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A (I) LEGITIMIDADE DO VOTO DE QUALIDADE QUANDO NO DOMÍNIO DO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS – CARF THE (I) LEGITIMACY VOTING OF QUALITY WHEN IN THE FIELD OF THE ADMINISTRATIVE COUNCIL FOR FISCAL RESOURCES – ACFR Hallef de Oliveira1 Resumo No presente artigo, tentou-se expor críticas considerações acerca do voto de qualidade em sede do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, com os artigos 25, § 9°, do Decreto n. 70.235/72 e 54 do Regimento Interno do CARF, sob a luz do princípio da segurança jurídica, com intuito de externar a ilegitimidade do voto duplo nos Tribunais Administrativos, ou de qualidade, como se diz em algumas atmosferas de discussão; também, a ausência de vinculação para com o artigo 112, do CTN, o qual preleciona que, em caso de dúvida, interpretar-se-á favoravelmente ao acusado; outras rápidas considerações se fez necessário a respeito do processo administrativo fiscal federal, o qual traz a figura da impugnação ao auto de infração ou a notificação de lançamento. Adiante, analisa-se o princípio da segurança jurídica, este relacionado ao direito tributário, como fundamento da proteção sobre a relação jurídica e socioeconômica entre o Fisco e o contribuinte. Logo, finaliza-se a presente produção norteada pelo entendimento de ilegitimidade, e, consequente inconstitucionalidade do voto de qualidade quando empregado pelo CARF, mas, prolepticamente, adianta-se a informação de que tal matéria repousa no seio do STF para ser analisada, haja vista a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5.731/DF, cuja decisão produzirá efeitos erga omnes e ex tunc, o que irá ocasionar, em caso de pronunciamento contrário ao que dispõe o § 9°, do artigo 25, do Decreto n. 70/235/72, a nulidade de julgamentos proferidos com voto de qualidade, exceto modulação dos efeitos. Palavras-Chave: Voto de Qualidade; Voto de Minerva; Ilegitimidade do Voto Duplo; Processo Administrativo Tributário; e Direito Tributário. 1 Hallef de Oliveira é Professor de Português, Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Estácio do Recife, Licenciando em Letras – Português e Espanhol pela UFRPE e Pós-graduando em Direito Tributário pela UNICAP. Abstract In the present article, it was tried to expose critical considerations about the vote of quality in the Administrative Council of Tax Appeals – ACFR, with articles 25, § 9, of the Decree n. 70,235/72 and 54 of the Internal Regulations of ACFR, in the light of the principle of legal certainty, in order to express the illegitimacy of double voting in the Administrative Courts, or of quality, as it is said in some areas of discussion; also, the absence of any connection with Article 112 of the NTC, which states that, in case of doubt, the defendant will be interpreted favorably; other rapid considerations have become necessary regarding the federal fiscal administrative process, which brings the figure of the impugnation to the notice of infraction or the notification of launch. This paper analyzes the principle of legal certainty, which is related to tax law, as a basis for the protection of the legal and socioeconomic relationship between the tax authorities and the taxpayer. Therefore, the present production is based on the understanding of illegitimacy, and, consequently, the unconstitutionality of the quality vote when employed by ACFR, but, proleptically, the information that such matter rests within the FCJ for analysis is advanced. View the Direct Action of Unconstitutionality n. 5.731 / DF, whose decision will have effects erga omnes and ex tunc, which will cause, in case of a ruling contrary to the provisions of § 9, of article 25, Decree no. 70/235/72, the nullity of judgments pronounced with voting of quality, except modulation of the effects. Keywords: Quality Vote; Vote of Minerva; Illegitimacy of Double Voting; Administrative Tax Process; and Tax Law. SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF; 3. O nebuloso Voto de Qualidade do CARF; 4. Conclusões; e 5. Referências. 1. Introdução A Ilegitimidade e inconstitucionalidade do voto de qualidade quando no domínio do Conselho Administrativo de Recursos Fiscal (CARF) é o tema principal da presente produção, de modo que, em órbita, figurando a ideia de que incube ao Presidente do Colegiado o voto ordinário, e ainda, o voto de qualidade, caso não haja deliberação majoritária no julgamento das Turmas ordinárias ou da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), conforme os termos dos artigos 25, § 9º, do Decreto n. 70.235/72 (PAF) e 54 do Regimento Interno do CARF (RICARF). Outro tema orbitante no presente artigo é: a violação do princípio da segurança jurídica face ao “segundo voto” que tem o Presidente do Colegiado, princípio esse, teto de amparo para a relação jurídica, política e socioeconômica entre o fisco e o contribuinte. Adiante, discute-se o artigo 112 do Código Tribunal Nacional (CTN), onde tal dispositivo determina que na existência de dúvida no tocante a materialidade do fato, interpretar-se-á de maneira favorável ao contribuinte. Para elucidação, distingue-se o início do procedimento fiscal com a fase litigiosa, este formalizado a partir da impugnação do auto de infração ou a notificação de lançamento de ofício; ou ainda, através de manifestação de inconformidade, instrumento pelo qual o sujeito que ocupar o polo passivo conteste decisões denegatórias de pedidos de restituição, compensação, imunidade, suspensão, etc. Logo, se verá que o contencioso administrativo demandará três instancias: Delegacias de Julgamentos (1ª Instância); Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - Antigo Conselho de Contribuintes (2ª Instância); e Câmara Superior de Recursos Fiscais (3ª Instância). Por fim, o capítulo terceiro abordará também Ilegitimidade do voto duplo do CARF, costurando argumentos em desfavor do referido voto, comparando-o com sua origem, ou seja, a essência que ensejou o voto de Minerva ou de Qualidade, elencando o contexto histórico que remonta à cultura greco-romana. 2. O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF O CARF é um órgão colegiado paritário constituído por conselheiros representantes da Fazenda Nacional e dos Contribuintes; órgão esse, integrante da estrutura do Ministério da Fazenda, possuindo a finalidade de julgar recursos de ofício e voluntário de decisão de primeira instância, assim como os recursos de natureza especial que versem sobre a aplicação da legislação referente a tributos administrados pela SRB2. Dito isso, a interposição de recurso voluntário, ou recurso de ofício, inaugura a segunda fase recursal do processo administrativo fiscal (encontrando-se a primeira fase com as Delegacias de Julgamentos, e, a terceira fase com a Câmara Superior de Recursos Fiscais), a qual compete o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, estrutura que sucedeu os antigos Conselhos de Contribuintes – CC, e a Câmara Superior de Recursos Fiscal – CSRF. Os recursos são apreciados em uma das três Seções de Julgamento do CARF, compostas por Câmaras, por sua vez, dividas em Turmas, com competências específicas para julgamento em razão da matéria, como aduz os artigos 21, 22 e 23 do Regimento Interno do CARF, aprovado pela Portaria MF n. 256, de 22.06.2009: Art. 21. As Seções são compostas, cada uma, por 4 (quatro) Câmaras. Art. 22. As Câmaras poderão ser divididas em até 2 (duas) Turmas de julgamento. Art. 23. As Turmasde Julgamento são integradas por 8 (oito) conselheiros, sendo 4 (quatro). Cabe elencar as palavras de Hamilton Fernandes, no que diz respeito a recepção do processo pelo CARF, sintetizando o tramite: O processo é recebido por intermédio do recurso voluntário ou de ofício e distribuídos para um membro do Conselho, que é o relator, que deverá apresentar um voto circunstanciado sobre o processo. O processo continua sua tramitação com a inclusão em pauta para julgamento, realizada em sessão e logo em seguida os demais membros votam, decidindo, órgão colegiado e há a decisão, que é o acórdão. Obviamente já respeito às defesas e considerações com a oportunidade de manifestação o Relator, o interessado ou seu representante e o Procurador da Fazenda Nacional, na 2 Art. 1° do RICARF. BRASIL. Portaria MF n. 30, de 25 de fevereiro de 2005. Aprova o Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/imprimir.action?visao=anotado&idAto=379 65&t>. Acesso em: 16 nov. 2018. sessão podem os membros pedir vista ao processo, postergando os votos dos demais membros, havendo dúvidas é o momento de pedir diligências ou perícias. Ocorre que, por se tratar de órgão paritário, há com certa frequência empate no julgamento, à vista disso, conforme o art. 25, § 9°, do PAF e do art. 54 do Regimento Interno do CARF (RICARF), caberá “ao Presidente, além do voto ordinário, o de qualidade”. Confira-se: Art. 25, § 9° Os cargos de Presidente das Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, das câmaras, das suas turmas e das turmas especiais serão ocupados por conselheiros representantes da Fazenda Nacional, que, em caso de empate, terão o voto de qualidade, e os cargos de Vice- Presidente, por representantes dos contribuintes. Art. 54. As turmas só deliberarão quando presente a maioria de seus membros, e suas deliberações serão tomadas por maioria simples, cabendo ao presidente, além do voto ordinário, o de qualidade. Dentre os Conselheiros representantes da Fazenda Nacional que a compõem (art. 14, § 3°, do RICARF), designa-se o Presidente da Turma de Julgamento; em segunda instância, ao contrário do que ocorre nas DRJ, mediante publicação no Diário Oficial da União, as sessões são públicas e informadas com antecedência, não podendo decidir de maneira mais gravosa ao recorrente o órgão de segunda instância (salvo se em apreciação de recurso de ofício), a denominada reformatio in pejus. O autor Sérgio André Rocha3, quando se manifestou a respeito do tema, argumentou que: se o órgão julgador de segunda instância perceber que a decisão proferida pelo agente a quo não há de se compatibilizar com os regramentos legais, tem o órgão não só o direito, mas a obrigação de reformar a decisão antes proferida, haja vista que sua função não é proteger os interesses particulares, e sim os fins públicos materializados na realização prática da legalidade. Com visão contrária, o autor Alberto Xavier terce seus argumentos: A função subjetiva ou garantística da impugnação impede que os poderes de cognição e decisão do órgão de julgamento vão ultra petita no sentido de que uma reformatio in pejus, ou seja, que o ato jurídico de lançamento seja anulado e substituído por outro mais desfavorável ao impugnante que o próprio ato impugnado. E isto ainda que o órgão de julgamento tenha poderes 3 ROCHA, Sergio André. Processo administrativo fiscal: controle administrativo do lançamento tributário. 4. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010, p. 234. de órgão de lançamento. Em defesa da reformatio in pejus pode dizer-se que ela é um corolário lógico do princípio da legalidade. Se o lançamento é um ato estritamente vinculado e se o órgão de julgamento reconhece que ele violou a lei, deve restaurar a legalidade ofendida praticando ou mandando praticar um novo ato conforme à lei, sendo irrelevante se esse novo ato é mais ou menos favorável para o particular. De harmonia com esta doutrina, no tocante aos atos vinculados (como é o caso do lançamento tributário) a reformatio in pejus é não só admissível, como juridicamente obrigatória. Entendemos, porém, que os princípios constitucionais da legalidade e da verdade material devem ceder o passo à regra, igualmente constitucional, que concebe o direito de impugnar os atos do Poder Público como “garantia” do cidadão, regra essa que conduz a uma “visão subjetiva da legalidade”.4 A partir da decisão proferida pelo colegiado do CARF, sob o art. 64 do RICARF, possibilita-se oposição de embargos de declaração; interposição de recurso de divergência entre decisões de Câmaras, submetida à Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF); e agravo em face do despacho que negar seguimento, total ou parcial, ao recurso especial. Ao ser submetida a matéria ao exame da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) será publicada, novamente, no Diário Oficial da União, a data da sessão de julgamento. A CSRF, de acordo com o art. 25 do PAF e do art. 26 do RICARF, é composta pelo Presidente e Vice-Presidente do CARF e pelos Presidentes e Vice-Presidentes das Câmaras da respectiva sessão, observando-se ao mesmo procedimento no caso de empate do julgamento, ou seja, caberá ao Presidente do CARF, representante da Fazenda Nacional, o voto de “qualidade”. A decisão da CSRF é final, e encerra o processo administrativo fiscal; dela não cabendo recurso, ou até mesmo pedido de reconsideração (art. 42 do PAF); possibilita o contribuinte submeter a decisão ao exame do Poder Judiciário, porque apesar das decisões do CARF serem terminativas na seara administrativa, essa não terá atributo de coisa julgada, pois em nosso sistema constitucional, é privativo das decisões do Poder Judiciário.5 Ainda sobre as decisões “definitivas” ou “terminativas”, no âmbito do processo administrativo, é oportuno expor o seguinte acórdão do antigo Conselho de Contribuintes, citado por Gilson Wessler Michels: 4 XAVIER, Alberto. Princípios do processo administrativo e judicial tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 172. 5 NEDER, Marcus Vinícius; LOPEZ, Maria Teresa Martinez. Processo administrativo fiscal federal comentado: de acordo com a Lei n° 11.941, de 2009 e o regimento interno do CARF. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2004, p. 407. DECISÃO ADMINISTRATIVA - CONSELHO DE CONTRIBUINTES - Apesar de serem terminativas, na esfera administrativa, em relação às questões decididas, as decisões do CC não têm atributos de coisa julgada, que são, em nosso sistema constitucional, privativos das decisões do Poder Judiciário. São, em sua natureza, um ato administrativo a que é conferido atributo especial, qual seja o de terminar, na esfera administrativa e em relação à Administração, os litígios entre esta e os contribuintes. O caráter terminativo de tais decisões administrativas, por não possuírem os atributos da coisa julgada, só pode ser definido em relação ao mérito das questões apreciadas, não envolvendo a apreciação delas mesmas enquanto atos administrativos, sendo perfeitamente aceitável a discussão da validade de tais decisões, em si pela Administração, sem que disto decorra violação do princípio estabelecido de sua terminatividade, visto que esta se define não em relação à decisão, em si, formalmente considerada, mas em relação a uma solução de mérito tomada validamente pelo órgão próprio. É princípio pacificamente aceito o da revogabilidade dos atos administrativos nulos, entreos quais se situam os praticados contra disposição de lei. Se, por um lado, não se pode considerar ‘contrário’ à lei um ato deste Conselho que a interprete, pois interpretar a lei dentro de critério de sua livre formulação é prerrogativa inerente à sua atividade julgadora, devesse, por outro lado, considerar contrário a lei um ato que leve o Conselho a conhecer e pronunciar-se sobre determinado litígio, quando a lei dispõe que não lhe era permitido fazê-lo. (2.º CC, Acórdão n.º 51.648, de 16/04/1969, unânime, rel. Cons. Almeida Velloso) Cabe a observação de que se a decisão pelas turmas do CARF ou sua CSRF for favorável ao contribuinte, eximindo-o do pagamento do tributo e dos desdobramentos legais, demandará a impossibilidade de interposição de eventual recurso com vistas ao Poder Judiciário; do mesmo modo, caso a decisão, ainda que final, inutilize o lançamento por vicio de competência, formalização ou de procedimento, a exigência pode ser retomada com a edição de outro ato, com conteúdo idêntico, observando-se os requisitos dispostos em lei, em razão de que a decisão não foi proferida quanto ao mérito da exigência, mas sim, sobre questão preliminar do ato.6 Diante dessa hipótese, observando-se o art. 173 do CTN, o prazo decadencial para a Fazenda constituir o crédito tributário é iniciado na data da ‘definitividade’ da decisão que houver anulado, por virtude de vício formal, o lançamento efetuado anteriormente. Findo o processo administrativo fiscal federal, encaminha-se à repartição arrecadadora da SRFB para que o contribuinte seja exonerado da obrigação de pagar o tributo ou para que haja a apuração do montante atualizado da dívida 6 NEDER, Marcus Vinícius; LOPEZ, Maria Teresa Martinez. Processo administrativo fiscal federal comentado: de acordo com a Lei n° 11.941, de 2009 e o regimento interno do CARF. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2004, p. 413. tributária e, assim, efetue a cobrança amigável do crédito tributário através de aviso ou notificação ao devedor para a liquidação do débito, sem os encargos pertencentes ao executivo fiscal, no prazo de 30 dias. Não efetuando o contribuinte o pagamento ou parcelamento, terá ele seu débito inscrito em dívida ativa da União com cobrança por via judicial; ajuizamento de ação de execução fiscal pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional - PGFN, como nos termos do artigo 43 do PAF e do artigo 2°, § 3°, da Lei n. 6.830/1980. 3. O nebuloso Voto de Qualidade do CARF No do processo administrativo fiscal, conforme salienta-se em âmbito de discursões e estudos, o princípio da legalidade nitidamente é observado no caput do art. 37 da Constituição Federal, assim como no inciso I, do parágrafo único do art. 2º da Lei n. 9.784/99, o qual regimenta o processo administrativo federal. Acerca dos dispositivos mencionados, confere-se: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...] Art. 2°. A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de: I - atuação conforme a lei e o Direito; [...] Observa-se aqui, portanto, o intuito na proteção do contribuinte, conta as exações tributárias, o princípio da legalidade, porque em respeito ao Estado de Direito; comportando outros princípios como o da segurança jurídica e da certeza de direito, todos previstos na lei e na atual constituição brasileira. Logo, os Presidentes da CSRF e das turmas do CARF ao proferirem o voto de qualidade, disposto no artigo 54 do RICARF, muitas vezes, violam o princípio da legalidade mencionado acima, incorrendo-os em afronta a segurança jurídica e da certeza do direito, isso sob o teto da doutrina clássica de Paulo de Barros Carvalho. Como dito anteriormente, por corresponder a um órgão colegiado, integrante do Ministério da Fazenda, o CARF possui a finalidade de julgamento dos recursos de ofício e voluntário de decisão de primeira instância, como também dos recursos de natureza especial acerca da aplicação de legislação atinente a tributos capitaneados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB). Comumente ocorre empate no julgamento, ficando o voto de qualidade a cargo do Presidente das turmas ordinárias e da Câmara Superior de Recursos Fiscais, esse, representante da Fazenda Nacional, como observa-se nos artigos 25, § 9º, do PAF, e 54 do Regimento Interno do CARF. Originário da mitologia greco-romana, o voto de qualidade ou voto de minerva advém de um episódio mitológico, o qual envolveu a deusa Atena, ou Minerva (como era conhecida pelos romanos), ao presidir um julgamento há época. Para agregar mais conhecimento, no que tange a origem do voto, é valido observar o registro de Fernando Facury Scaff: Na Grécia Clássica este tipo de preocupação já estava presente, como se pode ver na peça Eumênides, de Ésquilo, representada pela primeira vez 458 anos antes de Cristo. Nesta peça de teatro, Orestes é perseguido pelas Fúrias por ter matado sua mãe (Clitemnestra), a qual havia matado seu marido e pai de Orestes (Agamênon). Orestes é réu confesso, mas pede absolvição por ter agido para vingar a morte de seu pai, cometida pela mãe. Levado à presença de Minerva, deusa da sabedoria, ela cria e convoca um tribunal de 500 pessoas (Aerópago) dentre os habitantes da cidade de Atenas para julgar o acusado, e menciona “Serei a última a pronunciar o voto, e o somarei aos favoráveis a Orestes. Para que este vença, basta que os votos se dividam igualmente”. Não precisa ser nenhum oráculo para adivinhar que este julgamento acabou empatado e voto da deusa Minerva foi pela absolvição do acusado. Surge daí a expressão “voto de Minerva” que é a regra usada nos órgãos colegiados para decidir um processo em caso de empate e que no Brasil foi assumida pela legislação com o nome de “voto de qualidade”.7 Diferentemente do mencionado acima, no plano do CARF, o Presidente da turma ordinária ou da CSRF não possui o “voto de qualidade”, mas, entende- se aqui como uma espécie de voto duplo, em virtude de que além do voto ordinário, possui o voto extraordinário, hipertrofiando uma só pessoa; obtém-se como resultado: a posição de “superjulgador”; viola-se o princípio da segurança jurídica que, relacionado ao direito tributário, é empregado como alicerce da relação jurídica entre o Fisco e contribuinte; e, ainda de acordo com Scaff8, “o voto de qualidade (ou de Minerva), puro e simples, se refere ao voto de desempate; quando tal conceito é transladado para o CARF ele muda sua 7 SCAFF, Fernando Facury. In dubio pro contribuinte e o voto de qualidade nos julgamentos administrativo-tributário. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 220, p. 21. 8 Ibidem. p. 27. conotação e passa a ser um voto duplo.”, o que nos termos do artigo 112, I, CTN deverá ser in dubio pro contribuinte. Em suma, ante ao exposto aqui, mesmo de maneira genérica, finaliza-se a presente produção importando expor que tal questão repousa no STF pendente de análise, haja vista que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB ajuizou Ação Direita de Inconstitucionalidade com pedidode medida cautelar (ADI 5.731), em 30.06.2017, para elucidação da expressão “em caso de empate, terão voto de qualidade”9 disposta no artigo 25, § 9, do Decreto 70.235/72. Argumenta-se a existência de ofensa aos princípios constitucionais da isonomia, da razoabilidade e da proporcionalidade uma vez que o dispositivo impugnado atribui ao Presidente “a prerrogativa de proferir, além do voto ordinário, o voto de qualidade”; e ao Conselheiro Presidente representante do Fisco, imparcialidade ao litígio, servindo aos interesses da Fazenda Nacional. Declara-se também que, incorrendo empate no julgamento, prevalecerá o princípio in dubio pro contribuinte, conforme artigo 112, do CTN. Distribuiu-se, e quedou o processo com o Ministro Gilmar Mendes. O relator, em 22.06.2017, aplicou ao caso o rito abreviado previsto no artigo 12 da Lei 9.868/1999, no intuito de que a ação fosse julgada em definitividade pelo Plenário, sem a análise do pedido de liminar. Mesmo adstrito essa produção pela ilegitimidade e, consequentemente, pela inconstitucionalidade do voto de qualidade no âmbito do CARF, aguarda-se a decisão do STF, com efeito erga omnes, vinculante e ex tunc; exceto o caso de o Tribunal, entender por limitar os efeitos de sua decisão, como observa os artigos 27 e 28, parágrafo único, da Lei n. 9.868/99. 9 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade. ADI 5731/DF. Impetrante: Ordem dos Advogados do Brasil Conselho Federal. Relator (a): Min. Gilmar Mendes. Brasília, 20 de junho de 2017. Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5212726>. Acesso em: 19 nov. 2018. 4. Conclusões Ao final da presente produção acadêmica, resta evidente que o tema trabalhado, o voto duplo do CARF, será ainda objeto de debates pela comunidade jurídica no que diz respeito ao amparo constitucional do instituto; prova disso, é a questão permanecer em apuração pelo Supremo Tribunal Federal, com o julgamento da ADI 5.731/DF. Entretanto, aqui, manifesta-se o entendimento de que privilegiar um único indivíduo com dois votos, este sediado a um órgão julgador, há que se falar em violação da ordem constitucional, haja vista que ao hipertrofiar esse indivíduo, ensejará na criação de um superjulgador. Logo, sugere-se mudanças na composição do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, seguindo a compostura do Tribunal Administrativo de Recursos Fiscais - TARF, órgão ligado à Secretaria da Fazenda, do Distrito Federal, cuja função é julgar em segunda instância administrativa os processos tributários. No TARF, as decisões são tomadas por maioria de votos, cabendo ao presidente o voto de qualidade como disposto no artigo 6º, § 5°, do Regimento Interno. Não se enxerga, portanto, violação da ordem constitucional, uma vez que o Presidente só votará quando não houver deliberação pela maioria; não havendo duplicidade do voto. Por fim, em síntese, o voto de qualidade quando no adstrito no TARF, possui significado original do voto de minerva (com história originária supramencionada) no sentido de que incorrendo empate, o indivíduo que preside apenas proferirá voto único; e diferindo-se da sistemática do CARF, pois, cujo presidente dispõe de voto ordinário e extraordinário. Do contrário, permanecendo a sistemática atual de composição do CARF, sugere-se ainda que, na ocorrência de empate dos votos no julgamento, por interpretação teleológica, o voto de qualidade deverá ser favorável ao sujeito que figurar o polo passivo, com observação do artigo 112 do CTN. 5. Referências Art. 1° do RICARF. BRASIL. Portaria MF n. 30, de 25 de fevereiro de 2005. Aprova o Regimento Interno da Secretaria da Receita Federal. Disponível em: <http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/imprimir.action?visao=anot ado&idAto=37965&t>. Acesso em: 16 nov. 2018. BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade. ADI 5731/DF. Impetrante: Ordem dos Advogados do Brasil Conselho Federal. Relator (a): Min. Gilmar Mendes. Brasília, 20 de junho de 2017. Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5212726>. Acesso em: 19 nov. 2018. CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2013. NEDER, Marcus Vinícius; LOPEZ, Maria Teresa Martinez. Processo administrativo fiscal federal comentado: de acordo com a Lei n° 11.941, de 2009 e o regimento interno do CARF. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2004. ROCHA, Sergio André. Processo administrativo fiscal: controle administrativo do lançamento tributário. 4. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010. SCAFF, Fernando Facury. In dubio pro contribuinte e o voto de qualidade nos julgamentos administrativo-tributário. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 220. XAVIER, Alberto. Princípios do processo administrativo e judicial tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2005.
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