2015.1

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DA LEGITIMIDADE DO SUJEITO POLÍTICO, DA RETÓRICA E DA PERSUASÃO DO DISCURSO POLÍTICO
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A respeito da legitimidade em um plano mais geral
Em termos gerais, a legitimidade se refere ao estado ou à qualidade daquele cuja ação é bem fundamentada, não se apresentando portanto como uma noção de exclusivo pertencimento ao domínio político.
Em sua origem, a legitimidade é instituída para dar sustentação aos feitos e aos gestos daquele que age em nome de um valor que deve ser reconhecido por todos os membros do grupo – o valor é o que dá direito ao exercício de um poder específico que se faz acompanhar de uma sanção ou de uma gratificação.
A legitimidade, portanto, depende de preceitos institucionais que guiam cada domínio, cada setor (campo) da prática social (na verdade, do espaço público), atribuindo poderes e status a seus atores.
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A legitimidade nos campos jurídico, econômico e midiático:
Regidos pela lógica da lei e da sanção, os “atores” da área jurídica são legitimados pela obtenção de um diploma e seu estatuto institucional é adquirido por meio de um sistema de recrutamento e de um sistema de nomeação pelos pares e pelos superiores hierárquicos, configurando-se assim uma proteção da profissão por regras institucionais – no caso de uma das regras ser infringida, questiona-se imediatamente a legitimidade da ação do profissional (do advogado, do juíz, do promotor).
 A legitimidade dos “atores” no domínio econômico (que é regido pela lógica do lucro) se configura pelo respeito às regras de concorrência e, no campo empresarial, pelo respeito às leis trabalhistas – é legítimo à empresa demitir quando entender ser necessário, obter a maior parte de um mercado, mas empregar crianças, demitir de maneira abusiva infringindo a lei, exercer monopólio compromete a sua legitimidade. 
No domínio das mídias de informação, o questionamento da legitimidade se mostra mais difícil, pelo fato deste domínio ser regido por duas lógicas: a da informação cidadã e a da concorrência comercial – os excessos na espetacularização da encenação da informação, a difusão de informações falsas (ou não confirmadas), a dependência que um órgão de informação possa ter em relação a um grupo econômico ou a um governo (ou partido), tudo isso pode minar a legitimidade da informação produzida e do próprio órgão de informação.
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PRIMEIRO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES
No que se refere à legitimidade no contexto das mídias, devemos lembrar que toda notícia que provém de órgãos de informação dependentes (de um poder político ou do poder de um conglomerado econômico) torna-se imediatamente suspeita de partidarismo e sua legitimidade será repudiada conforme aconteceu durante a Guerra do Golfo quando toda matéria era filtrada pelo Pentágono e difundida por uma única rede de televisão norte-americana, a CNN.
 Em muitos casos as legitimidades mudam, descobrindo-se ou desvelando-se, a posteriori, a ilegitimidade de uma situação anterior – quando ocorre um processo de democratização que se segue a um regime de exceção, a imprensa se desvincula de sua submissão/subserviência em relação ao arcabouço do poder ditatorial, emergindo assim uma nova legitimidade. 
 
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LEGITIMIDADE E CREDIBILIDADE
A legitimidade deve ser entendida como resultado de um reconhecimento, por parte dos outros, daquilo que dá poder a alguém de fazer ou de dizer em nome de um determinado estatuto (reconhecimento a partir de um cargo institucional), de um determinado saber (ser reconhecido como sábio) ou em nome de um saber-fazer (ser reconhecido como especialista, como expert).
A legitimidade não deve ser confundida com a credibilidade – a legitimidade determina um direito do sujeito de dizer ou de fazer, enquanto que a credibilidade trata da capacidade do sujeito de dizer “o fazer”. 
 Questionar a legitimidade é colocar em xeque o direito de dizer “o fazer” – já o questionamento da credibilidade incide sobre a pessoa, uma vez que ela não apresenta provas de seu poder de dizer “o fazer”. 
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LEGITIMIDADE E AUTORIDADE
A legitimidade não se confunde com a autoridade – enquanto a legitimidade se configura como um direito adquirido conforme vimos anteriormente, a autoridade esta ligada ao processo de submissão do outro.
 No âmbito da autoridade, o sujeito é colocado em uma posição que lhe confere a condição de fazer com que os outros tenham um determinado comportamento (fazer com que os outros façam) ou com que incorporem determinados pensamentos, determinadas concepções (fazer pensar, fazer dizer) que não teriam sem a sua intervenção.
No contexto da legitimidade, o sujeito não é colocado na condição de submeter o outro – até porque este “outro” não se colocaria na condição de reconhecimento da legitimidade para se converter em vítima.
 Por vezes, quando a autoridade se confunde com legitimidade significa que ela se soma à legitimidade – isto decorre do fato de que um sujeito para confirmar sua posição de legitimidade precisa recorrer a uma sanção sobre os que não querem se submeter, recorrendo por vezes à violência para a obtenção da obediência.
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LEGITIMIDADE E SOBERANIA
A legitimidade da instância política depende, no domínio político, da forma como tal legitimidade é atribuída – assim, a legitimidade é conferida por um sujeito coletivo que pode aceitar uma legitimidade imposta por um tradição institucional ou que constrói as condições de uma determinada legitimidade e do exercício de uma autoridade.
Em ambos os casos anteriormente citados, o sujeito coletivo encontra-se em uma posição de livre aceitação em relação a uma eventual sanção que poderia lhe ser aplicada e não em uma situação de submissão forçada.
 No caso do sujeito coletivo construir as condições de uma determinada legitimidade, sua posição não tem caráter de onipotência – ela é provisória, devendo permanecer sob o controle do sujeito coletivo, a quem o delegado (o representante) deve prestar contas.
O sujeito que se encontra legitimado (a instância política) deve entender que tal legitimidade resulta do acordo construído pelos cidadãos (instância cidadã) que serão o alvo dos atos de discurso do representante.
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SEGUNDO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES
Na difícil relação que se estabelece entre a instância cidadã e a instância política e que é própria do domínio político, a instância política dispõe dos procedimentos de coerção física que lhe permitem manter a ordem, gerir tensões, implementar maior justiça social, ao mesmo tempo em que a disponibilidade de tais instrumentos somente se concretiza na medida em que o poder for conservado como soberania reconhecida pela instância cidadã.
A soberania esta relacionada à representação que se dá quando se fala ou se age em nome de uma entidade que supera a representação e que ao mesmo tempo delega esta representação (tal delegação é provisória).
O representante não é a entidade – ele se confunde com a entidade porque se faz portador dos valores que o constituem o poder desta entidade .
A soberania é um poder que tutela e que ao mesmo tempo se configura como um poder que está sob tutela – ele é ao mesmo tempo “todo-poderoso” (intocável) e ao mesmo tempo é responsável (deve prestar contas). 
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TIPOS DE IMAGINÁRIO SOCIAL QUE ESTÃO NA ORIGEM DA LEGITIMIDADE POLÍTICA:
LEGITIMIDADE POR FILIAÇÃO: este tipo de legitimidade se funda sobre a idéia de que o sujeito deve ser bem-nascido, de que ele obtém sua legitimidade como uma herança dita natural – a filiação pode ser de três tipos: a filiação de natureza sagrada, a filiação de natureza social e afiliação de ordem biológica.
LEGITIMIDADE POR FORMAÇÃO: tal legitimado pressupõe que o sujeito deve ser bem-formado (melhores escolas, melhores desempenhos em faculdades de prestígio, exercício de cargos de responsabilidade prestigiosos), pois competência e experiência permitiriam ao sujeito agir com discernimento. 
LEGITIMIDADE POR MANDATO: este tipo de legitimidade se origina na tomada do poder pelo povo, que se opõe à soberania de direito divino
– tal legitimidade popular deve se transformar em legitimidade representativa, instaurando-se um sistema de delegação de poder que faça com os representantes sejam responsáveis por seus atos perante os que os elegeram. 
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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DA RETÓRICA
A retórica pode ser entendida como a arte de utilizar a linguagem em um discurso persuasivo que tem por objetivo fundamental a configuração do convencimento de uma determinada audiência (de um determinado público) a respeito da verdade de algo.
 Trata-se de uma técnica argumentativa que não se alicerça nem na lógica, nem no conhecimento mas na capacidade, na habilidade em empregar a linguagem de forma a impressionar favoravelmente os ouvintes.
 De um modo geral, considera-se que a retórica foi sistematizada e desenvolvida pelos sofistas que a adotaram em seu método. 
 O filósofo do Direito, Chaim Perelman, buscou promover uma revalorização da retórica (tratada pejorativamente por Platão) através da construção de uma teoria sistematizadora dos traços fundamentais do uso retórico da linguagem, mostrando que, mesmo o discurso científico, não está isento de elementos retóricos e de recursos persuasivos.
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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES (I)
De acordo com os sofistas (Górgias, Córax, Protágoras), a retórica não visa o argumento com base no que é verdadeiro, mas no que é verossímil (eikos), sendo que seu método se desenvolve em função de uma “polifonia” de opiniões, quase sempre antagônicas, quase sempre conflitantes.
Segundo o sofista Córax, a retórica “cria” persuasão, configurando-se como a arte, a técnica de “convencer qualquer um a respeito de qualquer coisa”.
 Como derivação importante da retórica, podemos destacar a ERÍSTICA (a arte da disputa), cujos desenvolvimento e sistematização são atribuídos a Protágoras – esta “arte da disputa”, derivada da retórica, significa argumentação que visa ao sucesso contra o adversário, independentemente da preocupação com a verdade, sucesso este que se deve buscar per fas et nefas (por todos os meios possíveis, pelo lícito ou pelo ilícito, de qualquer modo).
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TERCEIRO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES 
Entendendo-se a política como um domínio de prática social, ela só pode ser entendida e exercida se fundada sobre uma legitimidade adquirida e atribuída.
Ao mesmo tempo, o sujeito político deve se mostrar crível e deve persuadir o maior número de indivíduos de que ele, sujeito político, compartilha certos valores com os cidadãos.
Tal condição faz com que a instância política tenha sempre que buscar a articulação de opiniões visando o estabelecimento de consensos – assim, a instância política tem que fazer prova de persuasão para que o sujeito político possa desempenhar um duplo papel: o de representante e o de fiador do bem-estar social.
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DAS ESTRATÉGIAS DO “PARECER”... (I) 
O político (o sujeito político) encontra-se na dupla posição de precisar convencer os cidadãos da pertinência de seu projeto político e de fazer com que o maior número possível de cidadãos adira aos valores que se encontram presentes em seu projeto.
Assim, o político deve construir para si uma dupla identidade discursiva:
Uma que corresponda ao conceito político como lugar de constituição de um pensamento sobre a vida dos homens e sociedade (o posicionamento ideológico do sujeito do discurso).
 Outra que corresponda à prática política, lugar das estratégias da gestão do poder (o posicionamento do sujeito no processo comunicativo).
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DAS ESTRATÉGIAS DO “PARECER”... (II) 
O político, em sua singularidade, dirige-se a todos como portador de “valores transcendentais”, como se fosse o porta-voz de um TERCEIRO, de um “enunciador de um ideal social”.
 O político precisa saber como inspirar confiança, admiração – deve saber como se associar à imagem ideal do “chefe” que se encontra no imaginário coletivo dos sentimentos e das emoções.
 Para muitos pensadores e grandes políticos, a arte da boa política consiste na gestão das paixões – todavia, o exercício deste “parecer” (desta “gestão das paixões”) quando levado ao extremo, quando ela se dá no movimento de “mascaramento” de um desejo de poder pessoal, pode levar a “desvios fascistas ou demagógico-populistas”.
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INSTÂNCIAS DO DISCURSO POLÍTICO E DO DISCURSO RELIGIOSO – NO QUE SE APROXIMAM? 
O representante de uma instituição de poder e o representante de uma instituição religiosa, em tese, ocupam uma “posição intermediária” entre a voz de um TERCEIRO da ordem do sagrado (a voz de um DEUS SOCIAL ou de um DEUS DIVINO) e o povo (o povo da TERRA ou o povo de DEUS
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INSTÂNCIAS DO DISCURSO POLÍTICO E DO DISCURSO PUBLICITÁRIO – NO QUE SE DIFERENCIAM? 
Ambas são provedoras de um sonho, seja ele coletivo ou individual.
 A instância política volta-se para a construção de um ideal social (ou deve estar voltada para isso) vincula-se ao destinatário-cidadão (um pacto de aliança visando a construção, por exemplo, de uma sociedade mais justa)
 A instância da publicidade oferece um sonho supostamente desejado (singularidade do desejo) – vincula-se ao destinatário-consumidor e é o agente de uma busca pessoal (ser sedutor, ser diferente, estar na moda).
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EMOÇÃO E RAZÃO: POR ONDE TRANSITA A PERSUASÃO
A questão de saber se a persuasão está relacionada à razão ou aos sentimentos é antiga, admitindo-se todavia que não se pode descartar os sentimentos em nenhum processo de linguagem voltado para influenciar o interlocutor.
Deve-se, todavia, distinguir a convicção da persuasão – a convicção pertence ao puro raciocínio, estando voltada para o estabelecimento da verdade, enquanto que a persuasão pertenceria ao reino dos sentimentos (em linguagem atual, ao campo dos afetos), alicerçando-se sobre os deslocamentos emocionais, voltando-se para o auditório. 
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QUARTO CONJUNTO DE OBSERVAÇÕES
As estratégias discursivas utilizadas pelo sujeito político para atrair a simpatia do público dependem de vários fatores, tais como:
 a identidade social do sujeito político enunciador do discurso;
 a maneira como o político percebe a opinião pública (que pode ser favorável, desfavorável ou indiferente).
 o caminho para se atingir esta opinião pública.
 a “posição” dos demais atores políticos (parceiros ou adversários).
 os “alvos” a serem defendidos ou atacados: pessoas, idéias ou ações.
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A MENTIRA NA CENA PÚBLICA 
A mentira se constitui em um ato de linguagem que se vincula a três condições básicas:
 o sujeito que fala diz, na condição de portador de uma identidade discursiva, o contrário daquilo que sabe ou julga como indivíduo pensante.
 o sujeito que fala deve saber que aquilo que diz é contrário ao que pensa (neste sentido, não há mentira que não seja voluntária).
 o sujeito que fala deve fazer com que o interlocutor creia que o que está sendo enunciado é idêntico àquilo que ele (interlocutor) pensa.
 O alcance e a significação da mentira variam conforme o interlocutor (se singular ou plural) e a condição do locutor (se fala em particular ou em público) – a mentira pode se configurar pelo silêncio, pela omissão, pela dissimulação, pela fabulação ou pelo blefe.
 Todo político sabe que lhe é impossível dizer tudo a todo o momento (dizer todas as coisas exatamente como ele as pensa ou as percebe) – a ação política desenvolve-se no tempo e no momento em que o político pronuncia suas promessas, não sabendo exatamente de quais meios disporá nem quais serão os obstáculos que irá se opor à sua ação.
 Para que suas ações não sejam obliteradas, obstaculizadas no futuro, o político deve jogar com estratégias discursivas que não sejam muito explícitas e que pareçam vagas, mas não tão vagas a ponto de perder sua credibilidade – o político deve sempre “parecer dizer a verdade”.

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