Buscar

Processo Civil - Coisa Julgada

Prévia do material em texto

1 
 
TEXTO 13 
 
COISA JULGADA 
 
 
 
1. EFEITOS DA SENTENÇA E AUTORIDADE DA COISA JULGADA 
 
A coisa julgada é uma especial qualidade que imuniza os efeitos substanciais da sentença, a 
bem da estabilidade da tutela jurisdicional1. Embora Chiovenda tenha lançado originariamente 
esta base teórica sobre o assunto, ao considerar que a coisa julgada é obrigatória para os sujeitos da 
relação processual, enquanto a sentença existe e vale com respeito a todos, foi Liebman quem 
identificou com precisão a diferença entre a eficácia da sentença e autoridade da coisa julgada2. 
Enquanto a coisa julgada corresponde à eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença, 
em relação às partes que integram a relação jurídico-processual, sem prejudicar nem beneficiar 
terceiros, os efeitos da sentença (condenatórios, constitutivos ou meramente declaratórios) 
correspondem às alterações que esta decisão judicial produz na realidade jurídica, podendo ocorrer 
antes do trânsito em julgado, sem o manto da imutabilidade, e beneficiar ou prejudicar terceiros 
(daí porque se admite a assistência litisconsorcial, o recurso de terceiro e ação rescisória do 
terceiro prejudicado). 
Assim, todos são afetados pelos efeitos da sentença, até porque as relações jurídicas não 
existem isoladamente no plano da realidade, mas a própria ordem constitucional rejeita que 
aqueles que não participaram do processo fiquem vinculados à imutabilidade da coisa julgada lá 
produzida (princípios do devido processo legal, ampla defesa e contraditório). 
A coisa julgada pode ser MATERIAL (quando se projeta para fora do processo) ou 
FORMAL (imutabilidade da sentença em si mesmo – efeito endoprocessual que põe fim à relação 
processual)3. Representa uma opção política do legislador, que visa a conciliar os princípios da 
celeridade e segurança, certeza e justiça das decisões, buscando um equilíbrio entre estes vetores 
muitas vezes contrapostos. Sua previsão constitucional está no art. 5º, XXXVI e infraconstitucional 
no art. 467 e ss do CPC. 
 
 
2. EFICÁCIA PRECLUSIVA DA COISA JULGADA: 
 
Ao prever os efeitos preclusivos da coisa julgada, o art. 474 do CPC determina que passada em 
julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a 
parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido. 
Para Rodolfo Mancuso, a técnica da eficácia preclusiva acolhida por este dispositivo legal 
opera como uma válvula de segurança do sistema, de modo a imunizar as questões deduzidas e 
deduzíveis, mas desde que atinentes ao núcleo do thema decidendum, isto é, ao preciso objeto 
litigioso, técnica que lembra o collateral estoppel, das class actions do direito norte-americano, pelo 
qual consideram-se incluídos no julgado os necessary steps, ou seja, as premissas necessárias à 
conclusão4. 
 
1
 DINAMARCO, Cândido Rangel. Relativizar a coisa julgada material. In Nova era do Processo Civil, São Paulo: 
Malheiros editores, 2004, p. 217. 
2
 LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa julgada. Trad. Alfredo 
Buzaid e Benvindo Aires e Notas relativas ao direito brasileiro de Ada Pellegrini. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 113. 
3
 DINAMARCO, Relativizar cit., p. 221-222. 
4
 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Jurisdição Coletiva e Coisa Julgada: teoria geral das ações coletivas. São Paulo: 
RT, 2006, pp. 29,236. Sobre a possibilidade de emprego do collateral estoppel por terceiro, que não foi parte no processo, mas 
2 
 
Barbosa Moreira entende que há uma relação de instrumentalidade entre os limites objetivos 
da coisa julgada e a sua eficácia preclusiva, pois enquanto os limites objetivos geram a 
imutabilidade do julgado, no que tange à parte dispositiva, a eficácia preclusiva consiste no 
impedimento que surge à discussão e apreciação de questões suscetíveis de influir neste julgado, 
cobrindo o deduzido e dedutível. Assim, pode suceder que, de fato, não tenham sido 
exaustivamente consideradas, no processo, as questões que poderiam influir na decisão, sendo 
vedado que depois de findo o processo se viesse a pôr em dúvida o resultado atingido, acenando-se 
com tal ou qual questão que haja ficado na sombra e que, porventura trazida à luz, teria sido capaz 
de levar o órgão judicial à conclusão diferente da corporificada na sentença (ressalvados os casos 
restritos de rescindibilidade do julgado) 5. 
O expediente técnico a que se recorre é considerar implicitamente decididas pela sentença 
que transitou em julgado todas as questões, ainda que não apreciadas, cuja solução se devesse 
reputar idônea para influir no conteúdo do pronunciamento judicial. Trata-se de uma ficção, que 
não pode estender às questões a autoridade da coisa julgada (não estão imunes à rediscussão em 
outro processo), já que assim não ocorre nem mesmo entre as questões efetivamente apreciadas (a 
motivação da decisão não faz coisa julgada). Portanto, nem às questões deduzidas nem às 
dedutíveis se estende a auctoritas rei iudicatae, mas todas se submetem à eficácia preclusiva da 
coisa julgada, para que não venham ser utilizadas como instrumento de ataque ao julgado6. 
 
 
3. RELATIVIZAÇÃO DA COISA JULGADA - COISA JULGADA REBUS SIC 
STANTIBUS – TEORIA DA IMPREVISÃO 
 
Por fim, uma questão interessante se coloca: a coisa julgada gera imutabilidade absoluta ou 
relativa? Há possibilidades excepcionais de reabertura da discussão (relativização da coisa julgada), 
quando estão em jogo outros princípios e garantias constitucionais, dentre elas a garantia de acesso 
à justiça (CF, art. 5º, XXXV). “Não é legítimo eternizar injustiças a pretexto de se evitar a eternização 
de incertezas7”. 
Um dos casos mais comuns em que esta questão se coloca é o do advento de coisa julgada 
sobre reconhecimento de filiação antes do surgimento do teste de DNA, sendo posteriormente 
realizado o exame e descoberta a ausência de vínculo genético. Caso tenha transcorrido o prazo da 
rescisória, é possível se anular a relação de paternidade comprovadamente inexistente? 
Há quem defenda a propositura de ação declaratória de inexistência de coisa julgada, 
imprescritível, para promover a coincidência entre a verdade formal e a verdade real. Barbosa 
Moreira, por sua vez, acredita que seria interessante uma alteração legislativa neste caso para 
estabelecer como termo inicial do prazo da rescisória o dia em que o interessado obtém o laudo de 
DNA, ao invés do trânsito em julgado da sentença rescidenda8. 
 
 
Bibliografia Obrigatória 
 DINAMARCO, Cândido Rangel. Relativizar a coisa julgada material. In Nova era do processo 
civil. 2ª ed. pp. 217-225; 257-270 (22p). 
 
Bibliografia Complementar 
 
detém relação jurídica conexa à que foi decidida, vide TUCCI, José Rogério Cruz e. Limites subjetivos da eficácia da 
sentença e da coisa julgada civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, pp. 141-151. 
5
 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A eficácia preclusiva da coisa julgada material no sistema do processo civil 
brasileiro. Temas de Direito Processual. 1ª série, São Paulo: Saraiva, 1977, pp. 98-103. 
6
 BARBOSA MOREIRA, 1977, A eficácia preclusiva cit., pp. 98-103. 
7
 DINAMARCO, Relativizar a coisa julgada cit., p. 224. 
8
 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Considerações sobre a chamada ‘relativização’ da coisa julgada material, IN Temas 
de Direito Processual. 9ª série.São Paulo: Saraiva, 2007, pp. 264-265. 
3 
 
 
 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Considerações sobre a chamada ‘relativização’ da coisa 
julgada material. IN Temas de Direito Processual. 9ª série.São Paulo: Saraiva, 2007, pp. 235-265. 
 
 LIEBMAN, Enrico Tullio. Eficácia e autoridade da sentença e outros escritos sobre a coisa 
julgada. Trad. Alfredo Buzaid e Benvindo Aires e Notas relativas ao direito brasileiro de Ada 
Pellegrini. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

Continue navegando